Ex-governador Carlos Gaguim é denunciado por crimes cometidos em 2010
18 novembro 2018 às 00h00

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Deputado alega que fatos denunciados pelo Ministério Público Estadual já foram analisados pelo STF

Máscaras não duram para sempre. Um dia elas caem. Não apenas porque há uma onda de moralidade e combate à corrupção no País. Definitivamente não é só por isso. A bem da verdade, nada fica debaixo do tapete para sempre. Os processos judiciais são lentos, as investigações, na ampla maioria das vezes, seguem o mesmo ritmo e, em razão do imediatismo natural dos seres humanos, cria-se uma ideia de impunidade.
Entretanto, de vez em quando, as faturas são apresentadas. Se o ex-prefeito Carlos Amastha (PSB) foi questionado e confrontado na semana anterior por membros da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) do PreviPalma em razão de aplicações consideradas fraudulentas, nesta semana a bola da vez foi Carlos Henrique Gaguim (DEM), deputado federal reeleito, o primeiro a ser denunciado criminalmente em pleno exercício do mandato.
Segundo o novo entendimento do Supremo Tribunal Federal (STF), Gaguim apenas teria direito ao foro, por prerrogativa de função, se os crimes denunciados guardassem relação com as atribuições do cargo atualmente ocupado, o que não é o caso.
Na segunda-feira, 12, o Ministério Público do Estado do Tocantins (MP-TO) propôs denúncia por crimes cometidos ainda em 2010 na venda de 193 lotes públicos, localizados na quadra ARSO 71, em Palmas, contra o ex-governador Carlos Henrique Gaguim e mais quatro pessoas. Essa é a primeira de uma série de denúncias que serão oferecidas por irregularidades cometidas na venda de imóveis públicos do Estado do Tocantins naquele ano.
Além do ex-governador, foram denunciados o ex-procurador-geral do Estado, Haroldo Carneiro Rastoldo, a ex-subprocuradora-geral, Rossana Medeiros Ferreira de Albuquerque, além de José Aníbal Rodrigues Alves Lamattina e Ruy Adriano Ribeiro, ex-presidentes da Codetins.
Segundo a denúncia criminal, os imóveis da quadra ARSO 71, localizada em uma região nobre da capital, foram vendidos mediante dispensa de licitação fora das hipóteses previstas em lei sem autorização legislativa e sem avaliação prévia de valor de mercado.
Foram arrecadados R$ 1.596.089,94 com as vendas, mas o valor de mercado dos 193 imóveis alcançava R$ 12.587.372,23, segundo Relatório de Tomada de Contas Especial da Controladoria Geral do Estado (CGE). A venda envolveu 171 lotes comerciais, oito lotes multifamiliares e 13 lotes comerciais, que causaram prejuízos na ordem de R$ 10.991.282,29 aos cofres públicos.
Funcionamento do esquema criminoso
Segundo a denúncia, o ex-governador Gaguim é apontado como dirigente das atividades praticadas pelo grupo de denunciados. Ele teria capitaneado o cancelamento da liquidação da Codetins perante a Assembleia Legislativa, tendo por finalidade reativar a companhia e executar as atividades ilícitas. Pelo esquema engendrado, os lotes da ARSO 71 foram vendidos diretamente no balcão da Codetins, sem licitação, por preço bastante inferior àqueles verificados no mercado imobiliário.
Já Haroldo Rastoldo agia na instituição como porta-voz do então governador, tendo participado de todas as assembleias da estatal e autorizando a incorporação e a desincompatibilização de lotes públicos. Ele teria deixado de praticar, dolosamente, o controle prévio de legalidade dos atos da administração pública, assim como a subprocuradora-geral do Estado, Rossana Medeiros Ferreira Albuquerque, que o substituiu por diversas vezes como representante do Estado na Codetins.
José Aníbal Rodrigues Alves Lamattina foi indicado para a presidência da Codetins por Haroldo Rastoldo para participar da execução das ilicitudes. Posteriormente, o próprio Rastoldo teria proposto sua destituição e indicado como substituto Ruy Adriano Ribeiro para dar continuidade às práticas ilegais.
Os denunciados, se condenados, ficam sujeitos a pena privativa de liberdade, além de pagamento de indenização, no valor correspondente ao prejuízo causado devidamente atualizado, o que ultrapassa R$ 10 milhões.
Em resposta, o deputado disse que os fatos denunciados pelo Ministério Público Estadual já foram analisados em fevereiro de 2017 pelo Supremo Tribunal Federal (STF), que decidiu pelo arquivamento da ação por ausência de conduta irregular, enfatizando que confia totalmente na justiça tocantinense e que recebe com estranheza e surpresa a abertura deste processo com os mesmos fundamentos.
Entretanto, o parlamentar se esqueceu que aquele arquivamento foi apenas de um inquérito policial que investigava o caso em instâncias superiores. A denúncia apresentada em 2018 baseia-se nos documentos arregimentados pela força-tarefa do MP-TO e Polícia Civil, que indicam que o ex-governador era o autor intelectual das ações ilegais, travestidas de “regularização fundiária”.
Não se trata de prejulgamento. Mas, ao compulsar os autos, a denúncia em si, bem como as robustas provas juntadas, não fica difícil constatar que houve fraude. Os fatos são notórios. Em 2010, após a cassação de Marcelo Miranda (MDB) e a ascensão de Gaguim ao Palácio Araguaia, Tocantins ficou conhecido como “balcão de negócios”.
A conta pode até ter demorado a chegar, mas enfim chegou. Talvez o processo se arraste por longos anos. Talvez não. O certo é que uma condenação criminal do deputado pode ter como consequência a perda do mandato por falta de decoro parlamentar.