Centrão tem a força
10 dezembro 2016 às 09h07

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Ao “vetar” tucano na articulação política do governo, grupo faz o que sempre fez sobre todos os presidentes da era da redemocratização: pressão
No processo de elaboração da Constituição de 1988, foi formado um grupo chamado Centrão, para contrabalancear o viés por demais “esquerdista” que o texto constitucional ia assumindo. Com efeito, o grupo obteve êxito em muitos itens. Conseguiu piorar muita coisa, melhorou muitas outras. O maior êxito do grupo se deu na derrubada da proposta de parlamentarismo, que ia tomando corpo, que o Centrão derrubou e manteve o presidencialismo como forma de governo.
Desde então, e em todos os governos, o Centrão vem sendo protagonista em muitos momentos. Às vezes, a denominação não vem à baila, mas a atuação de dezenas de parlamentares sob a égide centrista é indiscutível. Observando que, muitas vezes, mesmo gente de partido de esquerda se alinha com ele.
O Centrão, como tal e assumidamente, voltou a dar o ar da graça.
O presidente Michel Temer adiou para esta semana a nomeação do substituto do peemedebista Geddel Vieira Lima (BA) na Secretaria de Governo. Até aí, nada demais. O problema é que Temer já tinha anunciado o tucano Antonio Imbassahy (BA) no cargo, que é nada mais nada menos que o articulador político do governo na Câmara dos Deputados, e como tal, importantíssimo para a aprovação das medidas de interesse do Palácio do Planalto.
E porque, afinal, Temer recuou na indicação, depois de ter feito o convite ao aliado tucano?
A razão é simples — e forte: reação contrária de setores da base aliada, mais especificamente o chamado Centrão. Essa reação põe sob perigo o avanço da reforma da Previdência, em fase de segunda votação na Câmara.
Para que o leitor tenha noção do que está em jogo, o Centrão é formado por PP, PR, PSD, PTB, PSC, PRB e SD, e disputa com o bloco dos tucanos (PSDB, DEM, PSB e PPS) o protagonismo na base governista. Os “centristas” consideram que a escolha de Imbassahy demonstra clara preferência do governo pelo presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-¬RJ) e um início de interferência concreta na eleição do próximo comandante da Casa, que ocorrerá em fevereiro.
De pronto, os centristas ameaçaram a reforma mais importante para o governo neste momento: a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) da Previdência, que o Planalto quer ver aprovada rapidinho nesta semana. E eles não têm maior preocupação em mostrar sutilezas na explicitação de seus interesses. Reportagem do “Valor” de sexta-feira, 9, traz declaração do presidente do Solidariedade e da Força Sindical, deputado Paulinho da Força (SP): “Se é assim vamos derrotar a admissibilidade da PEC [na CCJ]”.
Ao contrário do estilo “deixa-que-eu-chuto” de Paulinho, outros líderes do Centrão são mais amenos. A reportagem registra que líder do PSD, Rogério Rosso (DF) disse que o partido votaria de qualquer forma a favor da PEC da Previdência, mas que confia que o presidente Temer vai seguir o caminho que unirá a base. “Essa escolha mostra que o Planalto tem um candidato e, se é assim, me avisem que vou tirar minha candidatura [à Presidência da Câmara] porque não vou brigar com o governo”, disse.
O grupo teria avaliado que o governo fechou um acordo pela reeleição de Maia para a presidência da Câmara. Pelo regimento da Casa, Maia não pode disputar a reeleição, mas o democrata tenta uma manobra jurídica para continuar no cargo no próximo biênio — ele vai alegar que está em um mandato tampão; caberá ao Supremo Tribunal Federal (STF), em última instância, julgar o impedimento. Nesse arranjo, o PMDB ficaria com a 1ª vice-presidência.
Maia, que já teria acertado o apoio do PSDB e DEM, está costurando aliança com a oposição; a reportagem informa que ele jantou com o PDT na terça-feira, negocia a adesão do PSB (que está dividido) e busca traições no próprio Centrão.
O Centrão aposta nessa instabilidade para ganhar terreno. Além de Rosso, o líder do PTB, o goiano Jovair Arantes, é pré-candidato e hoje favorito dentro do grupo, caso o PP não lance um nome.
Com a reação dos centristas, o governo se mexeu. O ministro-chefe da Casa Civil, Eliseu Padilha (PMDB), entrou em contato com líderes do grupo para dizer que o presidente Temer “desmentia” o acerto com o PSDB. Não houve manifestação pública e a nomeação foi adiada até, pelo menos, a análise da PEC da Previdência na CCJ na quarta-feira.
A primeira missão de Imbassahy na articulação política será, justamente, “dar um gás” na votação da reforma da Previdência Social na Câmara. O convite ao baiano não foi por acaso. Michel Temer puxa de vez os tucanos para o núcleo do governo — há poucos dias o PSDB deu sinais de recuo —, e retira Imbassahy da disputa pela presidência da Câmara, uma vez que o tucano é a alternativa nos neogovernistas se Maia não se viabilizar.
A variável “tucano na articulação política” vem sendo considerada há duas semanas, quando Temer almoçou com a cúpula do PSDB no Palácio da Alvorada, do qual participou o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso. Na semana passada, durante um voo para São Paulo, em que dirigentes tucanos dividiram a cabine presidencial com Temer, o acordo foi selado.
Agora, é ver como o Palácio do Planalto vai lidar com a pressão do Centrão.