A Região da Rua 44 encontra-se em frente à rodoviária de Goiânia, no setor Norte Ferroviário. No entanto, o polo atacadista que se formou ao lado da maior feira a céu aberto do mundo, a tradicional Feira Hippie, atualmente vai além da Rua 44, estendendo-se também pela Avenida Contorno e todas as ruas laterais. Não é por acaso que a região da 44 se tornou rapidamente o segundo maior polo de moda do Brasil, surpreendendo até mesmo os primeiros lojistas.

A renomada moda goiana tem conquistado cada vez mais a atenção de lojistas não só de todo o território nacional, mas também do mundo. Compradores vêm de países da América Latina, como Paraguai, Colômbia, de países da África, como Guiné Bissau, São Tomé Príncipe e Angola, e as exportações vão para nações europeias e os Estados Unidos. “Podemos dizer que o mundo adota a nossa moda”, afirma o presidente da Associação Empresarial da Região da 44 (AER44), Lauro Naves.

Atualmente, o polo conta com cerca de 16 mil lojas, proporcionando oportunidades de trabalho para milhares de pessoas, aproximadamente 50 mil empregos diretos e mais 160 mil indiretos. Além disso, o número de consumidores ou sacoleiros, aqueles que compram para revender, que passam pelo local semanalmente ultrapassa a marca dos 260 mil. O faturamento anual da região da 44 alcança a surpreendente marca de R$ 15 bilhões. Esses dados são fornecidos pela Associação.

Daniel de Melo Silva, de 37 anos, morador de Goiânia, é responsável pela gestão de uma das três lojas localizadas na região da 44 especializadas em vestuário na área da saúde. Ele conta que tudo começou durante a pandemia da covid-19, quando o que parecia ser uma crise se transformou em uma oportunidade.

Daniel de Melo Silva diz que a crise da pandemia lhe abriu portas | Foto: Cilas Gontijo / Jornal Opção

“Na área em que eu trabalhava, que era a construção civil, as atividades não pararam durante a pandemia, mas a área da minha esposa sim. Como precisávamos complementar a renda, surgiu a ideia de entrarmos nesse ramo e segmento específico. Vimos uma grande oportunidade para iniciar um grande negócio. Graças a Deus, deu muito certo e está indo muito bem”, disse Daniel.

Ele relembra que quando abriram a primeira loja no shopping 18, localizado na rua 44, não imaginavam que em apenas cerca de três anos teriam outras filiais. Atualmente, o negócio emprega sete funcionários e tem as regiões norte e nordeste como principais consumidores. Daniel destaca o aumento das vendas online, que têm superado as vendas presenciais. “Confesso que a pandemia trouxe uma tendência que veio para ficar, as vendas pela internet. Hoje, nosso maior faturamento é, sem dúvida, proveniente desses clientes”, admite.

Lauro Naves explica como a 44 abastece o mundo da moda | Foto: Reprodução

Lauro Naves, por sua vez, garante que já em 2021, quando a pandemia estava controlada devido ao amplo trabalho de vacinação, a região da 44 registrou um forte crescimento. Ele reconhece que houve um aumento considerável nas vendas online durante e após a pandemia, e que essa tendência realmente veio para ficar. No entanto, em 2023, é possível notar a retomada dos números de clientes presenciais pré-pandemia, com uma média de 250 a 260 mil clientes por semana.

Reginaldo Cirilo Gomes, de 49 anos, viaja regularmente da cidade de Monte Alegre, Minas Gerais, para comprar na região da 44. Reginaldo não possui uma loja física em sua cidade; ele realiza suas vendas de casa em casa, atuando como mascate ou mercador ambulante.

O comerciante, Reginaldo, afirma que a região da 44 é o melhor lugar para quem compra confecções para revender. “Aqui é muito melhor do que São Paulo, com muitas variedades e qualidade imbatível, além dos preços atrativos”, conta, satisfeito. Ele atesta que comprar na região significa garantir lucro.

Para o presidente da AER44, Lauro Naves, os efeitos negativos causados pela pandemia já foram superados. “Na nossa avaliação, sim. O que temos hoje é uma nova adaptação natural a uma nova dinâmica de consumo com as vendas online convivendo junto com as vendas presenciais”, informa.

A lojista Maria de Fátima, de 49 anos, possui uma loja chamada “Menina de Luxo” há 15 anos no shopping Stillo. Ela vende para diversos estados brasileiros. Maria de Fátima relata que antes trabalhava no mesmo ramo, mas não tinha um espaço físico. “Eu viajava para entregar as mercadorias nas cidades. Eu comprava aqui e ia entregar aos meus clientes. Tenho muita experiência com vendas de confecções”, pontua.

Na verdade, o que a lojista fazia na época é exatamente o que seus clientes fazem agora: compram dela para revender. Ela menciona que realiza muitas vendas pela internet e destaca o sucesso do atacado. “Lojistas que compravam de mim na época em que eu ia até eles, hoje vêm até mim (risos). Não tenho do que reclamar, especialmente agora que as vendas melhoraram muito”, diz agradecida.

A empresária Claudete Elaine, de 47 anos, é uma das sacoleiras que viaja de fora pelo menos uma vez por mês para comprar na região da 44. Claudete possui uma loja na cidade de Pirangi, São Paulo, e destaca que nenhum outro lugar consegue superar a região da 44 em qualquer aspecto. “Aqui tem mais opções do que em São Paulo; por exemplo, o jeans daqui é o melhor, aliás, foi isso que me atraiu para cá. A qualidade dos jeans da 44 é a melhor”, fala entusiasmada. Claudete vende para ambos os sexos e gera empregos. Outro fator que faz grande diferença, segundo ela, é o atendimento dos goianos. “Eles são os melhores, sabem lidar com os compradores de uma forma única”, parabeniza.

Claudete Elaine vem de Pirangi, São Paulo, fazer compras na 44 | Foto: Cilas Gontijo / Reprodução

Lauro explica que Goiás possui a melhor moda do Brasil. “Quem diz isso não somos apenas nós, mas também designers de moda e influenciadores desse segmento, além dos lojistas que vêm aqui comprar. Todos são unânimes em afirmar que nossa moda é a que melhor modela o corpo, especialmente o jeans. Hoje, nosso jeans é o mais requisitado em todo o Brasil”, enfatiza.

Lauro Naves destaca que os chamados sacoleiros, que vêm de outros estados brasileiros, permanecem em Goiânia por no mínimo dois a três dias, o que movimenta diversas economias, não se limitando apenas ao setor de confecções. “Essas pessoas se hospedam em hotéis, consomem em lanchonetes, restaurantes, compram água, produtos em farmácias, etc. Somente na região da 44 existem cerca de 5 mil leitos em hotéis, muitas vezes localizados nos próprios shoppings”, informa.

Edna Vieira dos Santos, natural de Olhos D’Água, MG, revela que antes de trabalhar exclusivamente com vendas de roupas, já foi babá e não recusava trabalho. Hoje, ela é dona de uma loja e uma lanchonete que funcionam no mesmo espaço, proporcionando emprego para todos os membros de sua família. “Venho sempre aqui na região da 44. O atendimento aqui é excepcional, sem contar a qualidade das roupas. Há cinco anos que compro aqui e ninguém nunca reclamou, pelo contrário, elogiam, tanto que sempre querem mais”, aplaude.

O presidente da AER enfatiza que as mercadorias comercializadas na região da 44 não perdem em qualidade para as dos grandes shoppings da cidade. “Pelo contrário, muitas marcas goianas e nacionais são produzidas aqui e estão presentes nas prateleiras das lojas de grifes em todo o Brasil”, diz empolgado. Para ele, Goiás tem se consolidado como o segundo maior polo de confecção do país.

Eugênia Sobreira, de 42 anos, é paraibana, mas mora em Goiânia há 20 anos. Ela possui uma loja no shopping Pátio 44 há 17 anos. “Sigo as tendências da moda do momento, e meus clientes vêm de todas as partes do Brasil. Hoje, vendo mais no formato presencial”, alega. Em frente à loja de Eugênia, há diversos ambulantes na calçada. Questionada se eles a atrapalham, ela responde que não. “Somos de segmentos diferentes e todos precisam trabalhar. Sei que muitos colegas não gostam da presença deles aqui, mas para mim está tudo bem”, afirma.

A sacoleira Jeane Rodrigues, de 48 anos, reside em Joselândia, no estado do Maranhão. Jeane possui um ponto comercial em sua cidade, abastecido pelas confecções adquiridas na região da 44. “Minhas compras são variadas. Já fui a outros lugares, mas nenhum se compara à 44. Hoje, não perco tempo indo a outras cidades, aqui é o primeiro lugar para mim. Minha margem de lucro é excelente”, conclui.

Vale destacar o grande número de ambulantes, vendedores que não possuem um espaço físico, mas ficam nas calçadas e à beira das ruas e avenidas. São centenas deles, espalhados por toda parte, em frente às lojas e galerias. Os ambulantes vendem de tudo, desde roupas até alimentos, e a disputa por clientes é intensa entre eles. No entanto, esses comerciantes vivem constantemente com medo de perder suas mercadorias para a fiscalização municipal, o conhecido “rapa”.

Dentre esses camelôs, há muitos africanos, principalmente senegaleses e haitianos. Jean Edwich, de 49 anos, é haitiano e mora em Goiânia há cinco anos. Jean é um desses vendedores que atua na informalidade. Ele conta que foi obrigado a deixar seu país devido à falta de oportunidades de trabalho lá, e seu objetivo agora é trazer toda sua família. “Tenho trabalhado aqui há dois meses. Já tive emprego formal, mas aqui é melhor porque ganho mais dinheiro. A única preocupação é com a fiscalização, que pode levar minhas coisas a qualquer momento”, confessa.

Helena dos Santos Nunes, de 60 anos, vende meias e sacolão na calçada. Natural do estado do Maranhão, ela diz que não planeja abandonar as vendas, mesmo diante do risco de perder tudo. “Há cinco anos que vendo aqui e, graças a Deus, tem valido a pena. É daqui que tiro o sustento diário, não está nos meus planos abandonar meu ponto de venda”, conta.

Wesley Oliveira é gerente de uma loja do segmento de jeans há três anos. Ele destaca que uma das grandes melhorias que aconteceram recentemente na região foi em relação ao trânsito. “As intervenções feitas pela prefeitura foram muito acertadas. Até os motoristas de Uber estão vindo aqui. Antes, era muito difícil um motorista aceitar uma viagem porque era um verdadeiro caos”, revela.

O gerente também destaca a questão da segurança. “Sempre temos viaturas patrulhando as ruas, o que é bom porque inibe os criminosos”, defende. Wesley, assim como outros lojistas, reconhece que após a pandemia, as vendas pela internet se tornaram uma realidade. “Atualmente, a maior parte de nossas receitas vem dessas vendas. Os clientes descobriram que podem desfrutar dessa comodidade e também economizar em viagens e hospedagem”, explica. Wesley também menciona que a marca possui duas lojas, ambas na região da 44, e ainda possui fabricação própria, empregando cerca de 80 funcionários no total.

Região da Rua 44 | Foto: Cilas Gontijo / Jornal Opção

De acordo com o 1º Tenente Kleber Martins Ferreira, comandante do policiamento responsável pela região da 44, assumir essa responsabilidade foi um grande desafio, pois a região enfrentava a atuação de alguns criminosos, inclusive a chamada “turma da lasinha”, que aterrorizava os comerciantes. Contudo, esses criminosos agora estão fora de circulação, graças à atuação severa das forças de segurança pública na região.

“Estabelecemos grupos de WhatsApp entre os lojistas para que eles possam relatar qualquer situação em tempo real em que necessitem da segurança pública. Essa interação tem gerado resultados positivos e já temos 28 grupos ativos. Além disso, intensificamos o policiamento, tanto para demonstrar a presença policial nas ruas quanto para realizar abordagens a suspeitos, evitando roubos e furtos. Vale ressaltar também a utilização das câmeras de segurança, que têm nos auxiliado nesse trabalho”, destaca o Tenente.

Na quarta-feira, 19, foi lançada pela AER44 a campanha “A Região da 44 é MIL”, que será realizada entre 10 de agosto e 29 de dezembro de 2023. O presidente Lauro Naves explica que essa será uma campanha muito importante para lojistas e sacoleiros. “É a primeira grande campanha realizada pela 44. Preparamos um investimento de mais de R$1 milhão para divulgar ainda mais a região em todo o Brasil e mostrar aos brasileiros que a nossa região possui a melhor moda.”

Lauro reitera que, como a associação representa os empreendimentos da região da 44, somente os lojistas de shoppings e galerias associados poderão participar da campanha. Os cadastros começarão a ser feitos a partir de quinta-feira, 20, e irão até o dia 09/08. Para concorrer aos prêmios, os sacoleiros precisam gastar no mínimo R$500 em suas compras, o que lhes dará direito a um cupom. “Os sorteios ocorrerão uma vez por semana, com cinco prêmios no valor de mil reais em compras, de terça a sábado”, revela.