Alvo de 16 operações do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) em 2023, Goiás foi responsável por contabilizar mais de 90% dos trabalhadores resgatados de condições análogas à escravidão no Centro-Oeste (820). Ao todo, foram identificadas e remanejadas 739 pessoas escravizadas, principalmente de zonas rurais. É o maior número do país.

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Esses dados foram divulgados na quarta-feira, 10, pelo MTE. Os trabalhadores, normalmente, vêm de outros estados em busca de melhores condições de vida. Segundo o órgão federal, os maiores exportadores de “escravos” do Brasil são: Maranhão, Piauí, Bahia e Rio Grande do Norte.

“A gente ia para lá [usina] todos os anos (…) A única coisa que eles forneciam era o trabalho mesmo. Teve alguns anos que a gente ia trabalhar lá, e nem o acerto a gente recebia”, explicou o baiano Maciel Santos, que foi resgatado da usina Centroalcool, em Inhumas (GO), durante operação em outubro do ano passado.

Além de Maciel, outras 57 pessoas que trabalhavam na usina foram remanejadas por trabalhar em condições análogas à escravidão. O trabalhador explica que ficou pouco mais de um mês no local, onde atuava como cortador de cana. Ele afirmou que não tinha contrato com a empresa, mas que havia uma promessa de receber de forma quinzenal. Ele não tinha salário fixo – ganhava por produção, mas diz que nunca recebeu pelo serviço prestado.

Sem dinheiro, o autônomo teve a viagem de volta à Bahia bancado pelo MTE. O paulista, Reginaldo Pinto, também precisou da ajuda do ministério para voltar ao interior de São Paulo. Assim como Maciel, ele foi resgatado da usina Centroalcool. 

“Trabalhei por 11 meses e 20 dias. Dividia o aluguel de R$ 350 com outras duas pessoas. Trabalhava como cortador de cana das 7h às 15h e ganhava por produção. Voltei para a minha cidade com ajuda do ministério e continuo trabalhando na zona rural”, contou.

Operação na Centroalcool 

O procurador-chefe do Ministério Público do Trabalho (MPT) em Goiás, Alpiniano do Prado Lopes, explicou que as operações como a realizada na Centroalcool são feitas pelo MTE, em conjunto com a Receita Federal e a Polícia Federal (PF) ou Polícia Rodoviária Federal (PRF). 

As ações, que ocorrem por meio de denúncias, podem durar dias. Isso porque além de ouvir os trabalhadores, os agentes também inspecionam os contratos e as condições de moradia e alimentação, normalmente precárias neste tipo de condição.

“Você encontra trabalhador terceirizado com trabalhador direto. Neste da Centroalcool, por exemplo, foram 53 trabalhadores da própria usina e mais cinco terceirizados que eram motoristas. Tinham motoristas que estavam tendo jornadas de trabalho de 40 horas seguidas. Eles dormiam dentro do caminhão enquanto ele estava sendo carregado”, afirmou o alpiniano.

“Os outros 53 trabalhadores diretos da usina estavam mal alojados, com condições precárias de moradia e alimentação. A legislação foi totalmente ignorada [pela empresa]”, reforçou.

Alpiniano contou ainda que a empresa e o MTE travam uma luta na Justiça com o objetivo de que os trabalhadores sejam ressarcidos pelo tempo que atuaram na empresa sem receber. A Centroalcool, conforme o procurador-chefe, se recusou a fazer um acordo com o MTE para que pagasse e arcasse com o transporte dos trabalhadores resgatados.

“Um trabalhador em estado de escravidão pode ser indenizado em até 10 vezes a remuneração dele. Porém, nem sempre as denúncias que recebemos de fato são verídicas. Tem muita coisa que não é verdade”, concluiu. 

O Jornal Opção tentou contato por ligação com a Centroalcool, que decretou estado de falência, para que se posicionasse, mas não obteve sucesso.