Deputado lança livro sobre a propriedade urbana em Goiânia e critica cobrança de impostos, como o IPTU, sem que o contribuinte veja o retorno do que paga

Foto: Fernando Leite / Jornal Opção

Antes mesmo de ter seu primeiro mandato, Francisco Júnior foi um dos principais nomes da elaboração do atual Plano Diretor de Goiânia, como secretário municipal de Planejamento Urbano de Iris Rezende (PMDB). Era o primeiro mandato do peemedebista depois de duas grandes derrotas políticas – a perda da eleição estadual para Marconi Perillo (PSDB), em 1998, e o fracasso na reeleição ao Senado, em 2002. O jovem auxiliar foi peça importante na boa avaliação que a gestão teve, levando o veterano prefeito à recondução à cadeira do Paço com facilidade.

Dez anos depois, a situação mudou totalmente. Francisco Júnior, que havia se elegido vereador pelo PMDB em 2008 e se tornado presidente da Câmara de Goiânia, deixou o partido logo depois de obter uma vaga na Assembleia Legislativa. Pelo PSD, foi reeleito deputado em 2014 e, dois anos depois, candidatou-se a prefeito tendo seu ex-líder político como adversário. Iris ganhou novamente, mas Francisco saiu maior do que entrou das eleições municipais. O próximo passo na carreira política está estabelecido: “Se eu for candidato no próximo ano, será à Câmara dos Deputados”. Ele não esconde o desejo de estar em Brasília para discutir pautas ligadas à questão da família e da defesa da vida, temas prioritários de sua base, ligada à Igreja e à Renovação Carismática Católica (RCC).

À defesa da vida junta-se a “defesa da qualidade de vida”. A outra prioridade do parlamentar são questões ligadas ao meio ambiente, às cidades e ao planejamento urbano, que foi o eixo de sua dissertação de mestrado. Com base nela o deputado lançou o livro “A função social da propriedade urbana em Goiânia” (Editora PUC Goiás), no Palácio das Esmeraldas, na quinta-feira, 7. Sobre sua obra e vários outros temas, Francisco Júnior concedeu, ao Jornal Opção, a entrevista que se segue.

Alexandre Parrode – O sr. foi secretário municipal de Planeja­mento Ur­bano e está lançando um livro que questiona a função social da pro­priedade urbana em Goiânia. Qual é o enfoque que tem sua publicação?
O livro define a função social e começo fazendo um histórico disso, do planejamento urbano, de forma bem acadêmica. Para a segunda parte do livro, tentei atualizar todos os dados, tentando o que tinha de mais recente. É uma coisa difícil no Brasil e, para um livro científico, é preciso usar dados oficiais. Nesse sentido, muita coisa mais recente é ainda de 2010 ou de 2012. Sobre o planejamento em Goiânia adoto um tom mais crítico, avaliando o que deu certo e o que falta. Por fim, tomo dois estudos de caso. Um deles é sobre a trajetória do episódio do Parque Oeste Industrial ao Residencial Real Conquista, que foi objeto de minha dissertação. Faço uma atualização e defendo que, se o Plano Diretor de 2007 tivesse sido de fato implantado, situações como aquela não voltariam a ocorrer, por conta das ferramentas que hoje existem.

Na verdade, eu já havia até mesmo desistido de publicar esse livro – demorei bastante, a intenção era ter publicado ainda antes da campanha para prefeito –, mas a PUC [Pontifícia Universidade Católica de Goiás], mas naquele momento estávamos no auge de uma infestação por Aedes aegypti. Minha hipótese levantada foi de que, se as áreas de Goiânia cumprissem sua função social, não teríamos epidemias de dengue e outras doenças provocadas pelo mosquito. Trato da dificuldade da fiscalização das residências e toco em outro problema sério da capital, que é a gestão dos resíduos, sejam orgânicos, sólidos ou de construção. Isso também é uma questão de função social. Há uma crise particular da propriedade. As pessoas não podem ter poder absoluto sobre ela, mas, sim, têm de ter responsabilidade sobre o que têm e administram.

Faço um paralelo entre planejamento e gestão. Goiânia é uma cidade planejada, mas por que tem tantos problemas? Porque não tem gestão. Gestão e planejamento têm de conversar e acontecer em conjunto, senão não adianta ter boa ideia.

Augusto Diniz – O maior problema do lixo e dos resíduos sólidos em Goiâ­nia vem da gestão ou do planejamento?
As duas coisas, porque o que foi planejado não foi cumprido. E não só em Goiânia: temos uma legislação federal sobre o tema [Plano Nacional de Resíduos Sólidos] que está completamente ignorada, de prazos descumpridos, com prorrogação e tudo. Ou seja, há um descompasso total. Há uma falta de eficácia desde a educação. Qual programa educacional está preparando as famílias para isso? Curitiba é elogiada hoje por seu alto índice de coleta seletiva e reciclagem, mas têm quarenta anos que eles trabalham esse tema. Em Goiânia, o que há, no máximo, é lixeira colorida, que ninguém respeita e que ninguém estimula o uso. Parece algo apenas para dar satisfação, não há um programa educacional eficaz e comprometido. É possível, também, que a gestão aja por meio do bolso: há uma ONG que troca material reciclável por alimentos. Isso poderia ser apoiado pelo poder público em diversas esferas.
Hoje se pensa muito em aumentar impostos, como o IPTU, em subir a arrecadação. Porém, não se pensa em otimizar o gasto do que se arrecada. Nossa legislação tributária precisa ser revista – e é uma crítica que faço em meu livro –, não é só questão de arrecadar mais ou menos, mas em que e para que arrecadar, de modo a que se pense até em que situação seria melhor não arrecadar tanto, para gerar outros tipos de negócio. Isso dá para fazer, inclusive, na questão dos resíduos, porque, muitas vezes, o dinheiro arrecadado é usado para separar o lixo depois; ora, se o lixo já chega separado não se terá esse gasto e será possível distribuir o benefício a quem está ajudando a economizar.

Elder Dias – A Prefeitura de Goiânia está usando drones para verificar o avanço na área construída dos lotes para, assim, cobrar mais IPTU. Foi um “jeitinho” legal que arranjaram para aumentar a arrecadação. Só que o mesmo drone poderia estar sendo usado para verificar se os terrenos estão cumprindo a norma de permeabilidade do lote, de pelo menos 30%. E melhorar a drenagem urbana é algo fundamental para Goiânia. Isso poderia ser feito?
Eu penso que são a ordem e a motivação que estão erradas. Não posso pagar meu IPTU mais caro porque fiz um “puxadinho” sendo que o bueiro da minha rua continua entupido. E isso sem que ninguém tenha ido explicar a relação que teria entre eu ter impermeabilizado meu lote com aquele bueiro entupido.

Não me lembro de valor, mas posso citar a taxa de regularização de imóveis em Goiânia, em termos de aprovação de projeto e regularidade. Quem vai na Secretaria de Planejamento Urbano para apresentar e aprovar o projeto de sua casa é uma minoria escandalosa. O costume é de contratar o mestre de obras para fazer a casa ou reforma-la. Na época em que fui secretário da pasta, fizemos muito com um programa – que deve existir até hoje – pelo qual oferecíamos ao cidadão que nos procurava várias plantas de casa, desenhadas e aprovadas por arquitetos, e mesmo com previsão de ampliação, já que o puxadinho é de nossa cultura goiana.

A Prefeitura não tem o controle formal dos projetos aprovados, age por denúncia e por controle de imagens. No fim, há um controle financeiro, tributário, mas não da função dessa propriedade para a cidade. É preciso dar clareza ao cidadão do benefício que ele tem e isso não tem sido feito.

Alexandre Parrode – Como faz para resolver os problemas mais latentes da gestão em Goiânia? Por exemplo, o prefeito Iris Rezende (PMDB) apresentou um projeto de taxa do lixo, para cobrar pela coleta. Segundo a Prefeitura, não há dinheiro para o serviço.
Dinheiro há, mas é uma ques­tão de prioridades. As prioridades da Prefeitura não combinam com as prioridades da sociedade. O gestor está pensando em pagar bancos, dívidas, funcionários, ou seja, não está com a mesma linha de prioridades. Isso é um problema sério. É preciso dialogar com a sociedade e fazer uma política de regionalização dos recursos. Ou seja, o que é preciso em determinado bairro? Então, é preciso agir em cima de tal e tal demanda. O cidadão tem de perceber, senão não tem sentido. O projeto da Prefeitura, em termos de benefícios, tem de ficar claro para o cidadão, em relação ao que ele paga em tributos.

Elder Dias – Mas esses projetos não acabam ficando só no papel?
Este é o problema: a distância do planejamento em relação à gestão. Isso é planejamento. O que falta é a gestão trabalhar em cima do planejado.

Augusto Diniz – O IPTU tem causado, nos últimos anos, grandes crises entre a Câmara e o Paço. Por que isso ocorre? E por que o IPTU progressivo não sai do papel?
Hoje, a crise maior da Câma­ra com a Prefeitura, a meu ver, é política. Não é nem tanto a questão do IPTU em si, mas, de fato, existe um receio por parte dos vereadores em relação a tudo relativo a aumento de imposto, porque o efeito do último reajuste do IPTU foi devastador nas votações dos vereadores da legislatura passada e criou uma marca muito profunda na imagem deles, tirando a eleição de muitos e trazendo muita dificuldade a quem conseguiu retornar. Os vereadores estão assustados e não está havendo diálogo suficiente com a sociedade para dar clareza ao que está ocorrendo. O cidadão não vê benefício ao pagar imposto, só vê prejuízo moral. Então, não aguenta. É preciso cortar na carne e mostrar para a sociedade de onde vem e para onde está indo o dinheiro dos impostos, em forma de benefícios.

Marcelo Mariano – O sr. pretende dar um exemplar de seu livro ao prefeito Iris? E, caso afirmativo, espera que ele o leia?
Espero, sim. A propósito, eu já pedi audiência, inclusive para convidá-lo para o lançamento do livro. Ainda não me deram uma resposta, mas, se isso acontecer…

Elder Dias – Como ficou sua relação com Iris após a eleição municipal?
Não o encontrei em particular, apenas ocasionalmente em alguns eventos, quando o cumprimentei. Mas a forma com que conduzi minha participação na campanha foi muito respeitosa, não ataquei a imagem de qualquer pessoa em momento algum. Apenas fiz críticas, antes durante e depois, àquilo que considero que não está atendendo as demandas, em termos de gestão. Sou admirador de Iris por ele chegar a 60 anos de vida pública.

Elder Dias – O sr. considera que Iris esteja cumprindo aquilo que se esperava dele como prefeito?
O grande problema da administração tem sido o improviso. O que percebo hoje, particularmente, é que Iris realmente não queria ser candidato, como até chegou a revelar no início da campanha. Acabou eleito pela força de sua imagem.

Alexandre Parrode – Não foi pelo projeto que apresentou?
Iris não apresentou projeto, ofereceu muito pouco. Tanto que repetiu o mesmo discurso, que todos nós conhecemos, de que resolveria tal problema em seis meses, ou faria tal coisa assim que assumisse o mandato. E quando o questionavam como iria resolver, respondia “vou resolver porque sou o Iris”. Historicamente, ele chegou a dar boas soluções. Desta vez, porém, a gente percebe que ele está tendo mais dificuldades, não dá para perceber que esteja conseguindo implementar as soluções que costumava.

Elder Dias – Isso se deve a uma falta de motivação por parte dele?
Eu creio que seja o ambiente político. Por exemplo, Iris não conseguiu ter um líder na Câmara de Goiânia até hoje. Parceiros históricos de outros mandatos – inclusive que estavam na gestão de que participei – não estão com ele agora e sinto que fazem falta. Um Flávio Peixoto [ex-secretário de Governo de Iris em outros mandatos] é uma pessoa que faz muita falta; não estou lá dentro, mas não tenho visto Mauro Miranda [ex-chefe de Gabinete de Iris em mandatos anteriores]; um Iranzinho [Iram Saraiva Júnior, também ex-secretário de Governo de Iris em outras gestões]. São formuladores, que analisavam a gestão. Penso que isso possa estar desequilibrando.

Elder Dias – E como o sr. tem visto o papel da primeira-dama, Dona Iris (PMDB)? Ela realmente tem sido mais influente do que deveria?
Conheço muito pouco Dona Iris. Quando estive mais próximo da gestão, ela não tinha participação nenhuma.

Elder Dias – Será que ela talvez tenha ocupado o espaço vazio deixado por esses líderes que o sr. citou?
Se ocupou, ocupou mal, porque não vemos a gestão acontecendo.

Augusto Diniz – Quando começou a gestão de Iris e os vereadores tomaram posse, criou-se um discurso de haveria um tempo para o prefeito conhecer os novos legisladores para, então, o prefeito perceber qual seria o perfil adequado para ser seu líder na Câmara. Como o sr. vê esse contato da Câmara com o prefeito? O Paço está conseguindo sucesso nessa relação?
Objetivamente falando, pelo que estamos vendo nas votações, não está conseguindo. As votações têm tido uma discrepância muito grande em relação às expectativas do Paço. Se houve um líder de governo na Casa, no mínimo, os projetos sob risco de serem derrotados seriam retirados da pauta e haveria uma nova negociação, com uma articulação política que é normal ocorrer no Legislativo para as questões mais polêmicas. Perdem-se alguns anéis, mas salvam-se os dedos. Vi isso ocorrer quando eu era vereador, ocorre hoje na Assembleia e, com certeza, também na Câmara Federal. Quem tem o benefício de estar na situação tem de assumir também o desgaste, porque a oposição, muitas vezes, pode ser completamente “irresponsável” – entre aspas, assim –, por não ter compromisso com a gestão de forma direta, apenas indireto, pela fiscalização. O que se percebe na Câmara de Goiânia é que não estão estabelecidas a situação e a oposição. Se não há nem situação nem oposição, o que há é confusão. E o prejuízo para a cidade é muito grande.

Augusto Diniz – O que parece é que, do jeito que está, tudo tende a passar a depender de moeda de troca.
Sim, e isso é muito ruim.

Elder Dias – Nada muito diferente, então, em relação ao que anda ocorrendo em Brasília, neste momento. A moeda de troca como forma de fazer política está naturalizada?
Infelizmente isso está muito comum, conceder uma emenda em troca de apoio. É o pior dos mundos, mas é o que percebemos hoje. Mas precisa mudar.

Alexandre Parrode – O caos na saúde municipal está sendo destaque negativo em rede nacional. A justificativa número 1 da administração é a da “herança maldita”. O sr. acredita que a desordem é mesmo culpa da gestão passada, única e exclusivamente?
“Herança”? Mas está tudo em família! Paulo Garcia – que não está mais entre nós e, como pessoa, era um sujeito fantástico – só foi prefeito porque era o vice de Iris. E, quando foi prefeito, exerceu o cargo com um vice do PMDB que está no atual governo municipal, que cuida do planejamento da cidade, que é Agenor Mariano [secretário de Planejamento Urbano]. Paulo foi prefeito tendo, como secretário de Saúde um filiado ao PMDB [Fer­nan­­do Machado], durante todo o tem­po. Da mesma forma ocorreu na Secretaria de Obras e em outros órgãos. Portanto, não tem como falar em “herança”: ficou tu­do dentro de uma mesma coligação que está aí desde 2009. Em um determinado momento, hou­ve um rompimento em termos, porque ninguém foi demitido.

Alexandre Parrode – Sebastião Pei­xoto ficou na Agência Municipal de Turismo e Lazer (Agetul) até praticamente o fim do mandato de Paulo Garcia, apoiou Iris na eleição e agora está no Imas [Instituto Munici­pal de Assistência à Saúde e Social dos Servidores Municipais de Goiânia].
Há um grupo significativo que está na Prefeitura desde 2005.

Elder Dias – A última ruptura que teve na gestão, de fato, foi com a saída da equipe do então prefeito Pedro Wilson (PT), no fim de 2004, que perdeu a reeleição exatamente para Iris Rezende.
Sim, foi quando houve o último esvaziamento total da administração da área técnica.

Elder Dias – O sr. participou da­quele mandato de Iris, como secretário de Planejamento. Foi nessa gestão que foi aprovado o loteamento que se tornaria o Residencial Orlando de Morais e, salvo engano, também o Jardins do Cerrado. Mas vamos tomar como exemplo o Orlando de Morais: é um bairro a quatro quilômetros da última aglomeração urbana, que é a região do Campus Samambaia, da UFG [Universidade Federal de Goiás], para o qual o poder público teve, está e estará tendo de levar toda uma infraestrutura básica, desde linha de ônibus a escola, desde posto de saúde a rede de esgoto. Criou-se um novo bolsão, por assim dizer, que acaba por gerar mais gastos ao próprio poder público. Isso não é uma contradição para uma gestão que preparava um novo Plano Diretor? Como um loteamento como esse pôde ser aprovado?
Esse tipo de ação, como o que ocorreu no Orlando de Morais, vão na contramão do Plano Diretor de 2007, que criou a figura do princípio da contiguidade. Ou seja, para um novo loteamento não pode criar um vazio urbano, é preciso que esteja fazendo divisa com outro que esteja com uma ocupação de pelo menos 30% de total de lotes. A área técnica da Secretaria tenta agir com uma visão de gestão pública, há um grupo técnico que pensa dessa forma. Por outro lado, temos um prefeito que pensa ao contrário, historicamente. Quando se criou a Vila Mutirão, não havia nada próximo de lá. Iris tem uma visão de que, fazendo isso, está “puxando” o desenvolvimento para aquela região. É uma linha de pensamento, não deixa de ser, mas obviamente aumenta e muito o custo da cidade.

“Plano Diretor atual nunca foi implantado de fato”

Elder Dias – Uma linha de pensamento que está anacrônica há pelo menos umas três décadas, diga-se.
Mas não se pode dizer que seja novidade nem surpresa esse pensamento da parte dele. Mas vou além: os bairros da região noroeste – Jardim Curitiba, Bairro Floresta, Jardim Liberdade etc. – só agora foram regularizados, porque, em sua origem, não foram criados dentro dos princípios da regularidade, cumprindo todas as normas. No caso do Orlando de Morais, Santa Fé e outros bairros da mesma época, eles foram aprovados ainda na legislação anterior, colocando ao empreendedor a responsabilidade sobre a infraestrutura básica – o que não havia –, ficando para o município a pavimentação. Aproveitou-se, também, o programa Minha Casa Minha Vida, que gerou as condições para construir as casas. A inauguração de uma das etapas do Jardins do Cerrado contou com a presença do ex-presidente Lula (PT).

Enfim, temos um grande problema: o Plano Diretor de 2007, na verdade, não foi implantado. Para ter ideia, o novo plano revogou a Lei de Parcelamento da época e não foi feita outra até hoje – e era necessário fazer 40 novas leis em até 180 dias. Quando eu saí da Câmara [no fim de 2010, eleito deputado estadual], deixei 10 aprovadas e mais 3 para ser votadas. Depois disso, foram poucas as leis estabelecidas pelo Plano e que foram efetivadas.

Para ter ideia de como isso é grave, nós não temos uma legislação ambiental, por exemplo. Goiânia quer ser uma “cidade verde”, mas não tem lei para isso. Assim como não temos código de parcelamento do solo, nosso código tributário está completamente defasado. Como cidade jovem, tínhamos de dar exemplo, tínhamos de já ter regulamentado questões da nova realidade dos aplicativos, como o Uber. Mas nós não conseguimos atualizar nem o que ficou para trás, infelizmente.

Foto: Fernando Leite / Jornal OpçãoEntrevist

Augusto Diniz – Qual é o real poder de influência que o Codese [Conselho de Desenvolvimento Econômico, Sustentável e Estratégico de Goiânia] tem na discussão das políticas públicas habitacionais de Goiânia?
É uma pergunta para quem está de fora. O Codese reúne uma série de entidades que já existiam e que trabalhavam de sua forma, cada uma em seu setor. Acho o Codese uma boa ideia, porque é necessário conversar com a sociedade civil organizada. Essa conversa tem de ser transparente. O Codese, nesse sentido, se dispõe a preparar e trazer estudos que eventualmente podem ser aplicados pelo município. A influência que o Codese tem de ter, em minha opinião, é de dar ampla transparência aos interesses.

Augusto Diniz – Esse debate do Codese com a Prefeitura, hoje, é transparente?
Eu não estou lá para poder lhe responder. O que sei é que há as reuniões. Mas não estou participando. O que fico sabendo é por meio de amigos mais envolvidos diretamente, de um lado e de outro. E o que sei é que elogiam a disposição de Iris em ouvir. Por outro lado, o ex-prefeito Paulo Garcia era um excelente ouvinte, mas depois não passava à execução.

Alexandre Parrode – Uma das críticas de várias entidades – como o CAU [Conselho de Arquitetura e Urbanismo de Goiás] e outros – não tão alinhadas ao setor da construção civil é de que o Codese assumiu o lugar do Compur [Conselho Municipal de Política Urbana], que na prática não existe mais.
Isso é um problema, porque, para mim, o Compur é fundamental. Dois fatos ruins que ocorreram após a aprovação do Plano Diretor. Quando fui secretário, valorizei bastante o Compur, foi ao conselho que eu primeiramente apresentei o Plano Diretor. As políticas urbanas precisam passar por lá. Ele tem de dar as diretrizes, precisa acolher as diretrizes de política urbana. Por outro lado, essas diretrizes deveriam ser executadas por algo que foi criado pelo Plano e logo depois foi “descriado”, que é o Instituto de Planejamento. Quando saímos da pasta, deixamos um embrião do instituto dentro da Seplanh [Secretaria Municipal de Planejamento Urbano e Habitação], que deveria se tornar o instituto. A perspectiva é de que o presidente do Instituto de Planejamento seria indicado pelo prefeito, sabatinado pela Câmara e, se aprovado, passasse a ter um mandato. Seria fundamental que isso acontecesse, para que o presidente do instituto cumprisse as diretrizes. Tendo um mandato, nem o prefeito poderia tirá-lo. O corpo de aconselhamento do Instituto de Planejamento seria o Compur, justamente para evitar que houvesse uma relação mais ampla com a sociedade. Se fosse assim, o Codese, no caso, seria muito bem-vindo para ter uma cadeira no Compur. Creio que os estudos do Codese seriam também bem-vindos ao Compur, mas o foro para tomar as decisões precisaria ser o próprio Compur, por sua estrutura paritária.

Marcelo Mariano – A Assembleia Legislativa de Goiás (Alego) foi eleita a casa parlamentar mais eficiente do Brasil, em um levantamento da “Folha de S. Paulo”. A que se deve esse sucesso?
A Alego vive os problemas que a classe política tem, mas possui uma eficiência legislativa significativa. É uma Casa, nesse sentido, muito democrática. Todo deputado, de qualquer partido, seja da situação ou da oposição, temos todos muita liberdade para debater com a sociedade, para fazer audiências públicas e apresentar propostas. Os projetos andam e são aprovados. É bem verdade que muitos deles são vetados, mas isso já é uma questão com o Executivo. A Assembleia é reconhecida por ter uma boa Procuradoria, competente, envolvida. Falando como deputado, o que preciso para dar suporte a meu trabalho, a assessoria da Alego me oferece com uma competência muito grande. Isso produz projetos de ótima qualidade. Depois, há uma questão política de transformar esses projetos em leis e, mais adiante, que essas leis surtam efeitos reais na sociedade.

Alexandre Parrode – Como o sr. avalia a relação da Assembleia com o governo de Marconi Perillo (PSDB) neste segundo mandato?
Um segundo mandato no Executivo é diferente. Se no primeiro mandato, como temos o instituto da reeleição, o governante pensa em se reeleger, no segundo quer pôr ordem na casa para conseguir sair sem problema – tem uma máxima de que, quando se ocupa uma função pública, a pessoa sai da cadeira, mas a cadeira não sai da pessoa por pelo menos 20 anos (risos). Nesse aspecto, o governador Marconi foi muito austero, responsável e cuidadoso. Assumiu batalhas muito significativas e teve pulso para bancá-las, no que foi ajudado pela experiência e por sua postura. Ele conseguiu se antecipar à crise, o que garantiu ao Estado certa saúde financeira para que não acontecesse o que hoje vemos em outras unidades federativas.

Por outro lado, o governo faz de tudo para manter sua visão de desenvolvimento e crescimento. Então, precisa satisfazer a sociedade no sentido de buscar apoio para dar continuidade ao projeto político, para que aquilo que é feito de forma responsável, mas que gera desgaste, não seja um chicote contra si mesmo. Marconi é um malabarista para fazer com que o Estado não pare e, pela experiência que tem, está tirando leite de pedra para que tudo continue funcionando.

Alexandre Parrode – Como o sr. avalia a privatização da Celg e, agora, a proposta do governo de colocar pedágio em 13 trechos de rodovias estaduais?
Sobre a Celg, eu defendo que o Estado seja menor. Temos de ter regras claras e investir na capacidade de fiscalização do Estado, mas ele não tem de competir. Não sou radical em relação a não privatizar, mas sim em critérios para a privatização. O Brasil avançou depois das privatizações, em termos de criar condições de tecnologia e produção para competir no mercado globalizado. Nesse aspecto, foi importante. Mas é preciso que haja controle, por parte do Estado.

Na questão da concessão das rodovias, apenas nos foi apresentado, em forma de palestra, como seria feito esse controle, pela Fundação Getúlio Vargas (FGV), mas não foi nada escrito. O que os deputados estão esperando, para poder avaliar, é o que estará escrito na lei. A privatização é importante, principalmente depois que houve a concessão nas BRs, porque, à medida em que nelas há o pedágio, as rodovias estaduais passam a ser alternativa para a “fuga” de quem não quer pagar. Se não tiver a mesma gestão, as estradas não vão aguentar o tráfego.

Elder Dias – Politicamente, apesar de não chegar ao segundo turno, a campanha para prefeito de 2016 acabou sendo boa para o sr., porque, na reta final, sendo o candidato que mais subiu nas pesquisas de intenção de votos, terminou com uma avaliação muito positiva junto ao eleitor. Isso o cacifa para as próximas eleições proporcionais. O sr. é mesmo pré-candidato a deputado federal?
Se eu for candidato, serei à Câmara Federal, não tenho pretensão de reeleição a deputado estadual.

Elder Dias – Por quê?
Fiz uma discussão com vários setores que me apoiam e com quem dialogo. A primeira condição para alguém se lançar é ser candidato de alguém. Eu sou um representante e meus representados têm de querer que eu me candidato. Estarei terminando oito anos na Assembleia Legislativa e tenho uma satisfação muito grande com vários projetos que apresentei e que considero que serviram para avançar naquilo que considero prioridades.

Marcelo Mariano – E quais são essas prioridades?
Resumo em dois pontos: a defesa da vida e a defesa da qualidade de vida, em todas as situações. Nesse sentido, conseguimos avançar, por exemplo, na legislação em relação à pessoa com deficiência e na questão do meio ambiente – há uma lei criando o Selo Verde e fui o relator do Tesouro Verde, que vai colocar Goiás no cenário internacional do advento do crédito de floresta, pois tem um potencial muito grande com o Cerrado. Presidi a Comissão de Agricultura e Pecuária, quando pude mergulhar no mundo do agronegócio e, depois, fui para a Comissão de Finanças e Tributação, conseguindo me aprofundar na realidade financeira do Estado. Estou satisfeito com o que foi possível produzir como deputado estadual.

Neste momento, existem demandas em Brasília que são um convite para estar lá. O País está em uma crise muito profunda de liderança e de ética. Foi isso que me trouxe para a política, quero colaborar. Não ajudei a fazer o problema, mas quero ser parte da solução. Se eu sou soldado na política, a guerra está acontecendo em Brasília. O que me motiva é tentar dar minha contribuição. Tenho uma conduta ética, moral e de transparência que me deu a condição de passar por todos os cargos que ocupei mantendo uma história e uma imagem condizentes.

Também me move para Brasília uma questão muito particular, que é a defesa da vida. É uma discussão internacional para a qual, democraticamente, precisamos ter todos os lados envolvidos. É preciso discutir a ideologia de gênero sob o prisma de quem é a favor e de quem é contra, pois é uma polêmica que cresce; também questões com relação a aborto, eutanásia, suicídio assistido. São situações que estão vindo da Europa para cá e demandam muita discussão. Da mesma forma, quero estar dentro das questões da qualidade de vida e do urbanismo, debater os estatutos da Cidade e da Metrópole, a legislação de parcelamento e o problema nacional da água. É um trabalho intenso que tenho nessa área e não vou abrir mão de ser o relator do Plano Diretor da Região Metropolitana na Assembleia. São matérias muito caras para mim, porque estudei muito isso e me dedico muito a isso. Se tudo der certo, corre o risco de ainda a próxima legislatura discutir a reforma das reformas, que é a tributária. Quero estar lá por tudo isso.

Augusto Diniz – Será uma eleição diferente para o sr., pois, caso não seja eleito, não terá mandato, ao contrário das tentativas em 2010, para deputado estadual, e 2016, para prefeito. Não é arriscar um novo mandato quase certo aqui por um não tão certo assim em Brasília?
Ou a gente faz o que acredita ou não faz. É arriscado, sim, tenho de crescer significativamente minha votação em todo o Estado. Vejo como positivo o fato de eu nunca ter tido apoio financeiro, já que será uma novidade para outros. Acho que, nesse sentido, a campanha mais barata me nivela com os demais, pois sempre trabalhei sem dinheiro para isso. Mas penso que ou se faz política por ideal ou não faz sentido. Claro que posso sem mandato – embora não considere essa hipótese (risos) –, mas não vou ficar sem participar da política. Por outro lado, tenho minha profissão e meu sustento independentes de mandato.

Marcelo Mariano – Seu nome pode ser colocado entre os cogitados para a vice da chapa que será encabeçada José Eliton (PSDB)?
Citaram meu nome duas vezes nisso, mas o PSD decidiu discutir essa questão apenas ano que vem. Então, primeiro vem a decisão do partido; se for ofertada uma vaga na chapa majoritária ao PSD, nossa prioridade é a de senador, cargo para o qual nosso nome é Vilmar Rocha [presidente estadual do PSD e secretário estadual de Cidades e Meio Ambiente], que colaborará muito com o País se for eleito. Enfim, na política tudo pode, mas, em termos de fila de prioridades, além de decidir tudo no próximo ano, queremos Vilmar Rocha na chapa majoritária.

Alexandre Parrode – Em 2014, o PSD foi fundamental na reeleição do governador, teve um candidato na chapa majoritária [Vilmar Rocha, ao Senado] e começou a atual legislatura na Assembleia com cinco deputados. Só que o partido vai terminar o próximo ano com apenas um deputado na Casa – justamente o sr., já que Lincoln Tejota vai para o Pros. O PSD perdeu importância na base aliada?
Faço uma avaliação diferente. Se olhar de modo objetivo, você tem razão. Mas, avaliando caso a caso, são situações completamente isoladas. Os dois primeiros a sair do partido – Diego Sorgatto e Lissauer Vieira [ambos hoje no PSB] – são deputados regionalistas. Lissauer é do Sudoeste e era ligado a Heuler Cruvinel [PSD, deputado federal]; Diego é da região do Entorno do Distrito Federal e muito ligado ao prefeito de Luziânia, Cristóvão Tormin (PSD), seu primo. Ambos entraram em desacordo com seus parceiros políticos e saíram do partido. Foram perdas significativas, mas por questões pontuais, por problemas regionais.

Lincoln Tejota vai sair para um projeto pessoal – o de assumir o diretório do Pros em Goiás – e, em minha opinião, se ele ficasse poderia ser presidente do próprio PSD, não precisaria sair. Mas entendeu que é uma questão de oportunidade para ele e o grupo que o apoia.
Já o caso do deputado Virmondes Cruvinel teve um problema comigo, porque eu ganhei as prévias do partido para a Prefeitura de Goiânia – e de forma “muito bem ganhada”. Ele ficou magoado e achou que o melhor seria sair do PSD.

Augusto Diniz – Como está sua relação com Virmondes hoje?
Normal. Apesar de ter ocorrido esse fato, não foi um atrito pessoal, comigo ou com ninguém. Tanto é que, depois, na Assembleia, foi criado o G-6, um grupo de deputados da CCJ [Comissão de Constituição e Justiça] que se colocou contrário a certas questões, e dele participávamos Lissauer, Virmondes e eu. Não houve estremecimento de relação política ou de amizade, mas realmente teve um prejuízo muito grande ao partido, por questões pontuais. Ninguém saiu por ter problema comigo, ou com Vilmar, ou com Thiago [Peixoto, deputado federal].

Alexandre Parrode – Isso enfraquece o partido para disputa por vagas na chapa majoritária?
Do ponto de vista da bancada estadual, pode se dizer que sim; mas continuamos como o segundo maior partido da base aliada e com um número expressivo de prefeitos e vice-prefeitos. Em Brasília, somos um dos cinco maiores partidos em tempo de TV e também em fundo partidário, que agora passou a ter importância ainda mais significativa. O PSD continua um partido muito interessante para qualquer aliança.

Augusto Diniz – O sr. apareceu com um perfil de prefeito inovador, com uma ideia de uma cidade avançada, coletiva, inteligente e cosmopolita. Não teme que seja prejudicado política e eleitoralmente por algumas de suas proposições em defesa da vida e da família em que o sr. de fato acredita?
Quem concorda com minhas ideias se sente representado; quem discorda se sente provocado a debater comigo. As questões que mexem com a vida costumam ser apaixonadas. Sou radicalmente contra o aborto e uma vez, quando ainda era vereador, uma jornalista me fez uma pergunta que achei extremamente deselegante. Ela disse: “O sr. é uma revelação da política, mas como a sociedade vai passar a enxergá-lo, com posicionamentos tão retrógados?”. Eu respondi: Você acha que defender a vida da criança na barriga da mãe como algo retrogrado, eu não. São teses”. E não são teses religiosas, mas filosóficas, sociológicas, que deveriam estar superadas, mas que estão voltando. Tanto quanto o aborto, na Europa já se discute suicídio assistido, eutanásia, ortotanásia.

Tenho uma postura moderna em relação à gestão. Com relação a valores, penso que a sociedade brasileira ainda está em um ritmo conservador. Há números para todos os lados, mas pouca discussão. E acho que precisa ser muito mais discutido, de forma verdadeira. Tenho três filhos e, quando eu falo da questão da inclusão da ideologia de gênero no BNCC [Base Nacional Comum Curricular], eu coloco o que considero função da escola ensinar e o que é função da família. Não quero ser refém da decisão de outros em questões que vão além do conteúdo programático, que são uma questão de vida. As manifestações em torno de temas assim vão acontecer, mas, mais importante do que isso, são as discussões democráticas.