Projeto do IFG encoraja garotas a estudar engenharia, tecnologia, matemática e ciências
22 dezembro 2019 às 00h00
COMPARTILHAR
Com investimento de empresas apoiadoras, Steam4Girls surgiu após observação de que meninas se envolvem menos com a área de exatas
A proporção de mulheres nas ciências exatas é pequena em todo o mundo. Dados da Sociedade Brasileira de Computação (SBC) mostram que apenas 15% dos alunos matriculados em cursos de Ciência da Computação e Engenharia são mulheres. Nos Estados Unidos, um levantamento de 2013 mostrou que, enquanto as mulheres compõem 46% da força de trabalho, sua representação nas ciências e engenharia era de apenas 27%.
Na tentativa de transformar esse quadro em Goiânia, uma iniciativa foi criada para fazer que meninas se engajem nas exatas desde cedo. Professores e alunas do Instituto Federal de Goiás (IFG) desenvolvem o projeto Steam4Girls. O termo “steam” vem da sigla em inglês para ciência, tecnologia, engenharia, artes e matemática; enquanto 4girls é um homófono de “para garotas”. A ação, voltada para alunas de ensino fundamental (8º e 9º anos) de duas escolas municipais da capital, realiza oficinas interdisciplinares em que as estudantes desenvolvem habilidades de programação, robótica, matemática e outras disciplinas nas áreas Steam.
Dezesseis alunas da Escola Municipal João Braz, no setor São Judas Tadeu, e da Escola Municipal Professora Dalísia Elizabeth Martins Doles, no setor Goiânia 2, foram envolvidas. Esta é a segunda edição da iniciativa que, em sua primeira versão, foi feita de forma mista, também com garotos. O coordenador do projeto, Carlos Roberto da Silveira Júnior, conta que, na primeira versão, observou-se que os meninos costumavam tomar a frente em atividades relacionadas à tecnologia, enquanto garotas geralmente ficavam retraídas, o que acentuava as diferenças de aprendizado.
“É observado estatisticamente que meninas se desenvolve bem em atividades práticas e exercícios como criar relatórios”, afirma Carlos Roberto da Silveira Júnior. “Mas, em provas escritas na área de exatas, elas se saem um pouco pior – estudiosos relatam que tem a ver com baixa autoestima. O coordenador da primeira edição, em 2018, Cláudio Fleury, observou que as garotas se sentavam mais distantes do computador, tinham receio de testar”, explica o professor.
Giovana Fernandes da Costa, professora de matemática na Escola Municipal João Braz, foi quem ouviu falar sobre o projeto de robótica do IFG e resolveu contactá-los. “Eu já tinha concebido um projeto parecido que eu queria desenvolver, mas não sabia por onde começar. Não temos como fazer esses projetos acontecerem sem apoio”, afirma a professora. Além da parceria do IFG e das escolas municipais, o Steam4Girls também contou com investimento de empresas apoiadoras: FAAFTECH Soluções Automotivas, Santos Dumont – Componentes Eletrônicos e Entele Telecomunicações.
Graduada em matemática, a professora Giovana Fernandes da Costa vem de uma graduação predominantemente masculina e conta que, durante sua formação, houve algum estranhamento e que se tivesse passado por um projeto como o Steam4Girls em sua adolescência, as coisas talvez tivessem sido mais naturais. “Até hoje, minha presença em sala de aula ligada à matemática gera algum estranhamento, mas também gera admiração por parte das garotas. Principalmente admiração”.
Por isso, Carlos Roberto da Silveira Júnior convidou mulheres graduandas do Instituto Federal de Goiás do curso de Engenharia de Controle e Automação para serem monitoras e tomarem a frente do projeto, enquanto o próprio professor atuava apenas como coordenador. “No próprio IFG temos baixo número de mulheres comparativamente: em turmas de trinta, são quatro alunas de Engenharia Elétrica, duas alunas de Engenharia Mecânica, duas de Controle e Automação”.
Segundo os estudos do professor sobre o assunto, para reverter a situação, é necessário agir cedo. “Pesquisas do Ministério da Educação mostram que a quantidade de alunos que termina ensino fundamental e deixa a escola é alta”, diz Carlos Roberto da Silveira Júnior. “Até 28 anos, cai o interesse; muitos não buscam nem ao menos o ensino médio. No caso dos meninos, param de estudar para trabalhar. Para as meninas, o casamento e família são os principais fatores que as afastam do estudos. Por isso temos esse público alvo, do oitavo e nono ano, já que é o período que podem se interessar pelo Instituto Federal de Goiás, cursar o Ensino Técnico”.
Na prática, as atividades do Steam4Girls consistem em soluções de problemas que exigem conhecimentos interdisciplinares. Carlos Roberto da Silveira Júnior explica: “Começamos com robôs, luzes de led, falamos sobre semáforo inteligente, falamos de cidades inteligentes. As atividades são práticas e mais amplas do que disciplinas tradicionais. Conversando sobre sensores de ultrassom, falamos de animais como morcego e golfinho, que são capazes de ecolocalização e, então, usamos este conceito para programar robôs para se desviarem de obstáculo por ultrassom. Existe criatividade também, já que elas podem montar o robô como querem”.
Giovana Fernandes da Costa conta que a diferença entre as garotas que participaram do projeto foi sensível. “O interesse pela área da tecnologia foi a principal mudança”, diz a professora de matemática. “Tivemos o feedback delas, vimos que se desenvolveram bastante. Principalmente criaram gosto pela área de exatas, tecnologia, eletrônica, isso para mim é o mais importante”.
Carla Bueno do Nascimento Silva, graduanda no curso de Engenharia de Controle e Automação, foi uma das monitoras do Steam4Girls e relata que sempre teve segurança de seu desejo de estudar na área de exatas. Ela afirma que, quando conheceu o projeto, o encarou como uma missão pessoal. “Queria contribuir com as meninas em termos de conhecimento e também para dar outra opção a elas. Além de ser dona de casa, fazer serviço doméstico, dar confiança de que elas podiam ser o que quisessem”.
A graduanda conta que sente que o projeto foi exitoso, pois duas alunas que participaram do Steam4Girls foram aprovadas na seleção do IFG para o curso técnico em eletrônica e curso técnico de alimentos. “Nós sempre instigamos as garotas, sempre questionando do que gostavam dentre os conteúdos. Tivemos retorno de duas em especial, que nos disseram que as fizemos acreditar que eram capazes de coisas que não imaginavam – no caso, programar robôs”.