Márcio Moreira Alves e o AI-5: o discurso que tornou a dita ainda mais dura
02 setembro 2023 às 10h31
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Márcio Moreira Alves era deputado federal pela Guanabara. Ele era do MDB, partido de oposição aos militares que estavam no poder. No dia 2 de setembro de 1968, ele foi até a tribuna da Câmara dos Deputados e fez um discurso que marcaria o rumo da ditadura.
Inconformado com a invasão militar às universidades de Brasília e em Minas Gerais bem como as primeiras notícias de torturas, Márcio Moreira Alves aproveitou as proximidades dos festejos da Independência do Brasil e pediu à população para boicotar os desfiles do 7 de setembro e que as moças não namorassem os jovens oficiais.
O discurso foi considerado ofensivo pela linha dura militar. O presidente Arthur da Costa e Silva foi pressionado a cassar o mandato dele. O governo pediu autorização para processar o deputado, mas o pedido foi negado pela Câmara em votação ocorrida em 12 de dezembro de 1968.
No dia seguinte, Costa e Silva assinava o quinto Ato Institucional, que fechou o Congresso e, enfim, cassou o mandato de Márcio Moreira Alves.
Confira o discurso de Márcio Moreira Alves
“Senhor presidente, Senhores deputados. Todos reconhecem, ou dizem reconhecer, que a maioria das Forças Armadas não compactua com a cúpula militarista, que perpetra violências e mantem este país sob regime de opressão. Creio haver chegado, após os acontecimentos de Brasília, o grande momento da união pela democracia. Este é também o momento do boicote. As mães brasileiras já se manifestaram. Todas as classes sociais clamam por esse repúdio à violência.
“No entanto, isso não basta. É preciso que se estabeleça, sobretudo por parte das mulheres, como já começou a se estabelecer nesta Casa por parte das mulheres parlamentares da Arena, o boicote ao militarismo. Vem aí o Sete de Setembro. As cúpulas militaristas procuram explorar o sentimento profundo de patriotismo do povo e pedirão aos colégios que desfilem juntos com os algozes dos estudantes. Seria necessário que cada pai e cada mãe se compenetrasse de que a presença de seus filhos nesse desfile é um auxílio aos carrascos que os espancam e metralham nas ruas. Portanto, que cada um boicote esse desfile.
“Esse boicote pode passar também às moças, aquelas que dançam com cadetes e namoram jovens oficiais. Seria preciso fazer hoje no Brasil com que as mulheres de 1968 repetissem as paulistas da Guerra dos Emboabas e recusassem a entrada à porta de sua casa aqueles que vilipendiam a Nação. Recusassem a aceitar aqueles que silenciam e, portanto, se acumpliciam.
“Discordar em silêncio pouco adianta. Necessário se torna agir contra os que abusam das Forças Armadas falando e agindo em seu nome. Creio senhor presidente, que é possível resolver esta farsa, essa democratura, esse falso entendimento pelo boicote.
“Enquanto não se pronunciarem os silenciosos, todo e qualquer contato entre civis e militares deve cessar, porque só assim conseguiremos fazer com que este país volte à democracia. Só assim conseguiremos fazer com que os silenciosos que não compactuam com os desmandos de seus chefes, sigam o magnífico exemplo dos 14 oficiais de Crateus que tiveram a coragem e a hombridade de publicamente se manifestarem contra um ato ilegal e arbitrário de seus superiores.”