A pianista Maria Josephina Mignone, nos deixou no dia 18 de julho de 2024, aos 101 anos. Nascida em 25 de março de 1923, em Belém do Pará, Maria Josephina teve uma vida rica e inspiradora, marcada pelo amor à música e pela dedicação ao legado de seu marido, o compositor Francisco Mignone (1897 – 1976).

Maria Josephina descobriu seu amor pelo piano ainda na infância, enquanto explorava o piano antigo da fazenda de sua família na ilha de Carnapijó. Essa ilha, localizada em frente à ilha do Marajó, era um local onde a natureza exuberante despertou nela grande sensibilidade. O piano, herança de sua avó, Josephina Maria, foi o primeiro onde começou sua vida musical.

Sua paixão pelo piano se intensificou ao iniciar os estudos , em Belém, no Instituto Gentil Bittencourt e no Conservatório Carlos Gomes. Foi lá que ela começou a desenvolver sua técnica e interpretação. A dedicação de Maria Josephina ao piano foi notável desde o início, e sua família reconheceu seu talento, proporcionando-lhe as oportunidades necessárias para aprimorar suas habilidades. Em um dos concursos em que participou e venceu, ela recebeu, como prêmio, uma bolsa para ter aulas no Rio de Janeiro com Magda Tagliaferro e Arnaldo Estrella, vindo depois a desenvolver uma carreira tanto como concertista quanto como professora.

Francisco e Maria Josephina Mignone | Foto: Reprodução

No Rio de Janeiro, durante um recital na Academia Lorenzo Fernandez, Maria Josephina conheceu Francisco Mignone, com quem se casou em 1964. A partir desse momento, suas vidas pessoais e profissionais se entrelaçaram para sempre. O casal formou o Duo Mignone, apresentando-se em concertos a dois pianos e gravando inúmeras obras juntos – este duo depois continuaria com Miriam Ramos, após o falecimento de Mignone. Maria Josephina tornou-se a principal intérprete das composições de Mignone, dedicando-se a manter viva a obra do marido.

Após a morte de Mignone em 1986, Josephina contribuiu fortemente para a valorização e a divulgação da obra de Mignone. Ela continuou sua carreira como solista, realizando gravações históricas de obras de Mignone como as 24 Valsas brasileiras, as 12 Valsas de esquina, as 12 Valsas-choro, os 17 Choros para piano, além das Fantasias brasileiras No. 3 e No.4 e do importantíssimo Concerto para piano e orquestra. Também coordenou os Concertos FINEP por vinte anos e dirigiu o Centro Cultural Francisco Mignone. Sua contribuição para a música brasileira é inestimável, e sua dedicação inspirou muitas gerações de músicos.

Maria Josephina Mignone | Foto: Reprodução

Em 2023, aos 100 anos, Maria Josephina ainda praticava piano diariamente, mantendo viva a paixão pelo instrumento que marcou sua infância e toda sua vida profissional. Residente em São Paulo, ela vivia com sua filha Anete Rubin, advogada especializada em direitos autorais, que restaurou inúmeras gravações e lançou-as em CDs e nas plataformas digitais na “Coleção Mignone”, além de coordenar o lançamento de álbuns de partituras de Francisco Mignone pela editora Tipografia Musical, que contaram com a revisão da própria Maria Josephina.

A pianista celebrou seu centenário com a mesma dedicação à música que sempre a caracterizou – sua vida foi um exemplo de paixão, determinação e amor pelo piano.

Maria Josephina deixa um legado duradouro que continuará a inspirar a todos aqueles que tiverem o privilégio de ouvir suas interpretações e aprender com seu trabalho.

Ouviremos a pianista Maria Josephina Mignone interpretando a Valsa de Esquina nº 12, de Francisco Mignone.

Compostas entre 1938 e 1943 as 12 Valsas de Esquina de Francisco Mignone (cada um em um das 12 tonalidades menores) refletem a preocupação do compositor a atribuir brasilidade à valsa.

Como diz o próprio Mignone, em depoimento de 1968 ao MIS/RJ:

“Comecei a escrever, mas essas Valsas de Esquina, que parecem escritas de um jato só, algumas levaram meses até eu conseguir elaborar e tornar simples, sem parecer uma coisa vazia. Foi muito difícil.”

Observe a presença da música urbana das serestas, choros e valsas nessa obra. Mignone foi perfeito ao explorar as ideologias nacionalistas de forma criativa e original em suas “12 Valsas de Esquina”, “12 Valsas Choro” e “24 Valsas Brasileiras”.