Goiás deu um passo decisivo para se consolidar como referência mundial na produção e beneficiamento de minerais críticos, especialmente terras raras. Entre os dias 27 e 29 de agosto, o estado recebeu uma comitiva japonesa composta por autoridades diplomáticas e representantes de grandes empresas como Jogmec e Toyota, com o objetivo de aprofundar as relações bilaterais e avaliar oportunidades concretas de investimento. A visita culminou em reuniões estratégicas com o governador Ronaldo Caiado, realizadas no Palácio Pedro Ludovico Teixeira, onde foram discutidas parcerias voltadas à cadeia completa de produção de óxidos de terras raras (OTR), desde a extração até o refino.

O embaixador do Japão no Brasil, Teiji Hayashi, destacou o avanço real nas tratativas e reforçou o interesse japonês em ampliar os laços econômicos com Goiás. A interlocução entre os governos será conduzida pelos secretários Adriano Rocha Lima (Governo) e Joel Santana (Indústria e Comércio), com apoio da Embaixada do Japão em Brasília. A comitiva visitou Minaçu, onde opera a mineradora Serra Verde, atualmente a única produtora de terras raras em escala fora da Ásia.

O depósito da empresa é do tipo argila iônica, permitindo mineração a céu aberto com baixo impacto ambiental e sem uso de produtos químicos agressivos. Também conheceram a planta fabril da multinacional chilena Aclara Resources, em Aparecida de Goiânia, inaugurada em abril com investimento inicial de R$ 30 milhões, que dará suporte ao Projeto Carina, em Nova Roma, cujo investimento previsto é de R$ 2,8 bilhões e geração estimada de 5,7 mil empregos.

Goiás abriga cerca de 25% das reservas mundiais de terras raras, elementos essenciais para tecnologias de ponta e transição energética global, como turbinas eólicas, veículos elétricos, baterias, equipamentos militares e data centers. A atuação do estado nesse setor é estratégica, especialmente diante da busca global por alternativas à hegemonia chinesa no fornecimento desses minerais.

O governador Caiado enfatizou que Goiás não quer ser apenas exportador de matéria-prima, mas sim desenvolver a cadeia de valor local, incluindo as etapas de separação e refino, hoje dominadas pela China. Ele também destacou a agilidade do estado no licenciamento ambiental, garantindo que qualquer pesquisa ou instalação pode ser autorizada em até três meses.

Durante a mesma semana, Caiado sancionou a Lei nº 23.597, que institui a Autoridade Estadual de Minerais Críticos (AMIC/GO) e o Fundo Estadual de Desenvolvimento dos Minerais Críticos (FEDMC), com o objetivo de planejar e integrar políticas públicas voltadas à pesquisa, beneficiamento e comercialização de recursos como terras raras, nióbio, níquel, cobre e fosfato. A medida estabelece governança para todas as etapas da mineração e abre espaço para que o governo japonês contribua com tecnologia ou investimentos no fundo de pesquisa.

As tratativas entre Goiás e Japão tiveram início em julho, durante missão comercial liderada por Caiado em Tóquio. Na ocasião, o governador se reuniu com o ministro da Economia, Comércio e Indústria do Japão, Ogushi Masaki, que manifestou interesse em parcerias estratégicas e confirmou o envio da missão técnica ao estado. Segundo Yuzo Yamaguchi, diretor do Mineral Resources Division japonês, Goiás representa uma grande oportunidade para atender à demanda japonesa por terras raras pesadas, especialmente para ímãs de motores e componentes eletrônicos utilizados na indústria automobilística.

A atuação de Goiás no setor mineral está inserida em um plano mais amplo de desenvolvimento tecnológico. Em maio, Caiado apresentou nos Estados Unidos a primeira lei estadual do Brasil voltada à inteligência artificial, durante reunião com executivos da Amazon. O modelo goiano prevê incentivos para projetos de IA aplicados à saúde, agronegócio e indústria. Entre 2019 e 2024, o estado investiu mais de R$ 689 milhões em ciência e tecnologia. O Hub Goiás já apoiou mais de 160 startups, e o Centro de Excelência em Inteligência Artificial (Ceia), da UFG, tornou-se referência continental, captando mais de R$ 300 milhões em investimentos.

Conheça os pormenores do Plano Estadual de Recursos Minerais (PERM-GO) 

Goiás está prestes a dar um salto estratégico no setor mineral com a implementação do Plano Estadual de Recursos Minerais (PERM-GO), documento que orientará o desenvolvimento da mineração goiana até o ano de 2042. Elaborado com base em oficinas participativas e diagnósticos técnicos, o plano foi construído em parceria com universidades goianas e federais, e está disponível para consulta pública, podendo receber contribuições da sociedade antes de sua versão final. 

Ao Jornal Opção, Lívia Perreira, Coordenadora do Plano de Recursos Minerais, disse que o PERM-GO nasce com foco em temas centrais como sustentabilidade na mineração, relevância local do setor mineral e apoio a pequenos e microprodutores. “Queremos fortalecer os vínculos entre os atores da cadeia mineral, ampliar o conhecimento geológico das áreas potenciais e integrar o setor ao sistema de ciência, tecnologia e inovação do Estado”, afirma. 

Entre os objetivos estratégicos estão: 

  • Estruturação de clusters minerais regionais 
  • Fortalecimento da governança pública na gestão dos recursos minerais 
  • Estímulo à agregação de valor e à transformação mineral 
  • Incentivo à descarbonização e à economia circular 
  • Apoio à inovação por meio dos Parques Tecnológicos e Instituições de CT&I 

Lívia Perreira aponta que para garantir que o plano não fique apenas no papel, o governo estadual desenvolveu o estudo “Indicadores para Monitoramento da Política Mineral do Estado de Goiás”, que reúne 45 métricas para acompanhar tanto a dinâmica produtiva quanto a socioeconômica da mineração.  

Além dos indicadores clássicos, explica a especialista, como produção, valor da produção e exportações, o estudo também observa o desempenho dos fornecedores, o valor agregado na transformação mineral e o relacionamento com o ecossistema de inovação. 

Lívia também esclarece que o PERM-GO aposta na conexão entre os setores produtivos e o sistema de ciência e tecnologia para estimular o uso de tecnologias avançadas. Empresas que atuam em Goiás já vêm investindo em soluções voltadas à descarbonização e à economia circular, e o plano pretende ampliar esse movimento com apoio institucional e técnico. 

Enfoque específico 

O plano também contempla ações específicas para diferentes segmentos da mineração, incluindo: 

Cadeia Mineral Enfoque Estratégico 
Agrominerais Apoio à agricultura sustentável 
Construção Civil Incentivo à produção local e inovação 
Minerais Críticos e Estratégicos Segurança nacional e transição energética 
Gemas e Joias Valorização cultural e agregação de valor 

Participação social como base 

Apesar de já ter sido construído com ampla escuta dos segmentos ligados direta e indiretamente ao setor mineral, o documento está aberto à consulta pública. “A participação da sociedade é essencial para que o plano reflita os anseios e potencialidades reais do Estado”, reforça Lívia Perreira. 

Goiás mira liderança global

O estado de Goiás está se consolidando como um dos principais centros mundiais na produção de terras raras e outros minérios estratégicos para a indústria de alta tecnologia. Segundo o secretário de Indústria, Comércio e Serviços (Sic), Joel de Sant’Anna Braga Filho, o avanço é resultado de investimentos bilionários, geração de empregos e da implementação do Plano Estadual de Recursos Minerais (PERM-GO), que posicionam o estado como parceiro internacional de peso.

Foto: Sic

A crescente relevância de Goiás no setor atraiu a atenção de países como o Japão, que enviou recentemente uma missão oficial para visitar Minaçu, Goiânia e Aparecida de Goiânia. “São minerais essenciais para o desenvolvimento tecnológico”, afirmou Sant’Anna, destacando que, além dos 17 elementos de terras raras, o estado também se sobressai na extração de nióbio, bauxita, ouro e quartzo.

Um dos grandes diferenciais de Goiás é a presença da Serra Verde Pesquisa e Mineração (SVPM), localizada em Minaçu. A empresa é a única fora da Ásia que produz, em escala comercial, quatro elementos magnéticos de alto valor: disprósio (Dy), térbio (Tb), neodímio (Nd) e praseodímio (Pr). Esses óxidos de terras raras são fundamentais para a fabricação de motores elétricos, equipamentos eletrônicos, sistemas de defesa e tecnologias médicas. “Esses minerais têm valor extraordinário para o mundo”, afirmou o secretário, explicando que o desafio vai além da extração: é preciso separar e combinar os metais críticos para gerar ímãs utilizados em baterias, chips, tomógrafos, carros elétricos e motores de navios e trens.

A expansão da atividade mineral no estado é impulsionada por investimentos robustos. Em Nova Roma, a empresa Aclara Resources está investindo bilhões no processamento de argilas iônicas, com expectativa de gerar 5,7 mil empregos. O projeto é considerado referência mundial em mineração circular, por reutilizar 95% da água e eliminar o uso de barragens e explosivos. Em abril, a multinacional chilena inaugurou uma planta fabril em Aparecida de Goiânia dedicada ao projeto, que já acumula R$ 2,8 bilhões em investimentos no estado.

Sant’Anna atribui esse progresso à gestão do governador Ronaldo Caiado e ao planejamento estratégico da Secretaria de Indústria e Comércio. “Isso tudo só é possível porque o Governo de Goiás tem um projeto e tem a gestão do governador Ronaldo Caiado, que investe em educação, em saúde, em segurança. Isso proporcionou à Secretaria de Indústria e Comércio condições para fazer projetos e atrair novos investimentos na área industrial, na área de comércio, na área de serviço e na área de mineração”, afirmou.

Desde 2021 à frente da SIC, Sant’Anna lidera a implementação do PERM-GO, que visa orientar o desenvolvimento do setor mineral pelos próximos 20 anos. “O Governo do Estado investiu mais de R$ 2 milhões, nesses últimos 3 anos, em pesquisas e também para que possamos dar segurança jurídica para novos investimentos”, acrescentou.

O plano está alinhado ao objetivo de ampliar o conhecimento geológico do estado. Por meio da Superintendência de Gestão Estratégica do Setor Produtivo, a SIC realiza estudos geológicos básicos, mapeamentos e levantamentos geofísicos e geoquímicos. “Goiás, apesar de ter só 35% do seu solo geologicamente estudado, é um grande produtor de minérios”, pontuou Sant’Anna, citando a diversidade mineral do estado, como o quartzo em Cristalina, o nióbio em Catalão e o ouro em Mara Rosa.

Além do impacto econômico e industrial, Sant’Anna destaca o potencial transformador da mineração para a sociedade goiana. “Que a gente alcance melhores empregos, melhores salários, que possa ter condições de ter energia também para mover os centros que desenvolvem inteligência artificial, porque consomem muita energia. Então a gente precisa dominar algumas tecnologias para fazer essa transição”, concluiu.

Novas oportunidades, velhos desafios

Com exclusividade ao Jornal Opção, veio à tona uma informação que pode redesenhar o mapa mineral brasileiro, e também acender alertas. A empresa 3D Minerals, atualmente sob investigação da Agência Nacional de Mineração (ANM), arrematou 27 áreas em Goiás que apresentam indícios da presença de terras raras. Esses elementos químicos, essenciais para tecnologias de ponta como telecomunicações, energia renovável e defesa, são considerados estratégicos em disputas geopolíticas globais.

Terras Raras | Foto: Reprodução
Terras-raras. | Foto: Reprodução

As áreas requeridas somam 39.396 hectares e estão distribuídas por diversos municípios goianos, com destaque para Itapaci, Crixás, Montes Claros de Goiás e Monte Alegre de Goiás. Também aparecem na lista Guarinos, Niquelândia, Nova Iguaçu de Goiás, Mara Rosa, Pilar de Goiás, Santa Terezinha de Goiás, Campos Verdes e Nova Roma. Em alguns casos, os terrenos abrangem mais de um município, revelando uma estratégia territorial ampla e diversificada.

Segundo Luiz Antônio Vessani, presidente do Sindicato da Indústria da Mineração do Estado de Goiás e Distrito Federal (Minde), todas as áreas apresentam indícios de ocorrência de terras raras, mas isso não garante viabilidade econômica. “Estamos no início de um processo que pode revelar jazidas de alto valor, mas é preciso moderação. Muitas áreas são pesquisadas e não dão resultado”, afirmou.

A fase atual é apenas preliminar. Os requerimentos permitem a realização de pesquisas, que podem levar até dez anos e demandam investimentos milionários, sem retorno financeiro garantido. “Durante esse tempo, a empresa estará gastando só com a pesquisa. O que temos hoje é um papel sobre uma área com intenção e obrigação de investigar”, pontuou Vessani.

Vessani também destacou o papel estratégico das terras raras no cenário internacional, especialmente na disputa entre China e Estados Unidos. A China domina a cadeia global desses elementos e trata seus recursos como patrimônio nacional, investindo fortemente em pesquisa e tecnologia. “Eles sabem que são uma dádiva da natureza e têm a obrigação de aproveitá-los da melhor maneira possível”, disse.

A expectativa é que, com o avanço das pesquisas, o Brasil possa se tornar um player relevante no mercado global de terras raras, reduzindo sua dependência externa e fortalecendo setores industriais estratégicos. Mas o caminho é longo, exige paciência, investimento e, sobretudo, transparência, especialmente quando empresas envolvidas estão sob investigação.

Essa revelação exclusiva do Jornal Opção não apenas aponta para uma nova fronteira mineral em Goiás, mas também levanta questões sobre governança, sustentabilidade e soberania. O futuro pode ser promissor, desde que os passos sejam firmes e bem monitorados.

Leia também: Operação desmantela esquema milionário de venda ilegal de medicamentos em Goiás, Minas e Paraná