Dom Pedro I: seu coração e sua vida musical
20 julho 2022 às 09h22
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Sabe-se que Dom Pedro I (1798-1834) tinha grande apreço pelo Brasil, já que aqui viveu grande parte de sua breve existência. Dom Pedro I morreu com apenas 36 Anos.
Estamos em plena celebração dos 200 anos da “Independência do Brasil” (1822 – 2022). Além dos questionamentos e reflexões sobre a “independência” outro assunto que paira nas discussões nas redes, é a vinda ao Brasil do coração de Dom Pedro I, guardado a seu pedido na cidade do Porto em Portugal.
O coração de Pedro I foi depositado na capela-mor da igreja da Lapa, Porto (Portugal)
O governo de Portugal anunciou recentemente ter aceitado a solicitação de que o coração de Dom Pedro I fosse emprestado ao Brasil para as comemorações do bicentenário de nossa “independência”.
Será isso necessário? Temos uma independência a comemorar? Polêmica a parte, falaremos da música na vida de Dom Pedro I e sua primeira esposa, princesa Leopoldina.
Aos vinte anos a princesa Leopoldina (1797 – 1826) casou-se por procuração com Pedro de Alcântara (1798-1834), futuro D. Pedro I do Brasil e Pedro IV de Portugal.
Naquela época, o casamento entre nobres significava um tratado de relações exteriores, na realidade visando interesses políticos e econômicos entre os países envolvidos. Foi pensando em uma boa aliança com a Áustria que D. João VI decidiu casar seu filho com uma arquiduquesa de uma das famílias imperiais mais tradicionais, ricas e poderosas da Europa.
Embora a vida musical de Dom Pedro I não seja muito divulgada, sua ligação com as artes era bem acentuada. Seu professor de música em Lisboa, Marcos Portugal (1762 – 1830), chega ao Rio de Janeiro três anos após a chegada da família real, sendo músico de grande prestígio na corte de Dom João VI.
Já o responsável pela formação musical de Leopoldina, na Áustria, foi o pianista, professor e compositor nascido na Boêmia (atual República Tcheca), Leopold Koželuh (1747-1818), um dos mais destacados compositores tchecos da Viena do século XVIII.
O gosto pela música tanto da princesa como do jovem Pedro foi o primeiro elo de interesse do casal. Os jovens acompanhavam regularmente peças, óperas e concertos, sendo incansáveis na promoção de apresentações musicais na corte.
Na habitação real havia uma sala de música com três pianos, ambiente muito utilizado para o convívio do príncipe e da princesa. A princesa Leopoldina relatou em carta escrita à tia Maria Amélia em 24 de janeiro de 1818:
“Durante o dia, estou sempre ocupada a escrever, ler e tocar música; como meu esposo toca muito bem quase todos os instrumentos, costumo acompanhá-lo no piano e, desta maneira, tenho a satisfação de estar sempre perto da pessoa querida”. (KANN, 2006, p. 237).
Em outra carta, escrita a Rodrigo Navarro de Andrade, amigo da família, Leopoldina revelou:
“Estou muito ocupada; como o Príncipe gosta muito de música e de leitura; nosso dia fica todo ocupado”.
(KANN, 2006, p. 323).
Leopoldina, ao se casar com o Príncipe dom Pedro I não sabia muito bem o que a esperava no Novo Mundo, a princesa trouxe então para o Brasil além de grande comitiva composta de pintores, cientistas e botânicos europeus, um grande acervo de partituras, hoje pertencentes a “Coleção Thereza Christina Maria” depositada na Biblioteca Nacional do Rio de Janeiro.
Muito amada pelos brasileiros, Leopoldina viveu, no Rio de Janeiro, em uma corte pobre e repleta de problemas. Culta, preparada e caridosa, a princesa austríaca foi retratada, até pouco tempo, como uma mulher melancólica e humilhada com os escândalos e relações extraconjugais do príncipe.
A historiografia mais recente tem reivindicado a Maria Leopoldina uma imagem menos passiva na história nacional. Muito além de uma princesa acanhada e melancólica, Leopoldina teve grande destaque na cultura e na política brasileira.
Incansável na promoção de apresentações musicais na corte, particularmente das obras dos compositores de sua terra natal, a Áustria, a Imperatriz Leopoldina não só era patrona da música, mas também tinha muito interesse em praticá-la. Ao trazer para o Brasil seu acervo de partituras, e praticar estas obras em terras brasileiras, a Princesa Leopoldina contribuiu fortemente para a mudança da forma de compor de compositores que viveram e ou nasceram no Brasil deste tempo histórico.
Outro importante compositor que também fez parte dessa história, é o austríaco Sigismund Neukomm (1778-1858), também ministrou aulas para o casal de príncipes, e, produziu, na corte de Dom João VI no Rio de Janeiro, inúmeras obras musicas.
Ouviremos do compositor Neukomm – as Variações Kozeluch para Violoncelo e piano.
Observe que essa obra retrata a relação entre os dois dos professores da Princesa Leopoldina. Kozeluch, seu professor na Áustria, e, Neukomm professor no Rio de Janeiro. Segundo o pesquisador brasileiro Max Uriarte, “Neukomm escreveu as variações sobre um tema de Kozeluch no Rio de Janeiro em 1817 a pedido da princesa Maria Leopoldina, futura imperatriz do Brasi”l. (…)A parte de violoncelo é intencionalmente de secundária importância (tem um único solo, na segunda variação), estando a música mais concentrada na parte de piano. É possível também que Leopoldina tenha executado a obra com seu marido D. Pedro I, futuro imperador do Brasil, ao violoncelo”.