A luta das mulheres compositoras por equidade e respeito na sociedade

02 julho 2024 às 09h48

COMPARTILHAR
A luta das mulheres por equidade e respeito na sociedade data de séculos atrás. Desde as bruxas perseguidas na Idade Média até as sufragistas que foram às ruas para conquistar o direito ao voto, é impossível separar os períodos importantes da humanidade sem destacar as conquistas feministas no passar dos anos.
O combate à estrutura patriarcal é sim muito mais discutido hoje em dia. É inegável lembrar o quanto as mulheres lutaram e esperaram por essa liberdade para falar abertamente sobre suas vontades, necessidades e escolhas.
Embora a música fosse vista como um “atrativo a mais” para as mulheres “de boa família” exclui-las de atividades musicais profissionais era algo considerado completamente normal até a pouco tempo.
Num passado recente, orquestras como a Filarmônica de Berlim, a Filarmônica de Viena e a Filarmônica Tcheca não permitiam a entrada de mulheres em seu corpo efetivo.

No século XIX, ser compositora era quase inimaginável. Segundo a pianista e compositora Clara Schumann:
“Acreditei que tinha talento criativo, mas desisti desta ideia; uma mulher não pode desejar compor – nunca houve nenhuma capaz disso. E eu serei a primeira? Seria arrogância minha acreditar nisso.”
Clara Schumann passou para história, durante anos, como a “esposa pianista de Robert Schumann”.
Outra compositora de destaque é Amy Beach, nascida nos Estados Unidos, 1867, foi uma notável prodígio. Filha da talentosa pianista e cantora amadora Clara Imogene, Amy cantava com sua mãe aos 2 anos de idade. Aos 6 anos, começou a ter aulas de piano e, aos 7, tocava sonatas de Beethoven e composições próprias.
Não diferentemente de outras mulheres de seu tempo, Amy enfrentou muitos obstáculos de gênero ao longo de sua carreira. Naquela época, carreiras para mulheres fora de casa não eram consideradas práticas aceitáveis, razão pela qual sua família relutou no início a permitir seu crescimento como pianista.
No que diz respeito à sua carreira de compositora, ela também enfrentou dificuldades: enquanto compositores homens norte-americanos costumavam viajar para a Europa para receber aulas particulares de composição, foi recomendado que a artista estudasse como autodidata. Então, Amy dedicou-se a uma imersão em repertórios de orquestra, comparando partituras com performances que ouvia na Boston Symphony.
Aos 18 anos de idade, Amy casou-se com o médico Henry Beach. Após o casamento, ele decidiu restringir seus recitais públicos, de modo a se alinhar com as expectativas de uma esposa da alta classe norte-americana.
Após a morte de sua mãe e marido, ela pôde recomeçar sua carreira e viajou à Europa em turnê de 1911 a 1914. Ao longo de sua vida, Amy provou que as mulheres podem atuar com alto nível em qualquer área. Consequentemente, ela logo se tornou um emblema da luta feminista: durante o movimento sufragista, a artista era frequentemente citada como símbolo das conquistas das mulheres.
Amy Beach faleceu em 1944, em Nova York. Apesar de seu vasto repertório e conquistas, a artista foi rapidamente esquecida. Não por acaso, isso acontece com frequência.
Em 1990, compositoras trouxeram seu trabalho de volta à luz e homenagearam Amy por sua bravura em um tempo em que as mulheres sofriam grande opressão. A artista recebeu um lugar no “The Shell”, parede que grava os nomes dos artistas mais influentes. Em 1999, ela também recebeu um lugar de prestígio no American Classical Music Hall of Fame.

Amy viveu em um tempo em que as mulheres opinativas sofriam grandes preconceitos. A visão norte-americana acerca das compositoras centrava-se no fato de que elas não poderiam produzir um trabalho musical permanente. Um exemplo dessa visão é a declaração d o compositor checo Antonín Dvorak, em 1892, ao chegar aos Estados Unidos:
“Aqui todas as mulheres tocam. É bom, é legal. Mas eu receio que as damas não possam nos ajudar muito. Elas não têm o poder criativo”.
Citando dezenas de compositoras, Beach respondeu:
“Mais mulheres estão interessadas no estudo sério da ciência da música e da arte do que nunca”.
Em breve, Beach provaria que Dvorak estava errado. Ela não só foi capaz de produzir trabalhos de larga escala em um curto período de tempo, como também a se preparou para performances tão logo as composições dela estavam finalizadas. Como pianista, ela possuía uma memória extraordinária e uma técnica virtuosa. Como compositora Amy tinha um estilo maduro influenciado pelo romantismo e pela música folclórica escocesa e irlandesa.
A história de Amy Beach, assim como a de muitas outras compositoras, é um testemunho da luta e resiliência das mulheres na música. É essencial lembrar e celebrar essas conquistas para garantir que o legado dessas artistas continue a inspirar futuras gerações.
Ouviremos de Amy Beach, Sinfonia Gaélica, a primeira obra orquestral completa publicada por uma compositora americana, em 1896. Nessa gravação com a “Portland Youth Philharmonic” sob a regência do americano David Hattner.
Observe que a sinfonia de Beach incorpora elementos da música celta e da tradição gaélica. Amy funde temas e os trabalha a partir de uma rica orquestração, criando uma paisagem sonora que evoca acima de tudo um caráter nostálgico.