Entre as respostas, as soluções mais frequentes foram a pacificação política e a aprovação das reformas administrativa e tributária, de forma a reduzir a carga de impostos

O Jornal Opção ouviu seis representantes de diversos setores da indústria e do comércio varejista de Goiás para compreender como o empresariado goiano tem lidado com a crise inflacionária, alta do dólar e a frustração na retomada do mercado. As mesmas perguntas foram feitas a todos os empreendedores e representantes da classe: “Como você vê a crise atual? Como ela impactou em seus negócios? O que pode ser feito para solucioná-la?”

Thomaz Pina

Diretor da metalúrgica Metalforte, de Aparecida de Goiânia.

“A crise tem afetado o bolso de todo mundo, até mais do que registramos, já que a inflação percebida é maior que a noticiada no IPCA (Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo). Temos sentido ainda uma redução de demanda por conta da retração do mercado. O empresariado está arredio; todos postergam planos. 

“O curioso na situação é que, pela primeira vez, enfrentamos uma inflação que não foi gerada no Brasil, mas que parece ter vindo de fora, por conta da epidemia de Covid-19, e ela afeta todo o planeta. O Brasil importa muita coisa no processo industrial (em nosso caso, os insumos vêm da China). Essa inflação mundial fez o preço dos exportadores aumentar. Isso se soma à situação cambial e faz com que o preço do minério de ferro, petróleo, transporte marítimo – o preço disso tudo dispare. 

“A solução, em parte, vem com o tempo. Devemos esperar a retomada do Covid-19. Mas a longo prazo, o Brasil precisa de uma política de industrialização. É um país desindustrializado – a indústria praticamente morreu”.

Edwal Freitas Portilho

Presidente executivo da Adial – Associação Pró-Desenvolvimento Industrial do Estado de Goiás

“Os custos da produção industrial subiram exorbitantemente em função da inflação. Isso acarreta o aumento de preços e causa queda no consumo de nosso segmento, então estamos tendo dificuldade para realizar investimentos e crescer. A insegurança trazida pela crise política também tem prejudicado muito. 

“Em nossa perspectiva, deveríamos estar usando a energia gasta com essa turbulência política para destravar o desenvolvimento do país com políticas públicas. Infelizmente, estamos presos nessa conversa de problemas artificiais que não interessa ao país. Há sempre a necessidade da união: o poder público deveria conversar com setor produtivo, e infelizmente não temos diálogo para avançar no setor industrial. 

“O que mais pesa é o custo tributário do país. Nossa principal sugestão é, primeiramente, a realização de uma reforma administrativa e, depois, de uma reforma tributária. Isso tem de ser feito com foco na economia dos gastos públicos. Precisamos discutir redução dos custos via reforma administrativa e só assim vamos conseguir competir no mundo globalizado e o país tornará a se industrializar. Já aproveitamos nosso potencial de produção de alimentos e minérios, mas, no fim,  somos competitivos apenas na cadeia primária. O Brasil pode mais do que isso.”

Marçal Henrique Soares

O presidente executivo do Sindicato das Indústrias Farmacêuticas no Estado de Goiás (Sindifargo)

“O setor farmacêutico não vendeu menos medicamentos com a pandemia Com 20 milhões de infectados pela Covid-19, registramos crescimento nas classes dos medicamentos que compõem o kit intubação. Desse grupo, são fabricados em Goiás analgésicos, vitaminas e antiinflamatórios. O restante dos medicamentos manteve sua produção e consumo normais.

“Isso não significa que o setor farmacêutico não tenha sofrido: a alta inflação e a valorização do dólar atingem gravemente, já que 95% dos nossos ingredientes ativos são importados. Há ainda a alta dos preços internacionais devido a redução de oferta desses insumos. Essa redução, por sua vez, tem raízes no fechamento de fábricas na Ásia, redução de horários por conta da pandemia, entre outros. A produção de insumos ainda não se normalizou. 

“Outro problema sério é a logística internacional. O preço do frete entre Ásia  e América do Sul, antes da pandemia, era de 2 mil dólares. Hoje o preço está em mais de 10 mil dólares – um aumento de mais de cinco vezes. Isso se dá pela redução da oferta, tanto de vôos internacionais, já que 20% dos insumos farmacêuticos viaja no porão de carga de aviões, quanto pela redução da oferta do frete marítimo.

“O desastre do desemprego finaliza a perspectiva de crescimento. Sem crescimento da economia, não há novos empregos. Temos 14 milhões de desempregados e esse número vai aumentar até que haja crescimento da economia. É um efeito dominó que leva à queda no consumo de medicamentos também. Estávamos com uma grande esperança no crescimento anunciado do PIB em 4%, mas essa projeção foi recentemente frustrada. O reajuste para 1% foi um balde de água fria.

“Isso é extremamente preocupante em nosso setor porque nossos preços são tabelados pelo governo, revistos apenas uma vez ao ano. Então toda essa inflação, alta no dólar, aumento do custo de insumos e frete – tudo isso nós absorvemos; não podemos repassar ao consumidor. A indústria farmacêutica fica muito penalizada com essas flutuações, por mais que a venda dos medicamentos não tenha caído.

“Uma solução seria a aprovação das reformas política, administrativa e tributária. Diminuir o tamanho do estado, economizar e investir. Esperamos que a geração de emprego venha daí. A função do estado não é gerar empregos diretamente, mas isso é desdobramento de reformas que precisamos urgentemente. Reformas negociadas com participação do setor produtivo e da sociedade. Sem isso, não vejo como podemos deslanchar. Não temos saída: precisamos melhorar a gestão e ter responsabilidade fiscal agora.

Crhystiano Câmara

Superintendente do Mega Moda Shopping, centro de varejo de produtos têxteis

“A crise nos atingiu muito forte, mas já temos sentido uma retomada na economia. Não é um crescimento em V como anunciado pelo Ministro da Economia Paulo Guedes, mas já é algum crescimento. A queda foi de uma vez, uma interrupção abrupta das vendas por conta da pandemia, e um retorno lento, com recuperação gradual das vagas de emprego perdidas. A perspectiva do seguimento da moda é que retornemos a níveis pré-pandemia até o final deste ano, talvez novembro. 

“No setor do comércio de bens de consumo não duráveis, como é o caso das roupas, o que mais nos afeta é o desemprego. Mais do que a alta no dólar e inflação, a estagnação da economia pelo alto desemprego nos atinge. À medida que o dinheiro volta a circular, as pessoas voltam a consumir roupas. 

“A pandemia nos atingiu muito porque causou a proibição de eventos sociais, trabalho, lazer. O mercado da moda ficou paralisado. Com a volta das demandas sociais, as pessoas repõem seus guarda-roupas. Existe no mercado portanto uma demanda reprimida que vai começar a performar a partir de novembro, dezembro.”

Márcio Martins

Presidente do Sindicato do Comércio Varejista de Derivados de Petróleo no Estado de Goiás (Sindiposto)

“Temos acompanhado esse momento com muito cuidado e atenção. Nosso segmento é muito impactado pela cotação do dólar e do petróleo. Quando esses preços sobem, impactam o consumidor, mas também impactam o empresário que precisa de mais capital de giro para manter seu negócio. 

“Temos tido  grandes dificuldades com a subida do juros e agora de impostos como o IOF (Imposto sobre Operações Financeiras), porque os donos de postos precisam recorrer a empréstimos frequentemente. Piores condições de crédito nos colocam em uma situação muito difícil – especialmente aqueles empreendedores já fragilizados em função da pandemia. Além disso, altos preços do produto espantam o consumidor.

“A esperança é de que haja estabilidade na política para que o dólar possa voltar a patamares aceitáveis. Internamente, é isso que pode ser feito, além das reformas que precisam ser atacadas pelo congresso e executivo para que possamos crescer”.

Andre Luiz Rocha

Presidente da Câmara Setorial da Cadeia Produtiva do Açúcar e do Álcool

“Temos preocupação com a alta inflação e parâmetros e a perspectiva de baixo crescimento até o próximo ano. Precisamos de uma agenda positiva e de um esforço nacional para pacificar a crise interna. Acredito que um passo tenha sido dado nesta semana, com os três poderes tentando um equilíbrio. 

Nós temos sofrido um grande aumento dos custos por conta do dólar. O lado positivo é que o açúcar se exporta, mas ao mesmo tempo, há aumento de custos de fertilizantes, insumos químicos, máquinas colheitadeiras, mão de obra. O mais grave é aumento no custo de arrendamento de terras, que também sofre alta em função da exportação em dólar da soja e do milho. 

“Já havia um aumento considerável de custo pela pandemia: temos de fornecer testagem, equipamentos de proteção individual, fazer afastamento de pessoal, funcionar com horários modificados. A falta da aprovação da agenda de reformas, a insegurança jurídica e política, isso tudo dá perspectivas muito ruins para quem já está saindo fragilizado da pandemia.

“O que pode ser feito são reformas – a administrativa principalmente. Mas não vemos esforço para a aprovação das reformas, da agenda de privatizações, e outros. A reforma tributária é aquela que está mais adiantada na Câmara, mas ao que parece, poderá aumentar nossa carga tributária. Então vemos tudo com preocupação.