Marconi usa o crédito que tem para tentar driblar a crise
01 maio 2015 às 12h56
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É provável que nenhum governante brasileiro tenha acumulado tanto crédito junto aos servidores públicos como o governador Marconi Perillo. Agora, será o momento de usá-lo
Afonso Lopes
A notícia, na quarta-feira, 29, caiu como uma verdadeira bomba entre os servidores públicos estaduais. A partir deste mês e durante todo o ano de 2015, o Estado terá que pagar os salários em duas parcelas, com intervalo de cinco dias. Metade será pago dentro do mês trabalhado, e o restante em até cinco dias úteis. É óbvio que a quebra da rotina no contracheque é um baque que exige reengenharia econômico-financeira doméstica. Ao longo dos últimos três mandatos de Marconi, os salários sempre foram quitados integralmente até o último dia do mês. Uma mudança brusca, mesmo sendo um prazo extremamente curto, causa certo desconforto.
Os opositores aproveitaram bem o momento para acusar o governo de esconder a difícil realidade financeira do Estado no ano passado. Em parte, eles têm razão. Em campanhas eleitorais, em todas elas e sem qualquer exceção, ninguém exalta as dificuldades. Nem mesmo a oposição faz isso. É óbvio que se apresenta um quadro negativo do governo, mas sempre se tem uma solução. Já as campanhas do governo focam nas conquistas que conseguiu e nas próximas que pretende conseguir.
Por outro lado, e convenientemente, a oposição em Goiás fala sobre os problemas de caixa aqui, mas ignoram solenemente a origem, que é o ajuste fiscal baixado pelo governo federal e que já causa danosos efeitos para a economia do país como um todo. Goiás não é exceção. O silêncio da oposição sobre a situação em cima é porque os dois principais partidos contrários ao governo local são os grandes parceiros nacionalmente.
Por quê?
De qualquer forma, e independentemente da posição política dos opositores, absolutamente natural e inclusive salutar para a democracia, as autoridades da Fazenda precisam esclarecer o tamanho da encrenca e quais são as perspectivas de agora pra frente. Sem discutir abertamente sobre os problemas, é certo que o governo vai correr o sério risco de se ver vítima de ondas de boatos a cada mês, o que pode favorecer para o surgimento de um clima geral de insegurança e até, em caso extremo, instabilidade. A medida, a divisão dos salários em dois pagamentos, foi inédita, e só isso já revela que há, sim, motivos de preocupação.
Mas de onde se pode tirar essa ideia de que Marconi Perillo possui crédito junto aos servidores públicos estaduais? Da história recente. Até 1988, os servidores jamais tiveram uma data certa para receber. Em alguns períodos, os atrasos chegaram a acumular seis meses. Em 1999, além de colocar a conta salário em dia, Marconi estabeleceu o pagamento dentro do mês trabalho. Hoje, tantos anos depois, isso parece a coisa mais natural do mundo, mas não era. Não apenas os salários não eram quitados em dia certo, como o 13º e os abonos de férias também passavam dias, semanas e às vezes até meses sem ser liberados.
Além disso, os servidores públicos jamais sonhavam com planos de carreira e vencimentos. Isso só entrou na pauta de reivindicações nos governos de Marconi. Essa conduta, inclusive, acabou com uma prática antiga, que era o pagamento de um complemento extra porque inúmeros servidores ganhavam menos que o salário-mínimo.
É por isso que, embora assustados com a novidade, a esmagadora maioria dos servidores estaduais recebeu a notícia do parcelamento com apreensão, mas de maneira compreensiva. Barulho mesmo só quem promete fazer são os sindicatos, muitos dos quais ligados a partidos oposicionistas. Faz parte do jogo. Até pela representatividade que essas entidades possuem diante de seus representados.
A população também percebe o tamanho da crise. Afinal, ela está sendo sentida na conta de luz, no aumento das taxas de juros, no crédito cada vez mais apertado, nos postos de combustíveis e no aumento dos impostos, com reflexos imediatos nos preços de quase todos os produtos nos supermercados. Assim, a notícia de que os salários dos servidores vão ser pagos em duas parcelas, com intervalo de cinco dias, não é tão assustadora quanto o conjunto que se tem diariamente.
Mais ainda porque, ao contrário da atitude tomada em Brasília, o quarto mandato de Marconi Perillo começou com uma brutal redução da máquina administrativa, com a redução global para apenas dez secretarias de Estado. O governo federal, ao contrário, não mexeu na superestrutura composta por inacreditáveis 39 ministérios. Apesar da crise. É também por essa razão que pesquisas para consumo interno do governo vêm indicando que a população de Goiás mantém o governador com boa aceitação. Antes de pedir sacrifícios para os servidores e população, o governo se sacrificou com o corte de milhares de postos políticos. Numa hora dessas, isso conta.