Catherine Moraes

Nesta semana, um vídeo viral da Rita Von Hunty me pegou em cheio: “Quando você parou de desenhar?”. Uma sequência de perguntas que me reviraram a cabeça e o estômago. Óbvio, não estamos falando apenas de um desenho, mas quando foi que a gente foi deixando algumas coisas morrerem? Até dois anos atrás, Cecília dizia que quando crescesse queria ser ‘fada do dente’. Ela falou isso por anos, era a profissão dos sonhos. Eu nunca filmei. Era comum, eu adorava quando ela falava isso. Ontem quando eu perguntei, ela falou: ah, mãe, queria uma profissão que desse dinheiro…. mas aí ela voltou atrás, pensou melhor e me perguntou se dava pra ser ilustradora. Se existia uma profissão em que ela pudesse desenhar: livros, filmes… “Tipo o pessoal que desenha para a Disney, mãe!”

Eu lembro que quando eu era criança, juntava dinheiro para comprar sorvete e quando finalmente tinha o valor da taça, eu ia lá, com minha própria grana na sorveteria do bairro pra encher um sorvete de jujubas, coberturas e era tão mágico…. eu brincava na pracinha, escrevia poesia, músicas, eu tinha um diário. Eu sempre fui péssima nos desenhos, mas eu gostava de fantasia, criava coreografias, roteiros de filmes. Será que tudo isso ficou pra trás quando eu comecei a pagar boletos? Não totalmente, mas muito mais do que eu gostaria.

“Quando você parou de desenhar? Porque você era uma criança que fazia coisas. Você era uma criancinha que pintava, dançava, brincava de massinha. Quando você virou um porre de um saco de um caralho de um adulto chato, sem criatividade, que não faz nada. Quando você parou de dançar? Quando você parou de cantar? Quando você parou de compor? Quando você deixou a sua criança criativa morrer?”. O texto impecável do Reels da Rita me atravessa porque eu gosto tanto dos detalhes. Eu gosto muito de pensar que a vida acontece todo dia. Acontece no meio da tarde quando a gente sai de uma consulta médica e para no parquinho que fica no meio do caminho.

Ser mãe tem muitas mágicas e quem é esperto aproveita a oportunidade de “voltar a desenhar”. Pela Cecília eu voltei a desenhar, inventei músicas de ninar, criei grito de guerra pros jogos internos da escola e fui a fada do dente, o papai noel. E se você não tiver uma criança? Você também pode encontrar formas de não deixar essa criatividade morrer! Aprender a fazer crochê, reformar uma parte da própria casa, customizar uma roupa, praticar um esporte, uma arte. O que é que te faz feliz? O que é que diminui a sua ansiedade?
Minha chefa Carol outro dia me disse que aprendeu a costurar, que fez uma blusa pra si mesma…. uma amiga, a Jéssica fez aulas de coisas que ela nunca tinha feito antes: poesia, pintura, cerâmica. Tem gente que se forma aos 50, muda de carreira. Conhecem a Keka, a que viaja pelo mundo? Ela largou um concurso de bombeira em Goiás para conhecer o planeta e eu só acho isso incrível, corajoso. Não, claro que você não precisa largar tudo. Não dá certo pra todo mundo. Teu nome pode parar no SPC e você pode ficar sem comida na geladeira, mas é que dá pra não deixar toda a mágica da vida morrer.

Se a gente trabalha pensando no fim de semana, se mata todo dia só pra ter uma semana de férias no ano, a gente perde o caminho. E quando a gente é adulto esse tempo parece ir mais devagar. Agora experimenta ter um bebê em casa: em um dia ele não abre o olho direito e no outro tá aprendendo a andar. Passou um ano, dois, sua criança para de te chamar pra brincar e não quer mais dormir na sua cama. Por aqui ainda tem quarto cheio, tem magia e tem desenhos esparramados pela casa e eu queria tanto que esse tempo não passasse nunca. Porque eu não consigo me lembrar qual foi a última vez que eu pedi pra dormir na cama da minha mãe nem a última vez que um beijo curou meu dodói.

E se nadinha que eu falei faz sentido por aí, não tem problema. É que esse texto não é pra você!