Entenda a polêmica em torno do tratamento de presos com transtornos mentais

18 maio 2023 às 16h54


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A resolução do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) que determina o fechamento dos Hospitais de Custódia e Tratamento Psiquiátrico (HCTP) voltou a causar polêmica. Para o Ministério da Saúde, o tratamento da pessoa com transtornos psiquiátricos junto à sociedade é o melhor caminho. Eles argumentam que internar pacientes é um incentivo à institucionalização e vai contra a lei de 2001. Por outro lado, o Conselho Federal de Medicina (CFM) divulgou nota afirmando que pessoas com transtornos mentais apresentam riscos à própria integridade e saúde. Por isso eles veem a internação como única forma de preservá-las.
Na última segunda-feira, 15, o CNJ decidiu que, a partir de agosto, os HCTP não vão poder mais receber internações. A resolução ainda prevê o uso do tratamento ambulatorial em serviços comunitários e na Rede de Atenção Psicossocial (RAPS), do Sistema Único de Saúde (SUS). Dessa forma, uma junta médica do Ministério da Saúde e o CNJ avaliarão os presos e vão decidir quem poderá fazer o tratamento convencional, ou seja, junto ao restante da população.
O Ministério da Saúde
Segundo Helvécio Magalhães, secretário de Atenção Especializada à Saúde, o Ministério está empenhado em implementar medidas que visem proteger os direitos humanos de populações vulneráveis. Nesse contexto, está sendo planejada a elaboração de um Plano Nacional de Desinstitucionalização de pacientes.
“Será pactuado com Estados e municípios o financiamento federal para equipes multidisciplinares para este trabalho, para avaliar cada usuário e o integrar de forma responsável em um ponto da rede de atenção. Além disto, vamos induzir o crescimento desta rede onde for necessário. E este trabalho só será efetivo na parceria com o CNJ, dialogando com os juízes e avaliando conjuntamente com o SUS todo o plano de trabalho a ser elaborado de modo compartilhado”, justificou.
O assunto foi abordado em uma reunião realizada na semana passada com representantes da Saúde e do CNJ. De acordo com Sônia Barros, diretora do Departamento de Saúde Mental, a política antimanicomial do CNJ está alinhada com o modelo de atenção psicossocial que o ministério vem implementando há mais de duas décadas.
“O Brasil se tornou referência mundial em políticas de desinstitucionalização na saúde mental. O nosso departamento está investindo na expansão e na qualificação dos serviços de saúde mental que também irão atender as singularidades da desinstitucionalização dos Hospitais de Custódia. É compromisso do Ministério da Saúde garantir o cuidado de qualidade para todas essas pessoas”, afirmou.
O Conselho Federal de Medicina
O Conselho Federal de Medicina (CFM) emitiu uma nota no último dia 8 de maio em que expressa seu apoio à manifestação contra o fechamento de Hospitais de Custódia e Tratamentos Psiquiátricos.
A posição contrária à resolução do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) é reiterada pela Associação Brasileira de Psiquiatria (ABP), Associação Médica Brasileira (AMB), Federação Nacional dos Médicos (Fenam) e Federação Médica Brasileira (FMB).
Segundo as entidades, o fechamento dessas instituições, devido à determinação do CNJ, pode acarretar riscos com impactos sociais e para a segurança pública. De acordo com a nota divulgada, a medida, que entrará em vigor em breve, foi elaborada sem o devido debate com os profissionais médicos.
“Esse documento [a Resolução do CNJ] é um perigo para a população brasileira, pois determina o fechamento desses Hospitais de Custódia e Tratamento Psiquiátrico e diz que todas essas pessoas (criminosos) voltariam para a sociedade e fariam tratamento junto com a comunidade, se assim, essas pessoas quiserem”, argumentam.
Confira nota do CFM na íntegra:
“Alerta urgente à sociedade brasileira
Faltam sete dias para, 5.800* criminosos (matadores em série, assassinos, pedófilos, latrocidas, dentre outros) sentenciados que cumprem penas em Hospitais Psiquiátricos de Custódia comecem a soltos se valendo do disposto na Resolução nº 487 do Conselho Nacional de Justiça. Esse documento é um perigo para a população brasileira, pois determina o fechamento desses Hospitais de Custódia e Tratamento Psiquiátrico e diz que todas essas pessoas (criminosos) voltariam para a sociedade e fariam tratamento junto com a comunidade, se assim, essas pessoas quiserem.
Art. 16. No prazo de até 6 (seis) meses, contados a partir da entrada em vigor desta Resolução, a autoridade judicial competente revisará os processos a fim de avaliar a possibilidade de extinção da medida em curso, progressão para tratamento ambulatorial em meio aberto ou transferência para estabelecimento de saúde adequado, nos casos relativos:
I – à execução de medida de segurança que estejam sendo cumpridas em HCTPs, em instituições congêneres ou unidades prisionais;
II – a pessoas que permaneçam nesses estabelecimentos, apesar da extinção da medida ou da existência de ordem de desinternação condicional; e
III – a pessoas com transtorno mental ou deficiência psicossocial que estejam em prisão processual ou cumprimento de pena em unidades prisionais, delegacias de polícia ou estabelecimentos congêneres.
Nós, médicos, não fomos consultados sobre essa medida que trará mudanças profundas para a saúde mental pública brasileira e também para a segurança pública, mas nos reunimos e viemos publicamente, mais uma vez, nos manifestar contra a Resolução nº487.
São muitos alertas! O sistema público de saúde e o sistema prisional comum não estão preparados para receber todas essas pessoas, por isso haverá abandono do tratamento médico, aumento da violência, aumento de criminosos com doenças mentais em prisões comuns, recidiva criminal, dentre outros prejuízos sociais.
Estamos diante de uma situação calamitosa e urgente, pois a partir de 15 de maio de 2023 a Resolução começará a valer e mais nada poderá ser feito, por isso precisamos que essa decisão seja revogada.
Fonte: Relatório Sistema Prisional em Números, do Conselho Nacional do Ministério Público, de 2021.“