O choro de desespero de Júlia dentro da mata
28 março 2023 às 17h42
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Enquanto observava uma cutia andando toda tranquila numa matinha do Parque Lago das Rosas, isso na manhã ensolarada de domingo, 26, surgiu a oportunidade que há tempo eu buscava e não conseguia realizar: fotografar uma maracanã-de-buriti. Vi três no Parque Areião certa vez, mas não deu tempo engaiolá-las virtualmente: apontei a máquina, elas voaram. As buscas por outras espécies continuam; minha dependência de passarinhos não me deixa parar.
No retorno ao meu automóvel, passei perto da exposição de cães border collie, raça que, conforme dizem, é a mais inteligente. Os filhotes custam caro, principalmente os machos. À minha frente iam duas senhoras, uma com um cão, dizendo, toda orgulhosa, à outra que seu cachorro tem pedigree, ou seja, que é um border collie autêntico. Vendo aquele tanto de cães distintos, a vira-lata Júlia me veio à mente. Está com dois anos. Sua dona, que recentemente me enviou uma foto da cadela, é uma cinófila no sentido literal da palavra, ou seja, seu amor é por cães e não pela raça deles.
Encontrei Júlia chorando no meio da mata do Bosque dos Buritis. Tenho hábito de zanzar pelos parques de Goiânia nos finais de semana. O que faço em busca de saúde e bem-estar em meio a tanto verde e rica fauna e também para colher as imagens ao baú dos meus olhos. Num certo sábado pela manhã, quando filmava um casal de araras-canindé num coito demorado no alto de um guapuruvu, ouvi alguns latidos de desespero. Fui em direção aos latidos. Era uma fêmea de aproximadamente uns três meses. Foi abandonada. Quando me viu, parou de latir, veio em minha direção abanando o rabinho de maneira veloz num sinal de alegria. Acomodou-se entre os meus pés e me olhou de modo implorativo, como se me dissesse: “Ainda bem que você chegou para me salvar”. E foi isso mesmo que aconteceu.
Tão logo a vi, pensei de imediato na minha amiga Wanessa, cujo coração é cheio de amor pelos bichos: “Ela certamente encontrará uma acomodação para esta cachorrinha”. No meio da mata, liguei para ela e enviei um vídeo curto do que havia encontrado. Em vez de buscar abrigo para a cachorrinha, Wanessa, que é bióloga, resolveu adotá-la e assim usufruir da companhia dos animais que já possuía: Patrick, Lelo e Antônio, respectivamente um cachorro e dois gatos. Patrick foi embora da vida em outubro do ano passado. Teve vida longa e foi bem-amado.
O nome “Júlia” surgiu quando eu estava a caminho do carro com a cachorrinha nas mãos para levá-la à casa da minha amiga. Encontrei um casal passeando no parque com duas filhas: a mais nova, ainda bebê, estava nos braços da mãe, a mais velha, de uns quatro anos, dentro de um carrinho, que era empurrado pelo pai. Ao me ver, ele disse: “Filhinha, olha que lindo o cachorrinho”. Parei para que a menininha visse o animalzinho. Contei ao casal a situação em que encontrara Júlia, que até aquele momento não tinha nenhum nome.
Toda graciosa e com voz de anjinho, a menina me perguntou o nome da cachorrinha, respondi-lhe que ainda não tinha. Pedi uma sugestão, e ela sugeriu “Júlia”. Nome que a Wanessa aceitou depois que lhe contei que ele fora dado por uma garotinha.
Sinésio Dioliveira é jornalista