Os Estados Unidos não seriam o mesmo país não fosse Henry Kissinger. Mais: o mundo inteiro foi influenciado por esse judeu nascido na Alemanha e cuja família migrou para a América quando Adolf Hitler já estava bem perto de expandir sua crueldade ao mundo, em 1938.

Kissinger morreu em sua casa no Estado de Connecticut (EUA), nesta quarta-feira, 29, aos 100 anos. A causa não foi divulgada e o funeral nesta quinta, 30, será reservado à família para, depois, haver uma cerimônia aberta em Nova York.

Ele foi um dos mais importantes nomes da construção da diplomacia na conturbada segunda metade do século passado. Como conta matéria da Folha de S.Paulo, dois fatos banais ajudam a dar ideia de como Kissinger era ao mesmo tempo inteligente e hábil: nascido na alemã Furth e sempre tendo forte sotaque germânico, se tornou o principal representante dos EUA, uma sociedade autocentrada; sendo judeu, foi a eminência parda do governo de Richard Nixon, presidente que foi considerado antissemita.

Em 1943, quando naturalizou-se americano, lutou no Exército de sua nova pátria contra os nazistas de sua antiga nação, na Segunda Guerra Mundial. Atuou sempre no setor de inteligência, onde sua fluência em alemão era apreciada.

Após a guerra, iniciou uma carreira acadêmica com bacharelado em Ciência Política em Harvard, em 1950. Lá também cursou mestrado e doutorado, cuja tese versou sobre “paz, legitimidade e equilíbrio”.

Foi o começo de uma relação estreita com a política, sendo admirado por republicanos e democratas. Colaborou com o governo de Dwight D. Eisenhower (presidente dos EUA de 1983 a 1961) e se aproximou de Nelson Rockefeller, da ala mais liberal do Partido Republicano. Rockefeller tentou a presidência, mas sempre perdeu as prévias do partido, duas vezes para Richard Nixon, que, mesmo com toda a animosidade formada, chamou Kissinger para assessorá-lo na Casa Branca, em 1969.

De Eisenhower até Gerald Ford, em 1977, Kissinger sempre esteve no Conselho Nacional de Segurança, chegando a secretário de Estado com Nixon em 1973 (o primeiro a ter nascido fora do país), cargo em que foi mantido pelo sucessor Ford, depois de o caso Watergate levar o presidente à renúncia.

Nos oito anos em que ditou o modo como os EUA lidavam com o mundo, Kissinger estabeleceu o império da “realpolitik”, conceito genérico que contrasta com o do idealismo, e realizou operações diplomáticas inimagináveis para um governo conservador, como o de Nixon, num ambiente de plena Guerra Fria entre capitalismo e comunismo.

Em 1973, foi laureado com o Prêmio Nobel da Paz, pelo acordo para pôr fim à Guerra do Vietnã. Na América Latina, especialmente, Kissinger foi e ainda é alvo de muitas críticas, por seu apoio às ditaduras. Nos anos 70, ele comandou a desestabilização de governos como Chile, Uruguai e Argentina, colaborando com os militares para os golpes à democracia. Em relação ao Brasil, uma nota importante foi seu apoio ao programa nuclear dos governos dos generais.