Efeitos jurídicos da extradição de Carla Zambelli: condição de foragida, desdobramentos legais e fundamentos normativos

22 junho 2025 às 11h56

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No dia 4 de junho de 2025, o ministro Alexandre de Moraes, do STF, atendeu ao pedido da PGR e decretou a prisão preventiva de Carla Zambelli, determinando ainda sua inclusão na lista vermelha da Interpol. Um oficial de Justiça foi enviado ao endereço que ela declarou, mas, não a encontrando, foi declarada foragida.
Importante distinção legal: até a expedição do mandado de prisão, sua saída do Brasil não constituía fuga formal, já que não havia restrição judicial nem mandado em vigor. Contudo, após a expedição do mandado, a manutenção da sua permanência no exterior caracteriza a condição de foragida, com efeitos práticos imediatos: Pedido de busca e apreensão internacional via Interpol (difusão vermelha); Possibilidade de decretar bloqueio de bens e passaportes, nacionais e internacionais e Intensificação da cooperação internacional com vistas à localização e retorno compulsório.
O chamado processo de extradição possui contornos jurídicos importantes. A Itália, país que possivelmente está foragida, o firmaram tratados bilaterais em 1989 (tratado este ratificado em 1993) que permitem a extradição de condenados por crimes comuns com pena mínima superior a 1 ano. A cidadania italiana confere à Itália a faculdade (não obrigação) de extraditar seus nacionais. A Constituição italiana permite extradição de nacionais por convenções internacionais, exceto em crimes políticos (art. 26).
Existem precedentes judiciais (casos Pizzolato em 2015 e Caciola em 2008) demonstram que dupla cidadania não impede a extradição, desde que o crime seja comum. Já nos Estados Unidos: o tratado vigente desde 1965 não abrange crimes de invasão de sistema, fonte do delito atribuído à parlamentar (invasão ao sistema do CNJ). No entanto, a Convenção de Budapeste sobre crimes cibernéticos pode permitir solicitação de cooperação e prisão provisória.
O procedimento do pedido de extradição até a decisão italiana, a justiça analisará: Natureza do crime: se político ou comum. No caso, trata-se de crime comum (invasão de sistema e falsidade ideológica), sem indícios de motivação política; a Garantia de direitos ao extraditando, se a extradição constitui “obrigação” ou “faculdade”, no caso italiano, remete a uma faculdade, mas precedentes (Pizzolato) mostram que, em caso favorável, ela pode ser aceita.
Caso a extradição seja recusada com base na dupla cidadania, o tratado prevê que a Itália pode processar ou executar pena em seu território, desde que fornecidos os elementos da condenação avisada pelo Brasil.
Esse processo de direito internacional produz efeitos jurídicos no Brasil, pois, enquanto for considerada foragida, Zambelli está sujeita a Prisão imediata ao ser localizada, em qualquer jurisdição que acolha a difusão vermelha da Interpol; bloqueio de bens e passaportes (válidos e diplomáticos); perda de direitos políticos (inelegibilidade pela Lei da Ficha Limpa), perda do mandato eletivo, além da suspensão desses direitos até eventual trânsito em julgado.
Caso a extradição seja concretizada ou provada impossibilidade, a execução da pena (10 anos de reclusão em regime inicialmente fechado) passará a correr sob a jurisdição brasileira ou sob coordenação internacional. Além repercussões político-jurídicas, a condição de foragida reforça a percepção de que há risco concreto de evasão, justificando as medidas da PGR e do STF. A extradição bem-sucedida fortalece o arcabouço da cooperação bilateral e demarca que dupla cidadania não é escudo absoluto para crimes comuns.
Já em caso de negativa italiana, gerará conflito de jurisdição, mas não impunidade: será possível cumprimento da pena na Itália, com base no mesmo tratado. O caso de Carla Zambelli ilustra um claro marco na aplicação eficiente dos instrumentos de cooperação penal internacional no Brasil. A condição de foragida, formalizada após o mandado de prisão expedido em 4 de junho de 2025, fortalece os fundamentos para executividade e extradição. Com crimes claramente tipificados como comuns, a esperança brasileira de retorno por meios legais está respaldada tanto pelo precedente Pizzolato quanto por tratados internacionais ‑ especialmente com a Itália.
É imprescindível que o sistema jurídico brasileiro atue com celeridade e solidez na solicitação diplomática, acompanhando os trâmites em ambos os polos (Itália e eventuais Estados Unidos). Caso a Itália opte por rejeitar a extradição, o caminho está aberto para a completa execução da pena nos moldes do tratado. O cenário exige vigilância constante de seu patrono, visando assegurar que todos os meios de cooperação e solicitação sejam plenamente utilizados, daí a importância da atuação advocatícia diuturna e estrategicamente embasada.
DANÚBIO CARDOSO REMY ROMANO FRAUZINO é advogado, mestre em Direito Público e especialista em Direito Eleitoral.