Deputados alertam que governo pode “fabricar” decreto legislativo sobre rejeição das contas do ex-governador atribuindo improbidade administrativa onde não tem para criar motivo para o TRE negar o registro de sua candidatura

Ruy Bucar

Ex-governador Marcelo Miranda (à esquerda): sob ataque cerrado do siqueirismo. Ex-governador Gaguim: contas de 2009 só agora sob análise. Fotos: Fernando leite/Jornal Opção
Ex-governador Marcelo Miranda (à esquerda): sob ataque cerrado do siqueirismo. Ex-governador Gaguim: contas de 2009 só agora sob análise. Fotos: Fernando leite/Jornal Opção

O golpe é rasteiro, violento e absurdo. Mas está sen­do urdido na As­sem­bleia Legislativa aos olhos dos deputados tanto do governo quanto da oposição e faz parte da estratégia do siqueirismo para se manter no poder a qualquer custo. Com uma gestão desastrosa e sem perspectiva o governo apela para o “tapetão”, tentando eliminar adversários considerados imbatíveis, já que não pode enfrentá-los nas urnas e conta com aliados poderosos, Tribunal de Contas do Estado e Tribunal Regional E­leitoral, órgãos aos quais o siqueirismo mantém controle e que atendem os seus caprichos, segundo os próprios deputados.

O ex-secretário de Relações Institucionais Eduardo Siqueira Campos (PTB), o grande responsável pelo desastre administrativo da gestão do pai, ainda não desistiu de todo de ser candidato ao governo. Por enquanto, talvez em função do índice de rejeição altíssimo, ensaia candidatura a deputado estadual, mas no fundo ainda acredita que terá chance de vir a disputar o Palácio Araguaia. As chances aumentam se não tiver concorrentes competitivos, daí se explica o esforço monumental para tirar o ex-governador Marcelo Miranda (PMDB) da disputa, o nome mais cotado até o mo­mento na corrida sucessória.

Deputados manifestam preocupação com a edição do decreto legislativo relativo às contas dos ex-governadores Marcelo Miranda e Carlos Henrique Gaguim (PMDB), referente ao exercício de 2009, que inexplicavelmente só agora estão sendo apreciadas. Como se sabe Marcelo Miranda deixou o cargo no dia 8 de setembro de 2009 e foi substituído pelo então presidente da As­sembleia Legislativa, Carlos Hen­rique Gaguim, que depois foi eleito governador e comandou o Estado até 31 de dezembro de 2010.

As contas, segundo o deputado José Augusto Pugliesi (PMDB), presidente da Comissão de Finan­ças, Tributação, Fisca­li­za­ção e Controle e relator da matéria, não têm nada de irregularidade e têm parecer técnico do TCE pela aprovação. O deputado conta que o parecer foi aprovado por unanimidade na comissão, mas rejeitado no plenário. “O objetivo é claro, tornar o ex-governador inelegível pela prestação de contas”, afirma o deputado, que avalia que o julgamento teve caráter político e ignorou o parecer técnico do TCE, pela aprovação.

“Não há razão para rejeição das contas. Foi um julgamento eminentemente político”, garante o deputado Bonifácio (PR), que é advogado e explica que em relação aos ex-governadores, se houve irregularidades eles não poderão ser responsabilizados, pois não são ordenadores de despesas. “Os responsáveis seriam os seus secretários, muitos deles estão aqui no plenário da Assembleia assumindo papel de juiz deles mesmos e votaram contra si próprios”, relata o parlamentar, que classifica a rejeição de ato politicamente incorreto.

Por incrível que pareça, a rejeição das contas de Mi­ran­da contou com votos favoráveis do PMDB, e foi um recado cla­ro de que a intenção do governo de tirar o ex-governador da disputa pode ir muito além da ameaça.

Os parlamentares alertam para o risco de manobra do governo na edição do decreto legislativo. Bonifácio, que é da base do governo, mas votou pela aprovação das contas, afirma que é preciso observar o que vai estar escrito neste documento, que precisa ser aprovado nas comissões permanentes e no plenário. O deputado observa que o decreto pode apontar improbidade administrativa que não consta no processo, seguramente para servir de motivação para o TRE negar o registro de candidatura ao peemedebista.

Tramita na Casa projeto de sua au­toria com pedido de anulação da votação por considerar que apreciação da matéria não permitiu o di­reito de ampla defesa. Bonifácio a­ponta ainda mais duas inconveniências na rejeição da matéria: a não individualização das contas e a não comprovação de que houve dolo. Para ele se os ex-governadores não são ordenadores de despesas não tem como lhes atribuir im­pro­bidade administrativa. A propositura do deputado certamente será rejeitada. O governo tem maioria no plenário e já assumiu po­sição contrária a anulação da votação.

A guerra declarada para impedir Miranda de ser candidato tem explicação clara. Pesquisas indicam que com Marcelo na disputa é uma coisa, sem Marcelo é outra bem diferente, em que todos estariam nivelados. O ex-governador é o nome mais cotado para conquistar o Palácio Araguaia nestas eleições. Talvez esse dado explique a operação “tapetão” que vem sendo empreendida pelo governo e que tem como meta impedir o peemedebista de ser candidato.

Para a advogada Ângela Mar­ques, a Lei 5.490 que alterou a Lei 139 (lei da Ficha Limpa), estabelece que o gestor só deixa de ser candidato quando condenado por ato de improbidade administrativa. A advogada explica que o TCE não aponta atos de improbidade, apenas irregularidades no remanejamento do orçamento, que segundo ela atendeu as exigências legais como em outros governos, inclusive do ex-governador Siqueira Campos. E que estaria de acordo com recomendações da Lei de Responsabilidade Fiscal. Para a advogada a lei é bem clara, “para se tornar inelegível não basta ter as contas reprovadas é preciso que sejam reprovadas por ato de improbidade administrativa”, observa, e não é o caso.

O jornalista e advogado Luiz Ar­mando Costa explica que do ponto de vista da responsabilidade le­gal governador não é gestor, portanto não deve responder por eventuais irregularidades nas suas contas. Quem responde são os secretários, ordenadores de despesas. Acrescenta ainda que no caso das contas de 2009 com parecer fa­vorável do TCE não houve ilegalidade, mas irregularidades sanáveis.

Marcelo Miranda é elegível e está em pré-campanha empolgado com a receptividade ao seu projeto político. Quem garante é a senadora Kátia Abreu (PMDB), provável companheira de chapa do ex-governador e que exibe durante reuniões do partido pelo interior do Estado certidões negativas que comprovam que nada há tramitando na Justiça Eleitoral que impeça Miranda de ser candidato ao cargo que desejar nas próximas eleições.

Irritado com a perseguição implacável que vem sofrendo, mas consciente de que o verdadeiro motivo é sua boa cotação nas pesquisas de intenção de voto, Miranda diz que não teme as manobras do governo para prejudicar o seu projeto político. Para o ex-governador esse tipo de posicionamento só revela o quanto são fracos e quanto temem o julgamento popular.

Juristas afirmam que o ex-go­vernador é elegível e que rejeição das contas pela Assembleia Le­gislativa não impede candidatura, pois não houve ilegalidade apenas irregularidades sanáveis. Os deputados governistas também sabem que não houve improbidade administrativa, mas isso não os interessa. O que interessa a eles é que as contas do ex-governador foram rejeitadas e que isso pode impedir o peemedebista de ser candidato.

Na verdade a reprovação das contas do ex-governador pela Assembleia Legislativa em si não determina nada, mas é um pretexto para o TRE negar o registro da sua candidatura. Advogados do ex-governador garantem que se isso ocorrer estão preparados para garantir o seu direito de disputar as eleições, ainda que tenham que recorrer aos tribunais superiores em Brasília onde é certa a vitória, como em outras ocasiões em que teve que recorrer e conseguiu.