O presidente do Banco Central Roberto Campos Neto anunciou nesta quinta-feira, 10, que a instituição avalia a possibilidade de eliminar a opção de crédito rotativo em cartões de crédito. Esta modalidade de crédito é reconhecida como uma das mais dispendiosas no mercado, tendo atingido uma taxa de juros anual de 437,3% em junho.

Campos Neto participou de uma sessão plenária no Senado Federal com o intuito de elucidar as decisões de política monetária e estabilidade financeira que foram implementadas pelo Banco Central ao longo do último semestre.

O crédito rotativo é um tipo de empréstimo ao consumidor que ocorre quando o mesmo efetua um pagamento inferior ao montante total da fatura do seu cartão. Esse crédito tem uma duração de 30 dias, após os quais as instituições financeiras oferecem um parcelamento para quitar a dívida. Conforme os números de junho, a taxa de juros associada ao parcelamento de cartão de crédito estava em 196,1% ao ano.

Campos Neto anunciou que uma solução para a questão do cartão de crédito, que ele descreveu como um “grande problema”, será apresentada pelo Banco Central em um prazo de até 90 dias. A abordagem que está sendo considerada é a eliminação do crédito rotativo, direcionando-o diretamente para a opção de parcelamento, com uma taxa de juros em torno de 9% ao mês.

“Ou seja, extingue-se o rotativo, quem não paga o cartão vai direto para o parcelamento ao redor de 9%. E que a gente crie algum tipo de tarifa para desincentivar esse parcelamento sem juros tão longos. Não é proibir o parcelamento sem juros, é simplesmente tentar fazer com que eles fiquem um pouco mais disciplinados, numa forma bem faseada, para não afetar o consumo”. Segundo Campos Neto, o cartão de crédito corresponde por 40% do consumo do Brasil.

Uma das razões que contribui para a elevada taxa de juros em cartões de crédito, de acordo com o presidente do Banco Central, é a ampla adoção do parcelamento de compras em prazos mais extensos. Esse cenário resulta no aumento do nível de risco associado ao crédito para as instituições financeiras, o que, por sua vez, impacta diretamente nas taxas de juros praticadas.

“A gente tem um parcelado sem juros, que ajuda muito o comércio, que ajuda muito a atividade, mas que tem aumentado muito o número de parcelas, de três para cinco, para sete, para nove, para onze. Hoje, o prazo médio são 13 parcelas. Então, é como se fizessem um financiamento de longo prazo sem juros. A pessoa que toma a decisão de dar os juros não é a mesma que paga pelo risco, isso gera uma assimetria”, explicou Campos Neto.

Aumento de cartões

Além disso, nos últimos anos, o Brasil experimentou um substancial aumento na quantidade de cartões em circulação e nas oportunidades de crédito, resultando em um aumento significativo na inadimplência nessa modalidade.

“Os bancos, novos entrantes e varejistas acabaram usando o cartão de crédito como um instrumento de fidelizar o cliente. Então, nós saímos de cento e poucos milhões de cartões de crédito para 215 milhões de cartões de crédito num período de dois anos e meio, isso é uma alta bastante grande”, disse. “O resultante disso foi uma inadimplência no rotativo de 52%. Não tem nenhuma inadimplência, nem parecida, em nenhum outro lugar do mundo, que eu tenha olhado, no cartão de crédito”, acrescentou.

Uma alternativa adicional poderia ser a imposição de um limite nos juros dos cartões, no entanto, de acordo com o presidente do Banco Central, essa medida poderia resultar na redução da circulação dos cartões.

“Para as pessoas que têm mais risco os bancos não ofereceriam aquele cartão, devido a uma relação de risco e retorno ineficiente. O problema de cortar o número de cartões é que se sabe como começa, mas não se sabe como termina. Então, isso pode gerar um efeito muito grande na parte de consumo, na parte de varejo”, disse.

Política monetária

Campos Neto comunicou aos parlamentares que sua mensagem central é que o Banco Central desempenhou eficazmente sua função na condução da política monetária, alcançando uma transição suave ao trazer a inflação para níveis mais baixos com o mínimo impacto. Ele ressaltou o aumento nas projeções de crescimento econômico e a tendência de redução do desemprego.

“O que é o pouso suave? É a gente ter conseguido trazer a inflação muito alta para um nível muito mais baixo, com quase nenhum custo ou muito pouco custo, tanto de crescimento, quanto de emprego, quanto de contração de crédito. Quando a gente faz uma comparação relativa, o Brasil atingiu ou está atingindo um pouso suave. É importante mencionar que a gente ainda tem uma luta com a inflação pela frente, mas a gente está atingindo um pouso suave de forma bastante eficiente”, disse.

Frente a uma significativa queda na taxa de inflação, na semana passada, o Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central (BC) tomou a decisão de reduzir a taxa básica de juros, conhecida como Selic, de 13,75% ao ano para 13,25% ao ano. Esse corte de juros representa o primeiro ocorrido em um intervalo de três anos. A Selic, por sua vez, é a principal ferramenta empregada pelo Banco Central para atingir a meta de inflação, estabelecida pelo Conselho Monetário Nacional (CMN).

A última ocasião em que o Banco Central promoveu uma redução na Selic ocorreu em agosto de 2020, quando a taxa foi rebaixada de 2,25% para 2% ao ano, como resposta à recessão econômica ocasionada pela pandemia de covid-19. A partir desse ponto, o Copom empreendeu um ciclo de 12 aumentos consecutivos na Selic, iniciado em março de 2021. Esse movimento se deu em meio ao aumento dos preços dos alimentos, da energia e dos combustíveis. A partir de agosto do ano passado, a taxa foi mantida em 13,75% ao ano por um período de sete ajustes sucessivos.

A decisão de manter a Selic em um nível tão elevado durante esse período foi objeto de críticas por parte do governo federal e de alguns setores produtivos. Essa crítica derivou do fato de que o aumento na Selic impacta diretamente nos níveis de preços, encarece o custo do crédito e fomenta a poupança, o que por sua vez pode criar obstáculos para a expansão da atividade econômica.

Conforme ressaltado por Campo Neto em outras ocasiões, as decisões do Banco Central acerca da Selic são pautadas em considerações técnicas, levando em consideração as projeções de inflação para os próximos 12 a 18 meses, o hiato de produção (ou seja, a capacidade de crescimento sem gerar inflação) e a inflação atual. Adicionalmente, Campo Neto defendeu a autonomia do Banco Central e apresentou dados que indicam uma correlação entre o grau de autonomia das instituições financeiras pelo mundo e os níveis de inflação.

“Ela [a autonomia] garante um ganho institucional, ele separa o ciclo político do ciclo econômico, ele facilita a obtenção de inflação baixa e menores juros estruturais na economia e alinha o Brasil às melhores práticas internacionais”, disse.

O líder do Banco Central do Brasil também declarou que o mérito da sólida avaliação atual e das previsões favoráveis para a economia do país recai, sem dúvida, na atuação proativa da instituição. Ele mencionou não somente o aumento das classificações de crédito do Brasil por agências internacionais de avaliação de risco, mas também as análises positivas provenientes de outras organizações respeitadas, inclusive veículos de imprensa especializada.

“Quando a gente olha todos esses índices de termômetro, todos eles, 100% deles, mencionam a autonomia do Banco Central e mencionam a política de juros do Banco Central como um fator decisivo”, disse. “Isso foi atingido aqui, com a ajuda do Congresso, em termos de colocar a autonomia do Banco Central e essa capacidade do Banco Central de gerir a crise de forma autônoma e técnica, tem mostrado grandes e grandes frutos. Então acho que, por trás de cada comemoração que a gente tem feito recentemente no Brasil, tem também um pedaço que foi a atuação do Banco Central. Eu gostaria que isso não fosse esquecido”, acrescentou.

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