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Vivemos um tempo em que os algoritmos já não apenas organizam a informação do mundo, mas também influenciam o modo como sentimos, escolhemos, julgamos e até convivemos em sociedade. Neste cenário, a inteligência artificial emerge como o centro de uma revolução civilizatória que não é apenas tecnológica, mas também jurídica, ética e política.

Este será o ponto de partida do meu mais recente trabalho: Inteligência Artificial e os Tempos do Algoritmo, que convidará o leitor a uma jornada crítica e reflexiva sobre os caminhos da IA e sua imersão nas instituições jurídicas, na economia global, nas práticas de justiça criminal, na administração pública e na vida cotidiana. A obra não virá apenas para denunciar os riscos ou exaltar as promessas das novas tecnologias, mas oferecer elementos sólidos para compreender, debater e intervir no tempo algorítmico em que vivemos.

O livro abordará as origens técnicas e históricas da inteligência artificial, mostrando como ela nasceu de um longo processo científico iniciado no século XIX, com os estudos sobre eletricidade e eletromagnetismo, passando pelo transistor e os primeiros computadores, até chegar às redes neurais e ao aprendizado profundo que caracterizam a IA atual. Esse processo foi essencial para a constituição de sistemas eletrônicos que hoje tomam decisões com base em volumes massivos de dados.

No cenário contemporâneo, a IA se consolida como uma das tecnologias mais influentes do século XXI. Está presente em setores como a indústria, a medicina, o transporte, a comunicação e, com especial relevância, no Direito. O uso de sistemas de recomendação, reconhecimento facial, jurimetria e análise preditiva no sistema de justiça promete maior eficiência e racionalidade. No entanto, levanta também preocupações éticas sobre transparência, responsabilidade, discriminação algorítmica e vigilância.

A complexidade dos algoritmos — muitas vezes verdadeiras “caixas-pretas” indecifráveis — desafia princípios constitucionais como o contraditório, a ampla defesa e a motivação das decisões. Além disso, o acesso desigual às tecnologias de IA entre países, instituições e classes sociais reforça o risco de exclusão digital e concentração de poder nas mãos de poucos agentes privados globais.

No Brasil, o uso da IA no Poder Judiciário já é uma realidade. Ferramentas como o sistema Victor, do Supremo Tribunal Federal, e a plataforma Sinapses, do Conselho Nacional de Justiça, têm sido empregadas para triagem de processos e apoio na elaboração de decisões. Essas ferramentas, se bem reguladas e compreendidas, podem auxiliar significativamente a gestão do Judiciário.

Contudo, a obra alerta para os riscos da automação em atividades-fim da jurisdição, como a prolação de sentenças ou definição de penas. A função jurisdicional é indelegável e essencial para a proteção dos direitos fundamentais. A inteligência artificial deve atuar como apoio e não como substituto da atividade decisória judicial.

O livro também cuidará de experiências internacionais, como o caso do software COMPAS nos Estados Unidos, utilizado para prever reincidência criminal, que evidenciou os perigos da reprodução algorítmica de preconceitos históricos. A importância da explicabilidade (explainability) dos sistemas utilizados é central para garantir que os cidadãos compreendam os critérios das decisões que os afetam — direito que se liga diretamente ao devido processo legal.

Mais do que uma análise técnica, a obra traz uma profunda reflexão sobre os fundamentos éticos e políticos da regulação da IA. Cita diretrizes internacionais da Unesco e da OCDE, discutindo o papel dos juristas e da sociedade na construção de uma governança democrática e inclusiva das novas tecnologias.

Capítulos específicos vão explorar as transformações do trabalho, o modelo chinês de crédito social, o envelhecimento populacional diante da IA, e a crise da verdade causada pela proliferação de fake news por sistemas de IA generativa.

O livro não será um ponto de chegada, mas uma convocação ao pensamento, ao diálogo e à ação. É um chamado à coragem: de pensar criticamente, de regular com sensibilidade e de construir pontes entre o mundo da técnica e o mundo da justiça.

É por assim dizer uma homenagem à inteligência coletiva, à memória histórica e ao espírito crítico que nos mantêm humanos, mesmo em tempos de máquinas pensantes.

Alguns tópicos em gestação:

1. O Nascimento da Inteligência Artificial e o Mundo dos Algoritmos 2. IA e Sociedade: Redes, Subjetividades e Polarização Algorítmica 3. Trabalho, Desigualdade e Algoritmização do Mundo 4. A Experiência Chinesa: Crédito Social, Funções Sociais e Envelhecimento 5. IA, Justiça Criminal e Segurança Pública: Entre o Controle e a Dignidade 6. Ética, Regulação e o Papel dos Juristas na Era Algorítmica 7. IA Generativa, Fake News e a Crise da Verdade na Democracia Digital 8. Inteligência Artificial e a Reconstrução do Futuro: Entre o Medo e a Esperança

Será imperioso concluir a obra observando que a inteligência artificial não é neutra. Reflete escolhas humanas, políticas e econômicas. A construção de um futuro justo e democrático diante dessa nova realidade depende da atuação crítica e corajosa de todos nós — juristas, técnicos, gestores públicos, professores, comunicadores e cidadãos.

O tempo dos algoritmos já começou. E com ele, a responsabilidade coletiva de manter a humanidade no centro da tecnologia.