TADEU ALENCAR ARRAIS

É conhecida a premissa de que, em se tratando de planejamento urbano, as decisões do presente comprometem o futuro das cidades. A qualidade de vida nas cidades pode ser mensurada pela eficácia das políticas de mobilidade, pelas políticas habitacionais para as camadas de menor poder aquisitivo, pela preservação dos espaços públicos e, especialmente, pelo cuidado com os recursos hídricos. Essas políticas, considerando os marcos da democracia representativa, têm na lei de uso e regulação do solo urbano sua principal matriz jurídica.

O grande avanço normativo da política urbana brasileira, reforçado no Estatuto das Cidades, foi a separação entre o Direito de Propriedade e o Direito de Construir. É essa separação que garante, em tese, a função social da propriedade, de maneira particular, e a função social da cidade, de maneira geral. Se aprovado, o novo Código de Parcelamento do Município de Goiânia (projeto de Lei Complementar 020, de 27 de agosto de 2015, que está em trâmite da Câmara Municipal de Goiânia) será um divisor de águas entre um projeto de cidade verdadeiramente sustentável — a que todos defendemos — e um projeto de cidade cujo cuidado com o meio ambiente não passará de um sonho nostálgico.

As macrozonas rurais do município de Goiânia estão assentadas, estrategicamente, em áreas com função ambiental imprescindível para o futuro da cidade. A liberação dessas áreas para instalação de Núcleos Residenciais de Recreio e Núcleos Industriais coloca em risco os recursos hídricos e a cobertura vegetal remanescente. A preservação da Macro­zona Rural do Capivara e da Macrozona Rural do João Leite é fundamental para preservar o abastecimento de água do município de Goiânia. As áreas rurais, em função da cobertura vegetal e o do uso do solo de baixa densidade, são essenciais para qualidade de vida urbana. É preciso que todos compreendam, com urgência, que as intervenções urbanas promovidas pelo governo municipal, aparentemente pontuais, prejudicarão as diferentes regiões do município de Goiânia.

É por esses motivos, entre outros, que nos manifestamos contra o novo Código de Parcelamento do Município de Goiânia. O compromisso com uma cidade sustentável deve, prioritariamente, sair do campo da retórica. O governo municipal e a Câmara Municipal de Goiânia deveriam traduzir a retórica sobre a cidade sustentável em ações que, efetivamente, possam colaborar com a construção uma cidade mais sustentável e mais democrática.

Tadeu Alencar Arrais é doutor em Geografia pela UFF (RJ) e professor associado do Instituto de Estudos Socioambientais (Iesa) da UFG.

Também assinam o manifesto: Maria Ester (arquiteta e vice-presidente do Conselho de Arquitetura e Urbanismo/CAU- GO); Daniel Emídio de Souza (médico psicanalista); Arnaldo Mascarenhas (arquiteto e presidente do Conselho de Arquitetura e Urbanismo/CAU-GO); Celene Barreira (diretora do Iesa/UFG e coordenadora do Plano Diretor da Região Metropolitana de Goiânia); Aristides Moysés (doutor em Ciências Sociais pela PUC-SP, professor do Mestrado em Desenvolvimento e Planejamento Territorial e ex-diretor do Departamento de Ordenação Socioeconômico da Secretaria Municipal de Planejamento da Prefeitura de Goiânia); Luis Felipe Cherem (doutor em Geociências do Meio Ambiente pela Universidade de Aix-Marselha, França e professor adjunto do Iesa/UFG); Lana Jubé (arquiteta e conselheira federal do CAU); Sandra de Fátima Oliveira (doutora em Ciências pela USP e professora titular do Iesa/UFG); João Batista de Deus (doutor em Geografia pela USP e professor associado do Iesa/UFG); Pedro Célio Alves Borges (doutor em Sociologia pela Universidade de Brasília/UnB) e professor da UFG); Gisélia Lima Carvalho (professora doutora do IF Goiano); Romualdo Pessoa (professor adjunto do Iesa/UFG e presidente da Associação de Geógrafos Brasileiros/AGB-GO); Lorena Cavalcante (arquiteta e conselheira do CAU-GO); Denis Castilho (doutor em Geografia e professor adjunto do Iesa/UFG); Adriano Rodrigues (doutor em Geografia pela Unesp e professor adjunto do Iesa/UFG); Genilda Bernardes (doutora em Sociologia e professora da UniEvangélica/ Anápolis); Matheus Hoffmann Pfrimer (doutor e pós-doutor em Geografia pela USP e professor adjunto da Faculdade de Ciências Sociais (FCS/UFG); Francisco Mata Machado (coordenador do Programa de Pós-Graduação em Ciência Política da UFG); e Leandro Oliveira Lima (doutor em Geografia e professor da UEG).