“Estamos muito amarrados em termos de execução orçamentária e financeira”
21 fevereiro 2015 às 08h40

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Secretário de Planejamento diz que Lei Orçamentária Anual, que será enviada à Assembleia Legislativa do Estado nesta semana, está aquém do necessário e deverá restringir algumas ações do governo para este ano

Gilson Cavalcante
Lei Orçamentária Anual (LOA) para o exercício deste ano será encaminhada pelo governo, no início desta semana à Assembleia Legislativa. O documento estima a receita e fixa a despesa em mais de R$ 9,7 bilhões, mais de 21% de aumento. A LOA será protocolada pelo secretário de Estado do Planejamento, Davi Torres, para quem o governo está sem execução financeira nos primeiros meses do ano, em razão da falta do orçamento. “Perdemos muito porque não tinha nada para executar, não existia nenhuma alternativa, não tinha dinheiro nem para comprar água. Em janeiro, fevereiro e março só podemos executar 1/12 do orçamento do ano passado. Qualquer despesa tem que passar antes na Seplan e na Sefaz (Secretaria da Fazenda); estamos muito amarrados em termos de execução orçamentária e financeira”, lastimou o secretário na entrevista concedida, com exclusividade, ao Jornal Opção. Torres disse que o maior problema que o Estado enfrenta hoje é com relação ao Cadastro Único de Convênios (Cauc). “Se a gente não estiver limpo no Cauc, não conseguimos convênios. E nós ainda estamos sujos. O esforço que estamos fazendo é para que, ainda nesse primeiro quadrimestre, o governo continue fazendo o pagamento dos servidores até o dia 12 de cada mês. Mas, a partir do segundo quadrimestre, iremos começar a pagar já do dia 1º ao quinto dia útil”, relatou o secretário. O esforço de Seplan e Sefaz, segundo ele, é que a receita tributária seja igual à despesa de pessoal. Pelos seus cálculos, hoje a despesa com pessoal gira em torno de R$ 250 milhões brutos e a receita tributária está na ordem de R$ 170 milhões. “A ideia é adotar um procedimento para evitar sonegação e fiscalização, nada de injustiça social. A ideia é não aumentar imposto, mas melhorar os procedimentos de arrecadação”, adiantou. Outro problema apontado por Torres se relaciona à contrapartida do Estado com relação aos programas e convênio. Segundo ele, o Estado tinha que ter R$ 60 milhões no orçamento de 2015, mas só conseguiu consignar R$ 26 milhões. “Este ano, em síntese, o Estado tem que ter o equilíbrio entre receita e despesa. Esse serviço está em torno de R$ 1,8 bilhão de dívida ativa. Por isso, estamos entrando com o Refis”, aponta.
Diante das dificuldades encontradas pelo governo Marcelo Miranda no aspecto financeiro, é possível dizer que 2015 será um ano difícil?
Justamente. Nós estamos com uma dificuldade muito grande na questão da receita do Estado, que se encontra inteiramente comprometida com a herança que nós recebemos. Metade dessa receita é para a despesa de pessoal. Por isso, os decretos do governador tornando nulos os atos do governo passado, que concediam benefícios a uma série de categorias de servidores, fora do período permitido pela Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF). A ideia para fazermos esse orçamento tem como base a legalidade. O que significa isso? São os índices de pessoal, da LRF, que são de 49%, o índice da educação (25%), o índice da saúde (12%), pagamento de dívidas. Então, o que não for legal não será colocado no orçamento. Nós temos 13 folhas de pagamentos a serem quitadas no ano (de janeiro a dezembro mais o 13º salário). Se pegarmos a folha de dezembro, a gente consegue fazer o pagamento das 13 folhas. Agora, todas as leis que foram aprovadas nos 180 dias antes do final de 2014, são consideradas atos nulos porque é uma exigência da Lei Eleitoral, que proíbe qualquer aumento de salário nesse período. Outra questão é o limite legal, que já estava em 51,17%. Portanto, não poderia ser concedido nenhum aumento. O que acontece? Se a gente considerar esses aumentos dos últimos 180 dias de 2014, representam mais uma folha de pagamento de servidores a ser quitada, ou seja, R$ 250 milhões. Se a gente considerar os outros aumentos que nós suspendemos para análise, totalizariam duas folhas e meia. Então, nós teríamos de pagar 16 folhas e meia em um ano. O orçamento daria, portanto, para pagar as despesas com folha dos servidores somente até o próximo mês de agosto. O que fizemos no orçamento: o engessamento dos outros Poderes. Teve um aumento na LDO do ano passado, elaborado pelo governo passado, de 6,48%. Os outros Poderes tiveram o orçamento praticamente engessado também. Nós, então, encaminharemos esse orçamento com um acréscimo de 6,48% e durante o exercício deste ano nós vamos conversar com cada órgão.
Os presidentes desses órgãos estão cientes das dificuldades do Estado?
Eles são grandes parceiros. Todos os poderes reconhecem e são solidários com a situação que o Estado se encontra atualmente. O governador, tão logo assumiu a administração e sua primeira determinação foi me incumbir, juntamente com o doutor Sérgio do Vale (Procurador Geral do Estado) e o Paulo Afonso (secretário da Fazenda) de visitar cada Poder e relatar sobre a situação financeira do Estado. Os dois órgãos que tiveram problemas de ajustes foram Defensoria Pública e o Tribunal de Justiça. Mas eles estão entendendo o aperto pelo qual nós estamos passando (o Estado) e vão dar a parte de contribuição deles também. Durante o ano, vamos verificar o que pode ser feito, para aumentar a receita. Nós estamos fazendo o dever de casa.

O secretário da Fazenda, Paulo Afonso, disse que a situação financeira do Estado só poderia ser melhorada se fossem feitos cortes drásticos nas despesas e aumento na receita. Como fazer isso?
O corte drástico foi a contenção, por exemplo, da parte de custeio da máquina, em 40% com diárias, serviços de consultorias e despesas, como coffe breaks e viagens. Estamos sendo muito firmes nessa contenção. Desde a época de 2008, se recorrermos aos demonstrativos, o pessoal cresce assustadoramente, com uma variação acima de 300% na folha do Executivo. A receita nesse período só cresceu 131%. Aí dá uma diferença muito grande entre crescimento de pessoal e crescimento de receita. Se cresce o pessoal, a gente tira de onde? Do investimento. Então, a taxa de investimento praticamente desabou. Em 2008, no segundo mandato do governador Marcelo Miranda, era de 25% do orçamento; no último ano não chegou nem a 12%. E este ano tende a ser menor ainda.
Este ano, então, não vai sobrar dinheiro para investimentos?
Muito pouco. O volume de recursos do Tesouro é praticamente zero. Então, a prioridade do governo este ano é saúde, educação e segurança pública. Existe muito dinheiro para a saúde, mas a questão é gestão. O secretário da Saúde (Samuel Bonilha) está fazendo um esforço muito grande de tentar colocar o trem nos trilhos e com todo o dinheiro que está sendo locado, tenho certeza de que ele fará um bom trabalho, apesar de toda a crise, evitando desperdício e fazendo uma gestão melhor. Na educação, tem as vinculações, que são oriundas do Fundeb [Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica], mas com todas as dificuldades dá para se ajustar as contas e os compromissos. O restante que é o problema. A gente não dispõe de recursos ordinários. Temos um dinheiro bom do Banco Mundial, do PDRIS [Projeto de Desenvolvimento Regional Integrado e Sustentável], temos dificuldades da contrapartida do governo.
Essas dificuldades são em função, principalmente, de quê? Do rombo do Igeprev?
De tudo. Essa herança que o governo assumiu, muitas dívidas, muitos acertos, despesas continuadas que o governo tem que pagar. Quando o governo assumiu, tinha o Cauc (Cadastro Único de Convênios) com pendências seríssimas. A maior delas chama-se previdência. O que aconteceu na última gestão? Além da dívida da parte patronal, existe também a própria dívida dos recursos que foram descontados dos servidores. Isso tem que ser regularizado. A parte do servidor tem que ser paga à vista e isto já está sendo feito pela Secretaria da Fazenda, que está devolvendo para o Igeprev o dinheiro que foi recolhido e não repassado. Agora, as demais parcelas o governo vai negociar. Vamos encaminhar um projeto para a Assembleia Legislativa para a regularização. A partir disso, com as outras pendências no Cauc, estamos também verificando a questão dos convênios e prestações de contas. São pendências que não têm justificativa de o governo não ter um acompanhamento de prestação de contas, de não ter um acompanhamento dos motivos que levaram a paralisar os serviços com dinheiro em conta que não foi utilizado. Então, nós temos uma equipe aqui na Seplan para acompanhar todos os convênios do Estado. Hoje, o Estado tem 168 convênios. Montamos outra equipe para controlar todas as operações de crédito do Estado. Esse controle é acompanhar dia a dia todos os convênios para que não haja atrasos na prestação de contas. Tudo isso para evitar a entrada no Cauc, que é o maior problema que nós temos hoje para efeito de convênios. Se a gente não estiver limpo no cadastro, não conseguimos convênios. E nós ainda estamos sujos.
Quando o governo terá condições para normalizar o pagamento dos servidores todo dia 1º do mês subsequente ou até o quinto dia útil?
O esforço que estamos fazendo é para que, ainda nesse primeiro quadrimestre, o governo continue fazendo o pagamento até o dia 12 de cada mês. Mas, a partir do segundo quadrimestre, começar a pagar já do dia 1º ao quinto dia útil. O esforço nosso —Seplan, Sefaz e o próprio governador o — é que a receita tributária seja igual à despesa de pessoal. Hoje a despesa com pessoal gira em torno de R$ 250 milhões brutos e a receita tributária está na ordem de R$ 170 milhões. A ideia é adotar um procedimento para evitar sonegação e aumentar a fiscalização; nada de injustiça social. A ideia é não aumentar imposto, mas melhorar os procedimentos de arrecadação.
Como o governo vai conseguir efetivar isso?
Consegue sim. Nós vamos fazer uma equipe da Sefaz empreender estudos e tomar os procedimentos para aumentar a receita. Acho que vai ser um ano difícil, dificílimo. Herdamos muita pendência, muitos problemas de pessoal, mas não tiraremos nenhuma vantagem dos servidores. Não podemos pagar, mas não significa que nós vamos tirar. O governador deixou muito claro: os benefícios que foram concedidos no período proibitivo de 180 dias tornam-se nulos, segundo a LRF. Ou seja, podem ser aprovados, mas tornam-se atos nulos.
A oposição diz que decreto governamental não pode revogar uma lei.
O governo não está revogando a lei. A peça que o Executivo pode legislar é o decreto. Ninguém está falando que a lei é inconstitucional. Ela é nula.
Mas isso vai culminar em uma série de ações na Justiça.
Sim, mas, de acordo com a Procuradoria Geral, estamos no caminho certo. Não adianta a gente falar que o Estado tem uma política única de servidor público, o que vai nos obrigar a tratar com cada categoria de servidor separadamente. Mas a nossa política de agora em diante é sempre pensar não apenas numa categoria A ou B ou C. É importantíssimo a gente pensar como Estado, principalmente como Executivo, porque os Poderes têm as suas categorias diferenciadas. A orientação do governador é pensarmos de maneira global e não fazer as ilhazinhas, porque isso complica demais. Já fizemos a reforma administrativa, reduzimos a folha de pagamento dos comissionados mais de 20% em janeiro. A ideia é a gente ter uma economia de R$ 36 milhões só com comissionados até o final do ano. A LRF exige que se diminua em 20% as despesas com comissionados. Estamos cumprindo.
O que o governo pensa em fazer para captar recursos nesse momento de crise? A capacidade de endividamento do Estado permite isso?
A nossa capacidade de endividamento é altíssima. O que está pegando é a questão dos pagamentos. Temos um serviço de dívida de quase 8% ao ano. A contrapartida do Estado com relação aos programas e convênios é outro problema. Nós tínhamos que ter R$ 60 milhões no orçamento de 2015. Não conseguimos isso, só consegui consignar R$ 26 milhões. Então, qual a política que nós vamos fazer no Planejamento? Aqueles convênios que estão aptos a serem liberados terão as contrapartidas migradas, porque se coloca muitos recursos de contrapartida nos orçamentos que não são utilizados. Este ano, em síntese, temos que ter o equilíbrio entre receita e despesa.
Que apelo o sr. faz para os outros Poderes e para as entidades sindicais nesse momento de crise financeira pelo qual o Estado passa?
Os outros poderes estão compreendendo, eu acho, o problema que o Estado está vivendo. Eles vão ser parceiros do Executivo. Os sindicatos e associações de servidores têm que entender que não há receita. Já começamos a nos reunir com cada sindicato, mostrar o relatório de gestão fiscal, que já foi publicado. Vamos analisar e, para cada questionamento, será feita uma análise para tentar uma solução. A ideia é não tirar nada de direito dos servidores. Vamos ajustar a situação, fazer um plano para tentarmos absorver essa demanda deles. Agora, o que foi considerado nulo não será possível atender. Mas tudo pode ser estudado futuramente, não há problema nenhum, desde que a receita seja compatível e o Estado esteja no caminho certo. Vai ser muito difícil uma parceria com o governo federal neste ano, porque o crescimento do Brasil é zero. Então, temos que recorrer para a política tributária e reduzir despesas.
E qual é o serviço da dívida de contribuintes com o Estado?
Esse serviço está em torno de R$ 1,8 bilhão de dívida ativa. Por isso, estamos entrando com o Refis, mas apenas 2%, 3% desse montante é pago, mas já é uma ajuda. O que for legal, nós vamos correr atrás, facilitando pagamento dos inadimplentes. Estamos estudando vários itens para que o Estado consiga receber boa parte dessa dívida, a exemplo de cupons ficais. A partir do mês de maio, vamos criar um novo modelo de gestão, todo informatizado, vamos começar a fazer o Planejamento Plurianual (PPA) para os próximos quatro anos, inteiramente discutido com sindicatos, associações, pais e mestres de colégios, fazer um grande mutirão de novas ideias. Queremos reunir federações, Sebrae e outros segmentos da sociedade para realizar um grande debate em torno do PPA.
Como está sendo trabalhar nesses primeiros meses sem orçamento?
Perdemos muito porque não tinha nada para executar, não tinha dinheiro nem para comprar água. Em janeiro, fevereiro e março só poderemos executar 1/12 do orçamento do ano passado. Qualquer despesa tem que passar antes na Seplan e na Sefaz; estamos muito amarrados em termos de execução orçamentária e financeira. A receita ordinária do Tesouro para manutenção da máquina e pessoal teve um aumento de R$ 11,08% e será fixada em R$ 5,3 bi. Em 2014, foram arrecadados R$ 8 bi e a LOA deste ano estima arrecadação de R$ 9,7 bi, mais de 21% de aumento. O orçamento prevê R$ 278 milhões para convênios e R$ 800 milhões de operações de crédito e financiamentos. O gasto previsto com receita líquida de pessoal é de R$ 6,79 milhões. Para os outros poderes e órgãos como Assembleia Legislativa, Defensoria Pública, Ministério Público, Tribunais de Contas e de Justiça, o aumento será de 16,49% com relação a 2014. Esse aumento já foi estabelecido pelo governo anterior através da LDO, que foi encaminhada ano passado. Mas estamos tendo um entendimento muito grande com os Poderes, que estão entendendo a situação do Estado e vão conseguir adequar as necessidades dentro do índice previsto.