Saia da caverna, deputado Gustavo Gayer!
29 agosto 2023 às 15h03
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Excelentíssimo senhor deputado federal Gustavo Gayer, já fui estudante, depois, por muitos anos, fui professor de língua portuguesa e literatura brasileira do segundo grau. Em momento algum em meu concurso de Letras, realizado na antiga Universidade Católica de Goiás, senti que meus professores estavam me catequizando para ser um imbecil. Senti em todos os braços estendidos para me tirar da caverna platônica (fato que ainda ocorre com o senhor). No segundo grau (com parte do curso realizado no Colégio Carlos Chagas de Campinas), também tive excelentes professores.
Vou aproveitar o momento para citar um episódio que nunca vai sair da parede de minha memória. Certa vez, o professor Pita, que lecionava português e isso sempre de modo risonho, perguntou se havia algum poeta na sala. Nessa época eu tinha uns 20 anos. Pediu poemas aos alunos. Falou da importância da poesia como alimento da alma (me tornei um glutão). Poucos entregaram. Faltei roer as unhas de tão ansioso para ouvir seu comentário sobre o meu, que foi último a ser entregue. Pita o leu na sala. Por pouco, não tive uma explosão poética de alegria com o comentário elogioso do querido Pita. O respectivo poema — “Eu mal enxergo” — inclusive está no meu livro premiado na Bolsa de Publicação Hugo de Carvalho Ramos, na edição de 2011: “Poema na Folha da Amendoeira”.
Estou falando do carinho dos meus professores, excelentíssimo deputado, para contrapor a sua contra-inteligência dita recentemente, dia 23, numa audiência pública sobre a criação de novas universidades e institutos federais. Em sua golfada de estultice, o senhor vociferou colericamente: “Vamos criar mais faculdades, vamos criar mais instituições de ensino para formar mais imbecis”. Como disse, acertadamente, ao senhor a deputada federal Silvye Alves, “vá trabalhar”, vá estudar mais, deputado.
Sei que Vossa Excelência não é um parlamentar de leitura, mas, ainda assim, vou deixar aqui para o senhor algumas palavras da economista, administradora e professora Claudia Maria Costin sobre a importância do investimento em educação: “Nenhum país é desenvolvido de forma inclusiva sem que a sociedade em geral entenda de educação e esteja envolvida com o assunto”. Se o nobre deputado não sabe, está mais fácil um jumento passar pelo buraco de uma agulha do que país se tornar desenvolvido sem investir em educação. Educação de desenvolvimento são inerentes.
Voltaire e a era da imbecilidade
Certamente o nobre deputado nem saiba quem é o filósofo francês Voltaire, que foi um dos principais pensadores iluministas, e que da ação destes surgiu a Era do Iluminismo, que questionou as formas tradicionais de pensar vindas da cartilha da Igreja Católica. E a luz dessas novas ideias chegou à educação, produzindo inclusive um público maior de leitura e mais questionador. A citação de Voltaire aqui é mais um pretexto meu para encaixar o excelentíssimo deputado numa frase do filósofo: “Quem revela o segredo dos outros passa por traidor; quem revela o próprio segredo passa por imbecil”. Ao revelar seu segredo de ignorância em relação aos benefícios socioeconômicos da educação, o excelentíssimo deputado explicita que talvez seja imbecil.
Bem perto do excelentíssimo parlamentar, há um senador, inclusive presidente estadual do partido do deputado, que foi um cara bem pobre na cidade de Taquaral de Goiás. Falo isso não por ouvir falar, mas por conhecer e inclusive entrevistar a primeira professora primária dele: dona Auristela, que me contou pormenores do seu aluno, que, por não ter mochila, levava seus objetos escolares dentro de um saco vazio de açúcar. Esse senador — Wilder Morais — só conseguiu ascensão social e saiu da pindaíba em que vivia na pequena cidade goiana porque estudou. Não fosse o curso de engenharia civil que fez na PUC-GO (e isso com crédito educativo), ele não teria se tornado um empresário de sucesso.
Saia da caverna, deputado! Antes que a caverna o devore.
Sinésio Dioliveira é jornalista.