Irajá Abreu, a voz solitária da oposição que começa a incomodar

04 junho 2023 às 00h00

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O senador Irajá Abreu (PSD) já deu provas absolutamente claras de que deseja ver o governador Wanderlei Barbosa (Republicanos) pelas costas, de preferência deixando o Palácio Araguaia. Antes mesmo de encerrar as eleições de 2022, o senador, que também concorria ao governo, protocolou ação de investigação judicial eleitoral (Aije) no Tribunal Regional Eleitoral (TRE-TO) sob a alegação de contratação de 16 mil servidores nos três meses que antecederam as eleições, o que, segundo a ação, configuraria uso da máquina para fins eleitorais.
A ação dificilmente será julgada procedente pela corte eleitoral, tendo em vista que a motivação está declaradamente ligada a disputa eleitoral. Não importa. O senador faz uma oposição sistemática, não raivosa, mas criteriosa, e tem buscado todas as possiblidades de expor o governo e denunciar o que considera pouco transparente. É óbvio que Irajá ainda não encontrou material robusto que possa levar a um escândalo. Porém, não tem deixado de acompanhar as ações do governo, atento a tudo que acontece. De tanto fustigar o governo com pequenas críticas, começa a incomodar.
Esta semana, o senador mostrou que mantém a vigilância. Por meio das redes sociais informou que teve requerimento aprovado no plenário do Senado pedindo auditoria no governo para averiguar aplicação de recursos na área da saúde. “Esta semana tive meu requerimento aprovado no Senado Federal para que o Tribunal de Contas da União (TCU) realize uma auditoria minuciosa nos contratos do governo do Tocantins na área da saúde e na Secretária de Trabalho e Desenvolvimento Social (Setas).
O senador denuncia que os valores “somam incríveis R$ 201 milhões e um exemplo chocante é o aluguel de 30 ambulâncias por R$ 30 milhões ao ano. Com esse montante, seria possível comprar 120 ambulâncias novas todo ano. Com o dinheiro de cada ambulância alugada, em três meses daria para comprar uma ambulância nova”, questiona, enfatizando que seu compromisso é de exigir transparência e punição para quem praticou irregularidades. É apenas um requerimento, sem maiores consequências, mas é a oportunidade que o senador tem para levantar dúvidas quanto à transparência do governo.
Aliados do governo condenam a postura do senador, a que consideram uma perseguição que no fundo pode prejudicar o Estado, que vem de um longo período de instabilidade política, com a cassação de governadores. De 2009 para cá, três governadores eleitos foram afastados do mandato. Marcelo Miranda, em 2009, teve mandato cassado; em 2018, ele novamente foi afastado do cargo, por prática de crime eleitoral; e em 2022, Mauro Carlesse renunciou ao mandato após afastamento pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ), por suspeita de esquema de corrupção e uso da máquina para interesses pessoais.
De aliado a adversário
O senador Irajá Abreu (PSD) e a senadora Kátia Abreu (pP) foram os primeiros líderes políticos a anunciar apoio ao governador Wanderlei Barbosa (Republicanos) no final de 2021, logo que o vice-governador assumiu o comando do Palácio Araguaia. Naquele momento, o novo governante apresentava fragilidade política em função do rompimento com o carlessismo.
Os senadores foram fundamentais para a construção da governabilidade que permitiu a Wanderlei estruturar o novo governo. Tornavam-se aliados de primeira hora do novo governador. Wanderlei chegou ao governo na condição de vice que foi alijado do poder, mas que soube manter uma convivência com toda a equipe. Ao assumir o governo, não teve dificuldade para reorganizar o time, sem grandes alterações, mas puxando para ele o comando, inclusive partidário. Irajá e Kátia faziam oposição a Carlesse e aproveitaram a ascensão do vice para se reaproximarem do Palácio Araguaia.
Tudo ia muito bem até meados de abril de 2022, quando começaram a afunilar as escolhas para a formação da chapa governista para as eleições. Ao se configurar a candidatura da Professora Dorinha Seabra (UB) para o Senado na chapa do governador, os Abreus resolveram se distanciar do Palácio e buscar outras opções de alianças. A senadora Kátia concorreu à reeleição com candidatura isolada. Irajá, que até então não falava em disputar as eleições, resolveu concorrer ao Palácio Araguaia.
Irajá fez campanha tecendo duras críticas ao candidato governista, com denúncias de abuso de poder, uso da máquina e a contratação excessiva de servidores com fins eleitoreiros. Irajá terminou o pleito em 4º lugar, tendo conquistado 63.048 votos, o que representa 7,61% dos votos válidos. Desde as eleições, o senador tem mantido a postura de oposição sistemática. Irajá é crítico do governo, mas permite que deputados do PSD sejam aliados do Palácio Araguaia.
O governo até agora tem ignorado solenemente as acusações do senador, mas não será por muito tempo, tendo em vista o desconforto que essas críticas provocam. É que o governador mantém um alto índice de aprovação popular, que tem a ver mais com expectativa do que com resultado. Ou seja, o governo ainda não tem uma imagem consolidada de bom gestor. Tem sido ágil em atiçar as expetativas da sociedade, lançados novos projetos e obras, mas, com o tempo, promessas não realizadas viram desgaste. O senador aposta que o governador não vai dar conta de realizar tudo que prometeu, o que se torna mais difícil se começar a enfrentar desgaste.
Bem ou mal, o senador Irajá Abreu vai marcando sua trajetória como a única voz capaz de incomodar o Palácio Araguaia. Ainda não conseguiu explorar de forma eficiente as contradições do governo, mas tem se revelado um opositor atento. Ao pedir transparência na aplicação de recursos na saúde, o senador sabe que este é uma área difícil para qualquer governo. Suas dúvidas certamente podem incomodar.