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Número de mortes de zero a 11 anos já é relativamente alto no Brasil e a nova variante aumentou ainda mais a preocupação, porque a faixa etária está sem vacina

Criança usando proteção contra a Covid-19 | Foto:  Singkham/Getty Images

 A variante ômicron aumentou a preocupação com o risco que a Covid-19 pode causar à saúde das crianças. Desde o começo da pandemia, o Brasil testou muito pouco sua população, dando prioridade a idosos e adultos. Isso gerou uma subnotificação de casos em relação a faixa etária de zero a 11 anos. O reflexo disso está nos número de crianças mortas pelo vírus, relativamente alto.

Segundo dados do Sistema de Informação de Vigilância da Gripe (Sivep-Gripe), em 2020, 10.356 crianças entre zero e 11 anos foram notificadas com Covid-19 no Brasil, das quais 722 evoluíram para óbito. Em 2021, o total de notificações subiu ainda mais e atingiu 12.921 ocorrências da síndrome respiratória na mesma faixa etária, com 727 mortes. No total, são 23.277 casos de Síndrome Respiratória Aguda Grave (SRAG) por Covid-19 e 1.449 mortes desde o início da epidemia até dezembro de 2021.

O número pode parecer pequeno, em relação aos dados dos adultos, mas em comparação a outras doenças, como problemas circulatórios, paralisia cerebral e câncer no cérebro, a Covid está entre as principais doenças que mais matam crianças no Brasil, ficando atrás apenas de acidentes de trânsito e deixando o país em 2º lugar no ranking mundial.

Em Goiás, entre as crianças que testaram positivo para o vírus, 41 vieram a óbito desde o início da pandemia, sendo 9 casos em 2020, 30 em 2021 e 2 casos em 2022, até a última verificação.

Os casos de crianças mortas por Covid têm ganhado mais espaço na mídia com a liberação da vacinação. Na terça-feira, 25, um menino de 2 anos e 8 meses – fora da faixa vacinal – , chamado José Vitor Xavier Rodrigues e morador da cidade de Morrinhos, no sul de Goiás, veio a óbito por conta da doença. Ele foi diagnosticado tardiamente.

Os dados e estudos a respeito da Covid em crianças só reforçam mais a necessidade de vacinar essa faixa etária. O Instituto da Criança do Hospital das Clínicas de São Paulo verificou que quatro em cada dez crianças apresentaram sequelas por terem tido a doença. Goiânia tem aproximadamente 120 mil crianças, destas, apenas 9.172 haviam sido imunizadas até o último dia 22.

Ômicron é o fim?
Sobre a ômicron em geral, muito se falou sobre ela ser a última variante, mas a Organização Mundial da Saúde (OMS) recentemente declarou que a pandemia está longe de acabar. Existem muitas outras cepas do coronavírus circulando e que ainda não foram identificadas. Então é muito cedo para afirmar isso – e para relaxar a preocupação, especialmente com as crianças neste momento.

De um lado, a ômicron mostrou que o vírus está começando a se adaptar melhor às células humanas, causando menos complicações. Mas por outro lado, é justamente a maior transmissão do vírus que causa sua mutação, podendo fazer surgir novas variantes, mais fracas ou mais fortes.

O infectologista Marcelo Daher acredita que o ideal seria um cenário de controle da pandemia, com maior número de vacinados, testagem ampliada, distanciamento e uso de máscaras e álcool gel, para os casos diminuírem até a Covid-19 se tornar algo raro.

Contudo, sem esse controle, Daher enxerga o cenário de uma endemia e cita a dengue como exemplo. “A dengue é uma endemia, nós temos casos acontecendo a todo momento e a gente acaba relaxando com isso”.

As principais entidades de saúde continuam recomendando o óbvio: máscaras com maior capacidade de proteção, distanciamento social, álcool em gel e lugares mais ventilados. Além disso, para conter a explosão de casos, a Prefeitura começa a implementar novas medidas de restrição, diminuindo a capacidade de lotação de ambientes e cancelando eventos de grande porte.

A pandemia ainda não acabou e para evitar um novo colapso do sistema de saúde, as medidas preventivas e a vacinação devem ser reforçadas.

 Desde o primeiro sequenciamento da variante ômicron, em novembro de 2021 na África do Sul, o cenário pandêmico mundial vem sofrendo alterações. Se no Brasil, a pandemia estava caminhando para o início de um controle, as festas de fim de ano se tornaram um prato cheio para a disseminação da nova variante do coronavírus.

Com 34 mutações na proteína spike, a responsável por permitir a entrada do vírus nas células humanas, a variante ômicron assustou as entidades ao ser descoberta. Em termos de comparação, a variante delta tem apenas 9 mutações, ou seja, a ômicron, em tese, teria quase quadruplicado seu potencial de infectar as pessoas.

Contudo, quando foram analisados os pacientes contaminados com a nova cepa, descobriu-se que o risco de ela infectar os pulmões era dez vezes menor do que a delta. Mas isso não quer dizer que a ômicron seja menos perigosa. Por ser uma variante que, predominantemente, contamina e se multiplica nas células do trato respiratório superior, como nariz, garganta e traqueia, seus sintomas são muito mais semelhantes aos da gripe do que os que haviam sido observados até agora causados pelo coronavírus.

Por estar mais localizada principalmente nas vias áreas, a ômicron é mais transmissível do que a delta. Enquanto que uma pessoa contaminada com a variante delta pode transmitir para até 6 pessoas, a ômicron consegue alcançar até 12. Essa característica fez a ômicron tornar a Covid-19 a doença mais transmissível do mundo, superando o sarampo.

Juntando sua alta transmissibilidade ao fato de as pessoas muitas vezes confundirem os sintomas da nova variante com uma gripe ou alergia, isso fez com que os números das transmissões se multiplicassem rápido demais. Com maior número de infectados, os hospitais voltaram a encher, mesmo que o número de óbitos não seja tão alto quanto nas ondas anteriores, antes da vacinação. Dessa forma, a sobrecarga do sistema de saúde voltou a ameaçar com o caos os hospitais e a sociedade como um todo.

No começo de janeiro, globalmente, foram registrados 3,2 milhões casos de Covid-19 causados pela variante ômicron. Esse foi o maior número, desde o início da pandemia, em março de 2020. Em Goiás, as perspectivas, segundo a Secretaria Estadual de Saúde (SES-GO), são de que até meados de fevereiro cerca de 50% da população goiana tenha sido infectada pela variante ômicron.

Dados apontam que no Estado, entre os dias 1º e 20 de janeiro, foram notificadas cerca de 35 mil pessoas com a Covid-19 em Goiás. Entre os dias 3 e 6 de janeiro, o Estado realizou sequenciamento genômico (genotipagem) em 15 amostras coletadas em diferentes regiões do território goiano. Os resultados das análises indicaram que 100% dos casos eram da variante ômicron. Ou seja, a maior parte dos casos de Covid-19 em Goiás são da nova variante, colocando o Estado em 4º lugar no ranking nacional de transmissibilidade da nova cepa. Foi durante a primeira semana de janeiro que o Brasil registrou seu primeiro óbito pela ômicron. O caso ocorreu em Goiás, em Aparecida de Goiânia. A vítima foi um idoso de 68 anos, portador de doença pulmonar obstrutiva crônica e hipertensão arterial.

Coleta no esgoto mostra alcance da pandemia

Recentemente, pesquisadores da Universidade Federal de Goiás (UFG), responsáveis pelo monitoramento do vírus SARS-CoV-2 no esgoto da cidade de Goiânia desde maio do ano passado, emitiram um alerta, ao constatar que a concentração do vírus encontrada no esgoto coletado na segunda semana do mês de janeiro deste ano é a maior desde agosto de 2021. Mais: a tendência é de aumento da carga viral. “Identificamos um aumento significativo na semana do Natal.  E a primeira semana de janeiro já apontou a tendência de aumento, apesar de não ter atingido alta concentração do vírus. Isso muito provavelmente devido às chuvas intensas do período que diluíram o material de análise. Com a estiagem, a carga viral da segunda semana de janeiro já atingiu níveis elevados”, explicou a professora da UFG e coordenadora do projeto, Gabriela Duarte, ao Jornal UFG.

O projeto, que conta com a parceria dos pesquisadores da Saneago, foi desenvolvido pelo Instituto de Química (IQ) da UFG, e é composto pelas professoras Gabriela Duarte, Andréa Fernandes Arruda e Núbia Natália de Brito e pelos pesquisadores e alunos de pós-graduação Paulo Felipe Neves Estrela e Geovana de Melo Mendes.

O infectologista Marcelo Daher explica que a ômicron “é uma variante com menor poder de lesão pulmonar e maior comprometimento de vias áreas superiores. Então, ela leva a pessoa a desenvolver um quadro mais leve de gripe resfriado e na maioria das vezes com menor gravidade. Isso se deve a característica da variante ômicron somado a um cenário de imunidade causado pela vacinação e por já ter um número alto de pessoas que se contaminaram com a Covid-19”.

Um dos efeitos da vacinação é a mudança dos sintomas. Antes, a perda de olfato e falta de ar eram ligados à Covid, mas, com a imunização e com a nova variante, esses sintomas mudaram. Hoje, os sintomas mais relatados por quem está infectado com a ômicron são dor de garganta leve, fadiga, dor de cabeça, coriza e tosse.

O tempo para o surgimento desses sintomas também diminuiu: com a delta, o mínimo eram cinco dias para o desenvolvimento dos sintomas. Mas com a ômicron, esse número passou para três dias.

Por ser mais transmissível e conseguir entrar nas células humanas com mais facilidade, o risco de uma pessoa ser reinfectada pela ômicron é maior. Nesse cenário, a terceira dose se torna primordial, pois, após os cinco meses, os anticorpos produzidos pela segunda dose começam a cair, tornando essencial o reforço causado pela dose extra da vacina contra a Covid-19. Em Goiás, 65% da população está com o esquema vacinal completo. O número ideal seria 70%.