O olhar de Dorothea Lange sobre a tragédia
09 fevereiro 2020 às 00h00
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Fotógrafa imortalizou imagens de pessoas que sofreram durante Grande Depressão
O Roaring Twenties ou os “Loucos anos 20” foi um período de entusiasmo político e cultural em todo mundo. Após a Primeira Guerra Mundial, os Estados Unidos (EUA) se consolidaram como potência econômica e passaram a proporcionar o “American Way of Life” (Estilo de Vida Americano) baseado no consumismo. Nesse período, o cinema, a fotografia, a moda, a tecnologia, a ciência, a política, tiveram um salto no desenvolvimento.
Entretanto, produzindo mais do que poderia vender, os mercados começaram a falir, gerando desempregos e desvalorização das ações — que recebiam muitos investimentos na Bolsa de Valores de Nova Iorque. Então, no dia 29 de outubro de 1929, a crise encontrou seu estopim. Conhecida como Black Tuesday, aquela terça-feira foi marcada pela quebra da bolsa e o início da Grande Depressão, que afetou não apenas os EUA, mas todo o ocidente.
Do American Way of Life para a miséria, famílias que eram abastadas agora esperavam na fila para receberem alimentos doados, pessoas perderam tudo o que tinham e o número de suicídios aumentou de forma exorbitante. Nesse cenário, uma lente captava os rostos marcados pela crise: Dorothea Lange imortalizou as imagens das pessoas que sofreram nesse período.
“Minhas fotografias poderiam ajudá-la”
Dorothea Lange nasceu em 26 de maio de 1895 em Nova Jersey e faleceu devido a um câncer no esôfago em 11 de outubro de 1965 na Califórnia, aos 70 anos. Foi uma das mais importantes fotógrafas norte-americanas e influenciou o desenvolvimento da fotografia documental.
Lange aprendeu fotografia com Clarence H. White, o fundador do movimento Photo-Secession. Além de ter estagiado em importantes estúdios, como o Arnold Genthe, antes de montar o seu próprio em São Francisco, na Califórnia. Com a Crise de 29, Dorothea resolveu sair dos estúdios para capturar imagens de pessoas afetadas pela situação.
Suas imagens pungentes se tornaram ícones da era. Seu marido, o economista Paul Schuster Taylor, a inspirou ainda mais a aprofundar-se nos problemas sociais das zonas rurais — enquanto Taylor coletava informações, Lange fotografava.
A fotojornalista cobriu a trajetória dos japoneses-americanos e sua internação em campos de concentração, destacando Manzanar, o primeiro dos campos permanentes. A sua fotografia de crianças japonesas-americanas que prometiam fidelidade à bandeira pouco antes de serem enviadas para campos de concentração é uma dolorosa lembrança dessa política de detenção de pessoas que não cometeram crime algum.
A perspicácia de Dorothea ao fotografar transmite sua sensibilidade social para as fotografias. Uma de suas imagens mais famosas da Grande Depressão, a Migrant Mother, tirada em 1936, mostra uma mãe com seus filhos em situação de miséria. Sobre o instante em que a foto foi tirada, Lange disse:
Eu vi e me aproximei da mãe faminta e desesperada, como se estivesse atraída por um ímã. Não me lembro de como eu expliquei minha presença ou minha câmera para ela, mas lembro que ela não me fez perguntas. Eu fiz cinco cliques, trabalhando cada vez mais perto dela. Não perguntei seu nome ou sua história. Ela me contou sua idade, ela tinha trinta e dois anos. Disse que haviam [ela e as crianças] vivido de vegetais congelados dos campos circundantes e de pássaros que as crianças mataram. Ela acabou de vender os pneus do carro para comprar comida. Ela sentou-se naquela tenda inclinada com seus filhos amontoados ao seu redor, e parecia saber que minhas fotografias poderiam ajudá-la, e então ela me ajudou. Havia uma espécie de igualdade sobre isso.