Os estranhos critérios do TRE
20 maio 2018 às 00h00
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Carlos Amastha e Kátia Abreu estavam na mesma situação quanto a prazo de desincompatibilização para a eleição suplementar, mas só a candidatura dele foi vetada
Foi uma semana de intensas surpresas, após uma maratona de julgamentos dos registros de candidaturas da eleição suplementar por parte do Tribunal Regional Eleitoral (TRE-TO). O calendário previa inicialmente que as decisões finais acerca das impugnações apresentadas deveriam ser julgadas até sexta-feira, 18. Reunidos, os juízes da Corte Eleitoral apresentaram seus vereditos antecipadamente.
Na terça-feira, 15, o Pleno do TRE deferiu o registro de candidatura de Márlon Reis, candidato a governador do Estado na eleição suplementar, e de seu vice, Edvan de Jesus Silva, ambos filiados ao partido Rede Sustentabilidade. Na mesma sessão, também foi deferido o registro de Vicentinho Alves (PR), pela coligação A Vez dos Tocantinenses, e do seu vice, Divino Bethânia Júnior (Pros).
Já na quarta-feira, 16, por unanimidade, os registros de candidatura do governador interino Mauro Carlesse (PHS) e de seu vice, Wanderlei Barbosa (PHS), também foram deferidos. Os magistrados entenderam que Carlesse não desrespeitou o prazo fatal para protocolo de registro de candidatura.
Já Wanderlei Barbosa era acusado de não possuir tempo de filiação, visto que se registrou no PHS apenas no início de abril. Entretanto, o TRE considerou a excepcionalidade da eleição suplementar e admitiu a possibilidade de mitigar o prazo, uma vez que se trata de uma norma infraconstitucional, podendo ser regulamentada por resolução.
Ato contínuo e adotando o mesmo princípio aplicado a Wanderlei Barbosa, os magistrados deferiram, ainda, o registro de candidatura da senadora Kátia Abreu (PDT), suprimindo a exigência do prazo de filiação. A pedetista havia sido expulsa do MDB em novembro de 2017 e se filiado ao PDT apenas em abril de 2018, não obedecendo, portanto, o prazo de seis meses exigido pela legislação eleitoral.
Entretanto, causou surpresa os indeferimentos das candidaturas de Mario Lúcio Avelar (PSol) e Carlos Amastha (PSB). O primeiro em razão do partido dele encontrar-se suspenso, no Tocantins, pela Justiça Eleitoral por falta de prestação de contas no ano de 2015. Tanto o candidato quanto a sigla partidária revelaram que vão recorrer ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE) da decisão do TRE. Os dirigentes do PSol afirmaram que toda a documentação referente à prestação de contas de 2015 já foi entregue e que o partido, está sim, apto a participar da eleição suplementar e vai procurar restabelecer seu direito na Corte superior eleitoral.
“Vamos recorrer”
Já o Procurador da República Mario Lúcio disse em nota: “A nossa candidatura está mantida. Continuaremos com nossas ações, encontros e propagação das ideias. Vamos recorrer junto ao TSE e, com certeza, vamos conseguir o mais breve possível voltar para o pleito dando ao eleitor a possibilidade de escolher a melhor proposta para tirar o Tocantins dessa crise pela qual o Estado passa”.
Por sua vez, o ex-prefeito de Palmas, Carlos Amastha, teve seu pleito indeferido em razão do tempo de desincompatibilização de seis meses, previsto na Constituição Federal, e exatamente por isso, os juízes consideraram que o prazo não pode ser mitigado. Como era de esperar, o ex-gestor da capital também retrucou em alto e bom som: “Nós temos a certeza da legalidade da nossa candidatura e vamos confirmá-la no TSE (Tribunal Superior Eleitoral)”, destacou o candidato.
A despeito de deferimentos ou indeferimentos, não parece razoável que sejam aplicadas regras previstas para eleições ordinárias em sufrágios extraordinários. Ninguém poderia prever, ainda em outubro de 2017, nem tampouco o próprio Amastha, que o então governador Marcelo Miranda (MDB) seria cassado em março de 2018. Não é plausível exigir do ex-prefeito, ou de quem quer que fosse, uma renúncia antecipada ao cargo que exercia, como se possuísse um oráculo ou bola de cristal.
A legislação deveria ser flexibilizada no referido caso, como foi no Estado do Amazonas, por exemplo, em que a resolução permitiu que os detentores de cargos públicos renunciassem 24 horas depois que as convenções lhes indicassem como candidatos. Nada mais justo e natural, uma vez que, nestes casos, há o advento da surpresa, do inesperado.
O fato de alguns serem contrários às posições políticas adotadas por Carlos Amastha não os credencia a chancelar e comemorar tal insanidade judicial e moral. É necessário enfatizar que inexiste direito e jornalismo sem o Estado democrático de direito. A maturidade do povo brasileiro – ainda tão desacostumado com a democracia – ainda carece de acertos e ajustes.
Não podemos decidir o futuro do nosso País, Estado ou cidade como se estivéssemos assistindo a uma partida de futebol, para comemorar enfaticamente um “pênalti roubado” para o time que torcemos, enquanto vociferamos toda sorte de impropérios contra o “pênalti legítimo” apitado em favor do adversário.
Não podemos nos portar como imbecis, tolos ou ingênuos. A era do “levar vantagem em tudo” acabou. Compactuar com o velho provérbio “dois pesos e duas medidas” chega a ser insano.
Próprio veneno
Amastha talvez experimente agora o próprio veneno, tão utilizado contra o candidato Raul Filho em 2016, ou seja, que a candidatura do republicano – à época – estava eivada de instabilidade jurídica e que se ganhasse a eleição, sequer assumiria o cargo. É provável que o ex-prefeito de Palmas reverta, no mérito, a decisão junto ao TSE, mas não por liminar, que não é prática rotineira daquele Tribunal. Talvez essa reversão venha ocorrer tarde demais.
A eleição suplementar se aproxima como foguete, já que ocorrerá no dia 3 de junho (em exatas duas semanas) e até lá, em vez de divulgar suas ideias e projetos, estará ocupado demais tentando provar sua elegibilidade ao eleitorado.
A decisão do TSE que cassou Marcelo Miranda faltando nove meses para acabar o mandato foi insana e tardia. Já a decisão que indeferiu a candidatura de Amastha, no mesmo diapasão, causou o caos, a insegurança jurídica e repercutiu de forma amplamente negativa junto ao eleitorado, que espera do Judiciário, acima de tudo, lisura, segurança, respeito aos princípios, coerência e justiça.