O fanatismo é a chave da porta do inferno
19 novembro 2024 às 19h29
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Francisco Wanderley Luiz, o homem que se explodiu, na noite de uma quarta-feira, 13, na Praça dos Três Poderes em Brasília, se enquadra nas definições de fanatismo apresentadas pelos filósofos Voltaire e Nietzsche. Enquanto aquele diz: “Quando o fanatismo gangrena o cérebro, a enfermidade é incurável”, este, por sua vez, declara: “O fanatismo é a única forma de força de vontade acessível aos fracos”. Francisco era chaveiro. Ele, que tanto abriu portas trancadas com as chaves certas, usou a chave errada ao se deitar sobre um explosivo. Perdeu a sua vida inutilmente em função de uma causa podre. (Tomara que alguém tenha colocado uma moeda em sua boca antes do seu enterro como pagamento do trabalho do barqueiro Caronte na travessia do seu corpo pelos rios do submundo que levam ao palácio de Hades.)
Francisco caiu no visgo pernicioso das milícias digitais, as quais gangrenam fácil o cérebro dos fracos, alucinando-os de um patriotismo pernicioso. Por terem o cérebro vazio, o diabo faz morada fácil nele e o resultado são trevas tenebrosas. Francisco foi letalmente ludibriado. Passaram melado em sua boca, ou melhor, veneno. Não realizou nada de útil à Pátria em seu gesto suicida. Deveria ter colocado sua vida acima da pátria. Afinal, por trás das pátrias, geralmente existem muitos patifes, muitos homens ocos, que andam defecando e andando para o País que governam. Visam apenas ao que o país pode lhes oferecer: mordomias, enriquecimento (sobretudo ilícito), mandonismo, entre outros aspectos abjetos.
Em “O Príncipe”, mais precisamente no capítulo XXII – “Os secretários do príncipe”, Nicolau Maquiavel conta que “existem três espécies de cérebros”. Chamou de “excelente” o que possui ideias próprias, de “bom” os sem ideias próprias, mas capazes entender as alheias, e de “inútil” o que não se enquadra nos dois critérios anteriores. Maquiavel inclusive observa que é de grande importância o príncipe “saber escolher os seus ministros”. Também ressalta, no mesmo capítulo, que a opinião a se formar sobre a inteligência de um príncipe advém dos homens que ele escolhe para ficar à sua volta.
Como este texto é uma crônica, portanto sem muito comprometimento com exatidão dos fatos (tarefa que é dos historiadores), tomei a liberdade de enfiar Maquiavel na conversa, especificamente em relação aos cérebros inúteis. Francisco levou a pior em seu intuito diabólico de assassinato. Semearam cicuta em cérebro. Seu recado deixado no seu perfil no Facebook foi explosão pela culatra: “Vamos jogar??? Polícia Federal, vocês têm 72 horas para desarmar a bomba que está na casa dos comunistas de merda”. E nessa toada torta de atritos políticos travados de modo vil, com fake news mais bizarras e beligerantes, não se pode descartar outros Franciscos, inclusive com métodos de ataque mais sofisticados. Vale aqui lembrar o episódio sinistro de 11 de setembro de 2001 em Nova York, em que ocorreu a morte de quase 3 mil pessoas com a destruição das Torres Gêmeas (World Trade Center) por meio de aviões comerciais americanos sequestrados pelo time tenebroso da Al-Qaeda, comandada pelo terrorista-mor Osama Bin Laden, que foi morto pela CIA em maio de 2011.
Esse episódio do Francisco em Brasília me levou a um conto que escrevi alguns anos atrás. Nele falo de facções criminosas brasileiras que se unem numa guerra de terror contra o estado. E isso trazendo homens-bomba do Afeganistão (a maioria adolescentes), que se explodiam em órgãos públicos, principalmente nos do Poder Judiciário. A eles eram oferecidos tesouros e virgens. Estas lhes eram dadas antes mesmo de se explodirem: meninas que os chefes das facções recrutavam nas favelas. O tesouro, óbvio, nunca é entregue.
Sinésio Dioliveira é jornalista, poeta e fotógrafo da natureza