É possível ser contra as OSs na Educação?
26 dezembro 2015 às 11h00

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Sem dados concretos e experiência prévia fica difícil criticar a iniciativa do governo de Goiás. Pode ser, ou não, uma saída para atenuar a distância gigantesca entre os ensinos privado e público. Só saberemos se for testada

Alexandre Parrode
Tenho acompanhado a discussão em torno da implantação das organizações sociais (OSs) nas escolas públicas em Goiás desde o começo do ano. Quando entrevistei pela primeira vez a secretária Raquel Teixeira, da Educação, Cultura e Esporte, ela me assegurou que o projeto era novo, estava em fase de avaliação e que só iria implantá-lo quando tivesse certeza de seu potencial.
Pela cautela para viabilizar a proposta, chegaram a sugerir, maliciosamente, que Raquel seria “contra” as OSs na Educação. Experiente, a secretária não se deixou levar pelas pressões e construiu a proposta, acompanhada de toda a equipe da secretaria. Agora, anunciou que pretende dar início à experiência — que será realizada em Anápolis.
Uma coisa que ninguém pode dizer é que não houve diálogo. O debate das OSs foi aberto com os sindicatos, sociedade, professores e escolas em janeiro, tão logo a nova equipe do governador de Goiás, Marconi Perillo (PSDB), assumiu. A imprensa noticiou diariamente todo o processo de construção do arcabouço jurídico, criação do edital, definição das regras… Foi pauta carimbada em todos os meses de 2015.
Pode ser que a discussão não tenha satisfeito os anseios de uma parte dos professores que, legitimamente, tem o direito de não concordar com a implantação. Seja por ideologia, seja por receio. No entanto, é preciso reconhecer que houve diálogo. Não é algo que está sendo feito a toque de caixa e, portanto, não podemos agir como se fosse uma atitude “truculenta”, como já li nas redes sociais por aí.
Lembro que, em uma das entrevistas, Raquel Teixeira me revelou que acreditava na possibilidade de avanço do ensino e da gestão escolar, mas tinha clareza que era preciso um “projeto piloto”, um “balão de ensaio” para que os resultados pudessem ser aferidos e, assim, comparados.
Das cerca de 1,1 mil escolas da rede estadual, apenas 23 unidades, da Macrorregional de Anápolis, serão repassadas à administração das OSs em 2016. A gestão compartilhada — termo usado pelo governo e que, de fato, mais se aproxima da realidade — será testada. E é assim que temos que encarar a implantação das OSs: um teste.
Usar termos como “terceirizar” e “privatizar” acabam deturpando todo o conceito que o governo quer construir junto aos goianos. Se não vai vender, não privatizou; se não vai demitir funcionários e colocar uma empresa para gerenciar, não terceirizou. Precisamos ser justos e dar um pouco de crédito ao governo. É uma atitude arrojada que pode, ou não, dar certo.
Ninguém afirmou que, com certeza, as OSs vão melhorar a educação pública. Há bons exemplos de OSs que funcionam. Em Goiás mesmo, nos hospitais públicos, o modelo elevou a qualidade de atendimento da Saúde. No próprio governo do PT — partido de oposição ao governador Marconi Perillo e que comanda vários sindicatos —, há gestão por OSs: o Instituto Nacional de Matemática Pura e Aplicada (Impa) é uma OS atuando na Educação e Pesquisa que se tornou referência no mundo.
Há falhas? Evidente. É preciso reconhecê-las e analisá-las para poder superá-las. Da mesma maneira que há grandes falhas na educação pública brasileira atual. O principal motivo? A falta de investimento nos professores, nas escolas e no sistema de ensino. Não há dúvidas que nos falta uma “Pátria Educadora”.
Não seria o caso, então, de se investir mais? De colocar mais dinheiro em todos os ciclos da Educação? Sim. Com certeza seria. No entanto, essa discussão está em segundo (talvez terceiro) plano. Enquanto Brasília continuar a pegar fogo com crise política e econômica, não há garantias de que teremos um horizonte melhor.
O sistema de OSs pode, ou não, ser uma saída criativa para atenuar a distância gigantesca entre os ensinos privado e público. Mas eu não posso afirmar com certeza. Nem os alunos que, em um gesto muito bonito e noticiado internacionalmente, ocuparam mais de 20 escolas por todo o Estado.
Acredito que precisamos debater Educação, discutir, cobrar, fiscalizar. Mas não podemos nos fechar para o novo. Ninguém disse que em vez de máquinas de escrever precisávamos usar computadores, mas, a partir de experiências, vimos que foi mais produtivo. A evolução é um processo natural. Mas, repito, não sei se OSs são evolução.
Vejo acusações de que o governo utilizará as OSs para “perseguir servidores”, “retirar direitos dos trabalhadores”, “acabar com os concursos públicos” e tantas outras conspirações. Não podemos virar reféns de discursos subversivos assim, pois temos um sistema judiciário eficiente e direitos conquistados versados em Lei. Se houver qualquer desrespeito, estou seguro que o Ministério Público estará pronto para intervir. O fortalecimento das instituições ao longo dos anos nos mostra isso. Tenho certeza que, caso a proposta seja ilegal, não passará. O próprio Ministério da Educação (MEC) acompanhará de perto a experiência. E é por isso que não acredito que haverá cobrança de taxas, precarização dos profissionais, nem tampouco descumprimento das diretrizes da educação pública.
Importante destacar que Raquel Teixeira acena positivamente aos professores quando garantiu que, caso não queiram, poderão ser remanejados das escolas comandadas por OSs.
Repito: são 23 unidades apenas. Será um projeto piloto, apenas uma tentativa. Por que nos opor a uma proposta do governo que tem como objetivo superar desafios da educação pública? Não estou dizendo que os professores, alunos, partidos políticos e sindicatos não têm o direito de se manifestar. Muito pelo contrário: as manifestações são legitimas e importantes.
Mas para criticar precisamos de referências. Precisamos de dados para mostrar à sociedade que as OSs não funcionam, que são ruins, prejudiciais e incompetentes. Ninguém pode dizer isso até então, porque não há tal experiência.
Sugiro aos sindicatos, professores e oposicionistas que se reúnam com a secretária Raquel Teixeira para conhecer a fundo o projeto. Copiem, tomem nota, analisem, tornem público todas as metas, cláusulas e dados dos contratos. Acompanhem todo o processo de perto.
Quando chegar o final de 2016, façam um balanço. Não tenho dúvidas que, caso não prospere a ideia, o governo refluirá. Mas isso é conjecturar o futuro. E, para se ter certeza, é preciso deixar acontecer.