Itaney Campos: “Nosso sistema é seguro e não vejo riscos para o processo eleitoral”
04 setembro 2022 às 00h00
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O desembargador Itaney Francisco Campos assumiu o Tribunal Regional Eleitoral (TRE-GO) em 29 de abril. Com a experiência de quem, como juiz, acompanha há décadas o processo das eleições, ele confessou que sentia certo temor pelo desenrolar do próximo pleito, por conta dos questionamentos injustificados às urnas eletrônicas e ao sistema como um todo.
Nas últimas semanas, essa preocupação arrefeceu. O motivo? A reação da sociedade civil, por meio da carta pela democracia, assinada por mais de 1 milhão de pessoas e lida em São Paulo, na Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (USP); e o acolhimento, pelos ocupantes dos principais cargos nos três Poderes, do discurso de posse do ministro Alexandre de Morais como presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) – diante do maior crítico das urnas eletrônicas, o presidente Jair Bolsonaro (PL).
Itaney Campos recebeu a equipe do Jornal Opção para conceder entrevista em seu gabinete na sede do TRE, em prédio erguido na construção de Goiânia para comportar um tribunal eleitoral, advento que surgia, em 1932, praticamente junto à nova capital de Goiás. Na comemoração dos 90 anos da Justiça Eleitoral, seu comandante no Estado falou sobre como prevê que ocorra as próximas eleições.
Além de um dos mais respeitados desembargadores do Estado, Itaney Campos também é membro da Academia Goiana de Letras (AGL) desde 2016. Como poeta e contista, tem vários livros publicados e cita também alguns de seus autores prediletos: Carlos Drummond de Andrade, Fernando Pessoa, Walt Whitman [poeta estadunidense] e Cecília Meireles, na poesia; já na prosa, ele cita o clássico Dostoiévski e, na literatura goiana, Edival Lourenço. “Sempre me surpreendo com a simplicidade e o aspecto fascinante do que ele [Edival] escreve sobre qualquer tema, por mais trivial que seja. É algo que o escritor talentoso possui”, justifica.
A experiência que o Brasil teve ao criar uma Justiça Eleitoral é muito proveitosa
Itaney Campos, presidente do TRE-GO
Elder Dias – A Justiça Eleitoral está completando 90 anos de existência. Quais são os países, além do Brasil, têm tribunais especializados para as eleições?
Na verdade, são poucos, o Brasil é um caso excepcional. Mas a experiência que o Brasil teve ao criar uma Justiça Eleitoral é muito proveitosa. Creio que a especialização, no caso, só ajuda, porque a tendência é aprimorar. A menor permeabilidade evita distorções no processo.
Euler de França Belém – E sobre as urnas eletrônicas, elas estão sendo adotadas por outros países?
Alguns países adotaram, com pequenas variações. A Índia é exemplo, alguns países da Europa Oriental. A questão é que a adoção do sistema eletrônico implica um investimento alto, e o Brasil bancou isso.
Elder Dias – O nível de tecnologia que temos no mundo hoje é alto. Por que são tão poucos os países que adotaram?
Eu acho que teria de averiguar isso mais detalhadamente, o porquê de outros países não terem investido como nós nesse aspecto. Nossa realidade é diferente, somos um país que é um continente e a transmissão eletrônica dos resultados, como fazemos, foi um benefício para o processo e notadamente um sucesso. Com poucas horas depois do encerramento da votação neste “continente”, já temos dados repassados para o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) poder divulgar os que estão sendo eleitos.
Sistema antigo de apuração dos votos era passível de muita distorção e falsificação
Marcos Aurélio Silva – Parece que, no Brasil, existiu um anseio por algo que trouxesse uma transparência e uma segurança maiores do que demonstrava o voto da forma antiga, convencional até então. Hidrolândia, foi a primeira cidade em Goiás e uma das primeiras do Brasil a ter urnas eletrônicas e lá era um lugar que se sabia de histórias de que até gente morta votava.
O processo eleitoral era muito vicioso. Trabalhei com esse sistema antigo de apuração e dou testemunho ocular e vivencial de que era um procedimento passível de muita distorção e falsificação. Era algo completamente inseguro, embora não possamos dizer que toda eleição teria sido fraudada. Mas havia a possibilidade de ocorrer algo assim – falsificar assinaturas, apresentar documento de alguém já falecido etc. –, não tinha como haver um controle rígido do eleitorado. Hoje, está tudo informatizado. Além da transparência, da segurança e da dificuldade – praticamente impossibilidade, eu diria – de fraudes, temos também a agilidade no processo, algo próprio dos sistemas informatizados.
Marcos Aurélio Silva – No sistema impresso, havia também uma insegurança na contagem das cédulas. Se algum candidato não se sentisse satisfeito com o resultado, buscava sempre um recurso na Justiça, para recontagem de votos. Ou seja, a pessoa muitas vezes já sabia que tinha perdido, mas procurava artifícios para causar certas situações. A urna eletrônica também foi um ponto de pacificação nesse sentido?
Sim, a urna eletrônica agilizou e diminuiu a margem de manobras para retardar a declaração e a diplomação de quem havia sido eleito. Consequentemente, reduziu também a possibilidade desse tipo de procedimento. Antes, o sujeito era impugnado como eleitor e tinha de votar em separado. Se não fosse assim e tivesse registro em ata, tinha de fazer recontagem de votos. Era um processo desgastante, que trazia uma situação de instabilidade emocional, sobretudo quando eram pleitos municipais, em que se desenvolvem paixões que causam até risco aos concorrentes. Esse clima de tensão era muito maior quando havia a possibilidade dessas manobras, que se abasteciam de fofocas, ilações às vezes até imaginárias.
Elder Dias – O que o sr., com a experiência de tanto tempo e tantas eleições, viu de mais anedótico durante sua trajetória?
Não me lembro de nada tão inusitado nos últimos tempos, com a urna eletrônica. Com relação ao período das cédulas em papel, da urna de lona, havia histórias, muitas delas recheadas de lendas, de muita imaginação. Posso contar a experiência que tive em Formoso [município do Norte goiano, a 400 quilômetros da capital], onde fui juiz eleitoral. Naquela época, sem sistema de comunicação como hoje, havia seções isoladas. Com esse cargo no interior, então, a gente tinha de percorrer praticamente todas as seções para ver como estava transcorrendo o processo, se estava tudo bem, até porque quem nos auxiliava eram às vezes pessoas mais simples, sem maior vivência no trabalho. Saíamos de Formoso, passávamos por Trombas e íamos até Montividiu [do Norte] e Mata Azul [distrito de Montividiu do Norte], aquela região limítrofe a Campinaçu e Minaçu. Nesses deslocamentos, tinha, por exemplo, um córrego que não dava passagem para o veículo da prefeitura, que nos levava. Então, deixávamos o carro, atravessávamos uma pinguela e pegávamos outro carro, do lado de lá. Era período de chuvas, então não tinha outro jeito. E estamos falando de um município no centro do Brasil, a dificuldade para ter acesso aos locais de votação. Da mesma forma, a urna demorava a chegar. A votação se encerrava às 5 horas da tarde e os votos chegavam 9 da noite, às vezes 10 horas da noite.
Elder Dias – E esse tempo todo dava margem para especulações…
Dava tempo para fofocas, imaginação, questionar o que estaria acontecendo, se não estavam falsificando algo no caminho.
Euler de França Belém – A urna eletrônica é segura e não há notícia de fraude efetiva. Mas está de novo a dúvida colocada, inclusive pelo presidente da República. Como o sr. avalia essa questão?
O que vemos me parece mais um discurso político que, de certa forma, mobiliza o eleitorado e a atenção das pessoas. E é isso que o candidato quer: ser o alvo das atenções, porque quer ficar em evidência. Então, pode até ser um estratagema político para se evidenciar. A questão é que, em se tratando de o candidato ser também o chefe de Estado, isso gera uma situação de pouca credibilidade em relação a instituições oficiais. Talvez, se fosse outro candidato, não geraria esse tipo de problema. Ao se confundir os dois papéis, o discurso me parece muito impróprio, além de não ter qualquer base fática, qualquer base comprobatória, qualquer precedente que o justificasse. É um discurso hoje isolado, superado. Tanto é assim que intelectuais se reuniram em São Paulo, no Largo de São Francisco, e lá fizeram a leitura da carta pela democracia, um manifesto com mais de 1 milhão de assinaturas, reeditando a carta de Goffredo Silva Telles Jr., do período do militarismo [Goffredo leu, no mesmo local, a “Carta aos Brasileiros” em agosto de 1977, exigindo democracia e nova Constituição em plena ditadura]. Ou seja, esse setor esclarecido, que é o “establishment” cultural brasileiro, já afastou qualquer possibilidade de acolher esse tipo de argumento [de desconfiança do sistema eleitoral], reforçando a credibilidade da Justiça Eleitoral. Da mesma forma, os chefes de Parlamentos – o presidente da Câmara dos Deputados [Arthur Lira (pP-AL), o presidente do Senado [Rodrigo Pacheco (PSD-MG)] – dizendo ter plena confiança no processo todo. Por isso tudo, acredito que seja um discurso superado e que não gerará nada mais, a não ser naquelas hostes militantes em que qualquer argumento que se use não funciona.
Elder Dias – O sr. acredita que o discurso do ministro Alexandre de Moraes em sua posse na presidência do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) – enfático na defesa das urnas e presenciado por quatro ex-presidentes e a nata do poder e das instituições do País – foi a pá de cal nesse tema?
“Pá de cal” é uma boa imagem para essa situação. Realmente, estiveram presentes lá os ex-presidentes vivos, à exceção de Fernando Henrique Cardoso – que justificou a ausência por problemas de saúde – e Fernando Collor. Foi um evento histórico, a meu ver, com a presença de praticamente todos os governadores.
Euler de França Belém – Além da defesa das urnas em si, foi muito importante também a defesa que Moraes fez da própria democracia.
Com certeza, ali se extrapolou o mero âmbito da questão eleitoral para se tornar uma defesa do regime democrático. E isso com uma firmeza, uma segurança que demonstrou que o Judiciário – ali estavam todos os ministros do Supremo – está imbuído de defender, dentro da competência dos tribunais, os princípios da democracia. Por isso tudo, esses dois eventos recentes – o dos intelectuais e o da elite dirigente do País – podem ser caracterizados como de grande caráter histórico-político.
O Judiciário é um dos Poderes do Estado e a quem a Constituição destinou a obrigação da efetivação de direitos e de ser seu guardião
Euler de França Belém – Há críticas ao Supremo em relação a um suposto ativismo político do Judiciário. Como o sr. avalia isso?
Não considero que seja ativismo. Volta e meia esse discurso reaparece, de que um Poder estaria invadindo a esfera de outro. Mas o que fez a Constituição de 1988? Ela outorgou ao Supremo a competência para disciplinar e até regulamentar matérias ligadas a direitos fundamentais e sobre as quais o Parlamento não providencia efetivamente a edição de leis e regulamentos para que esses direitos sejam efetivados. O Supremo tem à mão o mandado de injunção, que é um mecanismo constitucional justamente para isso, para efetivação de garantias fundamentais previstas na Constituição, dando efetividade máxima a ela. Ou seja, o Supremo está, nesse caso, no exercício de sua competência.
O Judiciário é um dos Poderes do Estado e a quem a Constituição destinou a obrigação da efetivação de direitos e de ser seu guardião. Portanto, para mim, não há qualquer invasão de atribuições. O Congresso é que precisa se mover e fazer o que deve ser feito, preenchendo esse espaço necessário, porque, caso contrário, o Supremo precisa agir em benefício da cidadania brasileira. Não vejo o Supremo agindo em benefício pessoal quando faz esse tipo de implementação. Por exemplo, em relação à demarcação de terras indígenas existe uma norma constitucional relativa à proteção das minorias, dos povos originários. A propósito, eu até já escrevi uma monografia sobre o tema do ativismo judicial.
Euler de França Belém – No Brasil, a gente se acostumou a ter procrastinação em tudo. Como a Justiça está sendo incisiva ao cumprir a lei, há esse estranhamento, já que no Legislativo há jogo político e negociações muito demoradas, com interferência do Executivo. E então, se depender disso, nada acontece. Ou seja, a Justiça parece estar sendo questionada por cumprir a lei.
Marcos Aurélio Silva – Nesse jogo, o sr. considera as fake news o principal inimigo da democracia hoje?
Talvez eu não dissesse da democracia, mas, pelo menos, de um movimento inerente ao regime democrático. É a questão da desinformação, por meio das fake news, com relação à urna eletrônica, ao processo eleitora e à isenção dos tribunais no exercício de seu papel constitucional. Há notícias falsas que dizem que os ministros [do Supremo] estão sendo parciais, perseguindo, que as urnas eletrônicas não são confiáveis etc. Desfiam argumentos sem base probatória nenhuma. Tudo isso traz uma grave consequência, já que induz a pessoa a uma escolha distorcida, porque fica mal informado. Às vezes, ele deixa de exercer o direito de voto baseado nessa crença de que o sistema não merece fé. Ou seja, há um desestímulo do exercício da cidadania. Para o tribunal, que quer que o eleitorado compareça e exerça seu direito de votar, realmente é uma circunstância que tem de ser combatida. Portanto, não sei se dá para eleger as fake news como principal adversário da democracia, mas é um elemento que perturba bastante o processo eleitoral.
Por outro lado, já há uma contra-argumentação: o TSE tem vários canais que possibilitam checar a veracidade ou não das notícias; a própria imprensa já cumpre esse papel e está empenhada nisso, em sua maioria; as plataformas de redes sociais também se comprometeram a fazer certa moderação e o controle desse material.
Elder Dias – Em 2018, talvez a Justiça Eleitoral tenha sido pega de surpresa pela avalanche de notícias falsas acima do esperado. Agora, para as próximas eleições, como o sr. avalia a preparação para combater esse tipo de ocorrência, que também está aprimorada em tecnologia, como com as deep fake news [fraudes que alteram voz e expressões das pessoas]?
É um perigo. A Justiça Eleitoral se preocupou – e se preocupa – muito com isso, e faz um trabalho de convencimento à imprensa e aos meios de comunicação, no sentido de combater isso, porque, ao cabo de tudo, prejudica a própria mídia, por tomar o espaço da informação séria.
Euler de França Belém – E faz, inclusive, os jornais e a imprensa em geral ficarem correndo atrás disso.
Cria-se um concorrente desleal, disseminado e difuso, que às vezes foge do controle. Por isso, o TSE estabeleceu que as plataformas de redes sociais precisam estar sujeitas a controle. Ou seja, se está estabelecida em um país, precisa se sujeitar às leis do país. Mas é uma situação difícil, porque são redes internacionais.
Marcos Aurélio Silva – Na fase atual da campanha eleitoral, o que é a maior demanda para a Justiça Eleitoral?
Estamos com demandas em relação a propagandas irregulares, mas também, por agora, temos a questão dos registros de candidaturas, conjuntamente com a questão das propagandas do horário eleitoral. Aí, então, vem o pleito em si, com a distribuição de material para o Estado inteiro e a convocação de todos os mesários – são cerca de 60 mil que devem receber essa missão, para trabalhar em mais de 90 zonas eleitorais. Agora o processo é contínuo, com prazos muito curtos – de 24 horas a três dias – e o tribunal mergulha nisso em sequência ininterrupta até que sejam diplomados os eleitos. No momento é isto: registro de candidaturas e fiscalização de propagandas, seja de ofício, seja objeto de reclamação.
Teve agora um candidato a deputado federal que fez uma postagem usando uma máscara de caveira e passando o fio da lâmina de uma faca no pescoço. Um juiz eleitoral viu aquilo e, como dever dele, tomou providências, porque não pode haver propaganda com esse tipo de incitação à violência.
Não se pode confundir liberdade de expressão com liberdade de pregação de violência
Elder Dias – Esse discurso de ódio – que também já foi propagado pelo ex-deputado Roberto Jefferson [então presidente nacional do PTB e apoiador de Jair Bolsonaro, que foi preso] e pelo deputado federal Daniel Silveira [parlamentar bolsonarista, hoje no PTB, que chegou a ser preso, foi condenado pelo STF e recebeu o perdão presidencial] – é sempre tido, por quem o utiliza, como “liberdade de expressão”, ainda que intimide as minorias e quem os incomode. Como o sr. vê esse tipo de posicionamento diante do estado de Direito e de uma parcela considerável da população que o aceita e até o endossa?
Infelizmente, temos pessoas com propostas permeadas de certas doses de algum fascismo, autoritarismo e totalitarismo que têm chance de ser eleitas. Há segmentos que podem querer ser representados por esse tipo de pessoas. O tribunal fiscaliza o conteúdo da propaganda e seu combate, mas é evidente que quem o adotou mostra o perfil de sua personalidade. Ainda que se possa impedir a propaganda, não há como impedir que alguém vote nessas pessoas – até porque elas representam mesmo um setor da sociedade, gente que considera que o Estado precisa ser rigoroso, autoritário, que vê o Estado democrático como “frouxo” e que o País precisa de uma força mais dura. Nesse aspecto, pessoalmente não comungo com esses ideais de Estado, como já tivemos, no militarismo; mas é preciso compreender que há segmentos sociais que querem esse tipo de representante. Porém, não se pode confundir liberdade de expressão com liberdade de pregação de violência, de apologia a ditaduras, de atos de violência, de algo contrário ao regime democrático. A própria legislação não permite isso, ainda que a pregação dos princípios seja possível. Aí está a sutileza, vira uma questão subjetiva: até onde vai a liberdade de expressão? É algo delicado, porque essa liberdade não pode servir para destruir o próprio regime de democracia. É uma avaliação que compete aos tribunais e à sociedade como um todo.
Elder Dias – O professor e pesquisador João Cezar de Castro Rocha falou recentemente, em entrevista ao “Jornal Opção” que é exatamente dessa brecha, que a democracia dá, que os autoritários se aproveitam para erodi-la.
Como dizia Winston Churchill [primeiro-ministro britânico durante a Segunda Guerra Mundial], a democracia é o pior dos regimes, com exceção de todos os outros.
Marcos Aurélio Silva – Esse clima de tensão chega até os mesários no dia da eleição? Existe o temor de um ambiente hostil? O tribunal trabalha, de alguma forma, para que o mesário se sinta em segurança, bem como o eleitor, para ir às urnas?
Em Brasília, recentemente, houve uma reunião com os diretores-gerais de tribunais eleitorais de todo o País e se ventilou, por parte de alguns Estados, o temor de que haveria uma dificuldade para composição das mesas receptoras de votos, porque estaria se disseminando um certo temor de insegurança. Outro comentário na reunião foi sobre que poderia haver, por parte de alguns mesários, uma desconfiança sobre a credibilidade nas urnas, já que eles também são tomados por uma posição política.
Euler de França Belém – A decisão do TSE sobre as armas [de que não poderá haver porte de arma nas proximidades das seções eleitorais] traz mais tranquilidade?
Exatamente. Salvo quem estiver a trabalho na segurança do processo eleitoral, ninguém poderá estar portando arma.
Marcos Aurélio Silva – Em 2018, houve gente votando com duas coisas que agora estão proibidas diante da cabine eleitoral: arma e aparelho celular.
Em ambos os casos, é uma proibição que já vem desde 1997, com a Lei nº 9.504, que não se pode entrar na cabine de votação com telefone celular ou câmera fotográfica. Por isso, estamos pedindo à Polícia Militar uma atuação ostensiva, no sentido de gerar uma sensação de segurança, principalmente em relação aos mesários, que pode ter receio de ser alvo de alguns movimentos.
Euler de França Belém – A Justiça Eleitoral está preparada para questionamentos sobre o resultado das eleições?
Quem questiona precisa trazer provas. Quando a votação se encerra, já há a impressão do boletim de urna, que fica disponível para todos os partidos. Cada seção tem seu boletim, que pode ser entregue a cada fiscal ou representante de partido. Se o resultado publicado for diferente do que foi somado pelos boletins, isso já é um elemento para contestar. Na maioria das vezes, quando há uma contestação, isso se dá por artimanhas jurídicas – alguém requerer anulação ou impugnação de uma seção eleitoral por alegar que houve gente impedida de votar ou demora na votação, por exemplo.
Não há espaço para uma eventual tentativa de tumulto ou de um golpe
Euler de França Belém – O sr. acredita que o processo eleitoral vai se dar de forma tranquila, normal? Ou o sr. teme a tentativa de algum golpe?
Já não acredito nisso. Em certo momento, tive receio de que pudesse entornar o caldo. Com tanto apoio institucional e do segmento político, com tantas entidades ressaltando que o sistema eleitoral é confiável, endossando a seriedade da Justiça Eleitoral, não vejo mais esse risco. Não tem espaço para uma eventual tentativa de tumulto ou de um golpe. Entretanto, algum vandalismo de rua depois dos resultados pode ocorrer, em algumas capitais, o que deve ser contido pela polícia. Neste ano teremos também um número muito maior de unidades para o teste de integridade de urnas. Eram 3 e agora vamos colocar 27 urnas. É uma espécie de auditoria que fazemos, como uma amostragem, com a presença de partidos e instituições que presenciarão como o sistema funciona, fazendo o teste com a votação das pessoas, de forma com que tudo fique muito transparente, sem dúvidas sobre a credibilidade da urna eletrônica. Vai haver também uma simulação de transferência de dados para o TSE, de modo a observar que nada congestiona no processo e prevenindo qualquer problema de última hora. A coisa está muito bem ordenada.
Elder Dias – De certo modo, as críticas e dúvidas que pairam forçam positivamente a Justiça a fazer mais pela transparência do processo?
Sim, a transparência está cada vez maior. A cobrança é importante.
Euler de França Belém – Importante também é ver como a Justiça Eleitoral esteve aberta e transparente. Ao contrário de muita gente, ela está cada vez mais moderna.
A Justiça Eleitoral tem hoje todos os seus processos digitalizados. Tudo muito rápido e muito ágil.
Euler de França Belém – Como ficou a aplicação da lei seca para as eleições deste ano?
É algo que fica para o juiz de cada zona eleitoral regulamentar a questão, por meio de uma portaria, por exemplo. Como se sabe, essa medida não tem funcionado da forma como deveria. Penso que tenha de haver uma mudança de cultura, por conta do processo eleitoral. De qualquer forma, o TSE não adotou uma medida de abrangência nacional proibindo a venda de bebida alcoólica. O que chegou a nosso conhecimento foi, até agora, a vedação do uso de armas nas proximidades dos locais de votação.
Euler de França Belém – Como é a campanha da acessibilidade promovida pelo TRE-GO?
Temos no tribunal uma comissão que trabalha a questão da acessibilidade. A Justiça Eleitoral utiliza prédios cedidos, tanto públicos como particulares. Quando os chefes de cartórios vão escolher esses locais, pedem sempre para que sejam com a máxima acessibilidade possível. Fizemos uma grande campanha e abrimos um prazo para que pessoas que tenham alguma dificuldade de locomoção ou algum tipo de necessidade especial requeressem uma seção com acessibilidade. De qualquer forma, se mesmo assim, a acessibilidade não for a necessária, basta procurar o chefe da seção, que, de alguma forma a urna vai ser disponibilizada. O que se pede é que esse pedido seja feito com alguma antecedência, para que não haja tumulto. São casos excepcionais, mas já houve episódios em que preferiram chamar a imprensa do que esperar um pouco, mesmo já sabendo que havia solução para o problema.
Euler de França Belém – A multa para quem não votar ainda é de R$ 3,50?
Ainda, sim. Mas, na verdade, a tendência é caminhar para a não obrigatoriedade, que seria o mais civilizado. O que ocorre é que, sem votar, fica prejudicada a participação em concursos públicos, viagem ao exterior e outras restrições.