O luxemburgês Jean-Claude Junker e o alemão Martin Schulz são os dois concorrentes ao importante cargo 

Jean-Claude Junker e Martin Schulz: um deles vai ditar os rumos da Europa nos próximos anos
Jean-Claude Junker e Martin Schulz: um deles vai ditar os rumos da Europa nos próximos anos

As eleições na Ucrânia para substituir o atual governo provisório, mar­cadas para este do­mingo, 25, estão sendo esperadas com muita expectativa tanto em Kiev como em Bruxelas, Moscou e em Washington. Os resultados provavelmente contribuirão para redigir o derradeiro texto de uma tragédia escrita e protagonizada por alguns ucranianos que foram à Praça Maidan para protestar contra um governo eleito pelo voto. Um protesto que poderá terminar com a divisão do país.

Divisão ou não divisão da Ucrânia. Eis a questão. Em breve teremos a resposta desta autoflagelação de uma nação que acabará sendo triturada entre os interesses geoestratégicos de dois blocos exteriores. A Ucrânia se encontra entre a bigorna e o martelo. Um episódio sem precedentes na moderna história política.

Paralelamente, neste mesmo fim de semana, estão sendo esperados os resultados da eleição para o Parlamento Europeu, cujo escrutínio está sendo realizado nos 28 países membros desde quinta-feira, 22, até este domingo. Nestes quatro dias um total de 375 milhões de europeus está sendo chamado às urnas para eleger os 751 deputados que compõem o Parlamento Eu­ropeu com sede em Estrasburgo.

Trata-se da oitava eleição na qual o Parlamento Europeu é eleito diretamente. Eleitores da Holanda e do Reino Unido votaram quinta-feira 22; na Irlanda a eleição foi sexta, 23; na Letônia, Malta, Eslováquia e nos Departamentos Franceses Ultra­marinos, 24; os demais países votarão neste domingo, 25. De acordo às normas da eleição, a escolha do dia entre 22 e 25 de maio fica a critério de cada país. O regulamento para a eleição de 2014 foi estipulado no Tratado de Lisboa em vigor desde 1° de dezembro de 2009.

Em qualquer país democrático uma eleição sempre é um processo complicado no qual entram em jogo interesses políticos, partidários e ideológicos de diferentes espectros. Fundalmente é este o processo, que também é válido para a Europa. Mesmo assim, uma eleição a nível europeu representa um processo bem mais complicado, tendo em vista o caleidoscópio politíco, linguístico, étnico, religioso e, além disso, multifacetado em seus interesses nacionais que formam esta união de 28 países, a União Europeia.

A amplitude dos interesses nacionais é imensa, o que de­mons­­tra o grande número de partidos, grandes e muitos pequenos, que se empenharam nesta campanha eleitoral que agitou as emoções europeias nos últimos meses. Ao todo registraram-se 384 partidos, muitos dos quais formaram coligações a nível nacional e, uma vez eleitos, formarão coligações com outros partidos dentro do Parlamento Europeu.

Segundo a lei eleitoral cada país tem direito a um número fixo de cadeiras no parlamento, independentemente dos partidos. Para a fixação do número de cadeiras vale o princípio da proporcionalidade degressiva, segundo a qual países maiores têm direito a mais cadeiras, países menores, no entanto, mais cadeiras por habitante do que os países maiores. O número máximo de cadeiras por país não pode ultrapassar 96.

Baseado neste princípio a Alemanha, como país mais populoso da União Europeia, tem direito ao número máximo de cadeiras, 96. A França tem 74; a Itália 73; Reino Unido 73; Polônia 51; Romênia 32; a Estônia, Luxemburgo, Malta e Chipre tem 6 cadeiras cada e, junto com os demais, somam o total de 751 cadeiras.

O Tratado de Lisboa estabeleceu que os 751 deputados do Parlamento Europeu elegerão o novo presidente da Comissão Europeia, o sucesssor do atual ocupante do cargo, o português José Manuel Barroso, cujo segundo mandato expira em poucos meses. O sucessor será um candidato recomendado pelo Con­selho Europeu. A recomendação do Conselho é baseada nos resultados da eleição.

As bancadas atualmente representadas no Parlamento decidiram nomear candidatos antes das eleições para concorrer ao cargo de presidente da Comissão Europeia. Em consequência foram indicados oito candidatos dos quais apenas dois têm reais chances de suceder a José Manuel Barroso.

O luxemburguês Jean-Claude Junker, jurista com longa experiencia política, é um dos candidatos que concorrem ao cargo. Durante sua carreira ocupou vários ministérios em Luxem­burgo. Foi primeiro-ministro por dois períodos consecutivos e presidente dos países do Grupo Euro durante dez anos.

Perdeu o cargo de primeiro-ministro em Luxemburgo por um escândalo de seu próprio serviço secreto. Candidatou-se à reeleição em novas eleições nas quais o seu partido saiu vencedor. Em virtude de nova coligação nos quadros da oposição, não conseguiu ser nomeado. Durante o seu período de presidente do Grupo Euro, era chamado de Mister Europa. Deixou o cargo, segundo suas próprias declarações “por estar cansado”. Jean-Claude Junker é, como muitos de seus conterrâneos, poliglota que fala o luxemburguês, francês, alemão, inglês, belga, holandês e o flamengo. Pertence à ala conservadora dos cristãos-democratas cujo partido, o EVP, com 248 deputados, é o mais forte no Parlamento Europeu.

O segundo candidato para o cargo de presidente da Comissão Europeia com potenciais possibilidades é o alemão Martin Schulz, que atualmente ocupa o cargo de presidente do Parlamento Euro­peu. Nesta função Martin Schulz é o político em Bruxelas, que é responsável por 500 milhões de europeus, a população total da União Europeia. Schulz levou muito a sério esta sua responsabilidade. Durante a campanha eleitoral esteve nos 28 países da União, em alguns até várias vezes.

Martin Schulz começou sua vida profissional numa área fora da política. Era dono de uma livraria. Lembra-se com saudades daquele período: “Naquela época eu lia muito, o dia todo, de manhã até altas horas da noite”, disse certa vez em entrevista.

Foi prefeito de uma pequena cidade alemã junto à fronteira com a Bélgica. Entrou no Parlamento Europeu, onde fez impressionante carreira até tornar-se presidente, cargo que ocupa até hoje. Martin Schulz é social-democrata e o seu partido, o SPE, tem 192 deputados no Parlamento Europeu. Schulz domina com maestria a arte da retórica. É um homem de palavras claras e não recua diante de situações complicadas. Dependendo das novas coligações que se fizerem após estas eleições no Par­lamento Europeu, Martin Schulz é um candidato que está em equilíbrio de chances para suceder a José Manuel Barroso numa corrida política contra Jean-Claude Junker, de quem diz ser amigo.

José Manuel Barroso, após dois períodos, terá que deixar o cargo. Está com 57 anos e diz “ainda não estar cansado”. Nos corredores em Bruxelas comentou-se que Barroso teria demonstrado interesse em suceder o dinamarquês Anders Fogh Rasmussen como secretário-geral da OTAN. Este projeto não se concretizou pois o sucessor de Rasmussen é o norueguês Jens Stoltenberg, que assumirá o cargo em outubro próximo. Comenta-se além disso que Barroso estaria de olho nas Nações Unidas, onde sonha em suceder a Ban Ki Moon, cujo mandato expira em outubro de 2015.

Jean-Claude Junker é convicto cristão-democrata desde o início de sua carreira; Martin Schulz é social-democrata desde que entrou na política. José Manuel Barroso iniciou sua atividade política em Lisboa como maoísta e tornou-se presidente da Comissão Europeia como conservador. Barroso passou por uma metamorfose política. Nunca se soube em que se baseou esta metamorfose. Por convicção ou oportunismo?

Domingo, 25 de maio, a partir das 23 horas (hora europeia), serão divulgados os resultados das duas importantes eleições. Para onde marchará a Europa? Permanecerá o conservadorismo ou dominarão os social-democratas? Indepen­dente­mente de quem assumir a presidência da Comissão Europeia, Junker ou Schulz, provavelmente haverá poucas alterações em Bruxelas, mas muitas na Ucrânia.