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Ilustre Vilanovense que deixou de ser motorista de prefeitos para ocupar o cargo de “vice” do Paço Municipal

Assim que desembarcou no Aeroporto Santa Genoveva em um voo vindo de São Paulo para Goiânia, Romário Policarpo sacou o celular e mirou sua câmara para  milhares de torcedores Vilanovenses que estavam do lado de fora do saguão. A euforia da torcida fez a filmagem tremer, mas foi cumprido o propósito de registrar a chegada do clube que acabara de conquistar o acesso à Série B do Campeonato Brasileiro. No fim da manhã de segunda-feira, 18, o presidente da Câmara Municipal de Goiânia era só mais um na multidão vestida de vermelho e branco que gritava “Tigrão, Tigrão”  —  nome do mascote do clube goianiense e que acabou se tornando sinônimo de nome do clube.

Vereador no segundo mandato, e ocupando pela segunda vez a presidência da Mesa Diretora da Casa, Romário Policarpo (Patriota), divide seu tempo entre a política e o Vila Nova. No time ele acumula as funções de torcedor ilustre e diretor de Comunicação, razão pela qual tem viajado junto ao clube para os jogos fora de Goiânia. “Neste ano eu consegui acompanhar o Vila Nova em todos os jogos.”

Romário diz não saber o que o levou a gostar de futebol. Tentando achar explicação, relata que seu nome foi inspirado em um jogador carioca, baixinho, marrento, vascaíno e também político. “Talvez eu tenha sido o primeiro a ter esse nome por causa do jogador. Nasci em 1987, ano em que Romário começou a fazer sucesso no futebol, foi artilheiro do Vasco e jogou pela seleção.” Já a paixão pelo Vila Nova é uma herança do avô.

Presidente da Câmara junto a torcida do Tigrão. Na foto ao lado do amigo Welkson, do Crimeia Leste | Foto: Arquivo pessoal

Natural de Novo Gama, no Distrito Federal, Romário Policarpo chegou ainda criança a Goiânia. Morou com seu avô nos bairros da Região Leste da capital, como na Vila Nova e Criméia. De família cristã, estudou todo ensino médio no colégio Claretiano Coração de Maria, no Centro. Com 31 anos, o vereador está próximo de completar uma década de política, embora sua determinação impressiona até os colegas bem mais experientes na vida pública. 

O vereador e presidente da Câmara Municipal já precisou dormir na rua e a depender da ajuda de amigos. Quando seu avô separou da companheira e se mudou para Palmas, no Tocantins, o jovem ficou em Goiânia morando com a senhora que assumiu o papel de mãe. Perto de completar 18 anos, Romário teve que enfrentar a perda da figura materna. “Quando ela morreu, passei muita dificuldade. Não tinha lugar para ir. Eu dormia na casa de um ou de outro amigo. Às vezes na rua. Graças a uns amigos não passei por coisas piores. Eles descobriram isso e fui morar com a família de um deles, que eram poloneses e tinham vindo para Goiânia. Eles me acolheram e passaram a ser minha família também.”

Essas dificuldades enfrentadas por Romário coincidem com o que ele considera um divisor de águas em sua vida. Ainda aos 17 anos, foi aprovado em um concurso da Guarda Civil Metropolitana de Goiânia (GCM), mas só assumiu o cargo mais de dois anos depois, quando já tinha 20 anos. “No momento que entrei na guarda foi um dos mais delicados da minha vida. Talvez por isso eu tenha tanta devoção pela corporação. Tudo que conquistei foi porque a GCM me deu condições.”

Em eventos públicos, Romário costuma usar uniforme da GCM | Foto: Jucimar de Sousa/reprodução

A GCM foi que aproximou Romário Policarpo da política. Ainda com pouco tempo de experiência na corporação, o jovem foi destacado para ficar no Paço Municipal. Logo ele passou a ter contato com um dos maiores líderes políticos de Goiás: Iris Rezende, ícone do MDB. Apenas os mais íntimos sabem que ele chegou a dirigir para o emedebista e depois para seu sucessor na Prefeitura de Goiânia, Paulo Garcia, do PT.

“Um dia na porta do gabinete do prefeito disse para um amigo da GCM que estava lá comigo que eu ainda seria prefeito de Goiânia. Era sério o que estava falando. Então ele respondeu: ‘Cara, a primeira coisa que você precisa fazer para ser prefeito é ser presidente da associação da guarda’”, lembra.

Após a dica do amigo, Romário pediu para ser alocado em outra função e se candidatou a presidente da Associação da Guarda Civil Metropolitana de Goiânia (ASGCMG). Essa pode ser considerada a sua primeira disputa eleitoral, e com sucesso. Foi eleito com quase 80% dos votos. “Depois disso, em 2012, houve uma votação interna da guarda para escolher o candidato a vereador que iria representar a classe. Eu fui escolhido, mas não fui eleito vereador. Foi o início”, lembra o vereador, que à época pertencia aos quadros do PSL. Depois disso, Romário se tornou vice-presidente do SindiGoiânia — que representa os servidores públicos da capital. Ele acabou assumindo a direção geral da entidade após um escândalo envolvendo denúncias de desvios de recursos que culminou no afastamento do presidente eleito.

Romário ficou três anos à frente do SindiGoiânia e em 2016, já no PTC, disputou pela segunda vez uma cadeira na Câmara Municipal de Goiânia. Desta vez conquistou 3.185 votos e foi eleito. “Minha vida na política é resumida por uma frase do Iris Rezende: ‘Essa trajetória só tem explicação em Deus’. Não tenho padrinho político, não tenho família política. Eu me aconselho com meus amigos.”

Em 2018, o vereador em primeiro mandato, chegou à presidência da Casa. O homem que há pouco anos era motorista do prefeito de Goiânia, passou a ser o vice-prefeito da cidade — Iris Rezende foi eleito em 2016 tendo como seu vice o Major Araújo, que renunciou ao cargo, fazendo com que o presidente da Câmara Municipal passasse a ser o primeiro na ordem sucessória do cargo de prefeito. 

Em 2020 foi reeleito, desta vez filiado ao partido Patriota. Ele também foi reconduzido para a presidência da Mesa Diretora. O feito o coloca na história da Casa. Pela primeira vez um vereador é reeleito para presidir a Câmara Municipal de Goiânia. Se manter no cargo com apoio de 21 dos 35 vereadores demonstra que Romário alcançou uma estatura elevada na vida política. Decisões tomadas no Paço levam em conta o posicionamento dele, além de figurar entre os líderes que são ativos nas articulações políticas de Goiânia e até do Estado. 

Romário não nega seu orgulho de ter sido o único presidente da Casa que alcançou a reeleição. No entanto, prefere ser lembrado pelo fato de ser o primeiro vereador declarado negro a presidir a Câmara de Goiânia.  “Quando volto ao colégio Claretiano, a diretora de lá gosta que eu conte pros alunos a minha história, que é de superação e determinação. Em mais de 80 anos de existência da Câmara Municipal, sou o primeiro negro que ocupa a presidência.” 

Romário Policarpo, primeiro negro presidente da Câmara de Goiânia ao lado de Rogério Cruz, que também faz história ao ser o primeiro negro prefeito de Goiânia | Foto: arquivo pessoal

A história de Romário chama atenção para outro fator: no último dia 15 de janeiro, o presidente da Câmara deu posse ao primeiro prefeito negro de Goiânia. Rogério Cruz (Republicanos) assume definitivamente o cargo após a morte de Maguito Vilela (MDB), em decorrência da Covid-19. “Vai ser difícil Goiânia repetir essa combinação: um negro prefeito e outro na presidência do Legislativo Municipal”, diz sem esconder o sorriso de satisfação legítima. Mais: Romário também é “vice”.

Mesmo já tendo seu nome na história política goiana, Romário ainda não se deu por satisfeito. Quando questionado sobre seu futuro político, não titubeia: “Quero ser prefeito de Goiânia. E quero ser lembrado também como o primeiro servidor público que foi eleito para o Paço”. Para garantir que o feito será seu, já pesquisou nos arquivos da cidade e garante que Goiânia nunca foi gerido por um servidor público de carreira.

Entre algumas características citadas por colegas e pessoas mais próximas a Romário, está a humildade (e a de cumpridor de acordos). De fato, é fácil observar esse adjetivo. Com a mesma naturalidade em que é fotografado em meio a torcida Vilanovense, Romário Policarpo posa ao lado do governador, prefeito e colegas vereadores | Foto: Arquivo pessoal