Responsável pela execução de políticas públicas de assistência social no município de Goiânia, a Secretaria Municipal de Desenvolvimento Humano e Social (Smdhs) é comandada há menos de dois meses pela secretária Maria Yvelônia, assistente social de formação, com vasta experiência na área pública na cidade de Valparaíso de Goiás e atuação por seis anos no Governo Federal, incluindo o posto de Secretária Nacional de Assistência Social. Diante da recente situação com pessoas em situação de rua vivendo sob ponte na Marginal Botafogo, a secretária concedeu entrevista ao Jornal Opção e falou sobre as prioridades da pasta.

Yvelônia esclarece que dentro das políticas públicas de assistência social da pasta, a situação das pessoas na rua será ponto prioritário. Ela avalia que é preciso cuidar dessa parcela da população, considerada invisível, até ser percebida quando causa algum tipo de incômodo. “Precisamos avançar no sentido de tratar estas pessoas como sujeito de direito. Inclusive, o direito que elas têm de estar nas ruas. Não podemos obrigá-las a sair se elas não quiserem. O poder público precisa oferecer incentivos para que se sintam acolhidas e valorizadas. Sabemos e entendemos que é uma questão muito mais social do que outra qualquer”, pontua a secretária.

Com o aumento da população que vive nas ruas, há um certo receio de que em Goiânia possa acontecer o que vemos hoje no centro de São Paulo que é a cracolândia. Quanto a isso, Yvelônia não acredita que a realidade esteja próxima. “Acho que é um caso sério e muito grave. Exatamente por isso, existem muitos órgãos públicos envolvidos para que a situação não chegue a tanto. Digo para a população goianiense que fiquem tranquilos, pois dentro de pouco tempo todos verão os resultados do nosso trabalho”, garante a secretária.

Direitos básicos

A assistente social explica que logo que assumiu a secretaria procurou o diretor de proteção especial para que, juntos, tratassem sobre questões de violações de direitos humanos da parcela da população nessa condição. “Uma pessoa que está sem situação de rua tem vários direitos violados, como direito à moradia, à própria segurança. Além disso, tem a questão do frio, das necessidades básicas. Para isso, nós montamos um grupo de trabalho incluindo a Pontifícia Universidade Católica de Goiás (PUC), a fim de debatermos sobre o atendimento a essa população da melhor forma possível”, explica.

Secretaria Municipal de Desenvolvimento Humano e Social, Maria Yvelônia | Foto: Divulgação

Segundo ela, uns estão nessa situação por causa da drogadição (o termo designa toda e qualquer modalidade de vício bioquímico), outros por problemas familiares. Alguns já não possuem nenhum vínculo familiar, enquanto outros decidem pelo distanciamento. “Cada situação precisa ser tratada de acordo com a sua particularidade e, esse é o intuito desse grupo de trabalho”, esclarece.

De acordo com apuração da reportagem, ao menos no grupo retirado da ponte sob a Marginal Botafogo, a maioria é de pessoas oriundas de outros Estados da federação, com maioria das regiões norte e nordeste. Yvelônia explica que a secretaria, inclusive, já tem ações para colaborar com o retorno dessas pessoas a seus estados de origem, quando há interesse. Quando questionada se não seria o caso de ajudar esses indivíduos a retomarem para suas terras, a secretária diz que isto já é feito. “Para atender a essa demanda, nós temos um ponto de atendimento na própria rodoviária, mas pouquíssimos procuram essa ajuda”, aponta.

Segundo a titular, muitos vêm para Goiás à procura de trabalho. Em alguns casos, já há promessa de emprego, mas, mesmo com algumas facilidades acertadas previamente, os recém-chegados encaram uma realidade totalmente diferente do esperado. Quando ficam sem dinheiro e sem trabalho, longe de casa, só lhes resta uma saída: as ruas, com opções de trabalho que ficam restritas praticamente à coleta de recicláveis.

Abrigos

Yvelônia ainda deixa claro que a prefeitura mantém casas que funcionam como abrigos permanentes ou de passagem para aqueles que querem. No entanto, grande parte não aceita ir para esses locais, mesmo com oferta de todo tipo de atendimento – incluindo médicos, psicólogos, alimentação e higienização. Segundo a secretária, o motivo da rejeição, geralmente, está ligado à dependência química e às regras impostas nesses abrigos. Nos locais, é proibido o consumo de entorpecentes, incluindo álcool.

Atualmente são três casas mantidas pela prefeitura, com espaços adicionais mantidos pelo terceiro setor.

De acordo com o último censo de 2019, Goiânia possui mais de 1,2 mil pessoas vivendo nas ruas. Contudo, desde o levantamento a percepção geral da população é de que esse número tem aumentado nos últimos anos. “Está na meta do grupo de trabalho a realização de um novo mapeamento da quantidade dessas pessoas que, com a pandemia, aumentou substancialmente. Isto é, de fato perceptível”, pontua a secretária.

Pessoas em situação de rua também estão presentes no Centro de Goiânia | Foto: Fernando Leite

Em relação aos que estavam vivendo debaixo da ponte da Avenida Independência, na Marginal Botafogo, Yvelônia esclarece que todos receberam a oferta de moradia em abrigos municipais, mas recusaram. Ela ainda relata que todos os esforços serão tomados para evitar que mais pessoas façam das ruas sua moradia. “Nesses casos, a secretaria fica de mãos atadas. O que temos feito para evitar que isso aconteça, é investir nos atendimentos preventivos que são feitos nos Centro de Referência de Assistência Social (CRAS), buscando o fortalecimento dos vínculos familiares dessas pessoas”, explica.

Além disso, a secretária informa que existe também o centro Centro de Referência Especializado para População em Situação de Rua (Centro Pop). Nessas unidades, são oferecidas refeições, local para higienização, cadastros nos programas do governo e todo atendimento normalmente feito num CRAS, oferecido para essas pessoas de forma específica no POP. Atualmente só existe um em Goiânia, localizado na Alameda Botafogo, número 68, no Centro. Apesar disso, o trabalho é reforçado com equipes itinerantes que realizam atendimentos pela cidade. Para mais ações, a prefeitura possui o aplicativo Prefeitura 24h, pelo qual qualquer pessoa pode entrar em contato e pedir atendimento.

Há também um programa que atende especificamente às mulheres que estão nessa situação. “Em relação a esse público, em especial as grávidas, nós temos o programa Criança Feliz, que tem o objetivo de acompanhá-las desde a gestação. Já na questão da gravidas precoce, nosso trabalho ocorre atráves de palestras de orientações e distribuição de preservativos”, informa.

Trabalho

Quanto a um direcionamento das pessoas atendidas para o mercado de trabalho, a secretária destaca o Programa de Promoção do Acesso ao Mundo do Trabalho (Acessuas), voltado para essa população. “Aqueles que querem uma colocação no mercado, são capacitados a elaborar um currículo, como se portar em uma entrevista de trabalho e são encaminhadas por meio do SINE para alguma empresa”, apresenta.

Interrogada se há uma parceria da secretaria com alguma cooperativa de reciclagem, já que quase todos trabalham nesse ramo, ou a possibilidade de realocá-los na Companhia de Urbanização de Goiânia (Comurg) para atuarem na limpeza da cidade, a secretária pontua que são planos que passam também por outras secretarias da administração e precisam ser trabalhados com maior cautela.

A reportagem também questionou se existe alguma clínica mantida pela administração municipal para cuidar da reabilitação e o tratamento de desintoxicação dessas pessoas, já que muitos são dependentes de algum tipo de droga. Ela explica que tudo isso entra na questão de política de saúde. “Em nosso grupo de trabalho, a saúde também está envolvida justamente por esse motivo. Não é uma área da assistência social. Eu desconheço algum projeto de alguma clínica para este fim”, afirma.

Cilas Gontijo é estagiário do Jornal Opção em convênio com a UniAraguaia, sob a supervisão do editor PH Mota.