Elizeu Oliveira: “O servidor público não é o vilão da história do Igeprev”
23 julho 2023 às 00h00
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Alvaro Vallim
Especial para o Jornal Opção
Há pouco mais de um ano assumia o Sindicato dos Servidores Públicos do Estado do Tocantins (Sisepe-TO) uma diretoria de oposição à anterior. Sob a liderança do inspetor de Serviços Fiscais, Elizeu Oliveira, de 47 anos, administrador de empresas e aprovado no concurso do quadro geral de 2012 – tomou posse em 2016 –, a nova diretoria enfrentou seu primeiro desafio ainda na eleição, vencida com placar apertado e contra uma disputa judicial, a qual também ganhou.
Por ter pouca experiência como sindicalista, Elizeu diz que ainda comete muitos erros, mas pede desculpas aos filiados e diz que essa fase está acabando. Entretanto, sua liderança perante os colegas de diretoria é exemplar: assim como todos, vai sempre para o batente. Viaja ao interior, visita as regionais do sindicato, as sedes das pastas do governo nas cidades, vendo de perto as condições de trabalho do servidor.
Em Palmas, conversa com os secretários para cobrar resultados de ofícios enviados e também cobra as movimentações dos diretores, seja pessoalmente nas reuniões de diretoria, seja por telefone para que problemas de gestão sejam resolvidos.
E os resultados vão aparecendo. Como na demanda conhecida como o caso dos 25%, um aumento concedido e retirado em seguida, ato o qual o Supremo Tribunal Federal (STF), por ação do Partido Verde (PV), acabou por considerar inconstitucional a lei que revogou o reajuste. Nesta entrevista ao Jornal Opção, Elizeu explica como está o andamento de uma reclamação que o Sisepe protocolou no STF para cumprimento da decisão.
O sindicalista também fala da reforma da Previdência, que considera totalmente maléfica para o servidor público. Ele pede que todos se engajem na luta e que façam parte do sindicato para engrossar as fileiras para manter os direitos já adquiridos pelos servidores públicos.
Que balanço o sr. faz da gestão administrativa do Sisepe-TO após este primeiro ano de mandato?
Nós já conseguimos sanar a maioria das dívidas herdadas por esta nova gestão. Mas temos ainda algumas questões judiciais trabalhistas que estão parceladas, mas que nós vamos cumprindo e vamos concluir em pouco tempo. Mas o Sisepe já teve um ganho quanto ao número de filiados e já temos mais filiados que a gestão anterior e isso mostra que ganhamos a confiança do servidor público. Uma das conquistas recentes foi a compra de um veículo zero quilômetro para a regional de Taguatinga e também a reforma completa do prédio daquela regional. Também colocamos energia fotovoltaica em todas as regionais, o que representa um ganho ambiental e uma economia para investimento em benefícios para o servidor público. Com isso, vamos implementar reformas em todas as sedes das regionais. Inclusive, nós já estamos com o projeto pronto para começar a implantar o alojamento próprio em Palmas, o que acontecerá em breve. Veja que o Sisepe é o maior sindicato do Estado do Tocantins e ainda não tem uma hospedagem própria e gratuita para o servidor filiado na Capital. Nós já evoluímos muito em um ano, conseguimos o pagamento de progressões, datas base, estamos cobrando sempre do governo do estado as melhorias das condições para o servidor. Temos sido recebidos pelo secretário da administração e os demais secretários com todas as demandas dos servidores e vemos isso como um ganho.
Tem outras reformas em andamento ou projeto para melhorar as hospedagens próprias que o Sisepe tem no interior?
Elizeu: A próxima reforma será a hospedagem de Palmas, que como eu disse, está com projeto pronto. Mas temos como meta reformar Araguaína e posteriormente Gurupi. Nós demos prioridade para Taguatinga porque lá corria o risco do telhado desabar sobre os servidores. Então, a gente sabe que a categoria dos servidores do quadro geral é sempre financeiramente desprestigiada pelos governantes que aí passaram e o sindicato tem a obrigação de, no mínimo, oferecer a hospedagem gratuita. Hoje, nós pagamos 50% da hospedagem dos servidores que ficam nos hotéis conveniados em Palmas. Tem o Hotel Eldorado e o Hotel Jardim do Porto, e quando o servidor vai lá e se hospeda, o Sisepe banca esta metade da diária.
Com relação a demandas, a questão dos 25% foi a que ganhou mais repercussão, embora a ação no STF não tenha sido sustentada diretamente pelo Sisepe. Como está a busca do Sisepe para o cumprimento da decisão e como isso está acontecendo?
Nós temos hoje duas grandes questões de interesse dos servidores públicos do Tocantins. Elas são muito importantes para todos os servidores. Mas você mesmo já nos acompanhou na Assembleia Legislativa e sabe que reforma da previdência, que vem sendo proposta desde o início pelo governo do estado, e que se não houvesse uma atuação firme de todos os sindicatos nós estaríamos numa situação muito complicada. Com relação aos 25%, nós começamos a ver ela discutida juntamente com a reforma da previdência como uma cortina de fumaça. Uma tentativa de esconder a gravidade da proposta que o governo protocolou na Assembleia Legislativa naquele momento. Mas voltando à ADI 4013 que trata sobre o direito dos servidores aos 25%, nós vimos que a decisão do STF não segregou nenhuma das categorias. A decisão de Brasília não diz que categoria A ou B não tem direito aos 25%. Como foi falado muitos anos, que os auxiliares de serviços gerais e administrativos não teriam direito. Não tá escrito em lugar nenhum isso. Mas o sindicato fez uma convocação para o servidor ficar atento e logo após a publicação da decisão da ADI 4013 houve o julgamento do mandado de segurança aqui no Tribunal de Justiça do Tocantins, que estava aguardando esta decisão do STF. Porque em Brasília se resolveu a questão da constitucionalidade e aqui se resolveria a questão do direito dos servidores. Entretanto, houve uma modulação por parte da desembargadora relatora, dando direito para os servidores que são anteriores a 2012. Então o sindicato fez uma reclamação em Brasília, porque ao fazer a modulação, a desembargadora, ao invés de esclarecer, acabou criando muitas dúvidas. Então, devido à nossa pouca experiência aqui no sindicato e com muitas opiniões controversas sobre o assunto, fizemos uma consulta popular se os servidores queriam que houvesse desistência e a opinião vencedora era que deveríamos desistir de questionar a decisão porque poderia atrasar o recebimento de quem já tinha conquistado o direito, digamos assim. Só que depois que nós declaramos a desistência vieram muitos servidores dizer, aqui mesmo nesta sala, que a desistência seria complicada porque havia muitos servidores que poderiam perder com aquela decisão. Então, recentemente pedimos a reconsideração da decisão e estivemos no gabinete da desembargadora relatora juntamente com nossa assessoria jurídica e conseguimos que a decisão fosse reconsiderada. Então, nós precisávamos que houvesse a reconsideração e assim aconteceu, para que o STF possa analisar nosso pedido para que não haja distinção na aplicação da decisão dos 25% e que todos os servidores do quadro geral possam recebê-lo.
Como fica o andamento? Todos os servidores do quadro geral terão direito aos 25%?
Nossos advogados estão buscando uma agenda com o ministro plantonista do STF para que seja feito o detalhamento ou a determinação para aplicação a todos os servidores e para que não haja distorções de salários entre as pessoas que exercem as mesmas funções. Porque o governo do Estado reconhece que têm direito apenas os que já estavam entre 2008 e 2012 e nós entendemos que o direito precisa ser expandido para evitar as distorções que nós citamos acima. A justificativa da desembargadora segue a argumentação do governo do estado que foi feita uma nova tabela a partir de 2012 e que os 25% só incidiriam na tabela anterior. Ela diz que houve um aumento na tabela de 2012 de 25%. Na reclamação nós colocamos a tabela de 2007, que era a base para aplicar os 25% e colocamos a de 2012, mostrando que foi dado um aumento de apenas R$ 91,00. Então, esta argumentação dela não é válida e temos prova que houve uma modulação, deixando a maioria dos servidores em situação financeira desconfortável. A decisão do STF não faz distinção de quem fez acordo, ou quem entrou depois de 2012. Ela manda aplicar na tabela de 2007 e por conseguinte deveriam ser reformuladas as posteriores, mas houve a criação de um novo PCCR em 2012 visando a não aplicação dos 25%, já que na época a ação já tramitava em Brasília. Assim, entendemos que a aplicação dos 25% deve acontecer para todos os servidores do quadro geral, sem qualquer distinção.
Vamos falar agora de Previdência. Quais os pontos que o Sisepe considera muito ruins para o servidor?
É preciso lembrar que a Reforma da Previdência do Tocantins não está em andamento na Assembleia. O governo enviou no final do ano, mas diante da reclamação dos sindicatos o governador pediu para retirar e que se fizesse uma discussão da proposta, para que pudéssemos garantir o menor impacto possível aos servidores. Mas é preciso dizer que esta reforma da previdência é maléfica para o servidor, que passou uma vida toda contribuindo e achando que ia receber salário integral e a paridade nos reajustes. Aí ele passou 28 anos contribuindo com 11% e depois passa a contribuir com 14%. Quando tivemos a reforma da previdência de 2019, o Estado já elevou o desconto do servidor de 11% para 14% e o governo do estado deveria contribuir com o dobro do que desconta do servidor, mas ele paga somente 20,20%, já deixando um déficit no sistema de quase 8%. Isso, é o repasse patronal que a legislação determina deve passar até o dobro da contribuição do servidor, que é 14%, mas ele repassa só 20,20%. Isso é ruim para o servidor porque ele vem contribuindo pensando em receber um determinado montante e este direito já vai ser retirado dele. Com argumentos que o Igeprev não tem capacidade financeira para pagar as aposentadorias e se não implementar a reforma, fica impedido de pegar a CRP, não tendo acesso a recursos federais para investimentos em saúde, nas estradas e outras obras e serviços. E tem pessoas que ficam querendo colocar o servidor como inimigo, como se ele fosse o culpado das mazelas que aconteceram no Igeprev com aplicações que deram prejuízos, desvios e vários outros problemas. Inclusive lembrando atrasos do próprio governo em várias gestões na hora de fazer o repasse da parte patronal devida ao Igeprev. Todo mundo sabe as coisas que aconteceram lá, mas tem gente colocando o servidor como culpado dessa situação e o servidor está simplesmente fazendo o seu trabalho, atendendo ao público, mesmo com todos os problemas que tem de condições de trabalho. O servidor não é o vilão da história, o vilão é quem roubou ou geriu mal o Igeprev.
Nessa nova proposta do governo o servidor vai aposentar com 80% do valor do salário. Se Deus o livre, ele morrer e a esposa dele for depender dessa pensão pra viver, o governo quer passar a pensão por morte do servidor para 50% do último salário, as viúvas ou viúvos recebem somente 75% do valor do último salário.
Com esta reforma, todo mundo será condenado ao pedágio. Se você tinha que trabalhar um determinado tempo, você terá um pedágio. Mas a nossa luta na Assembleia, que todo mundo acompanhou nós conseguimos que fosse feita uma mudança. Eles tinham colocado um pedágio de 100%, ou seja, se falta cinco anos pra você aposentar, você teria que trabalhar mais cinco. Com a mudança, eles baixaram pra 50%, o que é ainda muito alto, mas já é uma conquista.
Então, você já não tem a integralidade e nem a paridade que foram perdas acontecidas ao longo do tempo. E agora vai ter um pedágio se não tiver atingido a idade mínima pra aposentar.
Então, o que a gente vê, a gente vê um governador que fala o tempo todo que não vai tirar nenhum direito adquirido. Mas o que é direito adquirido para o governador? Eu não consigo entender, se todos esses direitos estão sendo retirados. A reforma deveria ser somente para quem vai entrar de agora em diante.
A gente sabe que a reforma da previdência é inevitável e necessária, mas não se pode fazer quem já está trabalhando há muito tempo perder direitos e estamos perdendo muito. A única coisa que vem diferente para quem está entrando é a previdência complementar, porque o teto vai ser o da previdência oficial e quem entrar vai poder optar por ter uma previdência complementar diretamente pelo governo do estado. Ele pode aderir ou não, mas se não aderir está limitado ao teto do INSS ou a fazer num banco de sua preferência sem passar pelo governo.
A previdência complementar que será oferecida será através do Banco do Brasil, que usaram uma ata de outro estado, e vários estados aderiram também, pra oferecer aos futuros servidores. E o governo do estado sustenta que foi legal aderir ao BBPrev, mesmo sem fazer licitação, fazer por adesão de ata.
A gente sabe que as coisas, quando é contra o servidor, é fácil de se resolver.
E como estão outros direitos do servidor que o Sisepe vem cobrando do governo?
O servidor público, cada dia que passa, lamentavelmente, vem somando perdas. O governo não paga data base e quando paga quer parcelar. Deve 24,5%, paga 6% dividido em 96 vezes. O que nós vemos foi uma enrolação de mais de 15 anos com esses 25%. O que nós vemos é uma reforma da previdência está sendo para acabar com o serviço público. Porque, o que tinha de atrativo no serviço público? Era a estabilidade, uma carreira promissora e uma aposentadoria mais justa. Hoje a gente não tem mais nada. As progressões para quem entrou antes de 2012 o salário do povo crescia 22%. Quando houve lei de 2012, no último governo Siqueira, caíram numa tabela transitória que era de 14%, e hoje recebe 11%. Porque é uma irresponsabilidade o que o governo fez porque ele deu com uma mão e tirou com as duas. Porque se você somar as perdas das progressões que eram de 2 em 2 anos e agora são de 3 em 3, já dá mais de 30% a menos no salário. Então, o governo deu 25% no remanejamento da tabela no governo Gaguim, colocou no final de uma tabela que deixou de existir e jogou todo mundo numa tabela que a progressão não é do mesmo tamanho da outra.
Então, a reforma da previdência é maléfica para o servidor. Essa questão desse atraso no pagamento dos 25% é um câncer na vida do servidor. E tudo que a gente vê é que a questão do Igeprev não será resolvida. Porque veja bem: quem é o concurseiro que vai querer vir para o Tocantins fazer concurso no Tocantins, um estado que paga mal, que não paga as progressões direito, e que o fundo de aposentadoria tá quebrado?
Então, voltando à Reforma da Previdência, o governo do estado faz um repasse de R$ 100 milhões para o Igeprev conseguir pagar os aposentados que tem hoje. É um repasse muito alto e tem gente falando que o servidor é um peso e que este dinheiro poderia estar sendo usado em investimentos. Mas nós temos que ver que o servidor, esse que eu acabei de dizer que está no prejuízo, esse cara, essa pessoa, esse pai ou mãe de família, é quem carrega este estado. É eles que estão atrás do balcão. Eles que doaram sua vida em prol do outro, em prol do estado, do contribuinte. E como eles estão sem dignidade e cada dia tem tirado mais ainda os seus direitos, eles têm dedicado mais força às atividades extra expediente. Porque a maioria dos servidores não consegue sobreviver só com o salário. Ele vai pra repartição pública mal pago, desiludido, despreparado, desprestigiado, sem disposição, mas mesmo assim ele tenta atender melhor as pessoas, tenta dar o seu melhor. Esses servidores trabalham sem estrutura, sem equipamentos descentes, computadores e impressoras velhos. Eu estive na Lagoa da Confusão na regional lá, da Secretaria da Fazenda, que é nível 3, igual à de Palmas. O servidor imprime dois ou três Dare e para porque esquenta muito e o contribuinte tem que voltar depois pra ter o resto. Eu tirei foto e mandei pro secretário. Então, o governo vive perdendo dinheiro por causa desses equipamentos precários e conduz o servidor a viver na precariedade, sem uma condição mínima de trabalho. Então se o servidor público não consegue atender direito, a culpa é do Estado, que não dá condições, não dá treinamento, não oferece cursos. O Sisepe mesmo já se colocou como parceiro para oferecer cursos aos servidores. Hoje, fazer a avaliação de um servidor público e não dar uma nota 100% pra ele é injustiça. Porque se eles não são 100% na repartição dele, a culpa é do estado. Mas que todos sejam pagos de forma digna porque ele não vai se dedicar a uma coisa que não tem retorno. O servidor precisa ter dignidade e dignidade só se constrói quando se é remunerado de forma justa.
A gente vê que há categorias de servidores que são privilegiadas tanto com a concessão de mais benefícios e melhores condições de trabalho quanto com reajustes no tempo certo e percentual correto. Como o Sisepe vê isso? O Sisepe vê com bons olhos as conquistas dos servidores dessas categorias. É um sinal que o governo tem condições de pagar e dar boas condições de trabalho e que não estende ao quadro geral por incompetência ou de falta de vontade política de dar a todos os servidores as mesmas condições. Então o problema não está nas categorias, está nas gestões. Desde o início da nossa gestão nós temos enviado ofícios com reivindicações diversas para os servidores do Quadro Geral que são os mais desassistidos pelo Governo. Por exemplo, nós solicitamos a concessão de vale alimentação, que muitos estados estão dando, mas não obtivemos nenhuma resposta. Nós estamos pedindo a reestruturação de várias categorias. Conseguimos ajudar a organizar a concessão do ADA do Naturatins, que agora vem sendo pago mensalmente. No Detran conseguimos algumas conquistas. O pessoal da Polícia Penal nós torcemos para que consigam suas reivindicações. Mas nós queremos que o governo seja justo e não contemplasse um em detrimento de outros. Que todo mundo seja contemplado e que tenha mais equidade no repasse das vantagens. O servidor público, o serviço público é um corpo só e todo mundo está aí para atender o contribuinte e precisa ter reconhecidos seus direitos.