“Tenho suficiente experiência como gestor para governar o Tocantins”
18 novembro 2017 às 11h37
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Ex-juiz Marlon Reis afirma que não vai desistir do projeto político de oferecer ao eleitorado tocantinense uma opção diferente em termos éticos e administrativos
Tocantinense de Pedro Afonso, graduado em direito pela Universidade Federal do Maranhão, Marlon Reis exerceu a magistratura por 20 anos naquele Estado. Requereu exoneração e atualmente exerce a advocacia e é pré-candidato a governador do Estado do Tocantins pela Rede Sustentabilidade.
Reis é um dos idealizadores e redatores da Lei da Ficha Limpa, que impede a participação eleitoral de candidatos que tenham sofrido condenações criminais em âmbito colegiado. A lei, fruto de uma iniciativa popular, foi aprovada após a coleta de 1,6 milhão de assinaturas e a mobilização de outros milhões de brasileiros. A lei já barrou mais de 1.200 candidatos em todo o Brasil.
Recentemente, o sr. ingressou na política partidária formal. Por quais razões escolheu o partido Rede?
Foram várias, mas em suma, o fato de não haver pessoas envolvidas em corrupção ou operações da Polícia Federal, nessa sigla partidária. Isso é muito importante para mim, uma vez que, caso me filiasse a um partido que possuísse membros com tais envolvimentos, estaria contrariando minha própria biografia. Por outro lado, a Rede tem premissas com as quais eu concordo, que não admitem extremismos e trabalham com ideias lógicas e elementares: sustentabilidade, gestão técnica e ética, além de atenção às necessidades sociais básicas. Ao contrário do que muitos pensam, inclusive os produtores rurais, a sustentabilidade é amiga do negócio, uma vez que não há empreendimento não sustentável. Esses elementos de uma lógica, que considero amadurecida ao longo tempo, estão presentes no discurso da Rede Sustentabilidade.
Filiado, pode disputar mandato eleitoral. Quais são os seus planos nesse sentido?
Ao deixar a magistratura [em 2016], passei a receber o assédio de pessoas e lideranças, dos Estados do Maranhão e do Tocantins, que me convocavam a me engajar na política. Voltei para o Tocantins, era o momento do regresso para minha origem. Percebi um quadro, que obviamente eu já conhecia por ser tocantinense, de degradação na política tradicional. Aliado a isso, taxas muito altas de reprovação e rejeição de mecanismos ou modelos de fazer política. Há uma nova tendência para mudanças e depois de uma profunda análise, troca de ideias com os mais diversos matizes reflexivos, além de consultar pessoas da minha confiança, decidi que vou apresentar meu nome para disputa do governo do Estado do Tocantins. Sou pré-candidato.
Nas últimas eleições municipais, houve um certo burburinho, quando se especulou a hipótese do procurador da República Mário Lúcio Avelar, também egresso do Judiciário, se candidatar ao cargo de prefeito de Palmas. A população viu na pessoa dele, a reflexão da ética e da moral e por isso, muitos simpatizantes se manifestaram. Há, definitivamente, esse anseio por parte da comunidade, não apenas do Tocantins, por novos nomes na política?
Primeiramente, é necessário que elas tenham essa opção, e isso não é uma característica das últimas eleições no Tocantins ou no Brasil. Não há opção de um nome fora da política tradicional que traga a mensagem de uma gestão séria. Conheço o Mário Lúcio e sei que ele é de uma integridade fantástica e não sei quais foram as razões que o levaram a desistir de concorrer. O que eu sei é que eu não vou desistir de concorrer nas próximas eleições de 2018.
Imagino que no próximo pleito, surgirão muitos nomes e, por consequência, eleição de várias pessoas que hoje estão desvinculadas da política, das mais diversas ideologias. A sociedade civil está em busca de seriedade, comprometimento, histórico determinado pelas biografias e está cansada dos antigos modelos baseados na compra de votos e no clientelismo que vem esgotando a cada dia. Isso gera a falência do Estado, deve ser extinto. Posso afirmar que o número de pessoas que percebem isso na sociedade é muito grande, uma vez que tenho conversado com pessoas dos mais diversos segmentos. O que tenho ouvido é: não se alie com pessoas que tenham essas práticas.
E como serão, então, essas alianças?
Defini três critérios: Não me aliarei a ninguém que esteja próximo às proibições impostas pela Lei da Ficha Limpa. Também estarei afastado de todos aqueles que pregam o extremismo, que pregam o ódio na política. Por fim, não me aliarei àqueles que tenham contribuído para que o Estado do Tocantins chegasse ao calamitoso ponto que está hoje, ou seja, àqueles que tenham um dia governado o Estado.
O sr. jamais disputou uma eleição, não havendo essa espécie de termômetro das urnas. Contudo, no Tocantins há exemplos dicotômicos de pessoas que disputaram o primeiro pleito, em voos solitários: o suplente de senador, Ataídes Oliveira – hoje no exercício do cargo – que disputou o governo do Estado, cuja performance pode ser considera como pífia, e o atual prefeito de Palmas, Amastha, que em 2012 se apresentou como a nova alternativa e foi eleito com uma expressiva votação. O sr. também, pelas próprias circunstâncias já abordadas, certamente caminhará sozinho. Qual a sua perspectiva em relação ao fato de não estar atrelado a nenhum grupo político?
Tenho convicção que as eleições de 2018 serão um marco, o ingresso efetivo na política de pessoas e setores que foram muito pouco ouvidas até agora, como por exemplo, a juventude. Hoje no Tocantins, esse segmento não se sente minimamente representada por esses nomes que estão aí. Outros segmentos, que estão interconectados pela tecnologia, que recebem as informações mais prontamente, também têm o mesmo sentimento. Houve uma explosão, um significativo aumento do número de smartphones vendidos no Brasil de 2014 para cá e isso é um fator que não pode ser desprezado, vez que é uma ferramenta poderosíssima de transformação.
Não vou me aliar com a velha política, em que cada qual comanda seu “feudo”, mas sim com muitas pessoas e segmentos sociais, através do contato corporal ou pela internet, pelas redes sociais, etc. O objetivo é ultrapassar a barreira dos líderes e dialogar diretamente com a comunidade, pessoal ou virtualmente, conseguindo assim expor minhas ideias e convicções. Esse universo mais complexo e plural – composto por pessoas mais preparadas intelectualmente – é que deve ser mobilizado para vencer a eleição.
Outro aspecto que merece ser abordado é o fato do país viver um verdadeiro parlamentarismo, travestido de presidencialismo. O parlamento é que define os destinos do País, do Estado ou do município. Como o sr. pretende enfrentar essa questão, na medida em que essa prática é recorrente, também, no Tocantins, e o seu grupo político estará reduzido face à “peneira” que pretende implantar?
Essa é uma dentre as matérias as quais, curiosamente, eu tenho mais experiência. Passei duas décadas dentro do Congresso Nacional, lutando por leis. A lei da lei da Ficha Limpa é apenas um exemplo, mas eu poderia citar várias outras, como a lei contra a compra de votos, inclusive a cassação como punição para pessoas que ameaçam ou constrangem eleitores. Além desta, a forma atual que revela o nome dos doadores ainda durante a campanha e não apenas no final, foi idealizada por mim. Também participei de todas as etapas, no Supremo Tribunal Federal (STF) e no Congresso Nacional da elaboração da norma que proíbe doações empresariais. Por tal razão, adquiri profunda experiência em lidar com blocos parlamentares e líderes, a construção de consensos, utilização das “armas” das minorias no parlamento, etc. Vou trazer toda essa experiência para o Estado do Tocantins, salientando, por fim, que tenho grande respeito pelo parlamento, que considero o ápice da democracia.
Pelo jeito, o sr. quer promover um verdadeiro choque de gestão.
Na verdade, não me preocupo em fazer comparações porque o que eu proponho é tão distante do que acontece hoje e das preocupações dos atuais governantes, que é impossível traçar parâmetros. Embora nunca tenha sido eleito, sou pós-graduado em gestão pública, possuo doutorado em gestão política e utilizei muitos mecanismos de gestão quando ainda fazia parte do poder judiciário, nas minhas atividades como magistrado. Fui juiz auxiliar da presidência do TSE e ajudei a administrar a Justiça Eleitoral do país inteiro.
Tenho, portanto, experiência em gestão e, também, conexões com pessoas que pensam de forma extremamente moderna. Pretendo trazer para cá, o mais simples, um modelo de gestão eficiente em que não se gaste mais do que se arrecada, levando-se em consideração os limites orçamentários e, ainda, da Lei de Responsabilidade Fiscal.
Há mecanismos que não exigem, sequer, verbas para implantar, como por exemplo, os arranjos produtivos, através da capacidade que o Estado possui de conectar os investidores e comunidades locais com vocações econômicas. Projetos que não são difíceis de concretizar. O bom trânsito internacional também traz bons frutos, mas esses investidores só virão para o Tocantins se tiverem segurança jurídica, confiarem no governo, que deve possuir credibilidade. Eles têm medo da corrupção, da má gestão, do surgimento de barreiras e outros entraves.
Quanto ao projeto de transposição das águas do Rio Tocantins para a bacia do Rio São Francisco, qual a sua visão acerca do tema?
Sou totalmente contra, temos que preservar os nossos recursos. O São Francisco foi virtualmente destruído por vários projetos irresponsáveis. O futuro dele passa pela recuperação das suas nascentes e matas ciliares. Não há razões para implantar projetos temerários também no Rio Tocantins que, este ano, já enfrentou uma seca inimaginável. Esse recurso hídrico não é inesgotável nem tampouco renovável e a ideia de ceder águas para aquela bacia é inexequível.
Temos que pensar nas futuras gerações e não podemos ser lembrados como a geração que iniciou a destruição dos cursos d’água e, também, da espécie humana. Os nossos passos devem ser pensados com muita responsabilidade.
No que concerne ao seu histórico, um tanto quanto peculiar, uma vez que o sr. pediu exoneração da magistratura – carreira que é um sonho de vários operadores do direito – para se dedicar à advocacia e à política, qual é o seu sentimento após tal decisão?
Fiz o curso de direito pensando em advogar. Ocorre que as dificuldades iniciais me fizeram refletir que um período dentro de uma instituição, como a magistratura, poderia me proporcionar experiência e até mesmo reunir as economias necessárias para um dia voltar para a advocacia.
O plano original era permanecer por apenas 5 anos na magistratura, porém, eu fiquei 20. Isso foi ótimo para mim, jamais vou esquecer tudo que por lá aprendi, especialmente a busca incessante pelo diálogo, pelo consenso. Além disso, sem a estabilidade da magistratura, eu não teria oportunidade de participar de projetos de longo prazo, como por exemplo, a conquista da Lei da Ficha Limpa, me proporcionando salvaguarda e até mesmo proteção, para lidar com temas extremamente difíceis.
Decorrido esse tempo, voltei a exercer a advocacia com base em Brasília, com extensão em mais de dez Estados, visto que é, verdadeiramente, uma profissão que eu amo. Meu trabalho está focado na assessoria jurídica junto aos Tribunais Superiores. Uma pessoa que tem o espírito de luta como eu, é mais adequado estar do lado de cá do balcão, lutando pelo direito das pessoas, do que esperar que alguém levasse demandas para que eu apresentasse soluções.
Não há dúvidas que o expoente de sua carreira foi a participação ativa no projeto que criou a Ficha Limpa. Como foi essa experiência?
Participei da fundação, em 2002, do Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral, uma rede organizada pela sociedade civil, voltada para a luta por eleições mais justas, mais livres, mais baratas, mais éticas. No seu nascedouro, o movimento arregimentou cinco organizações. Ao final de cinco anos, já era composto por 54 organizações nacionais, entre as quais a OAB, CNBB e outras de grande porte.
Em 2007, fui convocado a capitanear um movimento que visava transformar a legislação brasileira no que se referia a inelegibilidades. Iniciamos o projeto, elaborando coletivamente as linhas norteadoras e tive, inclusive, a sorte de idealizar até o nome do movimento, que traduzia a essência do que buscávamos: Projeto Ficha Limpa.
Percorremos todo o Brasil, articulando e estimulando as organizações sociais e pessoas a coletar assinaturas e após isso, partimos para o convencimento do Congresso Nacional. À época, utilizei períodos acumulados de férias para permanecer em Brasília acompanhando o dia a dia da tramitação, conversando com cada um dos parlamentares, juntamente com outros ativistas e voluntários. Creio que a aprovação do projeto só ocorreu em função da pressão popular, uma vez que era o anseio da própria sociedade. A escolha por apresentar o projeto por iniciativa popular, ao invés da forma tradicional no parlamento, por intermédio de um deputado, deu força à causa. A sociedade se mobilizou e pressionou o Congresso, através das redes sociais. Foi o primeiro grande caso de mobilização “on line” no Brasil, que originou um produto político no Brasil, a Lei da Ficha Limpa.
Recentemente, o sr. participou de um seminário sobre o tema Ficha Limpa, ocorrido na Câmara Municipal de Palmas. Qual sua avaliação?
O poder legislativo precisa se abrir e ouvir mais. Não há razão para o voto ser visto com uma delegação completa aos legislativos federal, estaduais ou municipais. É uma autorização para os parlamentares representarem a sociedade, mas para isso é necessário saber o que as pessoas estão pensando. Por tal razão, fiquei feliz pela abertura desse tema no parlamento municipal de Palmas e espero que isso se alastre, propiciando, cada vez mais mecanismos que possibilitem a expressão da vontade popular.
A tecnologia pode ajudar muito nisso. Juntamente com Ronaldo Lemos, do Instituto de Tecnologia e Sociedade do Rio de Janeiro, idealizamos o aplicativo “Mudamos”, lançado em maio e com mais de meio milhão de usuários no Brasil. Os serviços prestados são tão relevantes, que na próxima quinta-feira, dia 23 de novembro, vamos a São Paulo receber um prêmio pelo protagonismo no uso da tecnologia pelo aprimoramento da democracia.
A limitação da Lei da ficha Limpa tem sido tema de várias discussões. O sr. considera tal entrave como um retrocesso?
Um grupo de deputados, dos mais diversos partidos, apresentou um projeto com a finalidade de restringir o alcance que a Lei da Ficha Limpa tem hoje sobre fatos ocorridos no passado. Sem dúvidas é um grande retrocesso, uma vez que esse dispositivo legal é uma conquista da sociedade, que precisa ser protegida. Temos denunciado essas condutas e desde que a lei foi aprovada, várias foram as tentativas de mudanças, contudo, até o momento, conseguimos barrar todas. Eu aproveito para pedir ao leitor do Jornal Opção que se incorpore ao nosso movimento, se posicionando publicamente, pelas redes sociais ou fora delas, pela intocabilidade da Lei da Ficha Limpa.