“O PT tem de fazer aliança para disputar o governo”

02 dezembro 2017 às 10h13

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Figura de proa do partido é contrário à posição isolacionista do presidente regional da sigla e lembra que prioridade é criar palanque para campanha de Lula no Estado

Divino Donizeti Borges Nogueira é graduado em administração de empresas pela UFT. Filiado no PT desde 1983, foi presidente regional da sigla e atualmente é membro do diretório e secretário de formação política do partido. Como secretário-geral do PT, coordenou campanhas do partido, com destaque para as campanhas vitoriosas de Lula em 2002 e de Raul Filho, em Palmas, em 2004. No ano seguinte, assumiu a Secretaria Municipal de Governo, oportunidade em que implantou o programa Prefeitura nos Bairros, que descentralizou os serviços de gestão e atendeu mais de 150 mil palmenses.
Em 2014 foi eleito suplente da senadora Kátia Abreu e assumiu, em 2015, a cadeira no Senado Federal por 15 meses, uma vez que Kátia Abreu assumiu o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento. Nesta época, participou de votações e discussões polêmicas como, por exemplo, a prisão de um seus pares, o senador Delcídio Amaral, como também sobre o impeachment de Dilma Rousseff.
Donizeti Nogueira fala ao Jornal Opção sobre suas experiências na condução estadual do partido, exercício do mandato de senador entre os anos de 2015 e 2016, como também as perspectivas da sigla no Tocantins para as eleições de 2018
Como o sr. viu e absorveu o lançamento da pré-candidatura do deputado Paulo Mourão, seu correligionário, ao governo do Tocantins em 2018?
Creio que o partido está correto em lançar, desde já, um nome para concorrer no próximo pleito. Contudo, devemos ressaltar que eleição não se ganha sozinho, é necessário fazer alianças.
Mas o presidente regional do partido, deputado Zé Roberto, já disse que descarta alianças com a ampla maioria dos partidos…
O companheiro Zé é pragmático. Na verdade o que ele deseja, nesse momento, é uma distinção da sua gestão à frente do partido, daquelas que já houve anteriormente, inclusive a minha. É necessário, na visão dele, impingir uma marca.
Ocorre que eleição é um processo de somas e nós, nesse momento, precisamos seguir a diretriz estratégica nacional, que orienta que a prioridade é a eleição de Lula à Presidência. A segunda prioridade é a eleição de deputados federais, com a finalidade de dar sustentabilidade ao presidente. Caso a candidatura do Paulo —que afirmo: é séria— se viabilize e se transforme num palanque forte para o pré-candidato Lula, vamos abraçar e apoiar o projeto.
Há situações bem definidas hoje: o governador Marcelo Miranda (PMDB), que já consolidou seu grupo, o prefeito Carlos Amastha (PSB), que também o fez, a senadora Kátia Abreu (sem partido), que está trabalhando em busca do seu espaço, e, por fim, o PT. O pior erro nós poderíamos cometer, e não podemos correr esse risco, é ficarmos isolado. Seria o desastre total. Então, minha tese é que o PT deve abrir um intenso diálogo com a senadora Kátia Abreu.
E não é porque eu sou suplente dela e assumiria o cargo, não por isso, mas é que ela assumindo a candidatura ao governo do Estado e, sendo fiel a Lula e a Dilma, além de oposição a Temer no Senado Federal, como tem demonstrado, fica complicado para o PT do Tocantins não prestar-lhe apoio nessa jornada.
E uma aliança com o prefeito Carlos Amastha, seria possível?
Acho difícil, caso a senadora Kátia lance a candidatura dela, em razão daquilo que acabei de expor. Caso a candidatura dela não seja viabilizada, aí sim, poderíamos conversar sobre alianças com o prefeito.
No que concerne à suplência ao Senado, como está hoje a sua relação com a senadora Kátia Abreu?
Temos uma relação excelente. Foi uma honra para mim ter me tornado suplente dela e, posteriormente, exercido o cargo de senador da República por 15 meses. É lógico que nós temos divergências ideológicas, mas o que nos uniu na época foi a necessidade conjuntural de eleger a presidente Dilma e o governador Marcelo Miranda. Em relação ao desenvolvimento econômico do Estado, temos visões bem parecidas e convergência de ideias, uma vez que acreditamos que é necessário investir nas 50 mil famílias e assentados que praticam agricultura/pecuária familiar, fomentando essas atividades, estimulando a produção com novas tecnologias e, por consequência, distribuindo renda. Isto faz, verdadeiramente, que Estado cresça, econômica e socialmente.
Como foi essa experiência no Senado Federal?
Extraordinária. Em que pese estar no centro das discussões do impeachment, por ser filiado ao PT, participei de debates intensos e muito ricos, sobretudo acerca das mudanças climáticas, em várias reuniões e audiências públicas com as mais renomadas autoridades das mais diversas áreas.
Sobre o processo de impeachment de Dilma Rousseff, do qual o sr. participou intensamente por ser militante convicto do PT, além de estar no cargo de senador naquele momento, qual é sua avaliação?
Tudo é aprendizado, mas para quem tem a compreensão do projeto em desenvolvimento que nós havíamos colocado em curso, desde 2002, e vê, de repente, ele ameaçado, é realmente desolador.
O modelo brasileiro é, na verdade, confuso e injusto. Veja: afasta-se o governante denunciado para que se faça as investigações e alça-se o vice ao poder. Esse mesmo vice passa, naturalmente, a trabalhar contra o ex-governante, na medida em que pretende continuar no cargo.
Pude perceber que as coisas não se decidem apenas dentro dos limites do território brasileiro. Posso afirmar que, a partir do momento que o Brasil ocupou uma área marítima que, a princípio, não era de ninguém e, ato contínuo, divulgou que dominou a tecnologia de exploração do pré-sal, capaz de extrair petróleo infinitamente mais barato e de melhor qualidade, os gigantes internacionais passaram a ter interesse na política brasileira.
A verdade é que o Brasil avançou muito na cadeia e produção de gás e petróleo. Avançou, também, nos serviços de infraestrutura e engenharia naval. O país, por fim, deu um salto enorme, quando o assunto é produção de alimentos. Tudo isso incomodou e desagradou demais, sobretudo, os Estados Unidos da América. Restou provado um absurdo caso de espionagem e escutas telefônicas no Palácio do Planalto e, também, na Petrobrás. Evidentemente, toda essa sorte de fatores contribuiu muito para o desfecho do impeachment, sem dúvidas.
Quando se fala de PT no Tocantins imediatamente sua figura é lembrada. Como explicar para esse eleitor, como também para os apartidários, que a sigla que chegou ao poder em 2002 empunhando a bandeira do progresso e das mudanças, agora tornou-se referência quando o assunto é corrupção?
Ao longo da minha trajetória no PT, que já passa de 20 anos, eu tenho dito que o PT não perfeito, mas para mim, é o melhor. É necessário ressaltar que o principal problema do Brasil não é a corrupção, até porque as perseguições ao partido e seus integrantes não ocorreram por isso, e sim por “acertos políticos”. Na verdade, o PT possibilitou a ascensão da classe C e D em todos os aspectos, permitindo, por exemplo, que o filho do pobre estudasse na mesma universidade do filho do rico. É necessário lembrar disso e também de outras conquistas como aquisição da casa própria, advinda do programa Minha casa, minha vida.
Um dos graves erros do PT, em todo caso, é que a sigla na condição de partido de esquerda, não poderia se omitir em dizer que existe a luta de classes, e também, que ainda vigora a luta da direita contra a esquerda. Ao omitir isso, deixamos de conscientizar e intensificar a participação popular na vida política do país. Politicamente, o nosso erro foi privatizar ingenuamente o legado do PT para os petistas. As melhorias que o PT promoveu não pertenciam ao PT e sim ao povo. Deveríamos ter tido a capacidade de conscientizar a sociedade que as conquistas eram dela, porque quando a população tem essa consciência, ela luta pela causa. Caso isso houvesse ocorrido, não haveria “golpe”, contudo, como a conquista estava atrelada ao PT, o povo não se engajou na causa.
Polêmica atual no Estado do Tocantins, muito tem se discutido o projeto do deputado federal pernambucano Gonzaga Patriota (PSB), que tem a finalidade de transpor as águas do Rio Tocantins para a bacia do Rio São Francisco. Qual a sua opinião?
Eu gostaria muito que o nosso rio estivesse em condições de fazer essa concessão aos nossos irmãos nordestinos, mas infelizmente, não está. Ser contrário ou favorável à transposição não é o debate a que devemos nos ater. Nossa preocupação deve ser na elaboração de projetos para revitalizar as nascentes e bacias de ambos os rios, envolver a sociedade tocantinense na discussão desse tema. Se essas recuperações fossem realizadas, futuramente poderíamos até mesmo colocar em prática um antigo projeto do saudoso governador Mauro Borges, de emendar o Araguaia e o Tocantins, criando perpendicularmente, outro rio, visando equilibrar a vazão das águas.
Dentro da discussão neoliberalista, qual sua visão sobre a máxima que o Estado não pode gastar mais do que se arrecada?
Entendo que não se faz desenvolvimento sem endividamento. A questão é que esse endividamento tem que gerar o retorno, ser capaz de se pagar. Não podemos ser tão ingênuos de acreditar que podemos gastar apenas o que se arrecada, sob pena de não haver desenvolvimento. Se o Estado tem capacidade de endividamento, o que devemos discutir é se estamos investindo os recursos oriundos do endividamento de forma correta, que seja capaz de gerar desenvolvimento econômico e social, sem esquecer – evidentemente – da sustentabilidade.
Formulado ainda no início da criação do Tocantins, o slogan “O Estado da livre iniciativa e da Justiça Social” ainda se encaixa nos dias atuais?
É certo que devemos rediscutir o tema. Livre iniciativa para que ou para quem? Para continuar desmatando desenfreadamente as nascentes e assoreando os nossos rios? Para enricar ainda mais alguns poucos e empobrecendo tantos outros? A livre iniciativa que queremos, por exemplo, é o poder do Estado de gerenciar, fiscalizar e garantir a sustentabilidade ambiental.
Já a justiça social também anda capenga. Ainda temos muita pobreza, se levarmos em consideração a densidade demográfica do Estado do Tocantins. A verdade é que a implantação deste Estado foi realizada sem um projeto de planejamento estratégico e tivemos um governo de eventos pontuais. Para se ter uma ideia, o governo fez o projeto do Prodecer em Pedro Afonso, no entanto, não incluiu o projeto da ponte sobre o Rio Tocantins. A logística do escoamento da produção restou, portanto, prejudicada. Esse é apenas um exemplo para demonstrar que o Estado não foi pensado a longo prazo. Chegou a hora de o povo tocantinense repensar e reconceituar o Estado e definirmos o que queremos para os próximos 10, 20 ou 30 anos.
Quais são as suas impressões acerca do relatório do Cenovo [Comissão Especial de Estudos para o Novo Ordenamento Econômico, Administrativo, Social e Político do Tocantins], redigido pelo seu colega de partido, o deputado Paulo Mourão?
Não o conheço na íntegra, tenho que me debruçar sobre ele para estudá-lo, mas posso dizer que se trata um relatório socioeconômico do Estado do Tocantins, fruto de reuniões e audiências públicas que ele promoveu nas mais diversas cidades tocantinenses, ouvindo quem realmente importa: a população.