OS assume o Hugo com missão de acalmar os ânimos e manter a qualidade
01 dezembro 2019 às 00h01

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Referência em traumatologia no Estado de Goiás, o Hospital de Urgências de Goiânia recebe nova gestão em meio a expectativas e dúvidas

Dois meses após ter sido suspensa, foi finalmente concretizada neste final de semana a transição de gestão do Hospital de Urgências de Goiânia Dr. Valdemiro Cruz, o Hugo, unidade referência em traumatologia em Goiás e o segundo maior hospital de urgência e emergência do Estado, ficando atrás apenas do Hospital de Urgências Governador Otávio Lage de Siqueira, o Hugol.
Em outubro deste ano, o Instituto Haver, Organização Social (OS) com sede na capital goiana e à frente do hospital desde 27 de novembro de 2018, comunicou sua decisão de não participar do Processo de Chamamento Público que objetivava escolher a nova OS que tomaria posse da gestão do Hugo.
A OS goiana assumiu a gestão, no ano passado, durante um período no mínimo delicado do hospital. Em meio a turbulências financeiras e falhas estruturais – quando chegou a ser alvo de uma determinação judicial de interdição – a OS no comando da unidade na época, o Instituto Gerir, pediu a rescisão contratual em razão de, conforme a organização, falta de repasses do Estado pelo governo passado. Em resposta, a então Secretaria de Saúde de Goiás informou valores que haviam sido repassados e alegou “descumprimento de metas” por parte da OS.
Agora, depois de um ano do Instituto Haver ter tomado as rédeas do hospital, a gestão foi oficialmente transferida para o Instituto Nacional de Tecnologia (INTS). Com sede em Salvador, na Bahia, o INTS pega um hospital com, segundo o Haver, números mais positivos do que em relação ao ano passado. Entretanto, o clima de incertezas e expectativas é algo que paira nos corredores, como se transportado pelo ar esterilizado do ambiente hospitalar.
Ao mesmo tempo em que a nova OS assegura que nada mudará, e que diversos setores do hospital serão, ao invés de reduzidos, ampliados, boatos que antes circulavam a bocas pequenas pelo hospital, como demissões e remanejamentos, se confirmam.
Satisfação dos pacientes contrasta com receio dos profissionais
Quem chega ao Hugo, seja acidentado ou acompanhante, não detecta na recepção do hospital ou nas feições dos pacientes em espera a infeliz e corriqueira frustração de quem precisa recorrer constantemente ao serviço público para tratar da saúde, causada pela demora no atendimento.
Na quarta-feira, 27, a vendedora Daniele Gomes, de 20 anos, mexia no celular tranquilamente enquanto, no banco ao lado, repousavam duas muletas. A jovem sofreu um acidente há sete meses, quando quebrou o fêmur e precisou ser internada por cinco dias no Hugo. Em seu retorno, Daniele relembrou seu atendimento. “Foi tudo muito rápido. Em umas duras horas, fiz o raio-X na perna e fui logo para a cirurgia. Foi quando precisei ficar internada”, conta. Perguntada sobre a qualidade do atendimento recebida na unidade hospitalar, ela é categórica: “Olha, não tenho do que reclamar”.

A jovem Daniele parece não ser uma exceção. A advogada Irineia Souza, 43, ficou impaciente quanto à duração do atendimento do irmão, que realizava seu retorno no Hugo após cair de moto e fraturar o pulso, mas não poupou elogios ao atendimento recebido por Jaredes Antônio, 50, quando chegou ferido ao hospital. “Achei o atendimento muito rápido, foi ótimo”, comenta.
A estrutura hospitalar, que dispõe de milhares de profissionais de várias áreas que movimentam a máquina do atendimento, viabiliza a rapidez e a qualidade apontadas pelos pacientes.
O Hugo conta, hoje, com 407 leitos distribuídos em internação clínica (médica e cirúrgica), observação, traumatologia, reanimação, hemodíalise e de UTI. O hospital também disponibiliza exames laboratoriais e imagem, o que inclui tomografia. Entre as especialidades médicas que atendidas estão Clínica Médica, Ortopedia, Fonoaudiologia, Terapia Intensiva, Neurologia, Nutrição, Cardiologia, Odontologia, Geriatria, Fisioterapia, Geriatria e cirurgias gerais e do Trauma.
O hospital é um dos poucos em Goiás que oferecem exame de tomografia de crânio e coluna cervical. Em setembro deste ano, foi uma das unidades goianas beneficiadas com um projeto de inteligência artificial em exames do tipo da Fundação Instituto de Pesquisa e Estudo de Diagnóstico por Imagem, a FIDI. A tecnologia é usada para identificar lesões em tomografias ao mesmo tempo em que auxilia e sinaliza o paciente que deve ter um atendimento e laudo priorizados.
O Instituto Haver, agora ex-gestor do hospital, apresentou na última semana um balanço com saldo considerado positivo da gestão. Conforme estimado pela OS, enquanto esteve à frente do hospital, o Hugo atingiu marca de 16.406 cirurgias realizadas. A OS informou também, no balanço, que os dados coletados diariamente pela equipe responsável apontam que 70% dos usuários saíram satisfeitos com o atendimento.
A OS também assegura que gerou economia aos cofres públicos. Segundo ela, o custo operacional do hospital foi reduzido em 20%, o que poupou o valor estimado de R$ 24 milhões ao Estado.
Entretanto, é forte o clima de insegurança entre os funcionários nos corredores do Hospital de Urgências de Goiânia. Do outro “lado do espelho”, os profissionais da unidade que trabalham para proporcionar o atendimento que fez com que Daniele e Irineia até se esquecessem que estavam em um hospital estão temerosos. O motivo: as iminentes alterações com a mudança de gestão. Conforme confirmado pela assessoria do hospital e também pelo Instituto Haver, 1.095 profissionais que trabalham em regime de CLT serão desligados.
Isso ocorrerá em decorrência da decisão do INTS de não seguir o regime de sucessão. Tal estratégia foi usada pelo Instituto Haver que, ao tomar posse da gestão do hospital, em relação aos celetistas, manteve os profissionais alterando apenas o CNPJ em suas carteiras.
Já o INTS pretende trilhar outro caminho. Os mais de mil celetistas que atuam no Hugo, dos mais variados setores, serão desligados e a OS escolherá, destes, quais serão chamados de volta para integrar o quadro de funcionários do hospital na nova gestão.
Quanto aos concursados, 593 ao todo, 273 já foram remanejados para outras unidades hospitalares do Estado por um decisão de comum acordo entre o INTS e a Secretaria de Estado da Saúde de Goiás (SES-GO). Entre os transferidos estão médicos, dentistas, enfermeiros, técnicos de enfermagem e assistentes administrativos.
O hospital também conta, hoje, com a atuação de 602 funcionários terceirizados. Ainda não há informação referente à decisão do INTS de manter as empresas contratadas ou substituí-las. Um médico ortopedista ouvido pelo Jornal Opção revelou que o ânimo no hospital não é dos melhores. “É triste. O clima está tenso. Estão alegando corte de gastos para fazer isso [alterações no quadro de funcionários]”.

Um protesto organizado pelo Sindicato dos Médicos no Estado de Goiás (Simego) e o Sindicato dos Trabalhadores (as) do Sistema Único de Saúde no Estado de Goiás (Sindsaúde/GO) chegou a acontecer na quinta-feira, 28, em frente ao Hugo. O objetivo do ato, conforme o Simego, foi “chamar a atenção para medidas adotadas pela gestão da Secretaria Estadual de Saúde, que remove 276 servidores efetivos concursados do Hugo – dos quais 32 médicos”.
SES e INTS esclarecem mudanças e transição
Diante do furor de informações e boatos que rondam as mudanças e a nova gestão do Hugo, tanto a Secretaria de Saúde quanto a nova OS à frente do hospital, o INTS, se manifestaram para trazer esclarecimentos aos receosos.
Em resposta à queixa de “falta de transparência” na transição de OSs por parte de entidades sindicais, a SES informou que todas as etapas do Chamamento Público que definiu o INTS como OS vencedora estão públicas no site institucional da secretaria. Segundo a pasta, “é natural que durante um período de transição existam ruídos, entretanto, a SES-GO trabalha, diuturnamente, para que em nenhum momento, durante a fase de saída do Instituto Haver e a chegada do INTS, a população atendida no Hugo fique sem assistência”. Ainda conforme a Secretaria, a nova OS chega ao hospital com cerca de 1.700 profissionais, ou seja, 70% do total de profissionais que atualmente trabalham na unidade.
Um dos pontos da mudança que estavam no centro das discussões e insatisfação dos servidores concursados do Hugo, a transferência de servidores, entre eles 32 médicos, também foi abordado pela SES. Segundo ela, alguns serão remanejados para exercerem suas funções em outras unidades para suprir, “de acordo com a necessidade, o déficit de pessoal”. A secretaria pontua que a medida visa atender o interesse público e a necessária reorganização administrativa da pasta.
O governo reforça a economia que será obtida com a troca das OSs. Conforme a gestão estadual, o valor mensal do novo contrato de gestão celebrado para gerenciamento do Hugo para custeio da unidade, incluindo os serviços de residência médica e multiprofissional, é de R$ 15.036.374,80, o que vai gerar uma economia de cerca de R$ 5,7 milhões de reais por mês ao tesouro estadual, em relação ao valor inicial, que era de R$ 20.729.213,16.
No balanço da gestão, o Instituto Haver, que deixa o comando do Hugo, informou que o valor de R$ 20 milhões, referente a repasses de outubro e novembro deste ano, ainda deveriam ser feitos pelo Estado de Goiás. A SES respondeu que os valores que estiverem em aberto com Instituto Haver serão pagos e explicou também que “realiza um encontro de contas para que, se por ventura, exista algum descumprimento de metas de produção e desempenho, seja realizada a efetuação do desconto financeiro conforme previsão contratual”.
Já o INTS, corroborando as informações prestadas pela SES, declarou que “não ocorrerão alterações administrativas no hospital, apenas de pessoal e do corpo diretivo”. Em relação aos desligamentos, a OS informou que “não há qualquer mudança no funcionamento normal e na rotina da unidade que implique necessidade de reposição em virtude de demissões”.
Em resposta à informação de que a recontratação de celetistas desligados seria feita com revisão de jornada de trabalho e redução salarial, o INTS esclareceu que a alteração da jornada estará restrita apenas aos enfermeiros, que passarão a trabalhar em escala de 12×36, e não mais de 12×60. Quanto à possibilidade de redução de salário em decorrência da mudança da jornada de trabalho, a OS adiantou que a questão ainda não está definida.
O Instituto Nacional de Tecnologia arremata dizendo que tem como metas, entre outras, “implantar um serviço de excelência para a população de Goiânia e Goiás, usuárias do Hugo, como aumento do número de cirurgias eletivas e atendimentos para a sociedade”.
A SES afirmou que respeita a livre manifestação e opinião do SindSaúde, Simego e dos trabalhadores do HUGO, mas informa que “todas as medidas administrativas estão sendo tomadas para que não ocorra nenhuma descontinuidade dos serviços prestados na unidade e que os direitos trabalhistas sejam respeitados”.