Nexus, uma obra de parar o trânsito. Literalmente
25 março 2016 às 18h26
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Projeto avançado para a cidade, o complexo a ser erguido na Praça do Ratinho seria um orgulho para Goiânia. Mas antes a cidade precisaria alcançá-lo
Elder Dias
Não tem como ser diferente do que diz o título. E não é à toa que tem sido chamado de “Godzilla”. O empreendimento Nexus Business & Shopping, é portentoso e digno de qualquer grande metrópole. A ação conjunta entre dois empreendedores reconhecidamente de ponta não apenas em âmbito estadual — Ilézio Inácio Ferreira, dono da Consciente Construtora, e Júnior Friboi, da FJG Incorporações — trouxe para o meio imobiliário e comercial uma novidade quase que paradisíaca, ainda mais em meio ao cenário de crise instalada no País.
Não é para menos. Basta olhar o sumário do que é o Nexus: três torres, com salas comerciais, lajes corporativas, hotel executivo do mais alto padrão, um centro de convenções modulável e multiuso para eventos sociais ou corporativos, um shopping center de grande porte.
Detalhando os números, tudo fica mais impressionante: 27 pavimentos de lajes corporativas, 392 salas comerciais, hotel com 192 unidades, centro de convenções para 1,1 mil pessoas, estacionamento para 1,7 mil vagas e shopping com quase 10 mil metros quadrados de área bruta locável para, pelo menos, 140 lojas. A previsão é de que 4,5 mil pessoas trabalhem no local e que 9 mil pessoas circulem por lá todo dia, quando tudo estiver concluído, em 2020.
O problema é só um. E apenas este. Essa portentosidade do complexo abrangido pelo Nexus não combina com a “caixa de mobilidade” em que ele está inserido, no encontro de duas vias de muito fluxo: a Avenida D, que recebe o trânsito da região compreendida pelo Jardim América, pelo Setor Bueno e por Campinas; e a Avenida 85, uma das principais artérias do trânsito da capital, e que recebe, além do fluxo dos bairros da região sul, também os carros que trafegam rumo a Aparecida de Goiânia.
A 85, especialmente é uma avenida bastante complicada. Para tentar minimizar a situação caótica que envolve a via, várias medidas já vêm sendo tomadas, há décadas. Na terceira administração do prefeito Nion Albernaz (1997-2000), um caminho paralelo foi executado para dar fluidez ao trânsito da região: era a Avenida Cora Coralina, projetada para receber os carros que faziam o trajeto no sentido sul-norte a partir da Praça do Ratinho. O novo caminho não “pegou” e serviu para muito pouco para além de descaracterizar o já combalido projeto urbanístico do Setor Sul.
Novas intervenções na Avenida 85 vieram durante a gestão do prefeito Iris Rezende (PMDB), entre 2005 e 2010. Foi nesse período que foram construídos dois monumentos que se tornaram marcas de Goiânia — a trincheira da Praça do Ratinho (cujo nome oficial é Latif Sebba) e o viaduto da Praça do Chafariz (oficialmente Simão Carneiro).
Apesar do mau acabamento das obras — as placas se soltavam com facilidade já logo depois da inauguração —, os locais se tornaram cartões postais da cidade, inclusive se tornado o principal cenário para cliques e selfies durante as manifestações contra o governo que ocorrem desde 2013. Além de, obviamente, acabarem com as praças, serviram mais para espetáculo do que para resolver de fato o problema do trânsito na avenida. Como reza um ditado bem popular entre os urbanistas, um viaduto acaba por ser apenas a forma mais rápida de se chegar ao próximo congestionamento.
Ao longo da administração de Paulo Garcia (2010-2015) também foram implantadas mudanças no trânsito. Houve o alargamento da via, com a retirada das palmeiras imperiais, em parte da avenida, para aumentar as pistas para os veículos. Em um trecho, a ilha deixou de existir para conseguir abarcar o fluxo. Mesmo assim, as soluções soam e saem paliativas, independentemente do gestor, porque o desafio posto é outro: a) implementar uma rede de transporte público digna e eficiente; e b) convencer a população a deixar o seu veículo particular para passar a usar o transporte coletivo.
É nesse contexto que se quer erguer o Nexus Business & Shopping: como um oásis de modernidade do capitalismo mais bem-sucedido em meio a uma estrutura urbana totalmente deficitária. Não foi à toa que Ilézio Inácio Ferreira, ao falar aos jornalistas presentes ao lançamento de seu empreendimento — a imprensa local recebeu tudo em primeira mão, antes mesmo dos corretores — ressaltou mais de uma vez: o ponto em que será construído o complexo é um dos eixos de adensamento da cidade, por onde passará o metrô.
Em verdade, não há previsão de construção de metrô em Goiânia, onde obras de muito menor porte sofrem para saírem do papel e serem concluídas. Mas, de fato, o empresário estava certo ao discursar falando de que está, sim, implementando um projeto em um dos grandes eixos de adensamento da capital — o que está previsto de forma clara no Plano Diretor da cidade, como uma das formas de desenvolver seu planejamento urbano.
O que as diretrizes do plano preveem, no entanto, é que exista uma infraestrutura adequada aos empreendimentos que essas áreas receberão. Não é o que se vê. Dentro do horário comercial, qualquer um que tente passar pela região vizinha ao futuro Nexus vai encontrar dificuldade. Às vezes, especialmente no começo da manhã e no fim da tarde, o congestionamento se estende pela Avenida D até além do cruzamento com a Rua 9, centenas de metros abaixo. As vias adjacentes também enfrentam as consequências.
Portanto, para que o Nexus seja repensado — inclusive em termos de localização — não é preciso entrar nem nos argumentos ético-técnicos, como o da altíssima suspeição em torno do estudo de impacto de vizinhança (EIV), o qual, conforme já está evidenciado, foi feito com um relatório de assinaturas forjadas. Basta observar que será uma obra de parar o trânsito, de um local já congestionado.
Projeto avançado para a cidade, o Nexus seria um orgulho para Goiânia. Mas antes a cidade precisa alcançá-lo. Uma parceira de infraestrutura entre a empresa e o governo municipal para a região — o coração da área nobre da parte central da capital, entre os setores Marista, Oeste e Sul — talvez resolvesse. É o que a sociedade goianiense espera para que, a partir da finalização dessa tarefa, se dê início às obras. O contrário disso é o caos.