Entenda por que Adriana, Cruz, Fred, Mabel e Vanderlan precisam discutir meio ambiente
15 setembro 2024 às 00h00
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Há tesouros ambientais em Goiânia, a poucos quilômetros da Praça Cívica, mas nem sempre apreciados com o devido interesse pelos moradores da cidade. O Parque Lagoa Vargem Bonita, nas proximidades do Campus-Samambaia da Universidade Federal de Goiás, é um deles. Assim como o magnífico Parque Altamiro de Moura Pacheco, entre Goiânia e Anápolis? Se nunca os visitou, tire um tempinho e vá lá: só ganhará. Nada perderá.
Na lagoa do Vargem Bonita há peixes e, por isso, pássaros/aves que se alimentam deles. Podem ser vistos garças, martins-pescadores, socós, patos, frangos d’água e, eventualmente, tuiuiús. Entre outros. Há pouco dias, o professor e fotógrafo Jayrson Araújo fotografou uma sanã-amarela. Há pássaros menores, como bem-te-vi, anuns brancos e pretos, joão-de-barro, sabiá do campo, pica-pau do Cerrado, chora-chuva, corujas, pato-selvagem, pomba-de-bando, rolinha-roxa, quero-quero, ariramba, tiziu, chupim, jaçanã, suiriri, canário da terra, alma de gato.
A floresta é diversificada, com angico, imbaúba, ingá do brejo, escorrega-macaco, jatobá, sucupira, ipê, jenipapo, bambu, coité, amora silvestre, caju, goiaba, jaca (havia um pomar na área do parque invadida por alguns moradores da região). Há várias espécies de flores — e a diversificação faz do parque um jardim permanente. Há também um descampado, que, um dia, deve ter sido pasto sedimentado por grileiros de áreas públicas (o que parece ser uma savana, é, na verdade, um pasto). Um pecuarista da região está sempre deslocando parte de seu gado para se alimentar no parque. A Agência Municipal de Meio Ambiente (Amma) retira os animais, mas, dali a pouco, estão de volta.
Há algumas semanas, o Vargem Bonita pegou fogo. O Jornal Opção alertou tanto o governador Ronaldo Caiado (que sempre age rápido, pois, assim como seu parente Leolídio Caiado, um grande homem, é defensor do meio ambiente) quanto o delegado Luziano Carvalho (um dos policiais que mais entendem de meio ambiente, de sua defesa, no país).
O Vargem Bonita ardeu durante várias horas, pois o corpo de bombeiros, com tantos afazeres, chegou tarde. Nos dias seguintes, o parque encheu de gaviões carcarás à caça de um banquete trágico. Vários bichos morreram queimados. Um filhote de urubu, aninhado debaixo de um bambuzal, foi incinerado.
A investigação policial, a cargo dos eficientes delegados Luziano Carvalho e Lara Menezes Melo Oliveira, descobriu rapidamente a origem do incêndio. Dois homens desmataram uma chácara nas imediações e, no lugar de recolher os pedaços de madeira, colocaram fogo e foram almoçar. O fogo escapou da área privada e atingiu o parque, destroçando-o. Eles foram indiciados, o que tende a ser educativo.
(Frise-se: o parque é bem cuidado pela Amma, com a presença constante do funcionário Rauller, com o apoio de voluntários, como Wanderson.)
Nenhum político é uma ilha: diria John Donne
Costuma-se citar versos famosos do bardo britânico John Donne a respeito de que “nenhum homem é uma ilha” e “por quem os sinos dobram — eles dobram por ti” (usado pelo escritor americano Ernest Hemingway para titular um de seus romances mais lidos, “Por Quem os Sinos Dobram”). Mas passa-se a impressão de que os seres humanos parecem entender que vivem em unidades estanques — às vezes “preservados” de intempéries que acometem outras plagas. Trata-se de um engano. Porque a Terra é integrada. Estados, municípios e países são unidades “abstratas”, no sentido de que a separação só contempla ordenações administrativas e de povos diferentes. Mas a natureza, única, une tudo e todos.
Veja-se os debates de candidatos a prefeito em todo o país. Fala-se em saúde, educação, segurança pública, transporte coletivo, atração de indústrias e empregos. Tais temas devem mesmo ser debatidos. Mas quase não se fala em meio ambiente. Candidatos a prefeito e vereador não têm a ver com o assunto? Se a vida começa nos municípios — nos quais ficam parques ambientais e rios, por exemplo —, então os que planejam ser gestores e legisladores têm de se preocupar com o assunto.
O que se quer arrancar da Terra? Mais crescimento econômico. Ou seja, mais destruição da natureza. O que fazer? É preciso envolver não apenas presidente da República, como Lula da Silva, e ministros, como Marina Silva, na discussão da criação da autoridade climática. Prefeitos e vereadores — o Legislativo necessita ser visto como relevante — precisam ser convocados para o debate.
Adriana Accorsi, do PT, Fred Rodrigues, do PL, Matheus Ribeiro, do PSDB, Professor Pantaleão, do UP, Rogério Cruz, do Solidariedade, Sandro Mabel, do União Brasil, e Vanderlan Cardoso, do PSD, devem ser convocados pela imprensa para discutir o meio ambiente e não apenas “crescimento” econômico, como tem sido feito, inclusive por jornalistas gabaritados.
O leitor ouviu, nos debates, algum comentário denso sobre a preservação do Rio Meia Ponte, do Ribeirão João Leite e dos córregos, como o Botafogo e o Capim Puba? De onde, no futuro, os goianos — os goianienses — vão retirar água para beber, cozinhar e tomar banho? Os cursos de água estão aí, só nos incomodando quando irritam nossas narinas com seu mau-cheiro quase naturalizado. Precisamos deles e vamos precisar muito mais. E mais cedo do que imaginanos.
Pesquisa do Laboratório de Análise e Processamento de Imagens de Satélites (Lapis), da Universidade Federal de Alagoas, mostra que 12 grandes rios do Brasil estão secando. Um dos rios é o Tocantins, entre os Estados do Maranhão e Tocantins. O Rio São Francisco, segundo reportagem de “O Globo”, “já teve sua vazão reduzida em 60% nas últimas décadas”. As estiagens prolongadas, cada vez mais prolongadas, são responsáveis pelos esvaziamentos dos canais de água em todo o país.
Climatologista diz que está apavorado. E nós?
A repórter Roberta Jansen publicou no “Estadão” (quarta-feira, 11) uma entrevista com o climatologista Carlos Nobre, com o título de “‘Estou apavorado. Ninguém previa isso; é muito rápido’, diz Carlos Nobre sobre crise climática”.
Se o cientista Carlos Nobre, que integra o Planetary Guardians (Guardiões da Galáxia), que estuda a catástrofe ambiental, está “apavorado”, o que dizer dos políticos que os brasileiros vão escolher para administrar as cidades do país a partir de 1º de janeiro de 2025? Parece que estão no mundo da lua: falando mais de consumo do que de sustentabilidade.
O ar está irrespirável em várias cidades do país, inclusive em dezenas de goianas — o Parque da Chapada dos Veadeiros, em Goiás, foi queimado em larga escala. Carlos Nobre sublinha que, “entre 95% e 97%” dos incêndios “são causados pelo homem. A seca e as tempestades elevadas estão diretamente relacionadas às mudanças climáticas. Isso ajuda o fogo a se propagar. Mas os incêndios são criminosos. (…) Por mais que o desmatamento tenha sido reduzido, os grupos que fazem desmatamento ilegal e a grilagem de terras, e que estão sendo reprimidas pelo Ibama, ICMBio e polícia, continuam agindo”.
Carlos Nobre admite que o combate aos incêndios não é fácil. “O criminoso bota fogo em um minuto. O satélite só detecta o fogo quando ele já atingiu de 30 a 40 metros quadrados, ou seja, entre uma hora e meia a duas horas depois. O sistema detecta o fogo, mas mesmo que a polícia saia correndo, não conseguirá prender o criminoso, ele já não estará mais lá. É uma guerra e temos de começar a combatê-la”. O climatologista enfatiza que os produtores rurais, também vítimas dos incêndios, precisam ser vistos como aliados.
A respeito do meio ambiente, as intenções do governo Lula da Silva são as melhores possíveis. Mas fica-se com a impressão de que tanto o petista-chefe quanto a ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, apreciam mais fazer diagnósticos do que pôr a mão na massa e revolver os problemas efetivos. A gestão federal é lenta e, por exemplo, não contrata brigadistas em quantidade suficiente e em tempo hábil. Os brigadistas também são mal equipados. Se não há aviões suficientes para o combate aos incêndios, por que não alugar frotas por temporada? O que parece custo, é, a rigor, investimento, inclusive em saúde.
Lula da Silva e Marina da Silva precisam ir além das boas intenções. Precisam agir. Não estão mais na oposição. O governo não pode ser o primeiro a chegar atrasado, como está acontecendo.
O governo de Lula da Silva anunciou a criação de uma autoridade climática. Carlos Nobre pontua que é “importante para acelerar a redução de emissões, zerar desmatamento, fazer a transição energética, transição para pecuária e agricultura regenerativa. Estamos muito atrasados”.
Pantanal mato-grossense e o Cerrado
Marina Silva diz que o Pantanal mato-grossense tende a “morrer” até 2100. Carlos Nobre contrapõe: a ministra “foi otimista. O Pantanal acaba até 2070. A Amazônia, o Cerrado, a Caatinga: todos os biomas estão em risco. Se o desmatamento continuar desse jeito, a Amazônia vai perder pelo menos 50% da floresta até 2070. A Caatinga já avançou 200 mil quilômetros quadrados pelo Cerrado. Há uma região no norte da Bahia que já é tão seca que poderá ter, em futuro próximo, um clima semidesértico, com precipitação abaixo de 400 milímetros por ano. O Pantanal já reduziu 30% nos últimos 30 anos; está secando. E agora o fogo destrói sua vegetação”.
Carlos Nobre sustenta que”, se continuarmos com emissões altas, e só conseguirmos zerá-las em 2050, o que já é um enorme desafio, poderemos chegar a 2100 com temperatura a 2,5ºC da média. Se isso acontecer o Pantanal não terá mais lago”.
O cientista informa que “o que mais mata no mundo, muito mais do que as chuvas, são as ondas de calor”. Ele acrescenta que a agricultura “não está preparada para a seca” atual. Ninguém está. Mas o governo federal, com o apoio dos governos estaduais, precisa ficar mais atento. A questão climática tem a ver com sobrevivência e não com debate ideológico (embora não seja possível contornar as clivagens ideológicas).
Carlos Nobre diz que a temperatura subiu 1,5ºC muito rapidamente. “Mesmo que aceleremos” a redução de emissões, “o aumento da temperatura média do planeja vai ultrapassar os 2ºC, podendo chegar a 2,5ºC em 2050”. Por isso, o cientista está “apavorado” (e nós?). O ruim, que poderia acontecer num futuro distante, já está ocorrendo.
Então, Adriana Accorsi, Fred Rodrigues, Matheus Ribeiro, Professor Pantaleão, Rogério Cruz, Sandro Mabel e Vanderlan Cardoso: vamos falar um pouco mais de meio ambiente?