Donizeti Nogueira: “Governo Lula precisa dar certo logo”

22 janeiro 2023 às 00h01

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O suplente de senador Donizeti Nogueira, um dos líderes históricos do PT no Tocantins, aponta que o clima em Brasília após os atentados golpistas de 8 de janeiro ainda é de perplexidade e, naturalmente, de insegurança. “Eu sinto que as pessoas lá em Brasília ainda estão um pouco atônitas. É mais ou menos o cidadão sentindo como se alguém tivesse entrado na sua casa e quebrado tudo. Um sentimento de indignação e insegurança”, comenta o dirigente, enfatizando que o presidente Lula saiu fortalecido, e que segundo ele, isso é um aspecto muito importante.
Donizeti analisa que o desfecho violento dos atos golpistas contou com a negligência das forças de segurança, que, em algum momento, tomaram decisões que contrariaram procedimentos adotados em eventos anteriores. “O fato aconteceu porque houve uma sabotagem do governo do Distrito Federal, porque estava tudo combinado, como foi no 7 de setembro, como foi no dia da posse, quando as coisas aconteceram na normalidade”, ressalta o dirigente, que aponta que é preciso esclarecer por que a guarda responsável pelo Palácio do Planalto estava reduzida e por que a polícia demorou agir.
O dirigente petista defende apuração rigorosa até chegar ao núcleo pensante dos atentados terroristas e punição exemplar para todos os envolvidos. “Não dá para tergiversar neste momento, porque isso é um movimento de renascimento do fascismo que o Bolsonaro despertou e organiza. Não tem esse negócio de que ele não tem relação direta, ele ajuda na organização, com os filhos e com outros atores, como esse ex-ministro da Justiça [Anderson Torres]”, aponta o dirigente.
Nesta entrevista exclusiva ao Jornal Opção, Donizeti Nogueira fala ainda sobre a repercussão negativa dos atentados junto à opinião pública, da união dos poderes em defesa da democracia e das medidas que estão sendo adotadas pelo governo que buscam recuperar as contas públicas e a retomada de investimentos. O dirigente prevê que o pacote de ações a serem executadas pelo Ministério do Desenvolvimento Social pode ajudar a aumentar a credibilidade do governo.
O que o governo já conseguiu reunir de informações sobre os ataques terroristas de 8 de janeiro e o que está sendo articulado para evitar novos ataques?
Eu sinto que as pessoas lá em Brasília ainda estão um pouco atônitas. É mais ou menos o cidadão sentindo como se alguém tivesse entrado na casa dele e quebrado tudo. Um sentimento de indignação e insegurança, ainda. A reação do governo federal, sobretudo a do presidente Lula, deu o tom e assegurou que o golpismo não prosperasse, porque a ideia era que, com a baderna, as Forças Armadas interviessem e assumissem o poder. Está claro isso no documento encontrado na casa do ex-ministro [Anderson Torres], que era secretário de Segurança do DF. Aí tem uma série de desdobramentos. Mas acho que o desdobramento mais positivo é que [os atos golpistas] conseguiram unir o País, as autoridades resolveram combater essa anomalia que a gente não assistia há muito tempo no Brasil. Mesmo na Ditadura Militar não se viu essas coisas. Não houve esses quebra-quebras. Houve guerra urbana e rural dentre os contestadores e o Estado militar, mas não se assistiu a uma agressão ao Palácio, ao STF [Supremo Tribunal Federal], ao Congresso, como foi agora.
A possibilidade de atos pontuais de terror, como a derrubada de torres de energia, me preocupa
Essa evidência da união dos três Poderes e do Estado brasileiro no conjunto foi um ganho. Ninguém precisava disso para fazer com que os Poderes atuassem harmonicamente, mas ocorreu o fato e a reação foi muito positiva. Havia lá [na reunião com o presidente Lula, na segunda-feira, 9] os 27 governadores, os três Poderes reunidos, prefeitos das grandes cidades, das capitais, numa demonstração de que o País, o Estado brasileiro não vai tolerar essa barbárie, esses atos terroristas. Um dado positivo: a pesquisa Datafolha sobre a repercussão dos atos mostrou que o repúdio é massivo. Mas isso não é só na pesquisa, isso a gente vê na rua, lá em Brasília. Lá a gente sente, ando de ônibus, estou no Congresso, no supermercado, no shopping, em todo lugar eu sinto a repulsa. No ônibus, por exemplo, a discussão das pessoas condenando os atos é muito intensa. Hoje, até muitos daqueles que lá estavam e participaram repudiam o ato. Não foram 4 mil pessoas que quebraram tudo, mas estavam lá. Agora é a gente passar essa fase, que não acabou. Não dá pra dizer que acabou. Há os desesperados e me preocupa a possibilidade de atos pontuais de terror, como a derrubada de torres de energia. Mas [esse grupo terrorista] está muito isolado, o presidente saiu fortalecido e eu acho que isso é muito positivo.

Chegar aos apoiadores e financiadores não tem muita dificuldade, porque [eles] têm ligação com os que estão presos
Como o sr. avalia o processo de responsabilização pelos atos? Há presos entre os que participaram diretamente, mas ainda não conseguiram alcançou financiadores e planejadores.
Acho que a maior dificuldade é chegar ao núcleo pensante, mas chegar aos apoiadores e financiadores não tem muita dificuldade, porque têm ligação com os que estão presos, isso tem se revelado no dia a dia. Agora, chegar ao núcleo pensante talvez seja a maior dificuldade, embora as forças de segurança estejam agido com muita contundência. O fato aconteceu porque houve uma sabotagem do governo do DF, porque estava tudo combinado, como foi no 7 de setembro, no dia da posse, quando as coisas aconteceram na normalidade. E era o que se esperava que acontecesse tudo dentro da normalidade. Mas aos poucos vem se descobrindo, por exemplo, que a força que deveria defender o Palácio do Planalto estava reduzida. Por que foi reduzida? A Polícia Militar agiu muito tarde. Por que agiu muito tarde? Isso vem sendo investigado, as pontas vão sendo amarradas e vão sendo esclarecidas muitas dúvidas. A ideia era retardar a chegada da polícia para deixar os terroristas fugirem. Houve resistência da Polícia Legislativa do Congresso, houve facilitação no Palácio do Planalto, o STF foi barbaramente agredido, como foram o Palácio do Planalto e o Congresso Nacional, por negligência da força responsável, a Secretaria de Segurança Pública do governo do DF, que, inclusive, é bancada pelo governo federal para isso, porque lá é a capital do País. Então houve negligência.
Não é uma coisa rápida, mas tudo está indo mais rápido do que eu imaginava. Com a prisão do ex-secretário [Anderson Torres] pode se chegar a outros nomes, porque de onde saiu aquele documento? Da cabeça dele? Era um planejamento das coisas que tinham de acontecer? Tem uma tese de que os terroristas eram só a carne de canhão para poder possibilitar a tomada de poder. Eu acredito que muita água ainda vai rolar e vai passar por debaixo da ponte. E muitas figuras vão ser responsabilizadas. Não só esses financiadores pontuais do agronegócio, mas os idealizadores do processo.
Não dá para tergiversar neste momento, porque isso é um movimento de renascimento do fascismo
Como o sr. avalia a participação de tocantinenses, como tem sido apontada pela própria Corregedoria-Geral do Estado, que investiga o envolvimento de servidores públicos nos atos golpistas?
Eu penso que a Constituição é clara. Não é proibido fazer protesto neste País. Não é proibido fazer manifestação. Só que é preciso ter uma pauta, uma causa. A causa desses protestos é o ataque direto à democracia, ao Estado democrático de Direito, o não reconhecimento da eleição. Ver parlamentares que foram eleitos questionando as urnas, apoiando e incentivando o terrorismo, isso é muito triste. Eles não questionam a própria eleição. Foi eleito pela mesma urna, legitimamente, mas, na visão deles, o presidente não foi. Então isso é muito triste. Para servidores públicos que se envolveram nestes atos de terror e ataque ao patrimônio tem lei para isso, então eles devem ser punidos. Devem perder o emprego, não sei por quanto tempo ficarem presos, não sei como vai ser. Pela lei, podem ficar até 15 anos, se julgados e condenados. As autoridades, depois de apurados os fatos, precisam tomar a decisão de banir essas pessoas do serviço público, porque elas não estão fazendo por merecer estar nele.
É muito triste ver os computadores moídos, obras de arte magníficas destruídas. Mesas viradas, vidraças quebradas, quebraram tudo. E ainda querem construir uma narrativa segundo a qual os responsáveis foram infiltrados. Eu vi o depoimento de dois senhores, revoltados com o quebra-quebra, que estavam no movimento, mas eles acham que tinha infiltrado mesmo. Os caras conseguem mesmo vender essa ideia. Eu vi, num vídeo, um cidadão de Formoso do Araguaia [município ao sudoeste do Tocantins, a 320 quilômetros de Palmas], não sei se funcionário público ou não, mostrando a cara, dizendo que estava lá e por que estava. Então, essa pessoa tem de ser punida rigorosamente. Não dá para tergiversar neste momento, porque isso é um movimento de renascimento do fascismo que o Bolsonaro despertou e organiza. Ele ajuda na organização, com os filhos e com outros atores, como esse ex-ministro da Justiça [Anderson Torres].

O governo saiu muito fortalecido, ganhou fôlego, agora tem de mostrar resultado
Esse movimento não consegue ter nenhum apelo da opinião pública, mas isso pode mudar de acordo com desempenho do governo. O que é preciso fazer para evitar que novos atos possam acontecer?
Eu penso que o governo tem de dar certo rapidamente. Nestes próximos seis meses, o governo precisa mostrar a cara em diversas áreas. Sobretudo dar respostas à população. O governo saiu muito fortalecido, ganhou fôlego, aí agora tem de mostrar resultado. Eu estive conversando com o ministro do Desenvolvimento Social, Wellington Dias, ex-governador do Piauí, e penso que o conjunto de ações que esse ministério vai desenvolver deve impulsionar muito a crença no governo. E, como a gente conseguiu aprovar aquela PEC [da Transição], o orçamento está redondo, o pacote econômico lançado pelo ministro [Fernando] Haddad, da Fazenda, traz segurança fiscal e perspectiva de investimento, então o governo está muito bem articulado. O governo não tem problema de receita. O País está funcionando. Tentam dizer que o País parou, mas está funcionando plenamente e não estamos tendo problema de receita. O grande desafio nosso é que o governo que saiu deixou um rombo muito grande, será preciso equilibrar o rombo e, enquanto isso, a máquina não pode parar. Eu penso que a garantia mesmo é o governo mostrar serviço. E mostrar serviço não só na área de segurança, mas nos resultados das políticas que tratam diretamente com o cidadão, ajudando a resolver os problemas da vida dele.
Nenhum tocantinense foi convidado para compor o primeiro escalão do governo. Há expectativa de que quadros do Estado possam ser contemplados com cargos de segundo escalão?
Sim, nós temos discutido isso. Estamos trabalhando essa participação, não tem sido fácil. Nós ficamos sem representação parlamentar no Congresso Nacional. A gente tem um espaço garantido aqui no Estado, como sempre tivemos. O PT sempre governou áreas estratégicas aqui no Estado nos cargos do governo federal, desde que ganhou a Presidência da República. Em Brasília, estamos trabalhando algumas situações e esperamos que na semana que vem elas possam começar a acontecer.
O que foi atacado foi o País, foi o Estado democrático de Direito, a democracia, sobretudo o povo brasileiro
Senador, o que fica de lição desses episódios violentos de Brasília, considerados inéditos na história do País?
O que foi feito em Brasília, não é uma agressão ao prédio, agressão aos móveis, não é nem uma agressão ao presidente, é uma agressão ao povo brasileiro. Nós, brasileiros, que amamos nosso País, precisamos nos sentir ofendidos e indignados com isso, e devemos ajudar a combater essas coisas. Se for possível denunciar, porque o que foi atacado lá foi o País, foi o Estado democrático de Direito, a democracia, sobretudo o povo brasileiro.