“O Tocantins não tem mais tempo para improviso”

19 junho 2022 às 00h00

COMPARTILHAR
Deputada diz que o Estado precisa aprender com sua história para superar a crise de instabilidade institucional

A deputada federal Dorinha Seabra Rezende, a Professora Dorinha (União Brasil), avalia que o maior desafio dos líderes políticos que desejam governar o Tocantins é apresentar um plano de governo e explicar à sociedade como fazer para resolver problemas graves nas áreas de saúde, educação, transporte e segurança. Pré-candidata ao Senado, ela fala que também é necessário recuperar a capacidade de investimento do Estado, sem deixar de implementar políticas públicas de proteção aos menos favorecidos e, sobretudo, cuidar do meio ambiente.
Dorinha sente que está madura para buscar uma nova representação do Tocantins no Congresso Nacional. Depois de três mandados consecutivos na Câmara Federal decidiu tentar conquistar uma cadeira no Senado. Adianta que não é um projeto pessoal, mas uma construção coletiva, a partir da convocação que tem recebido de líderes políticos de todo o Estado. Ela busca deixar claro que sua postulação é resultado de construção coletiva.
A deputada encara como um desafio que a estimula a continuar ajudando o Tocantins e contribuindo para aprofundar o debate de valorização da educação como prioridade nacional. “A educação perpassa toda as áreas, mas ela tem um eixo estruturante e não tem nenhum país do mundo que mudou a sua condição de riqueza de desenvolvimento econômico sem ter feito uma guinada na educação. Eu vejo que a educação é um instrumento de redução da desigualdade, não é automático, mas é instrumento. A gente não constrói uma sociedade mais igualitária sem investimento na educação”, defende.
Sobre com quem formará chapa nesta disputa, Professora Dorinha é categórica. Diz que não há nada consolidado ainda na formação das chapas majoritárias e que esse processo está em construção. “Não tem nenhum candidato ao Senado e ao governo definido, com chapa completa. Todos estão nesse processo de construção, que vai desde a formação, alinhamento de grupo, discussão que envolve prefeitos, deputados, líderes que não estão no mandato, mas que têm importância no Estado. Tem uma conjuntura nacional, eu acho que é natural esse processo de discussão”, comenta, lembrando, tem conversado com o ex-prefeito Ronaldo Dimas, mas que ainda fechou acordo de composição de chapa majoritária.
Maria Auxiliadora Seabra Rezende, a Professora Dorinha, é goianiense, tem 57 anos e é professora universitária. Projetou-se politicamente ao comandar a Secretaria da Educação do Tocantins durante quase uma década. Conquistou o primeiro mandato eletivo em 2010 e exerce atualmente o seu terceiro mandado na Câmara Federal. Nesta entrevista ao Jornal Opção, ela se mostra uma parlamentar criteriosa, atenta e profundamente comprometida com as bandeiras que defende, e cuja atuação tem conquistado o reconhecido de seus pares, da opinião pública e de órgãos que acompanham o desempenho do Parlamento. Por dois anos consecutivos, integra a lista dos Cabeças do Congresso, que reúne os parlamentares mais influentes do Congresso Nacional.
Que balanço a sra. faz de sua atuação na Câmara Federal ao longo desses três mandatos?
O tempo consome a gente de maneira muito rápida. Quando olho e vejo que vamos fechar 12 anos de Câmara Federal percebo que foi um período muito marcante do meu trabalho na área da educação. Parece que foi ontem que eu sai da secretaria onde atuei por nove anos. O processo de aprendizagem na Câmara desde quando fui eleita, por um partido de oposição, na época, foi muito grande. Era um período de grande domínio da esquerda, o governo federal era do PT e eu, do Democratas, mas a minha relação com a educação me abriu as portas no MEC [Ministério da Educação]. Acho que o meu jeito de construção de pontes, de diálogo, eu tinha sido presidente do Conselho de Secretários, me credibilizou e olha que era de um Estado de oposição [ao governo federal], mas isso nunca me impediu, pelo contrário fui convidada pelo ministro Fernando Haddad por duas vezes para ser a secretária nacional. Uma vez na área de diversidade que lidava com comunidades indígenas, quilombolas, pessoas com deficiência; outra vez como secretária de Educação Básica.
Na espaço da Câmara, sair de um Estado pequeno, sem tradição política e conseguir, no meio de 513 deputados, ser conhecida e respeitada, foi um processo que foi muito importante. Eu tive papel e presença muito forte na construção de mudanças na legislação, no Plano Nacional da Educação, no próprio Fundeb [Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica] que é uma presença extremamente importante na estrutura da educação, e ao mesmo tempo aprendi a lidar com a possibilidade de ajudar os municípios do meu Estado. Vou fechar esse mandato com R$ 1,8 bilhão de recursos que eu trouxe para o Tocantins para várias áreas.
Que avaliação a sra. faz desse trabalho de destinação de emendas?
Quando eu fui eleita em 2010, era a professora Dorinha da Educação. Cada dia me consolidei assim, mas também eu sempre soube que, como parlamentar, não poderia ser só a deputada da educação. Forçosamente, até pelo meu perfil de diálogo – gosto muito de andar, de ir aos municípios, de atender – vi a possibilidade de entrar em outras lutas. Entrei numa comissão para tratar de rapto de pessoas; em debates como construção de hidroelétricas, tráfico de pessoas, prostituição infantil; comecei a lidar com temas da área de segurança pública, como a questão da posição internacional dos brasileiros que vivem fora do País e que não são enxergados como cidadãos.
Essa capacidade de estar à disposição para o debate, construir com o outro, lidar com temas que não lidaria usualmente, me oportunizou isso. Hoje eu posso fazer um balanço. Cumpri bem minha função de deputada federal. Gosto de participar da Comissão de Orçamento, principalmente nas áreas que muita gente não tem interesse, se preocupar como está o dinheiro da saúde, das universidades, dos institutos federais, a luta para terminar creches, para construir escolas, para asfalto, para água; a preocupação com o lixo, com o meio ambiente, com áreas indígenas; enfim, essa oportunidade de repente abriu um leque enorme que, talvez, se eu continuasse aqui, como professora na universidade, eu tivesse um outro foco. O Parlamento me abriu o olhar como um leque para o conhecimento do Estado.
Poderíamos considerar que sua trajetória é mais relevante em se tratando de um Estado em que a participação da mulher ainda é pequena. Como a sra. avalia essa condição de ser inspiração para uma maior participação política da mulher tocantinense?
Eu sou um dos exemplos, mas temos muitas mulheres que fizeram a diferença como prefeitas. Tem que haver uma quebra de paradigma, porque a mulher precisa primeiro despertar para a política, depois romper com estruturas de poder às vezes internas, de família, do próprio Estado, do município, aquela necessidade de dizer que ela sabe decidir, sabe se impor. Acho que são processos de construção e aprendizagem. Quem vem da educação sabe o quanto é importante investir na formação política de mulheres, na visibilidade de mulheres que já ocupam essa luta no dia a dia.
“A vontade de construir, pela educação, sempre me moveu como o principal eixo”
A sra. mantém uma atuação firme, de resultados, tanto em governos de esquerda como de direita. Essa é a vantagem de ser de centro e poder atuar na governabilidade, evitando os extremos? Qual o segredo?
Primeiramente, nunca me coloquei como uma parlamentar de centro. Lógico que o meu lugar na temática que eu represento, que é a educação, e essa vontade de construir pela educação sempre me moveram como principal eixo. Mesmo o União Brasil sendo de centro, em muitas situações minha votação foi totalmente diferente do partido como um todo. Meu olhar com o foco na educação me ajudou nisso e acredito nessa capacidade da educação como diferença em termos de transformação. Meu perfil, minha disposição para o diálogo, me mostra que tenho de ter capacidade de ouvir quem pensa diferente de mim.
É preciso ter essa capacidade de construir um lugar que não tenha ganhador e derrotado. Esse pensamento eu também desenvolvi na educação. Eu não sou dona da verdade, e não existe uma verdade, mas “verdades de aproximação”. Então acho que isso faz diferença ainda hoje. Eu estive à frente da Comissão de Educação, enfrentei períodos muito duros, com convocação de ministros, e quando seria muito cômodo, em minha posição, votar pela convocação. Mas minha vontade de diálogo sempre foi maior. Se uma questão precisava ser esclarecida na Câmara, mas não precisava ser no formato de convocação… ora, se o ministro tem disposição de ir como convidado, vamos transformar essa convocação em convite, em que a gente ao mesmo tempo o traz também para prestar contas, cumprindo o requisito da convocação. Se eles se negarem a vir para prestar contas, para esclarecer, para apresentar, a gente usa o instrumento que nós temos.
Se o objetivo é esclarecer, eu posso construir um diálogo que é respeitoso – e isso eu fiz no período da esquerda, no momento de direita e nesse último momento, de extrema-direita; fiz isso no Fundeb, andei muito, conversei muito com diferentes atores e enfrentamos e superamos muitas questões.
O que a sra. considera avanços que foram determinados por seu trabalho?
Avançamos no direito de professores, no investimento na estrutura física, então acho que foi um pouco pelo meu perfil, pela vontade de dialogar. Tanto é que por dois anos seguidos eu estou entre os Cabeças do Congresso, que é uma avaliação externa que é feito, do Diap [Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar], e estou lá como líder, não por questão institucional. Explicando, estão lá automaticamente os líderes partidários, o que é institucional; estão também os presidentes de partido; no meu caso, entro como parlamentar de temática, que é a educação, e como articuladora. É um levantamento que analisa a capacidade de influenciar outros deputados e de conseguir articular pessoas que, às vezes, por força partidárias, estão em extremos e que a gente pode construir um lugar que dê conforto para uma construção que não seja essa coisa de vencedor e vencido.
A sra. diz que não é de centro. Seria de centro-esquerda, progressista? Ou essa identificação ideológica não a preocupa?
Não gosto muito de rótulo. Isso sempre empobrece a visão que se tem das pessoas. Teve uma vez que, conversando com meu colega Rodrigo Maia [PSDB-RJ, deputado federal licenciado do Rio de Janeiro, ex-presidente da Câmara e hoje secretário estadual de Projetos e Ações Estratégicas de São Paulo], numa discussão nesse processo de construção do Fundeb, eu disse: “Estou conseguindo apoio do pessoal da esquerda”. E então, ele disse “ah, você não vale, você é um DEM do B”, fazendo alusão a um outro colega que era do PCdoB e com quem ele brincava dizendo que era um deputado do PC do DEM, em função de posições que a gente assumia em algumas situações.
“A Emenda 95 [teto de gastos] virou uma armadilha contra o próprio gestor”
Enfrentei isso na Emenda 95 [PEC do Teto de Gastos], fui a única parlamentar do meu partido e do Estado que votou contra a emenda do teto de gastos. Eu participei da discussão, o partido era base, era Michel Temer (MDB) o presidente, e o ministro da Educação [José Mendonça Filho] era de meu partido e eu recebi uma ligação do presidente da República insistindo para que eu entendesse que era importante ter aquela política. Acho que tem avanços com essa questão de teto de gastos, o cuidado fiscal, por exemplo, mas na época eu votei assim e continuo hoje com a mesma posição. A Emenda 95 virou uma armadilha contra o próprio gestor. O governo hoje às vezes tem o recurso, um teto orçamentário, mas tem um problema fiscal cujas regras do teto de gastos impedem de colocar verba na área da saúde, porque lá tem uma limitação; impede de colocar o dinheiro na educação porque às vezes acaba tendo que ficar só com superávit ou direcionar para onde não existe amarra do teto de gastos.
A sra. quer disputar uma cadeira no Senado. Como andam as articulações para a viabilidade desse projeto?
Eu vejo como natural. Estou na política e faz parte do nosso trabalho amanhã disputar a prefeitura de Palmas, ou o governo do Estado, ou, agora, me colocar como candidata a senadora. Isso é do envolvimento político, da disposição de lidar com a política. Estou no terceiro mandado como deputada federal, mas isso não é uma profissão, não vou ficar com quatro ou cinco mandatos de deputada federal. Como eu disse, tenho um projeto para o Estado e quero continuar trabalhando, atuando na minha área. Enxergo que no Senado existe um espaço de construção e de contribuição que eu posso dar para o Estado. O Tocantins tem boas representações no Senado, que cumprem a sua tarefa. Os três senadores que estão lá vieram da Câmara, tiveram esse mesmo caminho natural de perspectiva política e de representação.
No meu caso, tive um chamamento muito forte das lideranças políticas e, em especial, de prefeitos e de instituições de Estado que representam a educação. É um fluxo natural de representação e tem uma coisa além dessa representação política: enxergo que estar no Senado pela educação é importante. Tenho repetido, em várias situações, sobre o papel e a capacidade que o Senado tem para influenciar na melhoria de vida de nosso País e de nosso Estado.
No Senado, pela própria natureza da Casa, a representação do Tocantins é a mesma do Estado de São Paulo. Isso quer dizer o quê? Que existe um espaço de construção em que posso fazer a diferença para o meu Estado. Isso não quer dizer que o Tocantins não tenha sido bem representado até agora, mas acho que eu também posso fazer essa diferença.
Tenho uma ligação muito forte com o municipalismo. Acho que a educação perpassa todas as áreas, mas ela tem um eixo estruturante e não tem nenhum país do mundo que mudou a sua condição de riqueza, de desenvolvimento econômico sem ter feito uma guinada na educação. Eu a vejo como um instrumento de redução da desigualdade, não automaticamente, mas é instrumento. A gente não constrói uma sociedade mais igualitária sem investimento na educação. Minha pré-candidatura veio naturalmente: começou com prefeitos me dizendo “deputada, meu povo aqui quer votar para a senhora não mais para deputada, não, mas para senadora”. Dizem que quando falam de disputa para o Senado meu nome sempre aparece. Então, fomos avaliando isso e eu sempre disse, antes de assumir esse projeto, que uma candidatura ao Senado não é escolha pessoal ou de um pequeno grupo. Um cargo de tamanha representatividade precisa vir de uma construção de grupo político, de coletividade do Estado.
Com quem a sra. vai compor chapa nesta disputa? Tem sido cortejada por governistas, mas também por oposicionistas como o ex-prefeito de Araguaína Ronaldo Dimas (PL). Nos bastidores, dizem que já há um acordo certo entre PL e UB. O que sra. tem a dizer?
Não tem nenhum candidato ao Senado e ao governo definido, com chapa completa. Todos estão nesse processo de construção, que começa com a formação, alinhamento de grupo, discussão que envolve prefeitos, deputados, líderes que não estão no mandato, mas que têm importância no Estado. Tem uma conjuntura nacional, então eu acho que é natural haver esse processo de discussão. Logicamente, existem afinidades em termos de candidatos e até de partidos, alinhamentos, a visão sobre o Tocantins e o que as pessoas podem esperar de nosso Estado, que é sofrido. E é sofrido por quê? É um Estado recente, ao mesmo tempo com uma grande extensão geográfica e com riquezas que fazem diferença para qualquer país. Nós estamos no coração do Brasil, nossa logística é estratégica para o País, as riquezas que temos, a oportunidade de trazer investimento para o Estado. E, ao mesmo tempo, a gente se depara com um grande desafio, que é a geração de trabalho, de desenvolvimento, de renda que vá além do emprego público, o qual hoje é uma grande demanda, mas não pode ser sempre por aí. Nenhum país dá conta de atender a todos só com a estrutura pública.
Hoje, a posição do União Brasil tem passado por discussão. Estamos conversando exaustivamente sobre o que a gente quer para o Estado, sobre como vamos construir essa proposta, que não é proposta da minha candidatura, mas um trabalho para nosso Estado. Ainda é uma discussão, ela está avançada com determinados pré-candidatos. Eu, mas eu diria que a gente reconhece o trabalho realizado pelo ex-prefeito de Araguaína, que também foi presidente da Fieto [Federação das Indústrias do Estado do Tocantins], foi parceiro importante na educação, foi deputado federal e como prefeito é indiscutível o trabalho dele em Araguaína, o qual está tendo continuidade com o prefeito Wagner [Rodrigues].
Tivemos prefeitos que fizeram e estão fazendo um bom trabalho. Tem exemplo de grandes e de pequenas cidades que, no espaço que cada um tem, em seu desafio, têm excelentes gestores. Tivemos a professora Nilmar [Ruiz] que foi uma das melhores prefeitas, não só porque era da educação, mas pelos trabalhos estruturantes em Palmas. E é lógico que reconheço o desafio do ex-prefeito Ronaldo Dimas. Da mesma maneira, o atual governador, que assumiu a gestão do Estado numa situação extremamente delicada, com pouco tempo de gestão e com muita coisa por fazer e – não me cabe aqui estar avaliando o trabalho dele – que tem se movimentado. Tem ouvido líderes, tem atendido prefeitos e vai depender do que eles vão defender para o Estado. Mais do que a pessoa Ronaldo Dimas [pré-candidato ao governo pelo PL], a pessoa Wanderlei Barbosa [pré-candidato à reeleição pelo Republicanos], a pessoa Paulo Mourão [pré-candidato ao governo pelo PT], a que respeito, todos, pelo histórico, o que eles pensam para o Tocantins? O que eles defendem? Quais os projetos para a segurança, a saúde, a educação, mas principalmente para o meio ambiente. Em um Estado em que o meio ambiente grita por cuidados, o que eles defendem e qual proximidade com o que eles defendem? O que eles querem construir deve estar alinhado com o que eu defendo como pré-candidata ao Senado para firmar essa parceria para o Tocantins. Passada a eleição, se eu for eleita, vou trabalhar pelo Estado de uma forma nacionalmente. Se não for eu, continuo minha história política de igual forma, com os projetos que queremos construir juntos para o Tocantins. Não adianta ficar em gabinete achando que temos a solução para tudo. É preciso ouvir o povo.