Construções de viadutos, alargamentos de ruas e mudanças de avenidas para mão única abrindo mais espaços para veículos e diminuindo os espaços para outros modais de transportes indicam que Goiânia tem priorizado mais o uso de veículos individuais. Isto é, uma cidade para carros sem contemplar outros modais de transportes. Para a vice-presidente do Conselho de Arquitetura e Urbanismo de Goiás (CAU-GO), a urbanista Janaína de Holanda Camilo, a cultura do automóvel está muito arraigada em todos.

Segundo dados do Departamento Estadual de Trânsito de Goiás (Detran-GO), nos últimos anos a frota de veículos só tem aumentado. Em 2021 eram 1,27 milhão de veículos, sendo 966.433 de quatro ou mais rodas e 311.352 de duas rodas. Em 2022 os números subiram para 1.302,757, com mais de 318 mil motocicletas e 983.909 veículos de quatro ou mais rodas. Além de todos os emplacados na capital, ainda há os veículos da região metropolitana transitando pelas vias goianienses diariamente e o tráfego intenso de duas rodovias federais: a BR-153 e a BR-060.

Com tantos veículos aumentando a cada ano, Janaína de Holanda percebe que toda a infraestrutura é voltada para atender o crescente número da frota. “Dentro do município de Goiânia fala-se muito em cidade caminhável, de valorização dos pedestres, mas quando a gente vê na prática, no orçamento municipal, os recursos vão todos para intervenção nas vias. Muitas vezes reduzindo a largura das calçadas, inclusive, colocam a vida dos pedestres em risco”. A especialista salienta que esse é um problema que prejudica a mobilidade. “Não há uma só cidade no mundo que se mantenha funcional que não tenha feito os investimentos sérios em transporte coletivo. Esse investimento, dinheiro é mudança de política, tem sempre que focar no conforto, na eficiência, na pontualidade desse serviço [transporte público]”, elenca.

Todos os próximos projetos de viadutos e complexos viários irão contemplar tanto os pedestres em si, em passagens com segurança, quanto às ciclovias na questão da mobilidade, não priorizando apenas os veículos.

Seinfra

Como amenizar essa problemática na cidade? Os corredores centrais e faixas exclusivas para ônibus são apontadas como uma das alternativas. No entanto, o professor especialista em trânsito do Instituto Federal de Ciência e Tecnologia de Goiás (IFG), Marcos Rothen, ressalta que, apesar de alterações em vias para o transporte coletivo, as faixas exclusivas criadas são poucas priorizadas e depois de implantadas não se aumentaram a quantidade de ônibus e nem a qualidade.

Urbanista Janaína Holanda | Foto: arquivo pessoal
Urbanista Janaína Holanda | Foto: arquivo pessoal

“Os ônibus são velhos, mal conservados, chacoalham muito, fazem muito barulho para frear. Falta também ar condicionado para dar um conforto em nossa região, que em grande parte do ano é muito quente. Também depois da implantação das faixas as empresas reduziram a frota e o número de viagens, na hora do movimento os ônibus são cheios e fora deles tem muito poucos ônibus. O eixo Anhanguera pode ser considerado um quase BRT, mas ele foi muito maltratado, deixaram os ônibus com manutenção deficiente, com isso a quantidade de ônibus diminuiu e os veículos que quebram na rua aumentaram. E como paliativo alugaram uns ônibus usados, que vieram de Brasília, o que não garante a qualidade e o conforto que o passageiro necessita,” denuncia. “Uma das poucas exceções é o Eixo Anhanguera que é um exemplo copiado em quase todo o mundo, mas é um trecho curto”, ressalta, embora a linha tenha sido estendida para Trindade, Goianira e Senador Canedo.

Holanda reforça que o BRT proporcionaria uma melhora no transporte de passageiros, mas segundo ela, é uma obra que não fica pronta. Nesta sexta-feira, 3, o prefeito de Goiânia, Rogério Cruz (Republicanos), se reuniu com o consórcio responsável pela construção e ficou definido que o novo prazo de conclusão será dia 30 de junho. “É fundamental a gente entender que quando estávamos falando de mobilidade, transportes e deslocamentos não há uma solução mágica. Isso é o sistema. Então nós não temos que ter só uma BRT, todos os modais e o sistema de infraestrutura compatíveis com estes modais têm que receber investimentos. Não adianta eu ter uma ciclovia ou ciclofaixa que acaba em nada”, afirma. Para ela, teria que haver uma conexão com o transporte coletivo, com locais seguros para se guardar as bicicletas, com incentivos também das empresas. “No CAU o funcionário que vai de bicicleta conta com local para guardar a sua bike, banheiro para tomar uma ducha e ganha um dia de folga no mês”, incentiva a urbanista.

Em relação às vias para bicicleta, a especialista pontua a falta de fiscalização efetiva para coibir estacionamento e ocupação irregular desses espaços. “As ciclofaixas têm que transmitir ambientalmente conforto e segurança, porque as pessoas ficam com medo. Há uma competição entre as bicicletas, os carros, os ônibus e os pedestres; e sempre os mais fracos ficam prejudicado”, diz.

Marcos Rothen especialista em trânsito | Foto: arquivo pessoal
Marcos Rothen especialista em trânsito | Foto: arquivo pessoal

Marcos Rothen entende que para as pessoas deixarem os seus veículos e passarem a usar o transporte coletivo, muita coisa precisaria melhora. “Aqui em Goiânia não temos nem informações de como utilizar os ônibus, as pessoas que não usam o transporte não sabem como pagar a passagem, mesmo os que utilizam o transporte não tem informação para onde os ônibus estão indo. À vista luminosa fica alternando entre os pontos iniciais e finais, apenas”, aponta.

Ele comenta que sempre há um passageiro perdido na T-63. “O ônibus não informa para que lado vai por exemplo a Linha 015 Flamboyant x Praça A, passa sempre com as mesmas indicações. Não tem nem alguma informação nos ônibus informando as principais vias que o ônibus passa”, critica. Para o professor a redução de ônibus nos horários noturnos e nos fins de semana também é prejudicial ao sistema. “Ai se a pessoa não pode contar com o transporte coletivo todos os dias ele acaba comprando uma moto ou até mesmo um carro e deixa de usar o ônibus, aumentando o número de carros,” nota.

Acerca de melhorias no transporte coletivo, a Companhia Metropolitana de Transportes Coletivos (CMTC) informou que estão sendo implantados novos mecânicos para atrair e conquistar os usuários da Rede Metropolitana de Transportes Coletivos (RMTC). Dentre os programas, foram citados a implantação dos novos bilhetes tarifários temporais, como  o Cartão Família. Outra alternativa de viagem é o bilhete único com prazo de 2h30 para realizar até 5 integrações, foi adotado o pagamento da tarifa por meio do cartão de crédito, débito e PIX. Até então, eram possíveis pagamentos apenas com o cartão sit-pass. “No planejamento das ações temos ainda a renovação de 100% da frota até 2025, implantação do CityBus 3.0 e um programa de bicicletas compartilhadas integradas ao transporte público. O objetivo é criar condições para melhorar a qualidade dos serviços, a percepção dos usuários e reestruturação da infraestrutura do sistema”, cita a companhia.

“As ciclovias e ciclofaixas são poucas e mal usadas. Falta educação dos próprios ciclistas.

Professor Marcos Rothen

Nas últimas décadas, as gestões decidiram que o melhor para a cidade são as trincheiras, viadutos e complexos viários em cruzamentos congestionados. “A construção de viadutos em áreas urbanas não é algo muito recomendável. Normalmente para que um viaduto desse resultado em aumentar a fluidez teria que ter viadutos nos outros cruzamentos movimentados a frente. Um exemplo de um viaduto que não atende as necessidades é o da Praça do Chafariz na T-63, é comum que o viaduto fique congestionado devido aos semáforos fechados na sequência, como o da T-4 e os outros adiante”, ressalta o professor Marcos Rothen.

Ele acrescenta que no geral a cidade é planejada para os carros “em detrimento de pedestres, que muitas vezes tem que compartilhar o mesmo espaço com os carros”, observa Rothen. “E um agravante dessa situação é o de as novas obras não considerarem os pedestres, os portadores de dificuldades para locomoção e nem para as bicicletas. Um exemplo disso é o viaduto da Jamel Cecílio que só atende os carros e deixou os pedestres de lado,” lamenta.

A Secretaria Municipal de Infraestrutura (Seinfra) garante que todos os novos projetos de viadutos e complexos viários contemplaram tanto veículos quanto pedestres, que poderão caminhar com segurança. Além disso, as obras serão para todos os modais de transportes, contato com ciclovias. “Estes próximos projetos estão sendo estudados junto com a Secretaria Municipal de Mobilidade e uma das diretrizes do prefeito Rogério Cruz é contemplar pedestres e ciclistas nestes projetos,” cita.

Trânsito de bicicletas

Bicicleta trafega pela ciclovia da Avenida Universitária, a primeira construída em Goiânia | Foto: Fernando Leite/ Jornal Opção
Bicicleta trafega pela ciclovia da Avenida Universitária, a primeira construída em Goiânia | Foto: Fernando Leite/ Jornal Opção

Embora não se tenha um número exato da quantidade, o Instituto de Pesquisa Multiplicidade estima que Goiânia seja a quarta capital do Brasil com mais bicicletas. De acordo com os dados, há cerca de 280 mil bikes, isto é, 0,19 bicicleta por habitante. O índice foi calculado com base na última Pesquisa de Orçamentos Familiares (POF), do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Entretanto, a maioria é utilizada disputando espaços com veículos. O retrato mais concreto foi de um idoso de 60 anos acostumado a pedalar em sua bicicleta todas as manhãs pela Avenida Anhanguera e foi atropelado por um ônibus do eixo. O acidente aconteceu na quinta-feira, 2, a vítima foi atendida por uma equipe do Corpo de Bombeiros de Goiás (CMB-GO) e encaminhada gravemente para o Hospital de Urgência Governador Otávio Lage de Siqueira (Hugol). Testemunhas contaram que ele acessou a faixa central da via e foi atingido pelo veículo do transporte coletivo.

Sem ter a quantidade desses veículos, equipes da Secretaria Municipal de Mobilidade (SMM) realizaram uma pesquisa in loco e conseguiram identificar trechos com maior quantidade de bicicletas. No último dia 24, os agentes ficaram parados em locais como a Avenida Vera Cruz, no Jardim Guanabara, e Avenida Vereador José Monteiro, no Setor Negrão de Lima. Só nesses trechos conseguiram contabilizar a passagem de 108 ciclistas, entre 6h44 e 7h44 (Negrão de Lima com Rua 257), ou seja, 1,8 bikes por minuto.

No trecho do Jardim Guanabara, na semana anterior, a SMM conseguiu contar 181 ciclistas entre 6h40 e 7h40, o que deu mais de três bicicletas por minuto. Para o diretor de transportes da pasta, Jean Damas, esses dados demonstram que há pontos de maior fluxo de bicicletas na cidade e que podem direcionar a construção de novas ciclovias. A gestão de Cruz promete alcançar 100 km de ruas com espaços exclusivos para as bicicletas.

Atualmente a cidade conta com 39,30 quilômetros (km) de ciclovias – espaços segregados fisicamente das vias. São 20,35 km de ciclofaixas em que há apenas uma delimitação de sinalização ou física mínima entre o local dos carros e das bicicletas. Isso fornece apenas a taxa de 3,83 km a cada 100 mil habitantes. O levantamento é da Associação Brasileira do Setor de Bicicletas (Aliança Bike) e coloca Goiânia como a quarta pior capital que pensa alternativas para outros meios de transportes.

“As ciclovias e ciclofaixas são poucas e mal usadas. Falta educação dos próprios ciclistas. É comum mesmo onde tem a ciclovia ou a ciclofaixa os ciclistas não as usarem e continuarem a pedalar pela rua ou até mesmo pela calçada. Mas para que o uso da bicicleta fosse incentivado seria necessário que o trânsito de Goiânia fosse civilizado, aqui os motoristas podem andar a velocidades altas, fazerem o que quiserem. Aqui em Goiânia muitas avenidas tem o limite de 60 km/h que é muito alto e quando há um choque com outro carro, com uma moto, com um ciclista ou um pedestre o dano sempre é elevado,” frisa o professor Marcos Rothen.

Acidentes e mortalidade no trânsito

Motociclista colide em carro em Goiânia | Foto: PM-GO
Motociclista colide em carro em Goiânia | Foto: PM-GO

As estatísticas de violência no trânsito em Goiânia, cooptadas e divulgadas pela Secretaria de Segurança Pública de Goiás (SSP-GO), são alarmantes.  Em 2022, foram registrados 35.667 acidentes de trânsito, contra 31.690 de 2021, ou seja, quase 13% de aumento. Os setores com maiores números de casos são Bueno (1,572); Jardim América (1.501); Setor Marista (1.017) e Jardim Goiás (990). A quantidade de óbitos foi de 244, no ano anterior foram 258.

As ocorrências de atropelamentos de pedestres foram de 728 casos; acidentes envolvendo veículo de quatro rodas ou mais e bicicletas chegaram a 278; quedas de bicicleta (273); colisões entre carros (568); e batidas entre motos (596). A quantidade mais alta está relacionada a todo tipo de colisão entre veículos de quatro rodas ou mais e motocicletas. Nesses casos, o número salta para 5.348.

Nota na íntegra da Seinfra

Todos os próximos projetos de viadutos e complexos viários irão contemplar tanto os pedestres em si, em passagens com segurança, quanto às ciclovias na questão da mobilidade, não priorizando apenas os veículos. Estes próximos projetos estão sendo estudados junto com a Secretaria Municipal de Mobilidade e uma das diretrizes do prefeito Rogério Cruz é contemplar pedestres e ciclistas nestes projetos.

O BRT deve trazer uma fluidez e uma comodidade aos usuários do transporte coletivo, uma vez que o caminho do BRT é desobstruído. Ele terá mais velocidade do que, por exemplo, os demais veículos, principalmente nos horários de pico. Terá também mais conforto, porque são veículos mais novos, utilizando um pavimento de melhor qualidade, sem buracos e sem trepidação.

O BRT vai ser o mais importante corredor viário da capital, onde em todo o seu trajeto o transporte coletivo foi priorizado, incluindo a acessibilidade completa a quem vai utilizar este meio de transporte.

O balanço que a Prefeitura de Goiânia faz de obras para o transporte coletivo de passageiros é altamente positivo. Tanto a criação dos corredores de ônibus nas Avenidas T-7 e T-9, como o próprio BRT, quando efetivamente em funcionamento, vão melhorar a qualidade dos serviços prestados e diminuir o tempo de viagem dos passageiros.

Uma obra recente com foco no transporte coletivo é o recapeamento da Avenida Anhanguera. A Prefeitura de Goiânia, por meio da Seinfra,  priorizou a reforma completa deste importante eixo de transporte urbano, garantindo mais celeridade e qualidade ao serviço prestado ao usuário. As empresas se comprometeram a colocar ônibus mais novos também para melhorar a qualidade do serviço prestado.

A Prefeitura de Goiânia, em parceria com o Governo de Goiás, subsidia o valor da tarifa de ônibus desde 2022, garantindo o menor valor possível à passagem.

A Prefeitura de Goiânia e o Governo de Goiás lançaram também o Cartão Família, que permite que, com uma única passagem, até cinco pessoas possam utilizar o transporte coletivo nos finais de semana e feriados em Goiânia e Região Metropolitana.

A Seinfra reforça que a população pode sempre encaminhar reclamações e solicitações pelo aplicativo Prefeitura 24h.