Empório das Águas Quentes atrai público interessado em turismo, gastronomia e artesanato. Ator Marcos Palmeira conta os benefícios de produzir alimentos orgânicos

Thiago Araújo

A produtora rural Eleuza Alves Fernandes, da cidade turística de Caldas Novas, no sul de Goiás, veio de uma família de produtores rurais e, há seis anos, optou por cultivar hortaliças sob manejo orgânico. Segundo ela, essencialmente porque nos dias atuais as pessoas priorizam a qualidade de vida e a saúde “propiciada por alimentos que utilizam, em todos seus processos de produção, técnicas que respeitam o meio ambiente”.

Em 2010, Eleuza procurou o Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Se­brae-GO), onde realizou cursos de empreendedorismo, e contou com acompanhamento técnico pa­ra o fortalecimento da Associação dos Produtores Rurais de Caldas Novas (Aprocan).

Há dois anos, ao lado do Se­brae Goiás, a produtora rural lutou pela cer­tificação — procedimento pelo qual uma certificadora, devi­da­mente credenciada pelo Minis­tério da Agricultura, Pecuária e Abaste­ci­mento (Mapa) e habilitada pelo Instituto Nacional de Me­tro­logia, Normalização e Qualidade Indus­trial (Inmetro), assegura por escrito que determinado produto, processo ou serviço obedece às normas e práticas da produção orgânica.

Dona Eleuza está no segundo ano de certificação e conta que este detalhe foi decisivo para o diferencial no mercado: “O selo orgânico ajudou na divulgação de nossos produtos e chama a atenção dos turistas que vêm à cidade. Por enquanto, abastecemos apenas hotéis, feiras e supermercados. Quando entramos no mercado, preferimos não disputar pelo preço, e sim pela qualidade. As pessoas tem o hábito de dizer que o orgânico é caro para produzir e isso é mito. Claro que demanda um pouco mais de trabalho, entretanto é até mais barato fazer o adubo orgânico do que comprar o convencional.”

Na semana passada, a produtora rural caldense, dezenas de empreendedores do Estado, estudantes e moradores de Caldas Novas participaram da quarta edição do Empório das Águas Quen­tes – Turismo, Cultura e Meio Am­biente e Festival Gastro­nô­mico, que ocorreu no Centro de Con­venções Di Roma, em Caldas. O evento discutiu ideias lucrativas para a ampliação das possibilidades de inovação para os pequenos negócios do turismo no Estado.

Umas das atrações do encontro foi o ator Marcos Palmeira. O global contou aos participantes que em 1987, depois de juntar todas suas economias, comprou uma fazenda em Teresópolis, na região serrana do Rio de Janeiro, e iniciou a produção de alimentos totalmente nos moldes convencionais.

Depois do período inicial, o ator descobriu que as pessoas que trabalhavam em sua propriedade não comiam o que eles próprios plantavam. “Entendi então que aquilo que colocavam no solo para fortificá-lo, na verdade estava envenenando tanto o solo quanto quem se alimentava dos produtos. A partir daí radicalizei e proibi qualquer tipo de adubo químico, assim como os agrotóxicos”, lembrou.

Logo em seguida, Marcos mu­dou o foco de produção e descobriu que não existiam pragas, mas desequilíbrio. Assim como dona Eleuza, o ator mergulhou e investiu em compostos produzidos dentro da fazenda, bem como as mudas, visando u­ma planta saudável e resistente. “Fi­camos, cada vez mais, independentes de insumos externos, como adubos e pulverizantes químicos. Pas­samos por várias crises, contudo ho­je, tenho uma fazenda onde todos respeitam a natureza, onde os animais vivem livres, com gado leiteiro orgânico, frutas, legumes e verduras produzidos dentro de um sistema integrado e sustentável.”

Os produtos de sua fazenda, Vale das Palmeiras, são encontrados em supermercados e pequenos comércios naturais. Como consultor, o ator presta assistência em diversos projetos de alimentação orgânica pelo Brasil e compartilha suas experiências em encontros.

“Continuo sonhando que a agroecologia se multiplique e que o Brasil se torne o maior celeiro de produtos orgânicos do mundo. O problema da fome é parecido com o do dinheiro. Não falta comida. Ela está é mal distribuída, assim como o dinheiro. Estamos às ordens para dividirmos conhecimento e aprendermos mais com a vida e com as pessoas”, declarou aos participantes.

Troca de experiências

Na quarta-feira, 26, durante a abertura do Empório, Wanderson Portugal, diretor técnico do Sebrae, afirmou que os protagonistas do encontro eram os empresários e os empreendedores, pois a partir deles e de suas vivências era possível captar modelos aplicáveis de crescimento e eficiência mercadológica sustentáveis. “As entidades são coadjuvantes neste processo. O Sebrae não trabalha sozinho, mas através de parcerias que buscam o desenvolvimento de serviços e produtos para o turismo”, disse.

Por sua vez, a deputada federal reeleita Magda Mofatto (PR) esclareceu que o Sebrae sempre deu atenção especial ao turismo ecológico, religioso, histórico, cultural e esotérico no Estado. “É um serviço social, que auxilia constantemente na divulgação e ampliação do setor. Sem o Sebrae, talvez o turismo existisse, mas não em grandiosidade” rematou.

Segundo a gestora do projeto, Andrea Santos Carneiro, o turismo e a gastronomia são elementos que ressaltam a cultura do Estado. “Acreditamos que este encontro criou uma evolução no mercado turístico de Goiás a partir do avanço desse setor.”

De acordo com o diretor-superintendente do Sebrae Goiás, Manoel Xavier Ferreira Filho, os modelos inovadores de desenvolvimento do turismo a partir da criatividade, sustentabilidade e envolvimento social do entorno, vêm comprovando que os investimentos em capital social diminuem outras carências de recursos. “Acelerando assim, a projeção do setor como vetor econômico para as cidades”, pontuou.

Identificação de oportunidades

Entender as oportunidades de negócios e identificá-las são condições para entrada, sobrevivência e permanência no mercado. Há diferenças entre ideia e oportunidade de negócio. Uma ideia, mesmo sendo criativa, nem sempre representa uma oportunidade, por não poder ser realizada ou por não atender a uma necessidade humana. Já a opor­tunidade é caracterizada por um conjunto de eventos, situações ou circunstâncias que permitem a geração de mudanças positivas na empresa, entre os clientes ou até na vida.

De acordo com o Sebrae, para que isso ocorra, é fundamental levantar informações atualizadas e conhecer o mercado, tendências, necessidades e o que realmente faz diferença para o cliente. Assim, o domínio desse conhecimento terá como resposta a aceitação e valorização da nova empresa, de uma atividade, de um produto ou serviço.

O empreendedor Marcus Antô­nio, dono de um restaurante em Trindade que só comercializa comidas típicas do Cerrado, também participou do encontro e disse ao Jornal Opção que eventos como este, que foi realizado pelo governo de Goiás, por meio do Sebrae e da Goiás Turismo, serve, indubitavelmente, para a troca de experiências, novos aprendizados e a identificação dessas oportunidades. “Temos que compreender que o turista vai a Trindade em busca de conforto espiritual. Chegando lá, ele conhece a nossa gastronomia e tem a oportunidade de levar um pouco da nossa cultura para a sua região. Com isso, eles alimentam a alma e o corpo, com a nossa gastronomia local. Os empreendedores devem entender e debater que a cultura gastronômica tem influência em todo o setor turístico.”

Foi pensando no paladar e nas características turísticas, que José Afonso, de 56 anos, também presente no Empório, se matriculou no curso Empretec — que utiliza uma metodologia da Organização das Nações Unidas (ONU) voltada para o desenvolvimento de características de comportamento empreendedor e para a identificação de novas oportunidades de negócios, oferecido exclusivamente no Brasil pelo Sebrae, que já capacitou cerca de 200 mil pessoas, em 8.500 turmas distribuídas por todos os Estados.

Segundo pesquisa do Sebrae, os empreendedores que fazem Empretec registraram um acréscimo de R$ 24,6 mil por mês no faturamento de suas empresas. Mais de 90% dos entrevistados confirmam o aumento dos lucros após a conclusão do seminário e que aplicam imediatamente mudanças em seus produtos e serviços com base nos conhecimentos adquiridos.

O Empretec proporciona aos seus participantes a melhoria no seu desempenho empresarial, maior segurança na tomada de decisões, a ampliação da visão de oportunidades, dentre outros ganhos, aumentando assim as chances de sucesso empresarial.

José Afonso tinha familiares que produziam cachaça, e dentro deste contexto, após o Empretec, o empreendedor também começou a trabalhar com bebidas alcoólicas tipicamente brasileiras e criou a Cachaçaria Vale das Águas Quentes. Atualmente, Lucas Sanches, de 24 anos, Afonso Moraes, de 15, filhos de José Afonso, e Rubens Santos, de 30, também se juntaram ao projeto. “Procuramos atrair os turistas, trabalhamos com feiras e eventos como este do Sebrae. E já somos reconhecidos por quem vem ao munícipio”, disse, orgulhoso, Lucas Sanches.

A cachaçaria produz bebidas artesanais, na tradição dos alambiques, fabrica licores à base de creme de leite semelhante aos Irish Cream apreciados na Europa, com frutos típicos do Cerrado, como o pequi. Além disso, comercializa açúcar mascavo, melado de cana, doces diversos, farinhas e sorvetes regionais, com sabor rapadura.

Após um processo que engloba plantio, fermentação, destilação e envelhecimento, a Vale das Águas Quentes oferece três tipos de cachaça aos turistas e consumidores: a prata, envelhecida em tonéis de jequitibá rosa por um ano; a ouro, envelhecida em tonéis de amburana também por aproximadamente um ano; e a sênior, envelhecida em tonéis de carvalho por um período superior a dois anos.

“Evidentemente que temos algum custo com a degustação, o preço elevado das matérias-primas. Mas com o apoio do Sebrae, esforço e dedicação conseguimos superar os infortúnios”, afiançou Lucas Sanches.

Outro palestrante, o chef Alex Atala, proprietário do restaurante D.O.M, considerado o terceiro na lista “Os 50 Melhores Restaurantes da América Latina 2014”, palestrou sobre a relação da natureza com a cozinha e a cultura e detalhou aos participantes o desenvolvimento de trabalhos pela valorização dos ingredientes e sabores tipicamente brasileiros.

Turismo e ação social

Na cidade de Goiás, Milena Curado, de 39 anos, que participou do Empório, começou em 2007 uma produção de roupas bordadas, que aprendeu com a avó. Segundo a artesã, foi um produto que deu certo, principalmente pelas características turísticas da cidade. “Teve uma boa aceitação no mercado. No entanto, é um produto que demanda tempo, pois é feito à mão. Uma peça de vestido leva, por exemplo, três dias para ser feito. Então era necessário que se aumentássemos a produção”, conta.

Em seguida, ela pensou em ensinar e qualificar novas pessoas no minucioso trabalho. Na época, para aumentar a produção, Milena passou a ministrar oficinas de bordado aos detentos da unidade prisional da cidade por meio do Projeto Cabocla – Bordando a Cidadania. “Com isso, pagamos os detentos, conseguimos a remissão de presos e os reinserimos na sociedade, pois, depois da saída, eles têm a oportunidade de continuar trabalhando, pois criamos esse hábito neles”, disse.

Contudo, antes do projeto, Milena participava de eventos e tinha o apoio do Sebrae, participando do grupo gestor e fazendo cursos de capacitação. “Foi com essa entidade que aprendi questões como embalagem, etiquetas, precificação, exposição e saber valorizar e agregar valor ao produto. Eu não tenho outra renda, vivo disso e gero emprego direto e oportunidades. Além disso, acredito, acima de tudo, que essa ação demonstra que vale a penar trabalhar com presos. Através do trabalho, o preso tem a capacidade de optar por uma vida melhor”, salienta.