Mesmo cassados, políticos goianos devem concorrer a prefeituras

26 maio 2024 às 00h01

COMPARTILHAR
Responsável pelo maior número de candidaturas do Centro-Oeste nas eleições de 2020 e 2022, com 26.188 registrados (soma dos dois anos), Goiás contabilizou 1.232 irregularidades que levaram à cassação ou indeferimento de mandatos de prefeitos, vice-prefeitos, vereadores e deputados nos últimos quatro anos.
Entre as irregularidades mais comuns, conforme levantamento do Jornal Opção com base em dados do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), está a ausência de requisito de registro, que representa 55,1% (680) dos casos, seguido do partido invalido, com 282, e o indeferimento de partido, federação ou coligação – 164. Há ainda a cassação ou indeferimento por ficha limpa (93), partido ou federação inválida (12), compra de voto (3) e gasto ilícito (3).
Entretanto, mesmo perdendo o cargo político por irregularidades como as mencionadas, há casos em que é possível concorrer a novos pleitos, como feito por Gilmar Alves (Agir), pré-candidato à prefeito em Quirinópolis. O político foi condenado em 2021 por autopromoção e, em 2023, por compra de votos, juntamente com o candidato a vice-prefeito Antônio José Pereira. Os dois concorreram ao pleito em 2020, mas foram derrotados por Anderson de Paula (PDT), que tentará a reeleição.
De acordo com a sentença, Gilmar teria distribuído “indiscriminadamente” combustíveis para eleitores do município, se valendo de uma “carreata”. Gilmar e Antônio tiveram os registros de candidatura cassados e os direitos políticos suspensos por oito anos, além de serem multados em R$ 53 mil cada um. O ex-prefeito, no entanto, recorreu da decisão que tramita na Justiça e, inclusive, é um dos favoritos a comandar o município.
Cotado para ser vice do deputado federal Gustavo Gayer (PL) em Goiânia, o ex-parlamentar Fred Rodrigues (DC) também faz parte dos políticos que perderam o mandato por irregularidades. Fred, que foi eleito deputado em 2022 com 42,7 mil votos, teve o registro de candidatura anulado pelo TSE pela não prestação de contas da eleição de 2020, quando concorreu à Câmara de Goiânia.
Essas mesmas contas foram apresentadas no ano seguinte, em 2021, já fora do prazo. Por isso, foi considerado como não prestado. Vale ressaltar que caso Gayer abandone a corrida pela Prefeitura de Goiânia, Fred irá se tornar o principal nome da direita para desbancar Rogério Cruz (Solidariedade).
Prefeito de Caldas Novas por quatro mandatos, sendo eleito pelo PSDB em duas ocasiões – Evandro Magal, que retornou recentemente ao partido, também é pré-candidato a prefeito na cidade das águas quentes. O político chegou a ser condenado por improbidade administrativa, ofensa aos princípios da administração pública e danos ao erário enquanto esteve à frente da cidade.
Segundo o Ministério Público de Goiás (MPGO), o ex-prefeito recebeu um pagamento indevido de R$ 365 mil de um empresário. O dinheiro teria sido utilizado para a compra de um apartamento e influenciar decisões do Executivo municipal. Magal também foi condenado a pagar uma multa de R$ 3,65 milhões. O tucano sempre negou as irregularidades, afirmando se tratar de “perseguição política”.
O Jornal Opção tentou atualizar os processos dos políticos citados na matéria Justiça Eleitoral, mas não obteve retorno.
Políticos cassados podem se reeleger
O advogado eleitoralista Edson Ferrari Filho explica que mesmo tendo sido cassados, os políticos podem se candidatar antes do prazo de inelegibilidade imposto ser cumprido. Entretanto, é preciso um aval da Justiça, como por exemplo, uma liminar afastando a suspensão dos efeitos da decisão que levou à perda do cargo.
Um exemplo é o ex-vice-prefeito de Turvelândia, Marlos Souza Borges. O TRE cassou o mandato de Marlos e do ex-prefeito, Siron Queiroz dos Santos, por compra de votos e abuso de poder político nas Eleições 2020. Depois de serem afastados e multados em R$ 53 mil (prefeito) e R$ 33 mil (vice), a Justiça afastou a aplicação de inelegibilidade de oito anos imposta a Marlos, mas manteve a sanção de Siron. Com isso, o ex-vice mandatário pode concorrer às eleições deste ano.
“A cota de gêneros é um clássico. Mesmo que ele [político] não tenha cometido nada, ele é cassado por algo que o partido dele cometeu. A única pena dele é a cassação do seu mandato, podendo se candidatar posteriormente, caso ele não tenha contribuído para o ato ilícito”, explicou.
O advogado diz ainda que é possível reverter a cassação e, consequentemente, ficar “livre” para concorrer a novas eleições. A perda de mandatos em eleições municipais, como a deste ano, pode ocorrer em processos que se iniciam nas Zonas Eleitorais, com recurso ele chega no Tribunal Regional Eleitoral (TRE) e que, posteriormente, são enviados ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE).
Não é necessário o cometimento de um ilícito eleitoral para que um mandato seja anulado. A prática de fraude à cota de gêneros, por exemplo, não é crime, mas gera a cassação de todos os eleitos da chapa de um partido. A compra de votos, em contrapartida, é uma irregularidade eleitoral e basta a comprovação da compra de um voto para a cassação do mandato. Os ilícitos eleitorais são normalmente informados pelos adversários e Ministério Público à Justiça Eleitoral.
“Pode ser encontrada uma nulidade processual, o TRE pode ter um entendimento diferente do Juízo da Zona Eleitoral, assim como o TSE pode ter um entendimento diferente do TSE”, afirmou.
“Uma vez que ocorreu o trânsito em julgado definitivo da decisão que determina a inelegibilidade, a hipótese de desconstituição desta seria por uma ação anulatória, que demonstração da existência de vício processual insanável que macula a coisa julgada material, como, por exemplo, a ausência da citação válida no processo que ensejou a sanção”, reforça a também advogada eleitoralista Diana Fiedler.
Perda gradual
A partir do momento em que o político é cassado, ele não perde os direitos automaticamente, segundo Diana. A especialista diz que nos casos em questão, em que há a comprovação por meio da ação de impugnação de mandato eletivo, a inelegibilidade, com suspensão dos direitos políticos, é declarada na sentença. Já em outras decisões, é necessária a menção expressa da inelegibilidade.
“Existe um rito para as ações específicas, mas as peculiaridades do processo eleitoral – em especial o prazo certo do mandato – exigem a adoção dos procedimentos céleres próprios do Direito Eleitoral, respeitadas, sempre, as garantias do contraditório e da ampla defesa”, contou.
Nova eleição
Ao ter o mandato cassado, os suplentes de vereadores ou deputados assumem o lugar do político que perdeu a cadeira. Em relação aos prefeitos e vice-prefeitos, o presidente da Câmara dos Vereadores do município assume o lugar de mandatário temporário para que uma nova eleição seja realizada, mesmo estando fora do período eleitoral.
Em Turvelândia, depois da cassação de Sirin e Marlos, o TRE promoveu uma nova eleição suplementar em abril deste ano. Na ocasião, Osélia do Ailton (PL) foi eleita prefeita com o vice, Neto Pimenta (PL). O mandato vai até 31 de dezembro deste ano. A chapa foi eleita com 70,58% dos votos, superando os adversários Tenilson Pedreiro (Solidariedade) e Claudio Fontana (PP).
“Se um prefeito perde o mandato é feita uma nova eleição, exceto nos últimos seis meses de mandato. O novo candidato completa o mandato anterior. Com relação à câmara, os votos são tidos como nulos e, então, retotalizados. Eles são contados de novo e as vagas distribuídas, de acordo com os votos já dados”, concluiu Dyego Crossara, advogado eleitoralista.