Sandoval garante Eduardo Siqueira?

24 maio 2014 às 10h49

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Governador-tampão tem missão quase impossível: recuperar credibilidade do governo e conquistar prestígio capaz de influenciar no resultado das eleições. Uso da máquina já não será tão fácil como na era Siqueira Campos
Ruy Bucar

O ex-governador Siqueira Campos (PSDB) renunciou ao mandato, em tese, para permitir que o filho, Eduardo Siqueira Campos (PTB), tenha condições legais de postular candidatura ao governo, embora seja o candidato mais fraco da base do governo. Ele não empolga o eleitor, mas é o nome de preferência do siqueirismo.
Ao provocar a renúncia do vice-governador João Oliveira (DEM), bem antes da sua, Siqueira Campos revelou detalhes do plano para fazer o filho sucessor, que ao que tudo indica passa pela garantia de ter no comando do Palácio Araguaia um aliado confiável, que acredita que dará cumprimento ao plano. O que não deixa de levantar suspeita de uso da máquina administrativa. Senão o que explica a operação arriscada para deixar o governo em mãos confiáveis? A primeira medida – exoneração de servidores – corrobora com esta tese.
Para tanto Siqueira planejou a eleição do presidente da Assembleia Legislativa, Sandoval Cardoso (SD), com a contrapartida de este apoiar a candidatura de Eduardo. Pelo menos isso foi evidenciado por governistas para explicar a inexplicável renúncia do governador e do vice. A primeira parte do plano se cumpriu. Sandoval, depois de assumir o governo interinamente por 30 dias, foi eleito governador-tampão. A segunda parte, Sandoval apoiar Eduardo Siqueira, é que são elas.
Há quase dois meses no comando do Palácio Araguaia, Sandoval ainda não disse a que veio. Ainda estuda medidas de austeridade para tentar recuperar as finanças do Estado. Na semana passada teve que exonerar 2.600 servidores ocupantes de cargo em comissão na tentativa de enxugar a máquina administrativa. Não quis assumir o desgaste pela medida e deu o encargo ao secretário da Administração, Lúcio Mascarenhas, que já ganhou fama de carrasco dos servidores. Sandoval preferiu a tarefa de recontratação que pode lhe render dividendos eleitoreiros.
Pelo que se analisa Sandoval Cardoso não tem escolha. Precisa fazer um bom governo e não está fácil. O Estado passa pela sua pior crise de gestão. Dispõe de menos de 2% para investimento enquanto as despesas de custeio já ultrapassaram o limite prudencial de 46,9% de gastos com folha de pagamento. Ainda por cima com a ingerência de quem não deu conta do recado. Como fazer um bom governo tutelado por Eduardo Siqueira, o principal responsável pelo fracasso do governo do pai?
Sandoval tem uma missão quase impossível pela frente. Recuperar a credibilidade da gestão desgastada com a falta de cumprimento das promessas de campanha do ex-governador e conquistar prestígio capaz de influenciar no resultado das eleições. Não se pode deixar de mencionar que o pressuposto do uso da máquina administrativa, algo que se tornou inerente ao jeito siqueirista de governar, já não será tão fácil com a mudança de comando.
Sandoval pode até estar disposto a cumprir o compromisso que o levou a ser eleito governador, de apoiar a candidatura de Eduardo Siqueira Campos, mas resta saber se terá condições de fazê-lo. Eduardo certamente não quer apenas apoio formal do governador à sua candidatura. Quer muito mais. O controle do governo que inclui o uso deliberado da máquina administrativa, além da adoção de medidas pouco transparentes, prejudiciais ao bom andamento da gestão pública, mas favoráveis aos interesses políticos do grupo.
A renúncia de Siqueira Campos e do seu vice João Oliveira criou a possibilidade ainda que remota do pai Siqueira Campos e do filho Eduardo Siqueira Campos voltarem juntos aos palanques como candidatos a senador e a governador respectivamente, como em 2006. Naquele pleito, em que foram derrotados por Marcelo Miranda (PMDB) e Kátia Abreu (PMDB), pai e filho ocuparam posição invertida na chapa, Siqueira foi candidato ao governo e Eduardo ao Senado. O desejo dos siqueiristas de repetir a dobradinha de 2006 entre pai e filho existe, mas ficou muito mais distante depois da renúncia.
Para o analista político Melck Aquino, Siqueira Campos e o seu filho Eduardo Siqueira Campos ainda são os maiores líderes da base governista e mesmo de fora comandam com mão de ferro o governo de continuidade de Sandoval Cardoso. Para ele os dois só não serão candidatos ao governo e ao Senado se perceberem que não têm nenhuma chance de vitória. Pelo quadro atual indefinido, os dois são potenciais candidatos.
Fora do poder a tendência natural é que Siqueira e Eduardo percam o contato com o governo, com os líderes políticos e com o povo. Um caminho certo para o esquecimento e o ostracismo. Todas as vezes em que Siqueira ficou fora do poder, desapareceu.
Uma pergunta que se ouve todos os dias. Sandoval pode trair Siqueira? Será inevitável. Embora seja impossível prever quando vai acontecer. Mas tende a acontecer. A menos que Sandoval não tenha ideia própria nem ambição política. Neste caso não se trata de traição, mas de exercício de sobrevivência política.
Se quiser fazer um bom governo Sandoval terá que romper indiscutivelmente com o passado que o levou ao poder e que pode levar à ruína. Não há meio termo. Sandoval ou rompe ou aceita carregar o desgaste do siqueirismo nas costas a custo muito alto, o risco de ser ignorado pelo eleitor.