Senadora admite que pode ter problema com a Justiça eleitoral na campanha ao governo-tampão, mas enquanto isso apresenta plataforma eleitoral baseada na reforma da gestão e no conserto dos desequilíbrios da máquina administrativa

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Dock Júnior

Sob a ótica da senadora Kátia Abreu (PDT) é possível organizar as finanças do Tocantins e recolocá-lo nos trilhos do desenvolvimento. O combate à corrupção é um dos motes da campanha eleitoral suplementar que, diga-se de passagem, já teve o pontapé inicial e está a pleno vapor. Especialista em números, a parlamentar apresenta muitos deles para explicar por onde o dinheiro da saúde, por exemplo, está se esvaindo. Apostando em sua experiência como dirigente sindical patronal, ex-ministra da Agricultura, ex-deputada federal e senadora da República, ela se apresenta como candidata ao governo do Tocantins na “eleição-tampão”, após a cassação do governador Marcelo Miranda.

Psicóloga por formação e figura política exponencial da política tocantinense, Kátia Regina Abreu foi eleita deputada federal em 2002. Já em 2006 disputou as eleições para o Senado, obtendo êxito para exercer o mandato por oito anos. Em 2014 foi reeleita e reconduzida ao cargo, mandato este que se encerrará em 2022.

No domingo, dia 22, quando ocor­reram as convenções partidárias para a escolha dos candidatos a governador, hou­ve uma situação inesperada, já que era certo que o PT in­dicaria o nome para vice-go­vernador na sua chapa, con­tudo, a sigla acabou mi­grando para a chapa encabeçada pelo ex-prefeito de Pal­mas Carlos Amastha. Qual a ra­zão desse desacerto?
Quero destacar, primeiramente, que quando a gente to­ma uma decisão/atitude que pre­cisa de coragem, caráter ou prin­cípios, a primeira coisa a fa­zer é não esperar nenhum re­torno nem nada em troca. Pe­lo menos eu não fico chocada quando não há o reconhecimento.

Sempre pautei minha vida dentro desse princípio e ressalto que tudo que fiz pela pre­sidente Dilma [Rousseff, de quem foi ministra da Agri­cultura] foi porque eu acreditava no projeto dela e, também, por tudo que ela fez pelo setor agropecuário. Eu faria tudo de novo, se fosse necessário, mesmo depois do PT regional ter feito o que fez. Eu não esperava lealdade deles, então, estou tranquila. Se a direção nacional do PT vai in­ter­vir nisso, é uma questão partidária deles, todavia, reitero que não quero apoio forçado. Longe disso.

Agora, o pior de tudo isso é constatar que a componente mediocridade falou mais alto. Esse grupo do PT que resolveu apoiar o outro candidato tem medo que eu ganhe a eleição e o companheiro de partido deles, mas de outra ala, o meu suplente Donizeti No­guei­­ra (PT), assuma uma ca­dei­ra no Senado por quatro anos. É verdadeiramente lamentável.

No que concerne ao registro de sua candidatura, há um questionamento acerca do tempo de filiação par­tidária, exigido pe­la Constituição Fe­deral, que seria de seis meses an­tes do pleito. Em no­vembro de 2017 a sra. estava sem partido, em razão de sua desfiliação do MDB. Esse fato não poderia trazer insegurança jurídica ao seu pleito?
Na minha visão, essa história de candidato concorrer por força de uma liminar é algo que o eleitor tocantinense já não suporta mais. Enquanto po­líticos, temos que respeitar o momento que o Estado vive e a necessidade de passar se­gu­rança jurídica ao eleitorado. Se porventura ocorrer de o TRE [Tribunal Regional Elei­to­ra do Estado] não homologar o registro da minha candidatura, vou respeitar com bastante tranquilidade e afirmo: não vou recorrer da decisão ao TSE.

Confio na Justiça Eleitoral do Tocantins, por que no meu caso específico, não se trata de preceito constitucional. A questão da filiação partidária es­tá atrelada a Lei complementar e a Lei ordinária e por is­so, pode ser objeto de resolução por parte da Corte re­gio­nal. Portanto, em respeito ao povo e aos líderes, se isso ocor­rer, não seguirei a campanha eleitoral sob judice. Neste caso, disputarei apenas a eleição ordinária, marcada para o mês de outubro.

O eleitorado passou há algum tem­po, face às constantes subs­tituições, a analisar também os candidatos a vice nas cha­pas registradas. O que lhe fez optar por Marco Antonio Cos­ta para compor essa coligação?
Eu resolvi abrir mão, pura e simplesmente, do conchavo político. O meu vice está filiado no PSD e ocupou, na condição de meu suplente no primeiro mandato, a cadeira de senador por oito meses. Te­nho convicção que um vice tem que possuir capacidade ad­ministrativa, madura e honesta.

O Marco Antonio preenche os requisitos, pois é extremamente capaz, um excelente administrador, uma pessoa madura e equilibrada, além de ser correto e honesto. Creio que ele esteja preparado para assumir o governo, no caso de ocorrer minha ausência.

Por que a sra. quer ser governadora do Estado do Tocantins?
Eu queria muito ter a oportunidade – como já tive na CNA [Confederação da Agri­cul­tura e Pecuária do Brasil], no Senado e no Ministério da Agricultura – de provar que
a política é boa e todas as soluções passam por ela. O seguimento da vida das pessoas depende de ações positivas ou negativas, dos bons ou dos maus políticos. Tenho a convicção que exerço a política com responsabilidade e, por isso, não tenho vergonha de estar na política, como outros por aí têm. Muitos parlamentares também exercem o ofício com dignidade, fazem a boa política e são estes que merecem ser prestigiados pelos eleitores atuantes e engajados.

É possível aplicar essas ideias no comando do governo do Estado do Tocantins, caso a sra. seja eleita para o cargo?
Perfeitamente. É possível criar opor­tunidades para as pessoas me­nos favorecidas, começando pela edu­cação. É necessário, também, aliar os estudos com a alimentação. Não deixaria, jamais, deixar faltar me­renda escolar para os alunos da re­de pública. É fato notório que nin­guém aprende de barriga vazia, o cérebro não funciona. Ga­ran­tin­do o básico – a nutrição – começaremos o aprendizado em si.

E quanto à saúde, como a sra. pretende resolver os problemas?
O primeiro passo é dar um basta na corrupção. O segundo, aca­bar com a má gestão. O terceiro, pôr um fim no exacerbado corporativismo. A grande maioria dos servidores da saúde, desde enfermeiros, técnicos ou administrativos, é revoltada com uma minoria cor­porativa que domina tudo. Nós te­mos que romper com isso, porque são uns ganhando demais e ou­tros de menos.

A solução é pactuar, de forma ci­vilizada, honesta, transparente e ins­titucional, de forma a não deixar transparecer que é uma caça a al­go ou alguém, especificamente. Não se pode mais postergar essa con­duta, estamos no limite. Ora, se nós temos bons profissionais em nosso quadro – entre médicos e servidores; se possuímos 19 hospitais de referência e 23 de pequeno porte, que abrigam mais de 1.500 leitos, além de equipamentos; se os recursos federais têm sido direcionados ao Estado, é inconcebível que a população continue passando necessidades. O problema está na gestão, porque os números mostram que o Tocantins é o terceiro Estado que mais gastou com saúde em 2017, entretanto, é um dos piores no atendimento à população. Credito, portanto, esse fato à corrupção sistêmica, má administração e por fim, injustiça com nosso povo.

Se eleita governadora, como será o trato com os parlamentos estadual e federal?
Pretendo ter um relacionamento excepcional, mesmo porque vou agir sempre de boa-fé e não pedir nada aos deputados, que não seja republicano. Espero uma convivência harmônica e respeito por parte dos parlamentares, da mesma forma que também os respeitarei. Institucionalmente, bem como na política governamental, quero prestigiá-los, mes­mo porque não é possível governar sozinho. Esse princípio também vale para os deputados federais, senadores, prefeitos e vereadores. Vamos trabalhar juntos pelos interesses do Tocantins.

A Justiça tocantinense proferiu liminar para proibir que o governo transitório efetue pagamento de gas­tos que não sejam folha de pa­ga­mento ou que possuam caráter emer­gencial. O que acha dessa me­dida restritiva?
Não acho que a medida foi exagerada. O Tribunal de Justiça do Es­tado acertou ao deferir o pedido cau­telar. Hoje, quatro ex-governadores estão com sérios problemas na Justiça e, especificamente dois de­les, respondem exatamente pe­los atos cometidos durante o mandato-tampão. As pessoas, ao que parece, não têm limites e acham que ao assumir o governo, podem destroçar o Estado em pedaços, desde que muitos desses pedaços fi­quem em suas mãos.

Por isso, a Justiça agiu acertadamente. Governo temporário não tem que fazer obras, não tem que fa­­zer investimentos, mesmo porque sequer dá tempo para elaborar um planejamento. Tem é que manter a máquina funcionando, agir com dignidade, seriedade, discrição e respeito com a coisa pública, trans­mitindo segurança jurídica pa­ra o seu sucessor.

Recentemente a sra. se filiou ao PDT, visto que o MDB havia lhe ex­cluído dos seus quadros em no­vem­bro de 2017. Quais as foram as razões da expulsão daquela si­gla e porque a sra. escolheu o PDT?
Infelizmente, no MDB só são aceitos dois tipos de políticos: os cor­ruptos e os silenciosos. Se o fi­lia­do fugir de um desses estigmas é re­taliado e até mesmo expulso. Quem incomodava por lá, questionando condutas reprováveis? Kátia Abreu e Roberto Requião. Aqueles que não são corruptos são omissos, mesmo diante da corrupção des­carada que foi im­plantada e efe­tivamente praticada por Michel Te­mer (SP). Dessa forma, os silenciosos também são tão culpados quan­to os corruptos, mas preferem não sair de zona de conforto e não correrem o risco de serem punidos.

Se para a direção do partido foi um incômodo, para mim, ser expulsa do MDB foi um livramento, um prêmio. Ser punida por corruptos, presos com tornozeleira eletrônica ou prisão domiciliar, para mim foi um atestado de idoneidade. Se eu fosse igual a eles, lá eu estaria, inclusive exercendo o cargo de ministra, se assim o quisesse.

Quanto ao PDT, minha intenção era não radicalizar, uma vez que já fui considerada radical de direita – mesmo não sendo – como também não queria assumir compromissos com a extrema esquerda. Apesar de entender que essa dicotomia entre esquerda e direita está, inclusive, ultrapassada, os pedetistas se posicionam mais ao centro, rumo ao equilíbrio. Ora, se há tantas bandeiras boas na ala liberal, como também há excelentes ideias do pessoal da esquerda, por que não podemos convergir? Por que não é possível discutir o livre mercado e pobreza? Um não po­de ser excludente ao outro. Vi­ve­mos num país desigual, temos que discutir a concentração das for­tunas, que, sem dúvidas, geram inú­meros empregos, mas também a cruel miserabilidade do nosso po­vo, 22,4% no Brasil e 55% no To­cantins – o que é inadmissível e me entristece o coração. Pre­ci­sa­mos convergir, minimizar essas diferenças, encontrar soluções através da política, prezando sempre pela harmonia e pelo equilíbrio.

Qual é a sua visão acerca do modelo adotado no Brasil para o pacto federativo?
Já deveria ter sido revisto há muitos anos e se estivesse em votação no Congresso Nacional, neste momento, votaria a favor, independentemente de ser aliada do governo federal ou não. Não se trata de um debate demagogo, mas são nas cidades que as pessoas vivem e enfrentam seus problemas. Muitas vezes a União e os Es­ta­dos sequer sabem das dificuldades daquele povo. Não justifica o di­nheiro ser arrecadado na base, ir até Brasília e retornar menos da me­tade para os municípios e o pior, extremamente burocratizado. Nes­tas circunstâncias, o pacto fe­de­rativo retalhado e fatiado da for­ma como é atualmente – que permite que o governo federal apenas arrecade, vire as costas e não se preocupe com necessidades dos municípios – é prática comum de países subdesenvolvidos e por isso, deve ser rediscutido urgentemente.

Sua comprovada experiência parlamentar a credencia a debater quaisquer temas ligados ao Estado do Tocantins, mas o que a sra. classifica como fatos marcantes na sua carreira no Congresso Nacional?
Houve muitos embates em várias áreas como infraestrutura, econômica, logística, energia, agronegócio, saúde, etc. Levanto e defendo bandeiras importantes, portanto, não há pontos específicos de atuação. Creio que minha participação, em nível nacional, tem sido destaque e fez com que o Tocantins se tornasse um expoente, com suas potencialidades reconhecidas.

Todos nós parlamentares te­mos o dever de fazer com que o Es­tado se projete além das nossas fronteiras. O desempenho dos políticos impulsiona cada um dos territórios, para frente ou para trás. Exatamente por isso, sempre procurei não envergonhar o meu Estado e meus eleitores, cumpri com dignidade o meu papel de projetar o Tocantins positivamente, além de estudar bem as matérias que são objeto de discussão no Congresso Nacional. Acredito que tive sucesso, uma vez que o Tocantins foi adiante, fez a primeira ministra da Agricultura do país e, também, a presidente da maior confederação do país, que é a CNA.

Além disso, a sra. foi a primeira mulher a presidir a bancada ruralista, um feito realmente de vanguarda. Na sua visão, a questão do empoderamento feminino ainda está longe do ideal?
É necessário que as mulheres ocupem mais espaços, sem dúvidas. Em que pese algumas terem se destacado, muitas delas estão responsáveis, diretamente, pelo sustento da família. Isto influi diretamente na dificuldade de se dedicar aos estudos, que poderiam lhes proporcionar outras oportunidades. A questão é cultural, ainda há muito machismo no Brasil, infelizmente.

O fato de a sra. ter se tornado ministra da Agricultura foi um grande feito para sua carreira, mas principalmente, um orgulho para todos os tocantinenses, uma vez que nenhum dos representantes havia feito parte do primeiro escalão do governo federal. Em suma, qual foi o aprendizado e o upgrade que isso deu à sua carreira?
A presidente Dilma Rousseff havia me convidado para assumir o cargo desde o primeiro governo, iniciado em 2013. Todavia, do ponto de vista ético e moral, em razão de ter apoiado o candidato José Serra (PSDB) nas eleições presidenciais, não me senti à vontade para aceitar o convite. Seria difícil explicar aos meus eleitores tal conduta e, além disso, era extremamente desconfortável para mim, desembarcar “de carona” no governo dela. Fiz o compromisso que a apoiaria em 2016 e caso ela fosse eleita, eu estaria disposta a aceitar o convite para comandar o Ministério da Agricultura.

Assumir uma pasta tão importante foi realmente de grande valia e honraria, para mim e para o meu Estado. Geralmente os representantes dos Estados com pouca representatividade acabam assumindo ministérios com menos proeminência. Contudo, recebi a missão com muita humildade, consciente dos desafios e, o que me deixa mais orgulhosa, é saber que conduzi a pasta adotando um comportamento ilibado, desenvolvido um trabalho que foi reconhecido nacionalmente e que resultou em avanços. Modernizei o Ministério da Agricultura, uma vez que havia ali práticas arcaicas, processos físicos e manuais, a despeito da real possibilidade de serem eletrônicos. Modificamos a estrutura, acabamos com a “idade da pedra” e o deixamos à altura da importância da agropecuária brasileira.

Até que ponto essa sua passagem pelo Ministério da Agri­cul­tu­ra alavancou o Matopiba [acrô­nimo criado com as iniciais dos Estados do Maranhão, To­can­tins, Piauí e Bahia]?
Essa fronteira agrícola foi criada pelos produtores rurais, demarcada pela Embrapa e consolidada durante o governo da presidente Dilma. Nós apenas concretizamos, enfim, o projeto. Ocorre que, na cabeça de muitos políticos medíocres – que não tiveram a grandeza de enxergar a importância do projeto e sua condição estratégica – classificaram como plataforma eleitoral da Dilma ou da Kátia, o que não procede, verdadeiramente.

O Matopiba é conhecido internacionalmente por suas potencialidades, quer seja na Europa, China, Índia ou Japão. Todos sabem o que ele representa em termos de produção sustentável de alimentos. Os investidores só não aportaram mais recursos no projeto em razão do atual desgoverno presente no Estado do Tocantins. A via que liga o Matopiba à Ferrovia Norte-Sul e ao Estado do Pará, a BR-235, ainda precisa ser pavimentada em alguns trechos, o que vai facilitar sobremaneira, o escoamento da produção.

É necessário frisar que em nosso projeto, os grãos produzidos ali, no Mato Grosso ou Pará, não serão todos exportados pela ferrovia até o Porto de Itaqui no Maranhão. A ideia é que parte dessa produção de grãos seja industrializada em plataformas próximas à linha férrea, uma vez que se pode agregar muito mais valor se transformarmos a proteína vegetal em animal, fomentando a produção, por exemplo, de suínos, ovinos, aves e peixes. l