Presidenciável do PSL escorregou em declarações sobre a ONU e seus apoiadores defenderam o indefensável

Foto: Reprodução

“Vomitei aquilo sem falar de conselho de direitos humanos. Aí é onde houve uma falha minha”, disse o candidato a presidente Jair Bolsonaro (PSL) ao jornal “Folha de S. Paulo”, em referência a uma outra fala do presidenciável, que gerou polêmica após dar a entender que, se eleito, tiraria o Brasil da Organização das Nações Unidas (ONU). “Se eu for presidente, saio da ONU. Não serve para nada esta instituição.”

Imediatamente, os eleitores de Bolsonaro concordaram e apoiaram a decisão de sair das Nações Unidas — houve até quem fizesse vídeo na sede do órgão em Brasília pedindo que a ONU seja “demitida do governo brasileiro”, como é o caso da jornalista Elisa Robson, candidata a deputada federal pelo PRP.

Depois de o candidato à Presidência ter reconhecido a falha, seus apoiadores fizeram de tudo para achar alguma desculpa que justificasse. Nas redes sociais, Bolsonaro tem um verdadeiro exército de pessoas que o adotaram como político de estimação. Para eles, não importa o que o deputado federal pelo Rio de Janeiro fizer ou disser — ele sempre estará certo.

Aliás, abrindo um rápido parêntese, é também nas redes sociais onde se produz um dos mais impressionantes fenômenos da política brasileira atual: as pesquisas de intenção de voto mais confiáveis que as de institutos reconhecidos, que utilizam metodologia científica e registram os resultados no Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Mais bizarro do que isso é só o Cabo Daciolo, candidato a presidente pelo Patriota, que subiu um monte para se proteger de uma organização secreta que quer matá-lo.

ONU
A indignação em relação às Nações Unidas é até justificável em alguns aspectos, mas nada que chegue ao ponto de retirar o Brasil da instituição. Criada em outubro de 1945, após a Segunda Guerra Mundial, a ONU surgiu com o objetivo de promover a paz no mundo, substituindo a fracassada Liga das Nações. Contudo, há casos que podem pôr em cheque a sua credibilidade.

Em 2003, por exemplo, o Conselho de Segurança não conseguiu impedir a invasão estadunidense do Iraque, que desestabilizou o Oriente Médio e deu espaço para o surgimento de grupos terroristas, como o Estado Islâmico. Os Estados Unidos, por sua vez, não sofreram sanções — vale ressaltar que os EUA têm condições de bater de frente com as Nações Unidas, diferentemente do Brasil.

Ex-embaixador de Antígua e Barbuda na ONU, John Ashe presidiu a Assembleia Geral — o segundo órgão mais importante das Nações Unidas, atrás apenas do Conselho de Segurança — de setembro 2013 a setembro de 2014 e é acusado de receber propina de US$ 1,3 milhão de um bilionário chinês.

Além disso, foram registrados, em 2014, 79 casos de abuso sexual — um a cada quatro dias — de crianças e mulheres por parte de soldados das missões de paz da ONU no Haiti e na República Centro-Africana, operações chefiadas por Brasil e França, respectivamente. E o único punido foi Anders Kompass, funcionário das Nações Unidas responsável por, acredite, denunciar os escândalos.

Apesar de tudo isso, a ONU se faz necessária — ruim com ela, pior sem ela. Correspondente do jornal “O Estado de S. Paulo” em Genebra, na Suíça, desde 2002, o jornalista Jamil Chade, que cobre o órgão de perto, explica, em seu Twitter, o porquê: “A ONU alimenta 95 milhões de pessoas no mundo por dia e define regras que tocam a nossa vida diária, como emissões de CO2 e padrões técnicos. Ela falha muito mesmo. Mas isso é culpa dos governos, que não a querem forte. Dizer que não serve para nada não é exatamente correto”.

Venezuela
No tocante à situação dos venezuelanos que fogem do país vizinho rumo ao Brasil, Bolsonaro tem adotado uma postura sensata. O parlamentar se opõe ao fechamento da fronteira entre Venezuela e Roraima, discordando da governadora do Estado, Suely Campos (PP), e propõe a criação de um campo de refugiados, com o auxílio justamente da ONU.

“Quando você fala em refugiados você tem que buscar a ONU para apresentar uma alternativa”, declarou Bolsonaro à “Folha”. “Tem que abrir um campo de refugiados. Você não pode deixar o pessoal jogado na rua, deixar o pessoal fazendo necessidades fisiológicas na rua.”

De fato, o Brasil, que deve ter o papel de solucionar a crise na Venezuela — mas sem tomar lado, como manda as boas práticas da Política Externa brasileira —, tem que atuar junto à ONU para prestar os devidos serviços humanitários aos refugiados.

Em um mundo cada vez mais multipolar, isolar-se não é a solução. Bolsonaro parece estar aprendendo isso. Agora, falta seus eleitores também entenderem.