Elias Antunes

Em “Relações”, o poeta prosador Heleno Godoy, de 77 anos, construiu um clássico, isto é, um livro que pode ser lido em qualquer tempo sem decair sua qualidade e sua relação com a humanidade e sua verossimilhança.

“um dia como outro, qualquer dia, aquele ou antes: a cidade com seus contornos até quando a linha do horizonte (…)”. Godoy, 2006, página 19.

Assim começa o romance, com minúscula mesmo, e com a forma da continuidade, como se quisesse dizer que uma história é um recorte de algo maior, por isso não começa do começo, nem termina no fim.

O texto, que se aproxima-se do fluxo da memória, está muito bem construído, com palavras exatas e necessárias, exercendo o prazer estético da boa leitura.

Emblemático que as personagens, alguns, vão chegar à loucura.

Lembra uma viagem dentro da família, como se um personagem (ou muitos), são muitas vozes, quisesse dar sua versão dos fatos, chegando a seus pontos de vistas que elucidam, mas deixam brechas e, mais que isso, sequelas.

Heleno Godoy, poeta, prosador e crítico literário | Foto: Ube-Goiás

Heleno Godoy é um narrador exímio que domina as ferramentas das palavras e constrói, com o rigor necessário, uma narrativa brilhante, como a melhor produção de um Raduan Nassar ou um José Condé.

“E botava fogo na roupa também, eu lembro quando ele chegava na casa da mamãe, que ele ia muito lá (…)” — (Godoy, 2006, página 73)

O personagem piromaníaco e louco vivia apenas para o aqui e agora. Acredito que com a demência, perdemos as linhas do tempo e as barreiras entre o vivido e o imaginado.

Heleno Godoy sabe se posicionar frente às múltiplas vozes narrativas.

Com esse livro, Godoy sobressai-se tal um construir de histórias que se situam dentro do espaço mágico e da família.

Podemos identificar nuances que ocorrem em várias famílias, como se repetissem os mesmos dramas, todavia aqui há todo poder de narrador de um verdadeiro mestre da escrita.

Elias Antunes é escritor e crítico literário. Texto publicado na revista “Entre Poetas & Poesias”.