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Presidente do Senado se coloca como a grande esperança de Dilma Rousseff para desarmar a “pauta-bomba” da Câmara dos Deputados, mas ele vai cobrar caro por isso

Renan Calheiros,  o peemedebista passa  de opositor a grande fiador do governo  Dilma Rousseff | Foto: Jane de Araújo /Agência Senado
Renan Calheiros, o peemedebista passa de opositor a grande fiador do governo Dilma Rousseff | Foto: Jane de Araújo /Agência Senado

 

 

Certamente que o resultado da manifestação po­pular deste domingo, 16, terá influência na manutenção da recente “adesão” do senador Renan Calheiros, (PMDB-AL), presidente do Senado, ao governo. Se o levante for expressivo, indicativo de uma terremoto na opinião pública contra o lastimável governo de Dilma Rousseff, Renan poderá reavaliar sua posição; se não, não. Ele vai fazer o que for mais interessante politicamente.

O senador alagoano encarna na máxima expressão aquele tipo de político que pensa em primeiro lugar nele mesmo e em segundo lugar em si próprio. Neste momento da política brasileira, Renan Calheiros está mais do que nunca sendo Renan Calhei-ros, ao consolidar uma mudança de posição em relação ao governo Dilma, a quem ele ensaiava certa oposição, a exemplo do correligionário Eduardo Cunha (presidente da Câmara dos Deputados), este sim, em guerra aberta com o governo.

Na semana passada, Renan Calheiros disse que nesta segunda-feira, 17, vai apresentar um cronograma detalhado com as propostas que já poderão ser pautadas dentro da chamada Agenda Brasil. Na semana passada, Renan apresentou essas propostas ao ministro da Fazenda, Joaquim Levy, e depois fez o anúncio também no plenário do Senado.

As propostas em questão são a esperança de Dilma Rousseff de sair da crise em que seu governo esta atolado desde que assumiu o segundo mandato — aliás, continuação do que vinha acontecendo no primeiro. Na quinta-feira, 13, Renan disse que o Plenário deve votar já nesta terça-feira, 18, o último projeto do ajuste fiscal que aguarda deliberação dos senadores: o PLC 57/2015, que revê a política de desoneração da fo­lha de pagamento e aumenta as alíquotas sobre a receita bruta das empresas de 56 setores da economia.

“Não há consenso ainda, mas estamos trabalhando. Se não for possível votar hoje (quinta), faremos com certeza na terça-feira”, afirmou o senador, alertando para o fato de a Câmara ter excluído cinco setores, o que vai demandar análise do Senado.

Dentre as inovações, estão medidas controversas para o governo Dilma e o PT, como a redução de ministérios, fixação de limites para a dívida pública e até a implosão, na prática, do Mercosul. Ao todo, o número de tópicos da agenda saltou de 27 para 43, contemplando ações destinadas a melhorar o ambiente de negócios, reduzir despesas na área social e equilibrar o Orçamento.

Renan vai conduzir toda a votação no Senado de acordo como os interesses do governo. Conso-lida-se assim a “virada” de posição do alagoano, que chegou a fazer críticas ácidas ao governo e até à própria presidente Dilma. No primeiro semestre, o presidente do Senado esteve alinhado à oposição, principalmente depois da inclusão de seu nome entre os políticos investigados na Operação Lava Jato.

Mas o recesso de julho serviu para Renan reconsiderar sua posição. Cer­ta­mente, o papel de opositor muito o o incomodava, ele que por princípio nun­ca é contra go­verno.

Ao retornar às atividades parlamentares, o alagoano prometeu neutralizar a “pauta-bomba” de votações contra o governo preparada por Eduardo Cunha. De imediato al­mo­çou com o mi­nistro Levy, a quem prometeu apoio ao que até recentemente chamava de “capenga” ajuste fiscal, e pautou projetos que, entre outros efeitos, contribuem para o equilíbrio das contas públicas, as tais 27 propostas.

No Senado, ao anunciar a Agenda Brasil, Renan informou que o Legislativo quer colaborar para o fim da crise. “Não é uma colaboração do Senado Federal. É uma colaboração do Legislativo. Queremos ser vistos como facilitadores, e não como sabotadores.” O senador disse que discutir o impeachment todos os dias não re­solve a crise econômica. “O go­verno Dil­ma Rous­seff não é o Brasil. O reducionismo é impróprio. O go­verno Dilma, co­mo todos sa­bem, tem data pa­ra acabar e o Bra­sil vai continuar existindo”, afirmou.

Ponto sem nó

Renan não dá, como se diz popularmente, ponto sem nó. Ele se reaproximou da presidente Dilma às vésperas do julgamento da prestação de contas da petista pelo Tribunal de Contas da União (TCU), que tem três dos nove ministros indicados pelo PMDB — dois dos quais com forte apoio do senador: os novatos Bruno Dantas e Vital do Rêgo Filho. Se houver condenação por crime de responsabilidade no tribunal por causa das chamadas “pedaladas fiscais”, estará aberto o caminho para o impeachment de Dilma no Congresso.

Paralelamente, Renan está enrolado no Supremo Tribunal Federal (STF), onde é aguardada para os próximos dias a primeira leva de denúncias do procurador-geral da República, Rodrigo Janot — recém-reconduzido ao cargo — contra parlamentares que atualmente respondem a inquérito na Lava Jato. Renan é alvo de nada menos que três investigações, aliás, uma constante em sua vida política.

Do time de ministros do STF, apenas os mais antigos — Celso de Mello, Marco Aurélio Mello e Gilmar Mendes — não foram indicados por Dilma ou pelo ex-presidente Lula. A influência exercida pelo PMDB no TCU e pelo governo no STF é tida como notória e, por isso, Dilma e Renan contam receber uma “força” nessas duas cortes para se livrarem dos respectivos problemas.

Reportagem do site Congres­so em Foco assinalou que Renan Calheiros, fiel aliado do governo nos primeiros quatro anos de Dilma, estava determinado a contrariar o Executivo. Chegou a classificar como “capengas” o ajuste fiscal e a aliança entre PT e PMDB. Agora, diante de ameaças de impeachment da presidente Dilma, o peemedebista passou a ser visto pelo Planalto e aliados como o “fiel da balança” quando o cerco se fechar contra o governo.

Fatura é alta e será cobrada

O senador Renan Calheiros passou a sinalizar que pode voltar a colaborar com a “governabilidade”, mas, segundo interlocutores, cobrará “faturas” nas áreas política e econômica. “Não haverá ‘pauta-bomba’ no Congresso Nacional. Pelo contrário, nós estamos preocupados em desarmar a bomba que está posta na economia. Vou me pautar, sempre, como presidente do Congresso, um Poder independente e autônomo que quer colaborar, com o olhar da sociedade”, discursou assim que voltou do recesso.

O jornal “O Estado de S.Paulo” revelou que Renan cobrará mudanças em troca do auxílio à governabilidade de Dilma, começando pelo pedido de substituição do chamado “núcleo duro” do governo, implicando de imediato a troca do ministro da Casa Civil, Aloizio Mercadante, com quem o senador não tem boa relação, por um nome como Jaques Wagner (Defesa).

Em outra frente, o senador cobraria do governo mais auxílio financeiro para Alagoas, estado em sérias dificuldades orçamentárias governado por seu filho e herdeiro político, Renan Filho (PMDB). Renan quer também mais participação na política econômica e cortes na estrutura do governo, de acordo com o jornal.

O Congresso em Foco assinalou que a pauta favorável ao governo, segundo interlocutores de Renan, inclui também projetos como o que promove a reforma do ICMS, o que cria o Fundo de Desenvolvimento Regional e o que define a repartição de contribuições sociais. “Tanta ajuda ao Planalto por parte de Renan, no entanto, está longe de ser mero comprometimento institucional ou responsabilidade com o futuro país. Foi o que disse à reportagem um experiente senador aliado, ao ser indagado sobre a guinada governista do peemedebista. ‘Está [governista]. Ele não é bobo. Quando você vê esse tipo de coisa, é porque há outras coisas por trás’, disse o parlamentar da base, sob condição de anonimato.”

Segundo o site, um senador oposicionista, que também preferiu não se identificar, lembrou que as complicações de Dilma vão além do TCU, uma vez que o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) julga ação do PSDB contra a petista e, com menos implicação direta, a própria investigação da Lava Jato desgasta a imagem da presidente. “Nesse sentido, diz o parlamentar, o entendimento entre Dilma e Renan pode ter algum fundamento. O governo tem alguma chance no TCU. São ministros indicados pelo governo; eles devem ao governo essa indicação.
Além disso, alguns desses ministros do TCU estão enrolados [em investigações]. Já em relação ao STF, não acredito que alguém ainda conte com a generosidade dos ministros”, acrescentou.

De qualquer forma, com acordo declarado ou tácito, um governo que se vê na condição de refém de uma figura “impoluta” como Renan Calheiros está chegando ao fundo do poço. Renan, como foi dito no início deste texto, pensa em primeiro e em segundo lugar nele mesmo. Governo são apenas instrumentos para que ele ganhe mais, sempre mais.

Dilma gostou das propostas

Presidente Dilma Rousseff: “Propostas muito bem-vindas. Há convergência entre o Executivo e o Legislativo”
Presidente Dilma Rousseff: “Propostas muito bem-vindas. Há convergência entre o Executivo e o Legislativo”

Na semana passada, a presidente Dilma Rousseff afirmou ter “grande interesse” em estudar as propostas apresentadas pelo presidente do Congresso Nacional, senador Renan Calheiros, para reaquecer a economia. Dilma comentou a lista de 27 propostas apresentadas pelo peemedebista aos ministros Joa­quim Levy (Fazenda), Nelson Barbosa (Planejamento) e Edinho Silva (Comunicação Social). A intenção de Renan é “construir convergência” entre o Legislativo e o Executivo.

“Muitas das propostas do presidente Renan coincidem plenamente com as nossas e são propostas muito bem-vindas. Eu queria até dizer que para nós é a melhor relação do Executivo com o Legislativo. Então, nós olhamos essas 27 propostas com grande interesse e valorizamos muito a presença delas. Esta, sim, é a agenda positiva para o país”, disse a presidente.
A boa disposição de Renan com o governo contrasta com a franca oposição de Eduardo Cunha na Câmara dos Deputados, que na semana anterior tinha aprovado um projeto que eleva os gastos da União. Conhecido como “pauta-bomba”, porque sua aprovação se deu em meio ao esforços do governo para reajustar as contas públicas, o texto agora precisa ser analisado pelo Senado.

No dia 6, Há Dilma tinha chamado ao Planalto Renan Calheiros para pedir a ele que evite a aprovação do projeto. Na segunda-feira passada, ela ofereceu jantar aos senadores da base aliada no Palácio da Alvorada, também para pedir apoio dos parlamentares para que esse tipo de projeto não seja aprovado.

Em meio à crise política na relação entre o governo e o Congresso Nacional, com sucessivas derrotas do Executivo na votação de projetos, Dilma avaliou que a chamada “agenda positiva” para o país proposta por Renan mostra “disposição” do Senado para criar alternativas para a retomada do crescimento econômico.

“[As propostas] mostram por parte do Senado uma disposição de contribuir para que o Brasil possa sair das suas dificuldades o mais rápido possível”, acrescentou Dilma.

Cunha vai com a faca nos dentes?

Eduardo Cunha, presidente da Câmara dos Deputados: “É apenas jogo de espuma”
Eduardo Cunha, presidente da Câmara dos Deputados: “É apenas jogo de espuma”

Resta agora saber como se dará na prática reação do deptuado Eduardo Cunha à manobra de Renan Calheiros, que se jogou no colo do governo, contribuindo para certo isolamento do presidente da Câmara. Cunha corre o risco de pesar demais a mão na sua guerra contra o governo petista e se ver abandonado por seguidores fiéis.

Certamente que a reação do peemedebista também será pautada pelo resultado das manifestações deste domingo. Se o levante for expressivo, pode-se esperar que o presidente da Câmara se sentirá com moral para ir ao embate com a “faca nos dentes”, como se diz no jargão da política.

Após o anúncio da tal Agenda Brasil, Eduardo Cunha reagiu ao novo posicionamento de Renan Calheiros. Disse que é “jogo de espuma”. Afirmou que a Câmara está disposta a participar de qualquer coisa que seja para o bem do país. “Tem de saber que tipo de conteúdo. Até agora, vimos apenas um jogo de espuma, sem conteúdo concreto e utilizando parte da espuma que já vem da própria Câmara.”

Segundo Cunha, algumas das propostas apresentadas são de iniciativa da Câmara e já foram apreciadas na Casa. “Não precisa nem ter agenda. Propostas boas para o país sempre terão nosso apoio, assim como gostaríamos que nossas propostas que estão tramitando e que também são boas para o país, como a terceirização, já tivessem sido tratadas. De nossa parte, não há problema de analisar qualquer agenda ou tema.”

Cunha lembrou que o Congresso é bicameral, afirmando que as duas casas têm de funcionar. “Não dá para achar que vamos construir uma agenda única, que vamos votar e virar lei, porque não é assim que funciona. É preciso entender que não conseguimos costurar absolutamente nada se não envolvermos as duas casas.”